A Câmara dos Deputados deve votar nesta quinta-feira (11) uma emenda à reforma da Previdência, aprovada ontem, que torna mais brandas as regras de aposentadoria para policiais federais, rodoviários federais, seguranças do Congresso e agentes penitenciários. No entanto, mesmo a emenda, está longe de agradar os trabalhadores, que gostariam de se ver igualados aos militares, com regras previdenciárias próprias. Depois de uma série de idas e vindas, o texto que trata especificamente da categoria a ser votado e, provavelmente, aprovado deve ser um falso consolo para quem, em vários momentos, demonstrou apoio a Bolsonaro.
Durante a votação da reforma da Previdência na quarta, os líderes do centrão fecharam um acordo para flexibilizar as regras propostas inicialmente pelo Governo, que após uma série de cobranças de trabalhadores segurança acabou mudando de ideia a respeito do próprio projeto. A emenda, que foi apresentada pelo Podemos e que tem o apoio do PSL, prevê a incorporação de uma regra de transição, com idade mínima de aposentadoria de 53 anos para os homem e 52 anos para as mulheres. As medidas haviam integrado um acordo apresentado anteriormente pelo Governo, mas que foi, inicialmente, recusado por entidades representantes da categoria.
Ainda, a proposta do novo acordo inclui um pedágio de 100% sobre o tempo de contribuição que falta. Também serão feitas alterações no tempo na atividade policial para quem já ingressou na carreira, que será de 20 anos para homens e de 15 anos para mulheres. Para aqueles que ainda irão ingressar na profissão, o tempo sobe para 25 anos de atividade.
No texto original, a reforma estabelecia para a categoria federal de segurança pública 55 anos como idade mínima para a aposentadoria, tempo mínimo de 30 anos de contribuição e 25 de efetivo exercício da carreira. Atualmente, policiais federais, rodoviários federais e legislativos não têm idade mínima para se aposentar.
Um dos pontos criticados pelos agentes federais era a diferenciação no tratamento entre as regras para os funcionários da segurança pública federal e os militares. Inicialmente, a reforma continha um artigo que igualava as regras de aposentadoria dos policiais militares e bombeiros às das Forças Armadas. Na última semana, a comissão especial da reforma aprovou um destaque do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) que retirou esses trabalhadores do texto.
Para o pesquisador e agente da Polícia Federal de Santa Catarina Antônio José Moreira da Silva, a aprovação da reforma da Previdência do Governo Bolsonaro pode ter um efeito imediato em uma série de mudanças estruturais que são exigidas pela categoria de segurança federal como uma reforma policialnecessária. Dentre elas estão medidas como a implantação de uma carreira única nas polícias brasileiras, onde a mesma polícia faz o trabalho investigativo e o ostensivo, e a desmilitarização.
De acordo com Moreira da Silva, o apoio à desmilitarização pode minguar com a aprovação de uma reforma da Previdência que diferencia o tratamento dado aos policiais militares e federais. “Quando o Governo propõe um regime previdenciário mais benéfico para as polícias militares, o apoio dos policiais, inclusive dos militares, à desmilitarização tende a diminuir bastante”, explica o pesquisador.
Segundo ele, muitos policiais não querem estar submetidos a um regime militarizado, porém, ter uma previdência mais positiva pode fazer com que a proposta de desmilitarização perca força entre a categoria. De acordo com Moreira da Silva, a desmilitarização é vista como “essencial para a humanização das polícias e para a adequação dos policiais”, além de ser uma forma para “que os valores dos direitos humanos estejam incorporados às polícias”.
Foto: Agência Brasil
Acordo do centrão prevê regras previdenciárias mais flexíveis para a categoria de segurança pública
“Sentimento de traição”
No período de campanha eleitoral, Bolsonaro recebeu grande apoio dos trabalhadores da segurança. De acordo com Moreira da Silva, após ter sido inserida na reforma da Previdência com regras que seriam prejudiciais, a categoria passou a se sentir traída pelo Governo. “Diante desse vai e vem dos posicionamentos do Governo, isso gerou uma frustração muito grande para os colegas que se alinharam ao bolsonarismo. Há o sentimento de traição mesmo, porque foi dado, por uma parcela grande dos policiais, um apoio incondicional. Embora não haja um pronunciamento dos sindicatos, os policiais individualmente têm manifestado esse sentimento de traição”, conta.
Segundo relata Moreira da Silva, com a reforma os policiais federais passaram a se sentir traídos não só pelo presidente, mas também pelo restante da família Bolsonaro. “Com os pronunciamentos do Eduardo Bolsonaro sobre a reforma, eles [policiais] sentem que foram iludidos. Há poucos dias ele fez uma postagem dizendo que ia votar de acordo com o texto original da reforma da Previdência, sem abrir espaço para reivindicações da categoria”, explica.
Moreira da Silva diz ainda que o apoio a Bolsonaro gerou divisões entre os trabalhadores da segurança pública, afetando a articulação da categoria. “Embora a grande maioria dos policiais federais tenha apoiado Bolsonaro, isso gerou um racha também dentro da própria categoria de agentes, escrivães e papiloscopistas, porque havia uma minoria que era contrária a esse alinhamento incondicional. E eu acho que isso afetou demais o poder de articulação dos sindicatos da polícia federal”, afirma.
Na opinião dele, embora tivesse o apoio de muitos trabalhadores da Segurança, Bolsonaro não tinha propostas efetivas voltadas para o setor, e isso estava evidente mesmo durante o período eleitoral. “Estava muito claro que o desdobramento seria algo assim. Para a segurança pública, Bolsonaro nunca teve uma proposta que fosse além do armamento da população e da excludente de ilicitude, apresentada aqui pelo Sérgio Moro”, diz.
O pesquisador lembra de um vídeo gravado durante a campanha de Bolsonaro, onde o então candidato não quis se posicionar sobre as principais exigências da categoria, que são “a reforma do modelo de segurança pública e a implementação de uma carreira única”. “Não dá pra dizer que fomos traídos, mas quem confiou nele se sente assim. Muitos colegas punham uma fé quase religiosa de que votar no Bolsonaro e ser policial federal nos traria algum ganho”, afirma Moreira da Silva.
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