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Jorge Luna*
O escritor e jornalista uruguaio Eduardo Galeano, ao conquistar o Prêmio ALBA 2012, em 30 de janeiro passado, exclamou que não gosta de expressar suas emoções, mas não pode deixar de confessar que pouco falta para que o convertam “em campeão olímpico de salto de altura”.
Este prêmio me estimula muito, disse em declarações ao jornalista Jorge Luna, correspondente de Prensa Latina em Montevideo e colaborador de Diálogos do Sul, e acrescentou: “De alguma maneira me confirma que o que a gente escreve pode ser algo mais que um desabafo solitário: palavras que se unem a outras palavras escritas ou faladas por outras bocas ou por outras mãos, em lugares muito diversos”.
“A todos os que nos reconhecemos como parte da ALBA (Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América), move-nos a certeza de que estamos contribuindo a uma tarefa de recuperação da dignidade coletiva”, manifestou.
Mais adiante, asseverou: “Isso ultrapassa as fronteiras da geografia e do tempo. A gente pode se sentir companheiro de pessoas nascidas em lugares distantes e irmãos de pessoas que viveram em tempos muito distantes. Esses são os vínculos mais dignos de fé: os que nascem da solidariedade”.
É o que antes chamávamos internacionalismo, e que nada tem a ver com a globalização imposta pelos amos do mundo, que só nos une no dever de obediência, completou.
Os prêmios ALBA foram anunciados durante o encerramento do III Encontro Internacional pelo Equilíbrio do Mundo, que reuniu em La Habana a mais de 800 intelectuais de 40 países em homenagem ao herói nacional cubano José Martí.
Jorge Luna: Como descreveria o impacto da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América?
Eduardo Galeano: O desenvolvimento da ALBA é uma das mais eficazes respostas ao sistema mundial de poder que no convida a cuspir no espelho e nos obriga a aceitar a impotência como destino. Queremos ser corpos, não sombras. Queremos ser vozes, não ecos. Reivindicamos a dignidade, a solidariedade e a diversidade. Negamo-nos a aceitar a ordem de eleger entre as duas maneiras de morrer que o sistema nos oferece: não queremos morrer de fome e tampouco de tédio. Este mundo é muito injusto, muito desigual nas oportunidades que oferece e também muito igualador nos costumes que impõe. Temos somente o direito de copiar? É proibido criar?
JL: Entre tantas obras valiosas, seu livro As veias abertas de América Latina (1971), mantém especial vigência, tanto assim que o presidente venezuelano Hugo Chávez deu de presente ao presidente estadunidense Barack Obama, em 2009. O que o motiva a escrever sobre os temas que escreve?
EG: Dizem que Jean-Paul Sartre disse que escrever é uma paixão inútil. Não sei se disse ou não, mas, sei que continuou escrevendo, assim, não estava convencido. Eu escrevi alguns livros, mosaicos armados a partir de relatos breves, tratando sempre de dizer muito com pouco e sobretudo tento ajudar na recuperação do arco-íris terrestre, muito mais bonito que o arco-íris celeste, mas que tem sido mutilado pelo machismo, o racismo, o militarismo e tantos outros “ismos” inimigos da diversidade humana.
JL: Você tem abordado sempre temas da identidade latino-americana…
EG: Escrevi e continuo escrevendo para celebrar a alegria de ter nascido na América, nestas terras em que marcaram encontro todas as cores e dores do mundo, para ajudar a criar um mundo em que o próximo seja uma promessa e não uma ameaça e onde possamos viver livres das ditaduras do medo: o medo de ser o que podemos ser.
Criado em 2007, o prêmio ALBA das Artes e Letras é outorgado a criadores que consagraram suas vidas e suas obras a engrandecer o patrimônio cultural da América Latina, entre outras contribuições.
O jurado deste ano foi conformado pelo intelectual venezuelano Luis Britto, o sociólogo panamenho Guillermo Castro, o narrador equatoriano Raúl Pérez, o sociólogo boliviano Esteban Ticona e a acadêmica cubana Digna Guerra.