“Esse projeto de lei é absolutamente silencioso e omisso em relação aos direitos humanos”. A declaração é de Léo Heller, relator especial da ONU sobre o direito à água e ao saneamento e pesquisador da Fiocruz.
O senado aprovou na quarta-feira, dia 24 de junho o projeto de lei nº 4162 de 2019, que tem como principal ponto a ampliação da entrada do setor privado no fornecimento dos serviços de água e esgoto. Segundo o relator especial da ONU sobre o direito à água e ao saneamento, o abrasquiano Léo Heller, “esse projeto de lei é absolutamente silencioso e omisso em relação aos direitos humanos”. A declaração foi dada em entrevista concedida ao podcast “Café da Manhã” da Folha de São Paulo, onde o Léo também afirma que “o enfoque não foi garantir água e esgoto para todos, respeitando os direitos humanos, mas inserir a iniciativa privada”.
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Ao longo da entrevista, Léo Heller, que também é pesquisador da Fiocruz, faz um histórico acerca da regulação dos serviços de água e saneamento no Brasil e aponta que a atual lei se apresenta como uma reforma do Marco Legal aprovado em 2007, a lei nº 11.445. Ele aponta que a imprensa tem dado pouco espaço às vozes dissonantes acerca do projeto: “Poucas vozes dissonantes em relação a esse marco têm tido espaço, e eu sou uma voz dissonante. Minha visão não é essa. Todas as reformas estruturais que o país faz, você tem ganhadores e derrotados. A gente precisa entender que vivemos em uma sociedade muito desigual e com muitos interesses econômicos que transitam. Então, reformas como essa vão atender determinados interesses e não vão atender outros”. E quais interesses serão atendidos? Léo não tem dúvida: “A principal alteração que essa reforma traz é uma maciça privatização do serviço, sem precedentes em qualquer país num período mais recente. Parte de um pressuposto de que tudo vai melhorar com a maciça privatização dos serviços sem fazer o que é necessário para uma medida como essa”.
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A gente precisa entender que vivemos em uma sociedade muito desigual e com muitos interesses econômicos que transitam.
Outro aspecto apontado durante a entrevista é a dificuldade de empresas privadas se disponibilizarem a operar em áreas rurais, periferias das grandes cidades e cidades pequenas e de a falta de clareza acerca das licitações facilitar esquemas de corrupção nos contratos. O pesquisador aponta também que entre os anos de 2000 e 2018, 311 cidades remunicipalizaram os serviços de água e esgoto que haviam sido privatizados por conta de diversos tipos de insatisfação com o serviço privado e também pela vontade do Estado de fornecer um serviço melhor. Essa movimentação ocorreu na maioria das vezes na Europa, mas também em cidades como Buenos Aires e La Paz na América Latina.
A Associação Brasileira de Saúde Coletiva endossa a determinação da Organização das Nações Unidas (ONU) de que a água limpa e segura e o saneamento básico são um direito humano essencial. Não é mercadoria.
A reportagem é de Pedro Martins, publicada por Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco, 25-06-2020.
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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