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José Dirceu, preso político

Paulo Cannabrava Filho

Tradução:

“José Dirceu preso político condenado à prisão perpétua.”

Paulo Cannabrava Filho*

Paulo Cannabrava-27-1-17A ampliação da pena determinada por sentença judicial contra José Dirceu de 20 para 40 anos, para um réu idoso, é o mesmo que condená-lo a prisão perpétua. Mesmo com atenuantes, Dirceu está condenado a morrer na prisão. Vale recordar que o máximo de cumprimento de pena no Brasil é de 30 anos o que na prática significa prisão perpétua. Vale recordar também o sagrado princípio do direito “in dúbio, pro reo”. O Estado tem que provar a culpa, não o réu ter que provar inocência. Um absurdo próprio do fascismo.

José Dirceu não seria condenado - sequer a uma pena alternativa - mas foi o que ocorreu no caso do “mensalão” com base num numa incabível e deformada “teoria do domínio do fato”. Latuff 2014.
José Dirceu não seria condenado – sequer a uma pena alternativa – mas foi o que ocorreu no caso do “mensalão” com base num numa incabível e deformada “teoria do domínio do fato”. Latuff 2014.

O advogado José Roberto Batochio, comentando a sentença, escreveu que “num tribunal imparcial e sereno, em que impere somente a lei e as provas, José Dirceu, por exemplo, não seria condenado – sequer a uma pena alternativa – mas foi o que ocorreu no caso do “mensalão” com base num numa incabível e deformada “teoria do domínio do fato”.

Sem tentar esconder sua indignação e com a propriedade lhe conferida pelos muitos anos de experiência, tanto nas lides jurídicas como nas políticas, em longo artigo publicado em 26/9/17, Batochio assevera – “Quando se examinam certas decisões judiciais no Brasil contemporâneo, forçoso é concluir  que até o Tribunal de Nuremberg parece mais compassivo, a despeito das candentes críticas que lhe endereçou Hannah Arendt quanto aos desvios jurídicos nos critérios de fixação das responsabilidades”.

Não sou nem nunca fui petista. Sou apenas um observador atento e sedento em busca de segurança jurídica.

No episódio do “mensalão” cortaram a cabeça, tronco e membro do PT ao processar o presidente do partido, José Genoíno, os tesoureiros, Delúbio Soares e João Vaccari Neto, e o ex-secretário geral, deputado federal e Ministro Chefe da Casa Civil, José Dirceu. Só isso bastaria para mostrar intenção. Contudo, se observamos a evolução de cada caso, não fica dúvida sobre a intencionalidade política.

Dano maior a essas pessoas, sem dúvida, foi provocado pela mídia. Em país civilizado prevalece o princípio da presunção da inocência.
Dano maior a essas pessoas, sem dúvida, foi provocado pela mídia. Em país civilizado prevalece o princípio da presunção da inocência.

Genoíno, sobrevivente da Guerrilha do Araguaia, como deputado e como ministro, ganhou respeito e admiração até mesmo de adversários. Mas já estava previamente condenado pela grande mídia e por certos juízes. Foi denunciado em 2005, condenado em 2012 e teve a pena extinta pelo STF em 2014.

Delúbio, professor em Goiás, dirigente da CUT coordenou campanhas de Lula, foi tesoureiro do partido, igualmente condenado em 2012, foi inocentado pelo STF do crime de formação de quadrilha e foi indultado em 2016.

João Vaccari Neto, bancário e sindicalista, secretário de finanças e planejamento do PT, foi condenado em primeira instância em 2015, foi inocentado em 2017.

José Dirceu, de líder estudantil a combatente na resistência à ditadura, vítima de dois exílios, um no exterior e outro no seu próprio país, foi sem dúvida o grande artífice na construção do PT. Depois, na Casa Civil, foi também um grande articulador da governabilidade. Daí seu prestígio não só junto às bases populares a quem se mantém fiel como nas mais altas cúpulas do establishment.

José Dirceu também foi indultado em 2016, porém o atual governo limitou o indulto para penas de no máximo 12 anos. E na sequência, em 2017, na terceira vez em que foi julgado, Dirceu teve a pena dobrada.

E como ficarão na história os delatores? A delação é traição, é a mais vil das vilanias. Millôr Fernandes.
E como ficarão na história os delatores? A delação é traição, é a mais vil das vilanias. Millôr Fernandes.

Os quatro dirigentes foram acusados e condenados com os mesmos argumentos e sem provas. A justiça teve que admitir isso nos casos de Genoíno, Delúbio e Vaccari, mas insiste em manter preso José Dirceu.

Dano maior a essas pessoas, sem dúvida, foi provocado pela mídia. Em país civilizado prevalece o princípio da presunção da inocência. A Constituição brasileira também consagra este direito. Porém… pra que serve a Constituição? Aqui, pré julgaram culpa e praticaram um verdadeiro linchamento midiático. A demonização dos personagens deixa sequelas pro resto da vida, inclusive nos familiares. Como reparar tanto dano?

E como ficarão na história os delatores? A delação é traição, é a mais vil das vilanias. Pensei que essa frase fosse do Millôr Fernandes mas não consegui confirmar. Pelo que conheço dele, se não a assinasse a ilustraria. Bom, na história seguramente serão execrados, mas na vida, uma vez em liberdade, desfrutarão de muito dinheiro. Dinheiro mal havido, mas, dinheiro, e o poder que o dinheiro confere na sociedade de psicóticos.

É ou não é vilania o que estão fazendo com o Lula? Sangrando devagarinho, não lhe vão dar trégua, como não estão dando trégua ao Zé Dirceu. Querem depois de bem sangrado, vilipendiado, derrotá-lo nas urnas para acabar de vez com a alegria do povo. Vão com todo o dinheiro do mundo para as eleições de 2018, sem admitir possibilidade de derrota. Vale tudo. Por isso temos afirmado que só uma ruptura institucional detém a destruição do Estado e dilapidação da nação.

Despedida inglória de Janot

Em liberdade, os delatores, desfrutarão de muito dinheiro. Dinheiro mal havido, mas, dinheiro, e o poder que o dinheiro confere na sociedade de psicóticos. Ilustração: Millôr Fernandes.
Em liberdade, os delatores, desfrutarão de muito dinheiro. Dinheiro mal havido, mas, dinheiro, e o poder que o dinheiro confere na sociedade de psicóticos. Ilustração: Millôr Fernandes.

Há um pouco de covardia nisso: nos últimos dias do mandato do PGR, Rodrigo Janot, a imprensa conservadora publicou críticas sobre sua conduta, talvez com a intenção de alertar a sucessora, posto que já exteriorizaram a certeza de que com ela será melhor. Será?

O vetusto Estadão, é lido por tão pouca gente que vale a pena reproduzir algumas opiniões que foram reiteradas em dias seguidos. No 4o editorial sobre o mesmo tema, os Mesquitas titularam: “Mais uma denúncia inepta” explicando que a exemplo do que aconteceu na primeira denúncia de Janot contra Temer, feita em junho passado, a nova peça elaborada pelo procurador geral para acusar o presidente de Corrupção não se sustenta em nada além de declarações de delatores – tratadas, textualmente, como “provas”.

(…) Prudência não é o forte de quem se julga com a missão de salvar a política. (…) Em função dessa missão que Janot em sua peça acusatória transforma toda a negociação política em crime, por definição.

Finaliza esperando que os deputados que deverão julgar Temer, rejeitem a denúncia “ora apresentada, baseada em suposições e ilações, não as levando em conta”.

Por que será que nos jornais de maneira geral o juízo do procurador vale para Lula e não vale para Temer? Ilustração: tt Catalão*
Por que será que nos jornais de maneira geral o juízo do procurador vale para Lula e não vale para Temer? Ilustração: tt Catalão*

Isso foi no dia 16/9. No dia anterior, dizia que “ao dar por certo que nada de errado ocorreu (no caso dos irmãos Batista) a PGR mais parece preocupada em assegurar sua boa reputação do que em colaborar para o cabal esclarecimento dos fatos”.

No domingo 17/9, pela quinta vez, o Estadão reitera que a 2a denúncia de Janot “é tão insustentável que suas mais de 200 páginas não trouxeram  qualquer novidade probatória, nem sequer produziram abalo político”

Neste caso, houve erro, e não houve erro no caso de Dilma? Por que o Estadão não denunciou em editorial a farsa do impeachment, ridicularizada no mundo inteiro? Não está havendo erro no caso de Lula?

Vale lembrar que essa é a maneira de atuar do procurador em todos os casos e, principalmente, no caso de Lula. O juiz Moro se diz convicto de que Lula é o chefe de uma quadrinha igualzinho ao Procurador Geral da República – Janot – se diz convicto de que Temer é o chefe de uma quadrilha. Por que será que nos jornais de maneira geral o juízo do procurador vale para Lula e não vale para Temer?

Como a mídia brasileira se tornou uníssona, falar do Estadão ou do Globo é a mesma coisa. Estão atuando como partido político. O grave é que com esse comportamento contribuíram para a total insegurança jurídica que o país vive hoje. Sem segurança jurídica não se governa, não se tem democracia, nem mesmo o capitalismo se desenvolve. Farão autocrítica algum dia?

Nada vai mudar na PGR nem nas altas cúpulas do Judiciário Brasileiro. Ilustração: tt Catalão*
Nada vai mudar na PGR nem nas altas cúpulas do Judiciário Brasileiro. Ilustração: tt Catalão*

Não, não farão. De qualquer forma, se a mudança de atitude persistir, se continuarem a defender o bom comportamento  do judiciário, vai ajudar na necessária campanha pelo Estado de Direito.

Agora todo mundo a especular sobre a nova chefe da PGR com velada intenção de achar que ela será o que eles almejam. Para um dos supremos ministros agora a PGR vai andar direito. Vai pra onde, cara pálida?

Raquel Dodge é a 1a mulher na condução da PGR, porém, de Harvard, como Obama. A quem ela servirá? Ao Brasil ou aos EUA. Seu antecessor, sabemos, serviu aos EUA. Fiquem atentos, porque logo, logo ele irá lá prestar contas.

Raquel Dodge, dizem os que se dizem saber tudo, “fará com perfeição o que o outro fazia atabalhoadamente”.

Voltando à pergunta anterior. Harvard forma as elites do poder triunfante. Forma não só para servir o poder como para conduzi-lo. Raquel jamais deixará de servir as “zelites”. Nada vai mudar na PGR, como nada vai mudar no Sistema Judicial, pelo menos em sua cúpula.

Pobre de nós, condenados a assistir o desmantelamento da República e a dilapidação da Nação graças ao apoio da tal Base Aliada. Ilustração: Millôr Fernandes.
Pobre de nós, condenados a assistir o desmantelamento da República e a dilapidação da Nação graças ao apoio da tal Base Aliada. Ilustração: Millôr Fernandes.

O Sistema Judicial só mudará se uma nova geração de advogados formados para servir a nação (e lembre-se que nação só existe como povo) conquistar as altas hierarquias do poder judiciário. Existe isso?

Claro que sim, existe, certamente, um bocado de advogados com essa boa índole e até os ideologicamente comprometidos com o povo. Pobre deles como pobre de nós, condenados a assistir o desmantelamento da República e a dilapidação da Nação.

Engenheiros, Economistas, Profissionais Autônomos através de suas organizações profissionais e/ou sindicais tendo percebido que o Estado carece de um projeto nacional estão chamando suas bases para enfrentar essa lacuna através do debate criativo. É um bom exemplo, não só para os advogados, mas para todas as categorias profissionais. Vamos discutir que país queremos, que democracia queremos, que modelo de desenvolvimento queremos. Caminho que também deve conduzir para a formação da Frente de Salvação Nacional.

*Paulo Cannabrava Filho é jornalista e editor de Diálogos do Sul.

A caricatura de Paulo Cannabrava Filho é do colaborador cartunista e caricaturista carioca Antonio Máximo*

Algumas das Charges são do incomparável Millôr Fernandes

Ilustrações de tt Catalão que colabora com a Diálogos do Sul.

Edição: João Baptista Pimentel Neto


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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