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Líder indígena é o segundo Guarani Kaiowá assassinado em Amambai (MS) em 20 dias

Márcio Moreira foi executado após uma emboscada, em meio aos conflitos para retomada do território ancestral Guapoy, ocupado por fazendeiros
Gabriela Moncau
Brasil de Fato
São Paulo (SP)

Tradução:

Uma emboscada contra cinco indígenas do povo Guarani Kaiowá na cidade de Amambai (MS) resultou na morte a tiros de Márcio Moreira na tarde desta quinta-feira (14). Ele era liderança do Tekoha Gwapo’y Mi Tujury, território ancestral que está no nome da Fazenda Borda da Mata da empresa VT Brasil Administração, da família Torelli, e que foi retomado pelos indígenas em junho.

O assassinato de Márcio Moreira acontece três semanas depois do que ficou conhecido como Massacre de Gwapo’y, quando a polícia militar invadiu a área, feriu 15 pessoas e matou o indígena Vitor Fernandes.

Segundo a Aty Guasu – a Grande Assembleia Guarani Kaiowá –, cinco indígenas da retomada foram chamados para fazer um trabalho de construção de muro na tarde desta quinta-feira (14). Chegando ao local, na beira da rodovia MS 386 e perto da onde fica a sede da Coamo Agrodindustrial Cooperativa, eles teriam percebido a emboscada.

“Encontraram em torno de 20 pistoleiros, jagunços e policiais”, afirma a nota da Aty Guasu, segundo a qual Marcio Moreira foi morto a tiros, dois indígenas estão desaparecidos, um conseguiu escapar correndo e outro foi preso pela Polícia Militar, acusado de ter cometido o assassinato – versão contestada e denunciada pelos indígenas. Este último seria Wilis Fernandes, filho de Vitor, morto pela polícia no Massacre de Gwapo’y.

A Comunicação da Polícia Civil do Mato Grosso do Sul informou ao Brasil de Fato que, ao que consta no Boletim de Ocorrência, uma testemunha relatou que Márcio teria sido morto por dois suspeitos não identificados, que outra pessoa teria fugido e que, até o momento, ninguém foi preso.

A reportagem entrou em contato com a Delegacia da Polícia Civil de Amambai para questionar sobre a prisão de Fernandes, mas não quiseram dar informações. A Secretaria de Segurança Pública do Mato Grosso do Sul também foi acionada e não respondeu até o fechamento desta matéria.

Márcio Moreira foi executado após uma emboscada, em meio aos conflitos para retomada do território ancestral Guapoy, ocupado por fazendeiros

Foto: Leandro Barbosa – Twitter
Segundo a Apib, há temor de que "os policiais façam ‘queima de arquivo’ com os indígenas que presenciaram o ataque"




Ameaças de morte 

Márcio Moreira já estava ameaçado de morte, assim como estão outras lideranças da retomada. Ele estava coordenando a construção de uma casa de reza tradicional na área. Em um vídeo gravado dias atrás, Márcio afirma que a ocupação não é temporária, mas permanente, e pede doações para apoiadores para a construção de mais casas.

Em vídeo, Márcio Moreira (dir.) pede doações para a construção de casas de tijolo na retomada (Divulgação) 

“Existe uma ameaça de morte organizada, planejada, contra as lideranças do Gwapo’y Mi Tujury. Já denunciamos, mas continua”, afirma um integrante da Aty Guasu que pediu anonimato.

No último dia 4, o juiz Thales Braghini Leão, da 2ª Vara da Justiça Federal em Ponta Porã, negou a liminar de reintegração de posse da Fazenda Borda da Mata. “O fato de não existir demarcação sobre a área ou qualquer processo administrativo tendente a promovê-la não é suficiente para descaracterizar a luta pela posse das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”, escreveu o juiz na decisão.

“Quando não conseguiram a ordem de reintegração de posse, os fazendeiros passam para essa segunda opção, que é assassinar lideranças para intimidar”, afirma o membro da Aty Guasu. “É a continuidade do massacre. O genocídio mesmo, que continua. Isso não para. E a segurança e a proteção, nós não temos”, afirma.

Em nota, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) afirma que existe o temor de que “os policiais façam ‘queima de arquivo’ com os indígenas que presenciaram o ataque”.

“A violência recorrente só mostra mais uma vez a atuação dos fazendeiros como bandidos milicianos, que tomam as terras indígenas, pagam pistoleiros para assassinar aqueles que resistem e contam com o estímulo e a conivência da Funai anti-indígena e do governo Bolsonaro”, denuncia a Apib.

Gabriela Moncau | Brasil de Fato
Edição: Nicolau Soares


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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