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É claro que o tema educativo está profundamente enraizado na vida nacional. E que a crise do setor não constitui um elemento superficial nem anedótico. E é claro também que enquanto no Peru sejam aplicadas as “receitas” neoliberais, os problemas no setor não serão seriamente encarados, qualquer que seja o titular da pasta.
Gustavo Espinoza M.*
Hoje são registrados mais de um milhão e meio de crianças fora do sistema educativo, um terço de escolares que sofrem de desnutrição crônica, quase 800 mil escolas com infraestrutura severamente danificada; numa circunstância na qual em cada distrito se multiplicam discotecas e casinos, mas não existem bibliotecas municipais. Os programas de TV também não educam, pelo contrário estimulam a incultura e o ócio.
Nem o governo de PPK, nem qualquer outro do mesmo tipo poderão encarar os assuntos essenciais da questão, nem mesmo através de uma gestão formalmente “eficiente”. A administração Saavedra –ou outra parecida- poderá conseguir alguns avanços curriculares, ou certos “êxitos” de tipo acadêmico; mas os grandes temas: a liquidação do analfabetismo, do afã de converter a educação em uma mercadoria y tratá-la com o critério de lucro, ou situar o serviço educativo como um direito em benefício de todos os peruanos, só será possível através de uma política de longo prazo que rompa com os esquemas formais e abra passo à transformação revolucionária da sociedade.
Entretanto, nada disso deve nos impedir de definir critérios em torno do que está ocorrendo na área de educação nacional. Pelo contrário, temos o dever de situar cada um dos assuntos colocados em discussão hoje, sem perder de vista o cenário global. O objetivo essencial não é “defender Saavedra”, mas lutar abertamente – e com a maior força possível – para impedir a concretização dos objetivos da Máfia.
A análise desses problemas e o quadro que se vive, nos leva então a afirmar categoricamente que a “discussão parlamentar” que os peruanos puderam acompanhar pela TV na última quarta-feira dia 7, foi simplesmente um debate nauseabundo.
Ver “ao vivo e em direto” as cabeças das máfias mais corruptas “denunciando” a existência de “bandos organizados para delinquir” no setor da educação, foi como aludir à voz da experiência: os que organizaram esses grupos desde os anos 90 do século passado hoje os põem em evidência porque foram detectados e ainda denunciados.
Foi assim que aconteceu, efetivamente, no caso de Ruth Vilca Tasayco, mostrada agora como “corrupta” funcionária, que começou a “operar” nomeada como funcionária do Estado por Alberto Fujimori, y protegida pela Máfia em todos esses anos. Além do mais, ela figurou no recente processo eleitoral ao lado da hoje parlamentar keikista Úrsula Letona. E agora, é usada como “prova cabal” de corrupção no setor de educação. E é que foi, efetivamente, localizada a tempo e posta a disposição dos órgãos de controle competentes, em 23 de novembro passado.
A Máfia Fujimorista não atua em função dos interesses do país, nem pelo progresso da educação pública, que lhe importa um pepino. Aspira somente a enfraquecer ao máximo o governo com a ideia de derrubá-lo e promover um novo processo eleitoral que lhe permita ungir no Poder a Keiko Fujimori.
O que não pode fazer mediante métodos formais em 2011 e 2016, busca conseguir agora estimulando a “vacância presidencial”. Para isso, se vale da ostentosa “maioria parlamentar” que construiu ilegalmente.
Nunca estará demais repetir las cifras para compreender melhor: Keiko Fujimori obteve nas eleições de abril 26.3 % dos votos. Mas o Júri Nacional de Eleições lhe deu 39.8% arguindo que se computava em seu proveito, a porcentagem que “lhe correspondia” de nulos, viciados e em branco. Esse “operativo” foi consequência do plano idealizado pela classe dominante e orientada para impor no Palácio de Governo a Primeira Dama da ditadura do “chinito de la yuca”.
O segundo passo –é preciso recordar – foi ainda mais letal. O partido de Keiko alcançou apenas 23.6% dos votos para o Congresso da República, mas o mesmo “poder eleitoral” lhe concedeu 56% de los votos, para “reconhecer-lhe” 73 congressistas de um total de 130, outorgando-lhe assim a maioria absoluta do Parlamento Unicameral.
Esta segunda ação estava tramada desde o início e tinha um só propósito: dar ao keikismo o controle do Poder Legislativo, independentemente, inclusive, da votação presidencial que obtivesse sua candidata. Em outras palavras: Todo o Poder para a Máfia a fim de converter o Peru em um Narco Estado! Essa era “a missão” Da Classe Dominante.
Com esses perversos procedimentos, a Máfia pode construir no Congresso uma maioria obsequente e servil; mas, além disso, extremamente medíocre, inculta e – sobretudo – corrupta, mal educada e agressiva..
congressistas como Luis Galarreta, Bienvenido Ramírez, Hector Becerril, Lourdes Alcorta, Úrsula Letona e seus sócios de desventura, liderados por Mauricio Mulder foram os encarregados da artilharia mais insensata e disparatada, sustentando apenas duas teses: a) que o ministro Saavedra era culpado das deficiências que se registram na preparação dos Jogos Pan-americanos e b) responsável pela “corrupção” detectada no setor. Por extensão, o governo de PPK, em seus 100 dias de gestão, “não foi capaz de resolver estes graves problemas”.
É bom que se recorde agora que sob o império do fujimorato a “política educativa” teve signos inequívocos: Interveio, administrativa e militarmente, nas principais universidades públicas, consumou massacres contra estudantes e professores; colocou autoridades escolhidas a dedo, e as fez desfilar –por corrupção ou por medo- no El Pentagonito ao compasso da Máfia no Poder; e esterilizou a capacidade de pensar, envilecendo e corrompendo o cenário nacional.
Hoje, persiste nesse propósito porque acredita que conseguiu afirmar na cabeça das pessoas a ideia de que Keiko está algo assim como “predestinada” a ser Presidente, e que o será a qualquer preço. “Quem não estiver de acordo poderá votar contra, mas finalmente terá que se “resignar”“. Assim é “na democracia”!
Por enquanto, como primeiro passo, busca censurar o Ministro Saavedra para iniciar sua ofensiva. Depois colocará no banco dos réus o ministro Basombrío, e todo aquele que resista ao assédio da Máfia. Depois dirigirá sua pontaria a um nível mais alto. Na mira estará o Chefe do Estado.
Tem importância que isso ocorra na vida peruana, ou a Esquerda pode se dar ao luxo de ignorá-lo por ser – como se costuma chamar – um cúmulo de “contradições no campo inimigo”?
Cada passo dado pela Máfia por cooptar a estrutura do Estado afeta o país e os trabalhadores. Danifica o corpo social e envilece o meio em que se desenvolve a vida cidadã. Denigra as instituições e compromete a ação das classes sociais e dos partidos políticos. Gera um alto nível de desmobilização e desmoralização que desanima e corrompe. Ninguém pode ser alheio a esta realidade.
Não se trata, então, de identificar-se com uma pessoa ou um regime. Trata-se de algo muito mais transcendente: gerar no país um alto nível de consciência que seja capaz de barrar a passagem dos que vêem o Peru como um espólio e buscam ascender ao Poder para satisfazer vaidades pessoais e caprichos de clã.
É a vida que convoca hoje os peruanos.
*Colaborador de Diálogos do Sul, de Lima, Peru