Pesquisar
Pesquisar

Guatemala: Arévalo inicia presidência disposto a reconstruir democracia com justiça social

“Povo guatemalteco está oferecendo à comunidade mundial um exemplo de convicção e resiliência democrática”, afirmou novo líder nesta segunda (15)
Victoria Korn
Estratégia.la
Cidade da Guatemala

Tradução:

Nesta segunda-feira (15), depois de mais de dez horas de atraso da cerimônia, Arévalo entrou no Teatro Nacional Miguel Ángel Asturias, onde se realizou a cerimônia de posse, ao som do concerto para violino e orquestra “A Primavera”, do compositor italiano Antonio Vivaldi. Durante sua campanha prometeu a chegada de uma “nova primavera”, como a que protagonizou o Governo de seu pai, Juan José Arévalo, entre 1946 e 1951.

A posse da dupla Arévalo-Herrera não é vista com a sossegada esperança de um governo melhor, e sim com a convicção generalizada de que começou uma nova era na Guatemala, sentimento que corre o risco da desilusão precoce ante a ferocidade dos derrotados do chamado Pacto de Corruptos, que buscarão obstaculizar e depor a dupla Arévalo-Herrera por vias judiciais e legislativas.

“É graças aos jovens da Guatemala, que não perderam a esperança, que hoje posso falar-lhes neste pódio”, proclamou o acadêmico e líder político, que agradeceu aos povos indígenas por defender a democracia da Guatemala.

“O povo da Guatemala demonstrou sua sabedoria, e instituições como a Corte de Constitucionalidade e o Tribunal Superior Eleitoral protegeram o desejo soberano dos guatemaltecos de viver em democracia”, disse em seu primeiro discurso o presidente.

Assista na TV Diálogos do Sul

O novo presidente disse que demonstraram que hoje a democracia da Guatemala tem a força necessária para resistir, dizendo que, com vontade, pode-se transformar o panorama político do país. “Representa um passo firme para um futuro onde a participação cidadã e a mudança positiva prevaleçam”, afirmou Arévalo, quem instou a trabalhar em unidade.

“Este momento não só representa uma conquista pessoal, como um passo firme para um futuro onde a participação cidadã e a mudança positiva prevaleçam. Esta honra é fruto da confiança esperançosa e sincera que milhões de guatemaltecos depositaram em nosso projeto coletivo. Reflete a fé que as amplas maiorias de nosso país têm em nossa capacidade de superar desafios e avançar para um futuro mais promissor”, afirmou o novo mandatário.

Arévalo recebeu a faixa presidencial das mãos do presidente do Congresso, Samuel Pérez Álvarez, também eleito para o cargo neste domingo, devido a que o mandatário que sai, Alejandro Giammattei, ausentou-se da cerimônia argumentando que devia entregar seu posto o mais tardar antes da meia-noite do domingo e por isso enviou ao Congresso os símbolos institucionais por meio de sua secretária.

Continua após a imagem

“Povo guatemalteco está oferecendo à comunidade mundial um exemplo de convicção e resiliência democrática”, afirmou novo líder nesta segunda (15)

Estratégia.la
Arévalo é apoiado por centenas de milhares de cidadãos, dispostos a encarar a violência e as intimidações




Solidariedade e defesa da democracia

O presidente agradeceu as nações irmãs “pela solidariedade” e “aqueles que nos acompanharam em defesa das instituições democráticas e da preservação do estado de Direito”. “O apoio internacional foi muito útil para sustentar a democracia. Durante os últimos meses enfrentamos complexas tensões que levaram a crer que estávamos destinados a um retrocesso autoritário”, disse.

“Nunca mais o autoritarismo, nunca mais a violência ou a arbitrariedade para manter agendas particulares. Nunca mais se dobrarão as instituições à corrupção e à impunidade”, assegurou. “Enfrentamos novos modelos autoritários, de cooptação de instituições, que buscam trair os princípios de cada uma. Esta é a luta que estamos enfrentando na Guatemala e em outros lugares da América Central e do mundo. Enfrentam-se novas e velhas batalhas de autoritarismo”, expôs.

“Orgulha-me afirmar que o povo da Guatemala está oferecendo à comunidade mundial um exemplo de convicção e resiliência democrática”, afirmou. “Abracemos nossas diferenças e reconheçamos que estas contribuem com nossa sociedade. É hora de unidade, diálogo e paz. É uma oportunidade de acabar com décadas de abandono histórico. Retomar acordos de paz, que uma classe política egoísta destruiu”, enfatizou.

“Nossa proposta de governo em uma fórmula simples: não pode haver democracia sem justiça social, e esta não pode prevalecer sem a democracia. Apesar de sua simplicidade, esta fórmula esteve notoriamente ausente na administração governamental em grande parte de nossa história”, afirmou.

E assegurou que “o Estado assumirá seu papel histórico de gerar desenvolvimento em aspectos essenciais como a eletricidade, o saneamento ambiental, a educação; e a geração destas coisas criará milhares de novos empregos em todo o território nacional”.

Para transformar Guatemala, Semilla deve abraçar luta indígena e camponesa

Arévalo e Pérez Álvarez são dois dos fundadores do Movimento Semilla (Semente), o partido nascido das manifestações contra a corrupção registradas no país centroamericano durante 2015 e que culminaram com a queda do governo de Otto Pérez Molina, atualmente na prisão.


Um longo caminho

Desde que obteve o segundo lugar no primeiro turno das eleições presidenciais, Arévalo e o Movimento Semilla foram perseguidos pelo Ministério Público e pelos magistrados do Tribunal Superior Eleitoral, com o objetivo de reverter sua vitória nas urnas.

A posse estava programada para a tarde de domingo, mas atrasou mais de 10 horas, e vários chefes de Estado, entre eles o rei da Espanha, Felipe VI, e o presidente do Chile, Gabriel Boric, deixaram o país sem poder presenciar a cerimônia.

As manobras dilatatórias do chamado pacto de corruptos no Congresso que sai provocou um atraso que desencadeou protestos nas ruas e uma declaração conjunta de chefes de Estado e altas autoridades de outros países vindos para o ato de inauguração, depois de meses de uma ofensiva judicial atribuída a sua promessa de combater os corruptos da elite político-econômica desta nação centro-americana.

Com a mão esquerda sobre a Constituição e a direita levantada, Arévalo jurou como presidente da Guatemala às 0:20 horas de hoje para o período 2024-2028, o que foi seguido por uma nutrida ovação, e na sequência Karin Larisa Herrera fez o mesmo, como vicepresidenta.

Chegaram à Guatemala mais de 60 delegações internacionais, entre elas, a da Colômbia, com o presidente Gustavo Petro; do Chile, com Gabriel Boric; da Costa Rica, com Rodrigo Chaves, e do México, encabeçada pela chanceler Alicia Bárcena, assim como representantes dos Estados Unidos, da Organização das Nações Unidas e da União Europeia.


Samuel Pérez é o novo presidente do Legislativo

Após ásperos debates, a chapa encabeçada por Samuel Pérez, do Semilla, ganhou por 92 votos a presidência do Legislativo, a que se seguiu uma cascata de impugnações dos congressistas do chamado Pacto de corruptos. O resultado foi celebrado com o grito de “Sim, é possível” no Teatro Nacional, onde já estava Arévalo pronto para a cerimônia de juramentação; milhares nas ruas festejaram igualmente.

O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, leu para a imprensa uma declaração conjunta de chefes de Estado, chanceleres e altos funcionários de outros governos que foram para a posse: “Fazemos um apelo ao Congresso da República para que cumpra seu mandato constitucional de entregar o poder como exige a Constituição no dia de hoje ao presidente eleito, Bernardo Arévalo, e à vicepresidenta eleita, Karin Herrera, disse Almagro.

O atraso do Congresso estimulou os protestos no exterior do recinto, para onde se dirigiram grupos de camponeses que foram à capital para acompanhar a posse e defender a democracia.

Os manifestantes, que denunciaram uma tentativa de golpe de Estado, abriram passagem a empurrões entre a barreira policial para aproximar-se do Congresso, e enfrentaram dezenas de policiais que mantinham dois cercos na traseira do Palácio Legislativo, no centro histórico da cidade da Guatemala.

Finalmente, o pacto de corruptos teve que render-se à evidência de que o novo mandatário é apoiado por centenas de milhares de cidadãos, dispostos a encarar a violência e as intimidações para defender o que há um ano parecia impensável: a chegada à presidência de um personagem e de um projeto sem vínculos com as máfias que saquearam a Guatemala, e que tem autoridade moral para empreender a luta contra a impunidade.

A tarefa não será fácil. Arévalo recebe um país devastado pelo mais dilacerante racismo, onde a maioria indígena está excluída da educação, do governo, dos meios de comunicação, dos postos de direção; relegada à agricultura de sobrevivência, ao comércio informal, a ofícios e trabalhos mal remunerados e ao serviço doméstico de mestiços e brancos.

Durante as multitudinárias manifestações contra as tentativas de subverter as eleições pôde ver-se uma clara imagem do abismo que separa o punhado de privilegiados do resto de seus compatriotas: os habitantes dos bairros mais exclusivos postaram guardas armados sobre os muros por medo de que suas casas fossem invadidas pela turba.

A meta das novas autoridades é dotar o país de uma autêntica democracia, saldar a dívida histórica com os povos indígenas e fincar as bases para o desenvolvimento econômico da nação, em um contexto de violência criminosa, fanatismo religioso, debilidade de um aparato estatal reduzido a ser braço repressor pelos governos neoliberais, um setor industrial débil e monopolista, concentração extrema da riqueza e recursos naturais devastados ou entregues ao capital financeiro.

Victoria Korn | Jornalista venezuelana, analista de temas de América Central e Caribe,  associada ao Centro Latino-americano de Análise Estratégica (CLAE, www.estrategia.la)
Tradução: Ana Corbisier


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Assista na TV Diálogos do Sul


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Victoria Korn

LEIA tAMBÉM

$LIBRA criptofraude de Milei enfurece ricaços, afasta aliados e mune oposição
Milei na corda bomba: criptofraude com $LIBRA enfurece ricaços, afasta aliados e mune oposição
Inspirado por Nova Zelândia, movimento quer barrar entrada de genocidas israelenses no Chile
Inspirado por Nova Zelândia, movimento quer barrar entrada de genocidas israelenses no Chile
Pensei que estava só, mas somos muitas mães de falsos positivos se unem por justiça na Colômbia
"Pensei que estava só, mas somos muitas": mães de "falsos positivos" se unem por justiça na Colômbia
Diretor de “Operação Condor” vai solicitar reabertura de investigação sobre morte de João Goulart
Diretor de “Operação Condor” vai solicitar reabertura de investigação sobre morte de João Goulart