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Novos elementos paradigmáticos para realmente sair da crise

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Josep Xercavins Foto
Para o professor catalão não há saída para a crise repetindo-se o modelo atual

Josep Xercavns i Valls*

Crise financeira, crise econômica, crise do trabalho e/ou versus crise ambiental. Não há dúvida de que, atualmente, estamos imersos em duas (de fato em mais, mas as vezes é bom simplificar um pouco para poder avançar em algumas ideias) grandes crises: a econômica derivada da financeira e com especial efeito negativo no trabalho, por um lado, e a ambiental, com especial efeito no clima, de outro.

A primeira reflexão (e talvez também a última conclusão) que creio se impõe como preliminar ( e talvez também como principal), é que se pretendemos afrontar a primeira (de uma forma socialmente progressiva, neoclássica) por ela mesma e, por um momento (devido ao sofrimento diário de tantas pessoas no sul da Europa ou nos EUA que não podemos esquecer que se acrescenta a metade da humanidade no planeta), “esquecemos (não por indiferença mas por priorização) da crise climática e ambiental em geral”, poderíamos terminar saindo de uma crise aprofundando irreversível e irremediavelmente a outra.

A saída neoclássica keynesiana à crise financeira, econômica e do trabalho, diante da pretendida (e sempre fracassada) saída neoliberal

Não me estenderei muito. Já temos muitas opiniões, avaliações e propostas a favor de caminhar rapidamente para esta saída keynesiana e, portanto, só farei algumas apreciações sintéticas.

É óbvio, tanto para mim como para tantas vozes realmente “autorizadas”, que as políticas de austeridade, de redução do déficit púbico, de contenção e pagamento da dívida pública – na realidade de ajustes estruturais neoliberais com enormes doses de privatizações -, só levarão a mais uma fase (outra fase mais, e vale a redundância) de grande enriquecimento dos setores mais especulativos das finanças ligadas aos paraísos fiscais e, definitivamente, dos jogadores no cassino global da nuvem financeira que continua crescendo sem nenhum tipo de escrúpulo,  nem sentido nem objetivo (exceto o desde lunático, enlouquecido enriquecimento).

A contestação a estas políticas começa a ser tão forte, numa visão otimista me atreveria a prognosticar que irão perdendo peso e hegemonia no contexto das políticas mundial. E que de entrada pode ser que pouco a pouco, e logo com muito mais velocidade, devem mudar e mudarão radicalmente para um grande fortalecimento do setor e das políticas públicas com base em dois grandes tipos de medidas:

a)    as de proibições ao setor financeiro. Já é hora de que se lhes deixe de pagar o que eles mesmos dilapidaram em função única e exclusivamente de seus interesses particulares, e não como de motores da economia real que é sua única razão de ser do ponto  de vista social;

b)   iniciar com toda força políticas públicas de estímulo à economia real que, fundamentalmente, devem ser extensivas na criação de postos de trabalho. Se não acertamos nisso nos perderemos na busca de crescimentos na produção e no consumo de bens e serviços de alto valor agregado, com base no uso de tecnologias mais sofisticadas que nunc, e que só terminarão beneficiando aos setores econômicos de ponta, que de fato, não estão tão mal, e que precisamente não necessitam nem criam muitos postos de trabalho, e portanto, não favorecem o acesso social massivo aos bens e serviços de primeira necessidade. Cuidado, muito cuidado, com toda esta verborreia do empreendedorismo, a inovação, a excelência, etc, que poderia terminar com matando tudo do ponto de vista social.

Desenvolvimento (“crescimento”) econômico, social e verde, diante de um crescimento econômico standard   e ambientalmente predador

Se a hipótese anterior fosse correta, quais seriam os novos perigos a serem evitados, de início e a qualquer preço.

Por um lado, que o novo desenvolvimento econômico não desse resposta (e não deu até agora) ao sentido humano do fato econômico (distribuir recursos e riquezas de base natural –escassos-, para satisfazer necessidades humanas – priorizando sempre, sem exceções, as básicas e realmente necessárias individual e socialmente). Deve ser, portanto, uma economia social, principalmente justa distribuidora de recursos e riquezas entre os indivíduos da sociedade que, como tais, contribuem, cada um de acordo com suas capacidades, a que, inclusive sem demasiadas necessidades sistêmicas de crescer, em termos de medidas obsoletas como a do PIB, o desenvolvimento econômico social seja uma máquina eficiente de funcionamento contínuo.

Outro grande perigo que se deve evitar, eu diria que com a máxima e ordenada prioridade, é que o novo desenvolvimento econômico não seja verde. Na última cúpula Rio+20 na ONU ficou estabelecido um conceito, o de economia verde, que apesar de todas as críticas sobre suas insuficiências como paradigma realmente alternativo para caminhar para um desenvolvimento humano sustentável, continuo acreditando que é um dos ventos intelectuais más frescos que  sopram no nosso entorno.

Longe de propostas absurdas e fracassadas anteriormente. Por exemplo, a de separar a economia do meio ambiente, que sempre me pareceu uma espécie de alucinação espiritual. A  economia verde   se radica precisamente em uma nova articulação da natureza com o ser humano. Uma das bases fundamentais do trabalho dos indivíduos na sociedade deve ser e estar em relação íntima com a natureza para, precisamente, poder utilizá-la e trata-la como uma realidade da qual formamos, somos, uma parte (“amando a mãe terra como a nós mesmos) com a qual consubstanciamos sempre ecologicamente.

Essa nova simbiose implica necessariamente, por exemplo, que nos dediquemos como humanidade, como um dos primeiros, precípuos e máximos objetivos dos próximos anos, o desenvolvimento e utilização  de energias renováveis e limpas, deixando de utilizar os combustíveis de base fóssil. Estou convencido de que este objetivo, que de fato supõe uma nova revolução nos costumes, qualitativa e quantitativamente, de produzir os bens necessários para satisfazer as necessidades humanas, é a única origem possível para uma nova era que deve suplantar a página da revolução industrial capitalista de base fóssil. E digo capitalista porque, precisamente, a renovabilidade sustentável das novas energias limpas nos levará como realidade sine qua non, a abandonar a ficção de um crescimento ad infinitum para o consumo de algo que temos considerado como inesgotável e que, além de não ser, nos levou à catástrofe ambiental mais importante que antropocentricamente o planeta está sofrendo.

Transformar uma grande crise em uma grande oportunidade

Por tudo isso, mais que nunca há que transformar as crises em oportunidades. Porém, desta vez, a oportunidade não é sair da crise para voltar à situações conhecidas que, precisamente não são ambientalmente viáveis. Este é o alerta principal de meus pensamentos hoje. Sair das crises nas quais estamos instalados não pode ser nunca (não poderá ser) voltar a crescer economicamente nos moldes e com as bases com que se tem feito até agora.

Por isso transformar hoje a grande crise em uma grande oportunidade passa por sentar as bases de um novo sistema econômico, não como um exercício teórico ou filosófico sobre novo pensamento estritamente econômico, mas como nova e imperiosa realização de um novo modelo energético sustentável (renovável e limpo) capaz de satisfazer de outras maneira e velocidades (qualitativa e quantitativamente falando) as necessidades humanas sociais e individuais.

*Presidente da Associação Projeto Governamental Democrático Mundial, professor da Universidade Politécnica da Catalunha.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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