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Marli Gonçalves*
Bate no centro, pela direita, bate pela esquerda, soca, soca, soca; verga, mas não cai. Jornalista, com orgulho muito especial e carinho pela profissão que escolhi, embora tenha hora que um desânimo sem medida tome conta, vejo que viramos mesmo belo saco de pancadas, de um lado; culpados pelos problemas do mundo, de outro. Mal amados, malvistos. A chacina em Paris, contra o que é mais difícil de encontrar inclusive no jornalismo, o humor, arranca mais um pedaço daquilo que deveria ser considerado, isso sim, sagrado, que é a liberdade
O boneco que continua rindo em sua abaulada figura que vai e volta, às vezes com um sorriso inflável e indelével. Dias bem difíceis esses primeiros deste ano. Reparamos nas inúmeras incompetências governamentais de todas as esferas, mas é como se falássemos ao vento, o mesmo que a cem por hora derruba árvores na cidade de São Paulo, como se novidade fosse o péssimo estado de sua conservação, como se não valessem nada e servissem apenas para que desgraçados apoiem o lixo que juntam. árvore não é lixeira! Se tivesse condições criaria uma organização para cuidar dessas criaturas que ainda nos ajudam a respirar o ar sufocante de nossas cidades. Mas sou jornalista, apenas. E os jornalistas precisam estar em fortalezas mais seguras para empunhar suas armas, seja lápis, caneta, computador, cérebro, voz.
Acaba sendo difícil apontar temas, erros, soluções, sem um grande veículo por trás para apoiar; independente, e portanto sem patrocínios dos lados dessa questão, seja qual for a geometria de pontas esgarçadas que virou a política nacional. Aqui, para ter sucesso não basta ser bom ou competente. Tem de ter amigos influentes, algum sobrenome, bom dinheiro, participar de festas e/ou grupos sociais guetosos. Vide as blogueiras de moda que viraram milionárias …do jornalismo! Vide outros e outras que estão em todas porque socialmente integrados em alguma boquinha, casamento, “relação”, interesse. Na novela, mostram o que poderia de haver de pior e verdadeiro, infelizmente.
Se a gente fala que as ciclovias estão sendo feitas a navalhadas, que as bocas de lobo estão todas entupidas e parece que só fomos nós que ouvimos a previsão do tempo, que só nós sabemos que os temporais virão, virando tudo, ensopando e até matando, é porque somos de direita e perseguimos o coitadinho do prefeito Bonitinho. Não compreendemos a “essência”, a “modernidade” das suas propostas.
Por outro lado, se falamos que a questão da água que pode nos levar a uma escassez sem precedentes foi escamoteada é porque somos contra essa “maravilhosa” turma de tucaninhos e periquitos, que viram araras.
A mulher presidenta toma posse anunciando inconsequente um tema de forma quase nacionalista – Brasil, Pátria Educadora – e em menos de uma semana sabemos que foram cortados sete bilhões do orçamento na área da Educação, justamente, e temos de nos calar porque ela é candidata à oitava maravilha do mundo.
Difícil ser jornalista. Difícil ser colunista. Difícil ser crítico. Difícil ser cronista. Difícil discordar. Difícil querer discutir. Difícil concordar. Difícil discordar, concordar, discutir. Andamos numa corda bamba e tanto. Ao mesmo tempo, quem lê jornal e acompanha os fatos reportados pelos jornalistas sente-se como um palhaço no centro de um picadeiro de um enorme circo. Anunciamos que eles disseram que baixariam tarifas e elas sobem. Dizemos que as investigações serão feitas. As palavras às vezes já parecem apenas estar sendo levadas ao vento.
Quem defende os jornalistas? Somos saco de pancada de todos os lados, e assassinados tanto lá fora como aqui, e em número recorde. Ninguém vira herói. Nos matam de diversas formas. Só nessa semana houve mais de uma centena de demissões em redações grandes. Uma das editoras mais importantes do país perdeu metade de seu espaço físico. Um cínico feito ministro, pior, de novo, já que em outras áreas onde já andou só semeou bobagens, agora quer censura, lei de controle da mídia, que ainda tenta explicar! É aplaudido, inacreditavelmente, por jornalistas que até já estiveram na lista de admirados, mas que agora, sinceramente, parecem apenas querer coletes salva-vidas para suas salvações particulares e individuais.
É nesse cenário que estamos discutindo tanto quem é “Charlie” e quem não é. Vendo como imediatamente as forças da imprensa francesa se uniram para não deixar que uma revista acabasse, enquanto aqui vemos gente com a ousadia de comemorar – quase que soltando rojões – o fim de jornais, revistas, demissões e nos mostrando uma distância incrível do mundo civilizado.
Onde a liberdade seja respeitada. Ou, no mínimo, haja respeito entre uns e outros. Para continuarmos balançando como Joãos Bobos, também conhecidos como Joãos Teimosos.
Mas pode nos chamar de Charlie.
*Colaboradora de Diálogos do Sul Marli Gonçalves é jornalista – Embasbacada diante de tudo isso.