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Jerges Mercado: “Áñez faz uso macabro da pandemia para se manter no poder na Bolívia"

A Bolívia e a América Latina necessitam recuperar sua independência política e econômica com governos progressistas, que distribuam a riqueza nacional
Leonardo Wexell Severo
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Nesta entrevista exclusiva, o ex-ministro de Obras Públicas e ex-vice-ministro de Eletricidade da Bolívia, Jerges Mercado, denuncia que “a presidenta Jeanine Áñez faz uso macabro e descarado da pandemia para se manter no poder” e que ela “fracassou totalmente no combate à Covid-19”, resultado “materializado no incremento exponencial do números de contagiados e de mortos”.

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Candidato a deputado pelo Movimento Ao Socialismo (MAS) nas eleições do próximo 6 de setembro, reforçando a campanha de Luis Arce à presidência, Jerges assinala que “com as péssimas medidas, a corrupção durante a pandemia e os muitos atos de nepotismo, Áñez perdeu toda a credibilidade”.

A Bolívia e a América Latina necessitam recuperar sua independência política e econômica com governos progressistas, que distribuam a riqueza nacional

Carta Capital
O ex-ministro de Obras Públicas e ex-vice-ministro de Eletricidade da Bolívia, Jerges Mercado

Confira a entrevista

Leonardo Wexell Severo – Diante deste trágico aprofundamento da pandemia da Covid-19, que medidas vêm sendo adotadas pelo governo de Jeanine Áñez?

Jerges Mercado – Infelizmente, o governo de Añez demorou a agir, se atrasou completamente na prevenção e no combate ao coronavírus. Suas medidas foram muito improvisadas e inoportunas. Não se preveniu a onda de infectados, nem se preparou a infraestrutura hospitalar em tempo hábil, nem foram realizados testes maciços para detectar contagiados, isolá-los e curar os enfermos. Também não se estruturaram e equiparam as instalações hospitalares e o pessoal de saúde. Além disso, os equipamentos que foram importados, como respiradores, chegaram tarde, são de uso inapropriado e têm um enorme sobrepreço.

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Estamos há quase três meses em quarentena e o governo não tomou as medidas necessárias. Assim, muita gente está desobedecendo ao isolamento porque necessita gerar recursos para se alimentar, já que o apoio monetário foi ínfimo e chegou tarde.

Qual tem sido a resposta dos movimentos sociais frente a este abandono?

Inicialmente, se tentou apoiar as iniciativas do governo para conter a pandemia, inclusive foram apontadas várias propostas de políticas públicas, mas a maioria não foi ouvida e as ouvidas foram mal implementadas. Com as péssimas medidas, a corrupção durante a pandemia e os muitos atos de nepotismo, o governo perdeu toda a credibilidade. [Há poucos dias veio à tona o escândalo que envolve o Ministério da Saúde, com o superfaturamento na compra de respiradores, cujo custo máximo da unidade é de US$ 8.000, mas com o crédito do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) a aquisição foi por cerca de US$ 28.000, com um impacto de mais de US$ 3 milhões].

Como vês as recentes denúncias sobre a participação do governo Bolsonaro contra o processo democrático na Bolívia, especificamente na deposição do presidente Evo Morales, no final de 2019?

Está claro que Bolsonaro, conjuntamente com os Estados Unidos e seus aliados da direita reacionária, jogou um papel essencial no golpe de Estado do ano passado. Inclusive, segundo um alto dirigente do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), que esteve neste encontro na Universidade Católica da Bolívia, o embaixador de Bolsonaro participou da reunião que determinou que Jeanine Añez assumisse como presidente.

Como está o processo de eleição presidencial remarcado para o domingo, 6 de outubro?

É complexo. Por um lado, nosso país necessita de um governo legal, legítimo, surgido das urnas, com capacidade para resolver a pandemia e, sobretudo, para reconstruir a economia, a política e a sociedade boliviana, destruída por este governo e piorada pelo coronavírus. Este é um aspecto acordado entre os Órgãos Legislativos e Eleitoral, e estipulado na Lei que estende os termos para a realização de eleições no próximo dia 6 de setembro.

Por outro lado, ainda não chegamos ao pico da pandemia e a cada dia se incrementam exponencialmente os números de contagiados e de mortos. Finalmente, o governo faz todo o possível, incluindo o uso macabro e descarado da pandemia, para perpetuar-se no poder por isso continua se negando a publicar o determinado em lei.

E qual tem sido o papel da mídia boliviana nesta feroz disputa?

Os meios de comunicação em sua maioria são cúmplices ou estão silenciados pela propaganda paga do governo. Os poucos que informam a verdade, assim como os meios alternativos e redes sociais, vêm sendo ameaçados, perseguidos ou encarcerados.

Recentemente o governo pôs fim aos ministérios da Cultura, do Esporte e da Comunicação. Qual é o sentido desta política?

Quiseram mostrar austeridade, porém foi um show político e cumprimento das diretrizes do Fundo Monetário Internacional (FMI) e dos EUA. Apontaram para o encolhimento do Estado e a intenção de reduzir o déficit fiscal, de fechar embaixadas de países que não são títeres do Império (Irã e Nicarágua) e de começar o desmonte do Estado Plurinacional.

Centenas de milhares de bolivianos vivem no Brasil e na Argentina, a grande maioria votantes do Movimento Ao Socialismo (MAS). Como acredita que ficará sua participação nas próximas eleições?

Acredito que o governo de Añez fará todo o possível para evitar que os nossos compatriotas da Argentina e do Brasil votem, assim como de outros países onde a coletividade boliviana vota pelo MAS e por Luis Arce, seu candidato. Fará todo o necessário, cumprindo o mandato dos EUA e da direita internacional, para evitar o retorno do Movimento Ao Socialismo. Não descartam o uso indevido de recursos do Estado para a campanha, fraude ou autogolpe.

Uma última mensagem aos bolivianos que vivem no Brasil.

Vivemos um momento muito complexo no mundo, em que há uma luta internacional para construir um mundo multipolar, porém o império norte-americano resiste a perder sua hegemonia global. Diante da sua derrota no Extremo e no Oriente Médio, se protege na América Latina, que considera seu quintal. Por isso faz todo o possível para ter governos títeres e elites locais cúmplices que lhe garantam a supremacia na região e acesso fácil a recursos naturais estratégicos no século XXI, como são o lítio, a água doce, os hidrocarbonetos, o urânio, o tântalo, entre outros.

A Bolívia e a América Latina necessitam recuperar sua independência política e econômica com governos progressistas, que distribuam a riqueza nacional para superar a pobreza e o atraso, e retomem o caminho do desenvolvimento nacional, com soberania, equidade e respeito pela Mãe Terra.

Leonardo Wexell Severo, jornalista e colaborador da Diálogos do Sul


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Leonardo Wexell Severo

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