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Guerra na Ucrânia: acordo para exportar grãos é repactuado com ajuda de Turquia e ONU

Iniciativa alimentar do mar Negro permite à Ucrânia exportar cereais a partir de três portos; Rússia trabalha para desbloquear fertilizantes
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

O único consenso que até agora registra a guerra entre a Rússia e a Ucrânia — a chamada iniciativa alimentar do mar Negro, que permite exportar os grãos ucranianos a partir de três portos — foi  mantido para os seguintes quatro meses, com a mediação da Turquia e da Organização das Nações Unidas (ONU). 

Após semanas de incerteza sobre se seria renovado ou não o pacto dos cereais, cujo prazo de vigência vence em 19 de novembro, os quatro assinantes do acordo confirmaram sua prorrogação para os próximos 120 dias. 

Em ordem cronológica, pela Ucrânia o anunciou o presidente Volodymir Zelensky; pela Turquia, o presidente Recep Tayyip Erdogan; pela ONU, secretário-geral António Guterres; e pela Rússia, a chancelaria, mediante um comunicado.

Ante a ameaça de fome nos países mais pobres do mundo, a ampliação do pacto é uma excelente notícia já que, no meio das hostilidades entre Moscou e Kiev e o mar Negro fechado à navegação, deixa aberta a via que, desde que entrou em vigor em julho último, tornou possível levar para 38 países cerca de 11 milhões de cereais dos portos ucranianos de Odessa, Chornomorsk e Pivdennii, enquanto nos silos há ainda pelo menos igual quantidade de grãos da colheita anterior.

Iniciativa alimentar do mar Negro permite à Ucrânia exportar cereais a partir de três portos; Rússia trabalha para desbloquear fertilizantes

Pixabay
Campo de cereais

O entendimento alcançado não é o que queriam nem a Ucrânia, nem a Rússia, mas é sem dúvida o melhor que poderia suceder no atual contexto bélico, sobretudo depois que Moscou acusou Kiev de utilizar o corredor humanitário para atacar com drones aéreos e subaquáticos a base naval de Sevastópol. 

EXCLUSIVO

Embora o Kremlin tenha ameaçado suspender “indefinidamente” sua participação no pacto, poucos dias depois reconsiderou sua decisão ao receber seguranças de parte da Ucrânia, pressionada pela Turquia e pela ONU, de que “o corredor humanitário não deve ser usado com fins militares”, formulação que satisfez a Rússia, apesar de a Ucrânia não admitir ter atacado Sevastópol. 

Kiev — e o reiterou  no Twitter seu ministro de infraestruturas, Oleksandr Kubrakov — havia planteado no Centro Conjunto de Coordenação, instalado em Istambul, que o pacto se estendesse por um ano e que se incluísse um quarto porto, Mikolaiv, a partir do qual exportava antes da guerra 35% de seus alimentos. 

E Moscou, como recordou na quinta-feira (17) o vice-ministro de Relações Exteriores, Aleksandr Pankin, confia em que logo se cumpra o segundo acordo da iniciativa alimentar do mar Negro que se refere ao compromisso da ONU de interceder para facilitar que se levantem as sanções.Elas dificultam as exportações russas de alimentos e sobretudo de fertilizantes, os quais embora não figurem diretamente nas listas de restrições, não podem chegar ao seu destino pelos impedimentos que afetam o transporte mercante, as transferências bancárias, os seguros e outros aspectos logísticos.

No caso de fracassarem as gestões das Nações Unidas — e só em portos da União Europeia permanecem bloqueadas cerca de 300 mil toneladas de fertilizantes, que a Rússia, como gesto de boa vontade, ofereceu doar aos países mais pobres, com a ajuda logística da Turquia —, dentro de quatro meses o futuro do pacto dos cereais voltará a estar em dúvida. 

Pelo menos, assim deu a entender a chancelaria russa em um dos parágrafos de seu comunicado sobre a prorrogação da iniciativa alimentar:

“A Rússia toma nota dos esforços do secretariado do ONU por cumprir os compromissos que assumiu para desbloquear a exportação de alimentos e fertilizantes da Rússia. Todas as questões têm que ser resolvidas no prazo de 120 dias em que se estende a vigência do pacto.” 

Bombardeios em cidades, de novo

Como já se está tornando habitual, muitas cidades ucranianas amanheceram com sirenes antiaéreas, à espera dos enésimos bombardeios russos com mísseis de cruzeiros e drones, detectados pelos radares do exército ucraniano. 

A intensidade e a quantidade dos que impactaram na quinta-feira (17) não se compara com o ataque massivo de dois dias atrás e, embora a Rússia assegure que só dispara contra “objetivos militares”, resultaram danificadas instalações de infraestrutura energética e civis, já seja por erros de cálculo dos mísseis lançados ou por fragmentos dos que puderam ser derrubados. 

O porta-voz do Kremlin, Dimitri Peskov, explicou pela primeira vez por que os ataques russos se centram na infraestrutura energética das cidades ucranianas: “A falta de eletricidade e calefação em muitas regiões da Ucrânia é consequência das ações das autoridades de Kiev, que se negam a negociar”, declarou aos jornalistas. 

Segundo Peskov, “a parte ucraniana carece de vontade para resolver o problema e não quer iniciar negociações, além de já ter demonstrado que se desdiz dos entendimentos que já formavam parte de um borrador de acordo”, na interpretação russa da ruptura do processo negociador em Istambul em março passado. Não é preciso dizer que os ucranianos culpam os russos do fracasso na cidade turca. 

O porta-voz da presidência russa acredita que “se Washington fosse capaz de levar em consideração as preocupações de Moscou, poderia estimular Kiev a voltar à mesa de negociações, se quisesse”.

E agregou: “Se os Estados Unidos e a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) tivessem pressionado em seu dia o regime de Kiev e dado garantias de que este não desataria uma nova guerra civil e não atacaria sua própria população em duas repúblicas que se declararam independentes, não teria havido nenhuma operação militar especial”. 

Peskov concluiu seu comparecimento diário com a imprensa no mesmo estilo: “Washington diz que sem bombardeios russos não havia caído um míssil S-300 da defesa antiaérea ucraniana na Polônia. Com esta lógica, teríamos que convir que sem a completa falta de disposição a considerar as preocupações da Rússia que mostraram os Estados Unidos e a OTAN, não haveria a operação militar especial que se está levando a cabo na Ucrânia”.

(*) Juan Pablo Duch, do La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

Tradução: Beatriz Cannabrava


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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