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“Independência não significou liberdade para Guiné-Bissau”, diz sociólogo e ativista africano

Em entrevista especial, Miguel de Barros fala sobre a situação atual e os desafios colocados ao continente africano, no geral, e à Guiné-Bissau em particular
Marisa Rodrigues
Lisboa

Tradução:

Miguel de Barros é um Sociólogo e ativista guineense, especializado em Planeamento pelo ISCTE (Portugal). É igualmente Co-fundador do Centro de Estudos Sociais Amilcar Cabral – CESAC (Guiné-Bissau), Investigador no Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa – CEI/IUL-ISCTE (Portugal); Investigador no Centro de Estudios Internacionales Epistemología de Frontera y Economía Psicopolítica de la Cultura, Universidad de La Frontera (Chile) e Pesquisador no Núcleo de Estudos Transdisciplinares de Comunicação e Consciência da Universidade Federal do Rio de Janeiro – NETCCON/URFJ (Brasil) e membro do Conselho para o Desenvolvimento de Pesquisa em Ciências Sociais em África – CODESRIA (SENEGAL) e do Conselho Estratégico da Rede Internacional das Periferias – RIP (BRASIL).

Desde 2012, desempenha funções de Diretor Executivo da ONG Tiniguena, dedicada à preservação do meio ambiente na Guiné-Bissau (Prêmio Equador da ONU 2019). Foi eleito pela Confederação da Juventude da África Ocidental (CWAY) a personalidade mais influente do ano de 2019 e, em 2018, recebeu o prêmio humanitário Pan-Africano de Excelência em Pesquisa e Impacto Social (PALEDEC).

A Bantumen conversou, via e-mail, com o sociólogo numa entrevista onde são abordados os desafios colocados ao continente africano, a situação na Guiné-Bissau e a forma como os jovens podem contribuir para o desenvolvimento do continente.

Em entrevista especial, Miguel de Barros fala sobre a situação atual e os desafios colocados ao continente africano, no geral, e à Guiné-Bissau em particular

Gabrielly Pereira / Revista Periferias
Miguel de Barros é um Sociólogo e ativista guineense, especializado em Planeamento pelo ISCTE (Portugal).

Confira a entrevista

Bantumen – Miguel, nasceste em Bissau em 1980. De lá para cá, quais consideras serem as maiores alterações políticas e democráticas no país?

Miguel de Barros – Vivo num país que não suporta imposição em nome da “libertação” da opressão, mas que esconde a exploração. A Guiné-Bissau que conheço é um caldeirão que já experimentou quase tudo: impérios, escravagismo, colonização, luta de libertação, golpes, guerra civil, epidemias, democracia (disfarçada), tutelas e foi palco de disputas internacionais há séculos.

Mas é um país maravilhoso que tive a sorte de conhecer e de me encantar com ele, do norte ao sul, ainda na adolescência. É um dos países que em termos naturais e culturais é dos mais fascinantes, com um patrimônio verdadeiramente excepcional, que acolhe variedades de povos, tradições e também espécies raras e emblemáticas da fauna e flora selvagem, com recursos marinhos e florestais importantes para o equilíbrio ecológico e segurança alimentar, contribuindo deste modo para que o país se posicione no topo de sítios mais importantes da concentração da biodiversidade na África ocidental. 

Um contexto em transformação, eu sempre vivi em transformações. Nasci no ano do primeiro golpe de estado militar onde as legitimidades identitárias e ideológicas do processo de libertação estavam (e ainda estão) em confronto, o que tem marcado a disputa pelo poder político e tem condicionado o nosso desenvolvimento aliado aos interesses geoestratégicos regionais e mundiais da ordem econômica e de segurança internacional.

Neste sentido, a transição da independência para o regime de partido único trouxe a ditadura, o que constituiu uma premissa para o controle do poder político, que, ao não ser capaz de jogar o papel de provedor de recursos de bem-estar, de segurança ancorado em alianças (internas e externas), foi-se desmoronando ao longo dos tempos, perdendo o controle da capacidade de gerir instituições e atores decisivos para a sua coerência enquanto Estado.

Deste modo, embora o processo que levou à independência seja considerado como uma conquista nacional que todos se orgulham e exaltam a sua heroicidade – afinal o regime fascista português foi derrotado na África e na Guiné-Bissau -, porém, o processo da condução do novo Estado independente iria ser marcado por várias transformações.

Conflitos que começaram no próprio processo da luta de libertação nacional que levaram ao assassinato, em 1973, do pai das independências da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, Amílcar Cabral, passando pela falência do modelo de Estado monolítico à implementação do modelo neoliberal da economia a partir de 1984 e da política em 1991, resultando na adesão ao mercado comum monetário da África Ocidental (1997), à guerra civil (1998) e desembocando, até a atualidade, numa dupla tutela internacional das Nações Unidas e da CEDEAO.

Importa reconhecer que o território da Guiné era uma colônia de exploração, na qual foi aplicada a Lei do Indigenato que classificava as pessoas em categorias hierárquicas e limitava os direitos de cidadania e qualquer processo de transição de classe significava uma traumática alienação de identidades socioculturais para poder beneficiar do estatuto de “assimilado” e depois de “civilizado”.

A intensificação do processo de mobilização da resistência anticolonial desencadeou uma forte investida da então potência colonizadora, tendo levado a administração local a fazer investimentos na construção das primeiras escolas neste território, sendo que o primeiro liceu data de 1958, cinco anos antes do início da luta armada (23/01/1963).

Durante a vigência da administração colonial, este território esteve, até 1879 do Séc. XIX, sob a tutela da administração de Cabo Verde e com a luta de libertação nacional, o território guineense foi alvo da maior mobilização da milícia africana para os esforços da guerra colonial – comandos africanos.

Com a independência, proclamada unilateralmente em 1973 e reconhecida pela ONU e, só depois de um ano, pela então potência colonizadora, o novo Estado tinha apenas 14 pessoas com ensino superior.

O desafio era montar uma administração, criar infraestruturas e um sistema produtivo, educar a população e prover os serviços essenciais. No entanto, os primeiros dez anos (1974-84), com aplicação de um modelo de planificação da economia estatizada, geraram resultados que permitiram alargar a rede de serviços administrativos e sociais, com um ambicioso programa educativo com componentes produtivas, ideologicamente estruturante permitindo o resgate da história, a apropriação cultural e a aprendizagem das questões ligadas à cidadania.

Porém, a independência não significou a liberdade. O país transitou de regime de polícia política para regime de polícia-militar, ambos marcados por perseguições, prisões arbitrárias e assassinatos dos que eram considerados adversários e críticos do regime.

O Estado foi obrigado a liberalizar a economia, devido à falência, tanto do regime político cada vez mais contestado como da sua ineficácia na mobilização da capacidade financeira perante a crise econômica, com a inflação a níveis insustentáveis perante o colapso internacional do sistema comunista, maior aliado do país.

Nesta base, o governo embarcou na última vaga do Programa de Ajustamento Estrutural sob a batuta do FMI e do Banco Mundial, começando por abrir o mercado e o comércio aos privados, mas sem que no entanto houvesse vontade para o efeito e nem produção de capacidades ao nível do pensamento e atores com conhecimento e possibilidades de gerar impactos positivos para o país.

A liberalização não só acabou por matar o sistema de produção diversificada do país, mas também centralizou e reduziu o Estado ao mínimo (incluindo o sistema educativo, de saúde e agrícola), bem como ficou marcado por uma política de privatização selvática que desembocou na institucionalização da corrupção.

O país perdeu o ativo produtivo, passando a ser um país onde a monocultura de caju é o elemento estruturante da economia que permite agilizar os esforços de mobilização da divisa para o pagamento dos serviços da dívida.

A liberação econômica não gerou potência, mas sim tornou-se numa caução cujo preço foi colocar o país numa estrada de dependência: produção e exportação de castanha de caju bruta para o sudoeste asiático e importação de tudo, incluindo arroz, a base principal da alimentação.

No entanto, a minha geração começou efetivamente a entrar em contato com as transformações no país, sobretudo durante e após a abertura política e democrática com a realização das primeiras eleições em 1994.

Esse processo tinha sido marcado por uma grave crise no setor educativo que levou a manifestações de alunos do secundário que reivindicavam o direito à educação para todos e de qualidade, num contexto de greve de professores perante a emergência de organizações partidárias, mas também das primeiras organizações da sociedade civil e sindicatos independentes.

Todo esse processo criou uma insegurança ao regime levando-o a preocupar-se mais com a validação do voto do eleitor do que com a compreensão do sentido do voto. Deste processo, compreendi que as eleições em contexto de privação econômica e ditadura não conseguem ser instrumentos de mudanças políticas eficazes e efetivas, na medida que não geram nem apaziguamento social, nem mobilizam as pessoas para os desígnios coletivos e nem contribuem para a regeneração da sociedade.

No entanto, desde a realização das primeiras eleições multipartidárias as tensões aumentaram, a competição se agudizou e a luta pelo controle do Estado tornou-se e é assumida como luta pelo controle dos recursos de sobrevivência.

Com a crescente desvalorização da moeda nacional e a incapacidade de controlar a inflação, bem como atrair empréstimos internacionais, o país aderiu a União Econômica e Monetária do Oeste Africano (UEMOA) da África Ocidental, tendo adotado o franco CFA como moeda.

Se na verdade a integração econômica e monetária regional tinha a vantagem, em termos de estabilidade monetária, de agilizar o controle do déficit e permitir o crescimento financeiro e uma maior participação na economia global, por outro lado, os operadores econômicos não estavam preparados para a competitividade da integração e nem a população tinha cultura financeira ao ponto de compreender a desvalorização das suas poupanças face aos níveis exigidos pela disciplina financeira da comunidade, gerando falências de instituições e de famílias, criando um amplo movimento de novos imigrantes do campo para cidade, que colocaram as preocupações com a violência e delinquência na agenda pública.

Ou seja, crescemos vivendo as rápidas transformações sem dar-nos conta que estávamos também a ser obrigados a crescer demasiadamente cedo e com responsabilidades públicas.

Com a crise do Estado – sendo sentida sobretudo na desestatização da responsabilidade de proteger, educar as crianças, fornecer oportunidades lúdico-pedagógicas aos adolescentes e possibilidades de formação e emprego aos jovens – a minha geração foi obrigada a constituir os seus espaços alternativos de integração social e cultural, que mesmo atravessados por uma guerra civil, que durou 11 meses, conseguem produzir e gerar estratégias integradoras e não violentas capazes de permitir a mobilidade social ascendente mesmo quando o poder político torna-se supérfluo e descartável, já que a grande maioria das pessoas não sentem e nem reconhecem a ação do Estado como estruturante nas suas vidas.

Assim se fundou o movimento associativo juvenil guineense, enquanto uma realidade produzida a partir da ausência do Estado para gerar utopias de uma cidadania servidora através do voluntariado.

Deste modo, cresceu uma geração de resilientes, crentes na democracia, na solidariedade e justiça. Confrontam o desejo de vida com uma realidade indesejada, mas firmados num projeto de construção social de alternativas, com consciência que mobilizam a sua autoestima mesmo perante o descalabro político, valorizando os seus patrimônios ambiental, cultural e histórico, ensaiando formas de organização mais democráticas e performativas, geradoras de novos contratos sociais e econômicos.

Posso dizer que as mudanças que ocorreram no país, fez da minha geração agente que redesenha e constrói diariamente o novo mapa mental, identitário e produtivo das identidades transformadoras de um país potente mas frágil, com um passado glorioso, um presente complexo e fraturante, mas confiante na nossa capacidade de transformar o sofrimento em aprendizagens que nos transportam para a produção de um sentido patriótico capaz de gerar as mudanças desejadas. 

Vamos olhar agora para um contexto mais amplo. Consideras que, nos PALOP, ainda existe alguma relação com o passado colonial? Se sim, de que forma isso se reflete atualmente? 

Os PALOP foi uma “comunidade imaginada” baseada na afirmação da soberania política e da autodeterminação dos povos de sociedades com uma história comum de exploração e violência colonial sob a batuta do regime fascista português.

Fundou-se sob o princípio da solidariedade política e econômica na promoção de intercâmbios culturais entre os povos e partilha de visões sobre questões internacionais consideradas geoestratégicas, como por exemplo: a luta contra o apartheid na África do Sul marcada por uma ação diplomática intensa em prol da libertação de Nélson Mandela; o apoio ao processo da resistência Maubere (1975-1999) criando uma linha de retaguarda em África, permitindo aos líderes da FRETLIN deter passaportes diplomáticos dos estados-membros dos PALOP e residirem em países como Angola, Moçambique e Guiné-Bissau; a adoção de posições conjuntas na Organização da Unidade Africana – OUA (agora UA) e na ONU – para a defesa da independência da república do Sahara, da Palestina e fim do embargo a Cuba. 

Esta comunidade promovia reuniões anuais entre os chefes de Estado e de governo nos respectivos países, de forma rotativa, que se tornaram momentos de maior afirmação de um projeto internacional africano contra-colonial, sendo o único espaço do gênero de articulação entre as lideranças políticas das sociedades sofridas, a partir do continente sem tomar como principal fator de união o elemento de proximidade geográfico e nem também integrar os países que colonizaram.

Promoveram-se ainda outros elos de ligação através da cultura, tendo sido criada em São Tomé e Príncipe, em 1987, a Liga dos escritores dos cinco (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe).

No entanto, embora houvesse um espírito contra-colonial nestas sociedades, não se vislumbrou uma projeção da relação com esse passado capaz de abarcar um projeto de sociedade mais amplo e que não se resumisse apenas na relação entre os governos.

Para além do pós-independência não ter implicado a liberdade política, o processo de educação histórica e cultural nas nossas sociedades ficou obsoleto, esvaziado de conteúdo ideológico emancipatório.

Deste modo ficaram desativados o pensamento crítico de soberania política, econômica e cultural sobretudo na segunda metade dos anos 1980, à conta do Programa de Ajustamento Estrutural, sob liderança de Banco Mundial e FMI, num contexto de falência do sistema econômico-financeiro, do modelo do Partido Único.

A consequente queda dos regimes monolíticos esvaziou o dinamismo patriótico desses espaços dando lugar a um rompimento de vínculos – cada qual por si –  e nessa fase países como Angola e Moçambique que mais alimentavam essa agenda estavam mergulhados na guerra civil, outros que defendiam essa agenda (Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe) encontravam-se a braços com instabilidades políticas, enquanto Cabo Verde optava pela vinculação ao espaço de “afinidade atlântica” com maior proximidade à UE e EUA, o que contribuiu para desfalecimento dos vínculos.

As dinâmicas de resgate popular através da música RAP

Outros aspetos importantes para a fragmentação e fragilização dos PALOP tem a ver com os países onde houve uma alternância democrática (como são os casos de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe) onde alguma elite, que se revia na autonomia administrativa colonial (e não na independência), após terem chegado ao poder, decidiram apostar em “comunidades alternativas”, quer pela estratégia de mobilização de vantagens comparativas, através da possibilidade de atração de capital financeiro externo, mas sobretudo enquanto uma estratégia para o desmantelamento da memória comum dos movimentos independentistas que tinham gerido os países baseados na repressão e em alguns casos em ditadura. Foi como resultado desse processo que se favoreceu a aposta na integração nas comunidades regionais territoriais e geoestratégicas.

Entretanto, se é verdade que com a criação da Comunidade dos Países da Língua Oficial Portuguesa – CPLP, gerou-se uma oportunidade de retorno a um espaço de afinidades históricas e culturais, nunca se conseguiu resgatar (e nem poderia, devido ao passado colonial de Portugal e à marca do Brasil enquanto sociedade escravocrata) as bases dos PALOP.

Perderam-se vários ativos como por exemplo o direito de mobilidade e de entrada dos nacionais desses cinco países nos estados-membros, bem como todo intercâmbio cultural e artístico que se promoveu sobretudo no campo da literatura e das músicas populares, sendo as bandas músicais como Sangazuza/África Negra (STP), Super Mamadjombo (GB), os Tubarões/Buli Mundo (CV), Grupo Rádio Moçambique (Mz) e Kiezos/Jovens do Prenda (An) exemplos dessa construção social.

Hoje, há um enorme desconhecimento dessa realidade histórica comum, em consequência da falta de um projeto de “comunidade de desenvolvimento”.

Contudo, há dinâmicas interessantes de resgate popular das novas gerações e que projetam identidades baseadas em pesquisa e reconstrução de mecanismos de identificação com processos revolucionários dessa fase histórica de luta pelas independências, convocando os momentos simbólicos, os protagonistas e as suas causas num intenso diálogo com os contextos nos quais estão inseridos.

Podemos encontrar esses elementos sobretudo na cultura, através da música RAP, na produção artística e cinematográfica quer no interior da periferia desses países, como também das suas diásporas no Mundo. 

Olhando o contexto atual da África Ocidental, quais são os fatores que consideras colocarem em causa o desenvolvimento socioeconômico dos países? Ao nível dos recursos que o continente dispõe, que trabalho pode ser feito no sentido de os otimizar? 

O efeito imediato das medidas tomadas pelos Estados africanos para o combate à Covid-19 demonstrou quão o modelo econômico que os governos africanos estão a implementar não respondem às necessidades e aos desafios dos seus povos mas sim servem de motor ao modelo econômico neocolonial de promoção da dependência do continente, quando o que era preciso era potenciar a transformação da economia.

Na África ocidental, o dinamismo da economia gira em torno de seis eixos estruturantes, dos quais dois apenas dependem do mercado interno (negócios e serviços informais) sendo que os restantes cinco estão mais conectados com o exterior (exportação da matéria prima, importação de bens alimentares, turismo, remessa dos migrantes, ajuda pública ao desenvolvimento).

As projeções feitas pelas agências financeiras demonstram que o impacto da Covid-19 na economia vai fazer regredir o nosso crescimento global em menos de 6% do PIB, constituindo o pior resultado já registado nos últimos 30 anos.

Isso é um problema para uma das regiões mais dinâmicas em termos de crescimento mundial, o que não só demonstra a nossa vulnerabilidade, pelo facto de não diversificarmos nem orientarmos a nossa base produtiva para a transformação, criando empregos e serviços locais e encaminhando-a para mercados regionais no continente. 

A título ilustrativo, alguns casos são altamente preocupantes: a Nigéria, que é o motor da economia regional já que o seu peso representa dois terços do PIB total da CEDEAO (77% das exportações e 41% das importações), é altamente dependente da exportação do petróleo.

O fecho das fronteiras e a paragem das exportações provocou uma queda acentuada nas receitas do petróleo, o que teve como efeito um maior déficit em conta corrente este ano, com as reservas oficiais a diminuírem consideravelmente, prejudicando os consumidores com o aumento da taxa de IVA de 5% para 7,5% e um aumento nos preços da eletricidade desde abril deste ano, no meio de um desemprego galopante; o grupo de países dependentes do turismo e do envio da remessa dos migrantes (Cabo Verde, Gâmbia) deverão passar por um período de forte contrariedade com as economias em deterioração, algo que afetará o apoio à subsistência de várias famílias; para países como o Senegal, com os crescimentos mais estáveis e altos da região (6% PIB), a combinação entre a falta de exportação da matéria prima, a impossibilidade de importação e a redução na ajuda pública ao desenvolvimento irão levar ao sobre-endividamento para financiar projetos de desenvolvimento, quando são baixas as garantias de um encaixe financeiro a médio prazo com impacto na economia atendendo a baixa dos preços dos hidrocarbonetos e aumento da inflação, o que levará a um record do aumento da dívida pública em mais 60% do PIB. 

Um outro ponto extremamente crítico que limita o desenvolvimento econômico do continente e consequentemente evidencia o enfraquecimento das possibilidades de mobilização de capacidades para a geração de emprego, a circulação de capitais e serviços condicionando assim o protagonismo da liderança na transformação da sub-região – são as importações.

Há uma enorme dependência da China e da Europa que ultrapassam a média de 20% do PIB. Com o fecho das fronteiras, os países ficaram mais expostos, particularmente na importação de alimentos, tornando-se vulneráveis a riscos sistêmicos, como as oscilações de preços nos mercados internacionais, algo que afetou o comércio e a segurança alimentar.

Segundo os dados do FMI, a cada ano, o sistema de transporte mundial movimenta milho, trigo, arroz e soja em quantidades suficientes para alimentar 2,8 bilhões de pessoas, dos quais a África Subsaariana, só em 2018, absorveu mais de 40 milhões de toneladas de cereais de todo o mundo.

Um dos casos paradigmáticos é o meu país, com sete meses de chuva, terra agricultável, mão de obra juvenil disponível, mas que importa por ano do sudoeste asiático mais de 90% de arroz, a sua base de alimentação.  

Estes elementos todos que enumerei são provas que devemos recontextualizar as nossas políticas de investimento público no continente e na sub-região, criando estratégias mais robustas com metas objetivas que visem o impacto na melhoria das condições de produção e no acesso aos bens e serviços permitindo que seja feita a partir da economia e não da Ajuda Pública, algo que contribuirá para a superação da narrativa da pobreza.

A Covid-19 veio demonstrar-nos que é necessário acelerar essas transformações integrando a dimensão social da economia da vida enquanto condição estruturante para o bem-estar.

O que achas que podemos esperar dos países da África Ocidental nos próximos dez anos?

A isso devemos associar o aumento do investimento na transformação industrial local, de forma estruturada entre os países para a optimização de fileiras produtivas e comerciais. Para o efeito, a melhoria da infraestruturação – nas regiões com os espaços produtivos superando as rotas coloniais, otimizando a troca local, nacional e regional – serão decisivas.

Um dos maiores defensores dessa visão é o sociólogo e economista guineense Carlos Lopes, que demonstra que a ausência de uma união monetária ao nível continental tem tido impactos especialmente no comércio e no investimento intra-regional, que gira em torno de 18% em média, contra 21% para a América Latina e Caraíbas, 50% para a Ásia e 70% para a Europa.

Há que reformar e requalificar as instituições públicas no sentido democrático, combatendo a corrupção e adotando um quadro fiscal mais atraente para as pequenas e médias empresas, promovendo deste modo a economia inclusiva e empregos sustentáveis, incluindo a proteção social e a criação de sistemas de financiamento para as mulheres inseridas na economia informal.

Para viabilizar estas ideias, serão necessárias lideranças visionárias com alto nível de cultura democrática, capazes de promover a despartidarização e desmilitarização das instituições e das sociedades, fomentar políticas públicas afirmativas de forma sistêmica (saúde, educação, ambiente, cultura, desporto) com respeito pelos direitos e promoção de sociedades mais livres, equitativas e democráticas para assim potenciar o maior ativo dos nossos países que são os jovens.

O futuro tem que passar necessariamente pela busca da soberania política, econômica, produtiva, energética, alimentar, cultural e intelectual. Isso implica ter uma organização regional, a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental – CEDEAO, reformada, para que deixe de agir com base nos interesses conjunturais das lideranças, ou seja, com maior autonomia institucional e arrojo estratégico, cada vez mais competente e engajada com o bem-estar da sua população.

És Diretor Executivo da Tiniguena, uma das ONGs mais conceituadas da Guiné-Bissau. É legítimo considerar que, de certa forma, as ONGs colmatam as falhas do Estado? 

Há uma errada separação da ação da Sociedade Civil dentro do conceito do Estado. Isso é minimalismo do Estado democrático e uma visão que não faz sentido nos tempos atuais.

A concepção de que o Estado são os órgãos da soberania e as instituições públicas, como os únicos detentores de mandato para gerir territórios e serviços, é algo que se superou desde o momento que se convencionou de que o Estado não tem o monopólio de toda a ação pública e que de facto deveria ser igualmente controlado e fiscalizado. Mais caricato ainda, no contexto africano e do Sul, é que há comunidades tradicionais que são entidades que antecederam à organização deste modelo de Estado do tipo ocidental e que são proprietárias e guardiãs de espaços, recursos e ancestralidades que permitem com que o Estado hoje exista enquanto detentor de territórios, culturas e riquezas. 

No entanto quando se fala das políticas públicas, em algumas dimensões torna-se conflituante que as mesmas instituições (públicas) sejam os agentes responsáveis pela criação de ambientes econômicos e sociais favoráveis e, simultaneamente, pela implementação e fiscalização das suas ações.

Viram-se os limites das instituições formais e de coação, distantes da vida social, sem capacidade e alcance de mediação e/ou reparação.

Deste modo, ao tomar em conta o impacto dos aspetos distributivos (pobreza), aspetos relacionais (exclusão social), aspetos estruturais (poder/capacidade de influência) reconhece-se que são as Organizações da Sociedade Civil as entidades mais habilitadas para intervir na combinação da ação em torno dessas questões, ou seja, isso tem a ver com cidadania e assumir-se enquanto agente de mudança social.

Ora as ONGs são uma dimensão importante da Sociedade Civil, tal qual os sindicatos, as organizações religiosas, as associações socioprofissionais, as instituições de pesquisa, todos projetos formais alternativos de democracia participativa e de cidadania. Por outro lado, há ainda outras manifestações importantes como pessoas coletivamente organizadas em torno de movimentos sociais que intervêm no campo não formal.

Em muitos contextos, o debate em torno da complementaridade e/ou autonomia das ONGs é algo que decorre do perfil dos regimes políticos, na forma como exercem o poder político na sua relação com outros atores, podendo ser mais forte e centralizador ou forte e autônomo, ou ainda fraco e ausente. A dificuldade reside na forma como se projeta a relação de colaboração versus competição.

É claro que houve fases onde o discurso e a ação das ONGs, em vários quadrantes, sobrepôs-se à ação do Estado, sobretudo com as políticas neoliberais da redução do Estado, mas também houve contextos onde as ONGs foram a emanação do poder político, algo que se verifica nos contextos de ditadura ou de democracia disfarçada.

Por outro lado, há dinâmicas no interior do movimento das ONGs: há as que se posicionam na interface entre a população e as instituições como “intermediárias”, há as que são meros profissionais prestadores de serviços, mas há igualmente as que atuam como gestores de fundos e ainda há umas que se posicionam como agências de mobilização de fundos dentro do mercado de financiamento internacional. 

Toda essa dinâmica resulta de transformações profundas no modelo de solidariedade que norteia a Cooperação para o Desenvolvimento, para a consolidação do neoliberalismo no campo da solidariedade ganhando impulso de investimento e adotando instrumentos e discursos do setor privado para o setor social, bem como a incorporação no setor privado de discursos como “responsabilidade social das empresas” encobrindo o marketing.

A crise do financiamento internacional para o desenvolvimento gerou a deslocação do campo de intervenção de várias ONGs para a competição com suas parceiras, mas também à disputa com estruturas públicas dos mesmos recursos e protagonismos, levando igualmente as ONGs a recriarem a economia social, baseada na possibilidade de autofinanciamento para enfrentar questões como o desemprego, acesso à habitação, produção de bens, mutualidades na saúde, apoio aos grupos vulneráveis (crianças, idosos, pessoas com deficiência), mas também mecanismos de segurança social para os produtores rurais em particular as mulheres, a partir de premissas de economias territoriais ou de valorização dos recursos endógenos. 

Da minha experiência, durante estes 20 anos, enquanto ator e interessado em estudar esses processos, a lição que tiro é que esta forma de “engenharia sociopolítica”, desencadeada por atores considerados “não governamentais”, não significa que não estejam inseridos no âmbito do Estado

 Têm influenciado aspetos comportamentais e relacionais de grande parte do pensamento e da ação pública, permitindo, como sujeitos sociais, a afirmação não só de sociabilidades como de construção de alternativas socioeconômicas e sociopolíticas alicerçadas entre o localismo e o cosmopolitismo, contribuindo assim para desconstruir a dicotomia formal/informal, mostrando a sua relação e intersecções, incluindo as Diásporas.

Procuram superar desigualdades promovendo a justiça social através do reconhecimento, resgate, promoção e valorização da capacidade das comunidades e sociedades em geral em construir mecanismos de inclusão e influência da agenda política na vida pública, gerando transformações, conhecimentos e aprendizagens.

Posso dar dois exemplos muito concretos no que tange ao nosso caso: – um dos maiores problemas que enfrentamos é o negócio da madeira e a consequente desflorestação, com impactos incalculáveis quer para natureza, mudanças climáticas e economia local e nacional.

Se não houvesse a ação das ONGs no sentido de denunciar a corrupção e os males associados a esse negócio ilícito, elucidar a opinião pública, mobilizar comunidades para a defesa do seu patrimônio e santuários florestais, realizar estudos de impacto que demonstram as perdas inclusive financeiras com a exportação da madeira bruta e que viola as leis nacionais e ainda criar bases para edição de modelos de gestão endógena e comunitária que regulam esses espaços e recursos, quem iria fazê-lo?. 

Um outro exemplo, é a questão da alimentação escolar. Levamos anos a tentar convencer as autoridades que deveríamos superar a lógica de segurança alimentar para soberania alimentar. Em 2006, iniciamos o projeto “kil ki di nos ten balur” (o que é nosso tem valor), para além do investimento na capacidade de transformação local dos produtos da biodiversidade a partir de tecnologias ecológicas e baseadas em saberes locais com organização de fóruns de produtores.

Criou-se uma rede de distribuição e comercialização solidária e ainda projetou-se a promoção do consumo dos produtos naturais e locais. Agora, estamos a trabalhar com alguns desses produtores e produtoras rurais enquanto fornecedores da matéria prima para a alimentação escolar no âmbito do programa Cantina Escolar, como forma não só de redução da dependência externa com a importação, mas sobretudo de empoderamento social, econômico, organizacional dos camponeses e a sua consciencialização para a luta contra a pobreza através de um múltiplo investimento no ensino (redução de desistências, melhoria da capacidade nutricional e cognitiva dos alunos, educação do paladar), na economia familiar e no futuro dos seus filhos. Então nesses casos, as ONGs ainda continuam a ser apenas complementares?

Com isto, quero dizer que a legitimidade das ONGs não deve ser colocada apenas na eficácia dos serviços que prestam, mas sobretudo dentro do âmbito dos seus mandatos enquanto Movimentos Sociais, na capacidade de agirem com coerência (interna) e correspondência (externa/territorial), baseadas numa visão própria, com agenda de interesse público e geradoras de impacto no campo da cidadania de forma ativa e plena.

Foste reconhecido como uma das Personalidades Mais Influentes da África Ocidental (2019). Acreditas que o trabalho que tens desenvolvido até aqui pode servir de inspiração para outros jovens, no sentido de mostrar que, embora a caminhada seja longa, existem perspetivas de futuro?

Eu não me esgoto em mim, muito pelo contrário. Sou uma confluência de processos dinâmicos, contextos e de comunidades de afinidades.

O trabalho que tenho a possibilidade de desenvolver, antes de tudo, tem-me permitido absorver aprendizagens e conhecimentos que essas comunidades têm sido capazes de recriar de forma útil, permanente e que lhes dão sentido de pertença (como são os casos de povos tradicionais), instrumentos para abordar as contingências de vários níveis (como são os casos das mulheres rurais e/ou dos movimentos juvenis), modelos de agenciamento de novas abordagens organizacionais (como é o caso da Tiniguena, onde passo a maior parte do meu tempo) e a criação da capacidade de produção da massa crítica (como são os casos dos centros de pesquisa nos quais estou integrado).

São esses engajamentos que foram, antes de tudo, reconhecidos e que me inspiram para a intervenção pública.  

Em segundo lugar, não acredito que é essa projeção, com certa dose de visibilidade que servirá aos jovens para se inspirarem. Pode até ser em alguns casos, mas não é o elemento decisivo.

Os jovens têm sido protagonistas principais da ação mobilizadora em prol da ampliação da cidadania, pois só resiste quem tem consciência de si e profunda consciência sobre a sociedade, algo que não nos falta em África e nem precisa acontecer apenas quando as distinções acontecem.

Entretanto, é verdade que hoje as sociedades estão fortemente marcadas por intensos consumos e estilos de vida desencadeados pelos fenômenos mediáticos (youtubeselfies) que potenciam alguma alienação identitária e imediatismos, mas não há nenhum projeto social capaz de se emancipar sem que esteja integrado num modelo socioeconômico e socioambiental viável.

Daí que, o desenvolvimento da capacidade organizativa dos jovens que permita o ensaio de modelos de autoeducação e autogovernação não hierárquica, consensual, participativa e equitativa de comunicação não violenta, será sim, o elemento crucial que contribuirá para a mudança de paradigma do futuro dos jovens.

Daí o espaço como Teatro GRIOT (em termos territoriais) e BANTUMEN (em termos virtuais) constituem uma confluência para a operacionalidade de estratégias de mobilização através da comunicação também abertas, de tal forma que os próprios sujeitos tenham consciência e interesse em pensá-las e concretizá-las. Assim se conseguem projetos mobilizadores enquanto elementos fundamentais para vincar e manter uma agenda própria com reconhecimento, identidade e impacto no espaço público.

Ao nível dos jovens que estão na diáspora, de que forma estes podem ser considerados elementos estratégicos para o desenvolvimento do continente? 

É importante falarmos nas Diásporas, no plural. São comunidades de afinidades que podem ser baseadas em identidades territoriais e/ou imaginadas cuja máxima varia de geração a geração, de acordo com contextos globais e específicos nos quais cada comunidade se integra, associada à relação que desenvolve com as sociedades compreendidas como de origem.

Mas, o elemento crítico é o “capital da herança” ideológica (cultural, política, histórica e social) que mobilizam para as suas ações públicas. Essa construção teórica é algo muito complexo porque requer dimensões de reconhecimento e aceitabilidades que muitas das vezes transformam as tensões sociais num limbo que, individualmente e coletivamente, são inculcados pelas representações sociais e cristalizadas pela mediatização.

Mais complexo ainda quando esse conceito é aliado ao da Juventudes, também no plural. Aqui empresto as reflexões da socióloga moçambicana Alcinda Honwana, que caracteriza esse estádio como “waithood” (idade suspensa) para designar as complexidades da transição multifacetada e temporal para a vida adulta, tendo como variáveis aspetos da vida social como o acesso às oportunidades de formação e aprendizagem, empregabilidade, casamento e constituição da família, participação cívica. 

Essas dinâmicas fazem com que as Juventudes sejam compreendidas como relações entre a posição social, a idade e o poder em torno de significados e pertenças.

Analisando as Diásporas negras, é necessário ter uma abordagem histórica, cujo contributo dos percursores do Pan-africanismo, como Marcus Garvey e William Du Bois, são fundamentais para perenização da memória e consciência histórica de trajetórias de sofrimento, mas também de resistência para a construção e afirmação de uma agenda pública antirracista e de reconhecimento do legado e contributo dessas comunidades subalternizadas e inviabilizadas em contextos de opressão.

Mas importa dizer que ao analisar as Diásporas africanas, constata-se, nos tempos atuais, maior dinamismo em África, sendo que mais de 80% dos migrantes africanos estão a residir no próprio continente, na fase compreendida como jovem e ao associar às Diásporas fora do continente, o peso por exemplo das remessas na economia africana chega a atingir mais 60 mil milhões de dólares ultrapassando a Ajuda Pública ao Desenvolvimento que se situa entre 40 e 50 mil milhões de dólares.

Esses dados são muito importantes na medida em que os jovens no contexto diaspórico, embora marginalizados constituem um dos ativos mais produtivos e criativos, mas colocados fora do sistema econômico e do poder quer das sociedades de acolhimento, mas também nas sociedades de origem.

Essa dupla exclusão é algo que se comunga entre a Diásporas e as Juventudes sobretudo porque são atores da transformação, algo que gera medo ao sistema neocolonial e simultaneamente aos regimes mais fechados e ditatoriais. 

Deste modo, torna-se mais que evidente a necessidade da mobilização desse ativo historicamente inegável, intelectualmente defensável e empiricamente demonstrável em torno de afinidades culturais, atividades políticas e convenções socioeconômicas que embora sejam ainda alvo de exclusão e racismo (incluindo em África) podem e devem ser amplamente mobilizados para a transformação da África e das suas Diásporas, através dos jovens. Isso significa a revisão da ideia de cidadania e da mobilidade dos migrantes e de seus descendentes para além das nacionalidades específicas.

Neste campo particular, a União Africana, no processo da sua reforma, deu alguns passos importantes para incorporar formalmente as Diásporas africanas nos seus vários mecanismos, inclusive a supressão de vistos de entrada na capital sede da União, Etiópia e vários países estão a seguir esses passos, embora que ainda tímidos. 

As experiências dos africanos e de seus descendentes respondem de forma eficaz ao ecossistema produtivo, criativo, econômico e social sobre a potência africana e sua relevância é de extrema atualidade, tendo em conta as possibilidades de construção das narrativas emancipatórias para mudanças de paradigmas.

É preciso que os jovens nas Diásporas se mobilizem em comunidades de afinidades para estarem numa posição de poder que permita tomar posições coerentes, justas e transformadoras para deixarem a humanidade em melhores condições do que a herdaram.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Marisa Rodrigues

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