Pesquisar
Pesquisar

Itaú e dono da Ambev estão entre acionistas que invadem Terra Indígena Jaraguá em SP

Jorge Paulo Lemann é o 42º homem mais rico do mundo; ele e o maior banco do país compõem 10% da cartela da Tenda, que iniciou construções em torno de aldeias
Alceu Luís Castilho
De Olho Nos Ruralistas
São Paulo (SP)

Tradução:

Focada em habitação popular, a bilionária Construtora Tenda S.A. protagonizou na quinta-feira (30/01) a seguinte notícia, sintetizada neste título do Conselho Indigenista Missionário (Cimi): “Construtora avança sobre área tradicional Guarani Mbya na TI Jaraguá e derruba 4 mil árvores“. Os indígenas acordaram com motosserras e fizeram um ritual fúnebre, em homenagem às árvores destruídas, e em protesto contra o início da construção de cinco prédios ao lado de suas aldeias, na zona oeste de São Paulo.

Alguns dias antes, no dia 24, a empresa que faz parte do Novo Mercado, a elite da B3, comunicava ao mercado que uma de suas acionistas, a Constellation Investimentos e Participações, aumentava sua participação na empresa para 5,36% do total das ações ordinárias. Um dos sócios da Constellation é o bilionário Jorge Paulo Lemann, dono da Ambev, listado em novembro pela Forbes como o 42º homem mais rico do mundo.

Ele é também o segundo brasileiro mais rico, com um patrimônio de US$ 23,1 bilhões. Lemann tem alternado a liderança desse ranking com o banqueiro Joseph Safra. O antigo tenista afirmou-se como a figura mais influente na AB Inbev, grupo que controla a cervejaria, secundado pelos sócios Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira. Mas seu capital se espraia em vários ramos de atividade.

Embora não seja sócio majoritário da Constellation, o empresário foi o inspirador de seu discípulo Florian Bartunek, criador desse fundo de investimentos. Ele foi gestor de Lemann no banco Garantia. Outro sócio minoritário da Constellation é o Lone Pine Capital, por sua vez um fundo de hedge dos Estados Unidos.

Jorge Paulo Lemann é o 42º homem mais rico do mundo; ele e o maior banco do país compõem 10% da cartela da Tenda, que iniciou construções em torno de aldeias

Mídia Ninja
Indígenas protestam contra corte de árvores

A informação sobre a nova participação da Constellation no total de ações da Tenda consta de uma apresentação institucional da própria construtora, atualizada na segunda-feira (27/01). A empreiteira — desmembrada em 2017 de outra construtora, a Gafisa — tem capital pulverizado, mas costuma destacar os três principais acionistas.

O site da Tenda ainda mantém no ar uma composição anterior, onde a Constellattion não aparecia entre os principais acionistas. Em seu lugar, com 4,74% das ações, estava o Itaú, o maior banco do país, que teve lucro líquido de R$ 25 bilhões em 2018. A participação do Itaú Unibanco S.A. na empreiteira era maior, mas foi reduzida para esse percentual no dia 3 de janeiro. O banco chegou a ter 10% das ações da Tenda.

Constellation aumentou no fim de janeiro, para 5,4%, sua participação na Tenda. (Imagem: Reprodução)

Dois fundos de investimento, o Pátria Investimentos e o Polo Capital, são os acionistas com maior participação na Tenda. Possuem, respectivamente, 10,4% e 9,9% das ações. O percentual do Polo Capital, que comanda o Conselho de Administração da construtora, foi reduzido em janeiro. Essa empresa é comandada por Cláudio Andrade e Marcos Duarte. O Pátria Investimentos, por Olímpio Matarazzo Neto, o Pimpo, dono de uma casa de R$ 20 milhões em Trancoso (BA) que pertencia a Philippe de Nicolay Rothschild.

A Tenda divulgou em janeiro que teve R$ 2 bilhões em vendas líquidas em 2019. A construtora com foco em nove regiões metropolitanas possui 69 obras em andamento, mais da metade do que tinha no ano anterior. Só perde para a MRV e para a Cyrela. A empresa — uma das principais fornecedoras do programa Minha Casa, Minha Vida, do governo federal — possui um capital social de R$ 1,1 bilhão. Em 2018, teve um lucro líquido de R$ 200 milhões. Ela tem um dos cem ativos mais negociados da B3.

Indígenas apontam início “sorrateiro” das obras

O povo Guarani diz que a ação da construtora foi sorrateira. Em dezembro, segundo os indígenas, funcionários da Tenda disseram que “árvores isoladas” seriam cortadas no dia 8 de fevereiro. Mas a ação foi antecipada. A ativista Ana Flavia Carvalho contou ao Jornal GGN que mais da metade das árvores foram derrubadas: São remanescentes de Mata Atlântica e o empreendimento justificou sendo árvores isoladas, como se fossem apenas eucaliptos. E não é o caso. É uma área repleta de árvores nativas e animais”.

Povo Guarani alerta para destruição de árvores na região. (Foto: Reprodução)Segundo os indigenistas, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) determina que nenhuma obra a menos de dez quilômetros de distância de uma comunidade indígena pode ser iniciada sem a consulta prévia ao povo originário.

A prefeitura, porém, aprovou o empreendimento. Em nota oficial, a gestão Bruno Covas (PSDB) alega que o perímetro não está em área indígena e que o terreno está localizado em Zona Especial de Interesse Social (Zeis), “por isso deve ser destinado, exclusivamente, à construção de unidades habitacionais para famílias de baixa renda”. O plano da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente “prevê ao todo a supressão de 528 exemplares arbóreos e a compensação ambiental com o plantio de 549 mudas no local”.

O Conselho Indigenista Missionário explica porque a destruição das matas afeta estruturalmente a etnia:

— Os Guarani Mbya estão completamente abalados e em luto devido à ação ilegal da Tenda, e se manifesta em favor dos espíritos da floresta, agredidos e derrubados com as árvores que foram cortadas. O Pico do Jaraguá está sendo devastado em nome de um progresso avassalador e de extermínio. As florestas são entidades e espíritos de fortalecimento dos povos indígenas. Para os Guarani Mbya, derrubar uma árvore é como tombar um parente. Nessa ocasião 4 mil foram executados. Uma cerimônia fúnebre será realizada na área massacrada em nome de um apelo ao Nhanderu, o deus criador Guarani, pela maldade e agressão aos espíritos que protegem o povo da floresta.

Em nota, a Construtora Tenda “reafirma seu respeito à comunidade local e ressalta que todos os procedimentos necessários foram adotados para a legalização do empreendimento, com aprovação dos órgãos competentes”. O discurso é alinhado com o da prefeitura: “A companhia ressalta ainda que, conforme o Plano Diretor do município de São Paulo, a área em questão tem destinação exclusiva para a moradia da população de baixa renda, que é o objetivo da construção. A Tenda reforça que está à disposição das autoridades e da sociedade civil para qualquer esclarecimento”.

Os indígenas divulgaram um vídeo sobre o conflito:


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Alceu Luís Castilho

LEIA tAMBÉM

Com Trump, EUA vão retomar política de pressão máxima contra Cuba, diz analista político
Com Trump, EUA vão retomar política de "pressão máxima" contra Cuba, diz analista político
Valência Mazón recusa renúncia e responsabilidade por mortes que poderiam ter sido evitadas
Valência: Mazón recusa renúncia e responsabilidade por mortes que poderiam ter sido evitadas
COP29 de cúpula de ativistas climáticos a feira de lobistas fósseis e “vendedores de fumaça”
COP29: de cúpula de ativistas climáticos a feira de lobistas e “vendedores de fumaça”
Entidades denunciam governos de Valência e Espanha por homicídio culposo durante enchentes
Entidades denunciam governos de Valência e Espanha por homicídio culposo durante enchentes