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?Iris Pacheco*?
Em entrevista à Página do MST, Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST, afirma que o papel da militância social nesta disputa eleitoral foi fundamental para a reeleição da presidenta Dilma Rousseff (PT), e coloca que “os movimentos sociais têm o grande desafio de seguir lutando por reformas estruturantes no Brasil”.
Conceição falou ainda sobre a Reforma Agrária: “junto à luta pela Constituinte Exclusiva manteremos firme nossa luta pela terra e sua democratização do acesso e uso (…) A luta por Reforma Agrária é urgente e necessária, e a presidenta reeleita deve reconhecer esse fato e assentar as mais de 120 mil famílias acampadas pelo Brasil”, reforça, ao dizer que “derrotamos o neoliberalismo nas urnas e agora segue a luta para derrotar o latifúndio e o agronegócio”.
Outro debate importante que permeou toda a disputa eleitoral foi a atuação dos meios de comunicação convencionais, que Conceição citou ser a “ditadura da mídia” enfrentada pela presidenta.
“Dilma, que já enfrentou a ditadura militar, nesta campanha teve que enfrentar a ditadura da mídia. Agora reeleita não pode deixar de lado a democratização da mídia. Para construir um país democrático e desenvolvido é preciso avançar no direito à comunicação com ampliação da liberdade de expressão e garantia da diversidade e pluralidade na rádio e TV”.
Confira abaixo a entrevista:
Como você avalia a disputa do segundo turno, que se deu entre dois projetos antagônicos de governo: o neoliberalismo, representando na candidatura de Aécio Neves, e o neodesenvolvimentismo, na candidatura Dilma?
Primeiramente reconhecemos o papel e a força da militância social, que ao ver os dois projetos em jogo, conscientemente foi às ruas e fez a diferença, pois eleição se ganha nas ruas com mutirão popular, com uma militância preparada e um povo organizado para lutar pela democracia.
Neste cenário, em que o palco foram as ruas e as redes sociais, a direita disputou as eleições com todo seu poder, com o capital financeiro dos bancos, do agronegócio e principalmente com a mídia, que cumpriu um papel de construção do ódio a um projeto de mudanças, que tende a beneficiar a classe trabalhadora do Brasil.
Assim, Dilma, que já enfrentou a ditadura militar, nesta campanha teve que enfrentar a ditadura da mídia.
O que essa disputa significou para os movimentos sociais e a classe trabalhadora do país?
A disputa das eleições foi extremamente acirrada pelo ódio com que a direita queria derrotar o PT e os movimentos sociais.
Ódio que neste segundo turno ficou ainda mais nítido e se cristalizou na disputa da luta de classes, entre uma mudança que agregue direitos para o povo brasileiro e o programa símbolo do retrocesso neoliberal, que promove as privatizações, terceirização do funcionalismo público e o massacre e criminalização a luta pela terra.
Como você citou, a “ditadura da mídia” apoiou a onda conservadora nessa disputa. De que forma o governo deve atuar para mudar esse cenário? Após as críticas de Dilma à revista Veja, é possível que a democratização da comunicação seja pautada?
A presidenta Dilma, agora reeleita, não pode deixar de lado a democratização da mídia. Para construir um país democrático e desenvolvido é preciso avançar no direito à comunicação, com ampliação da liberdade de expressão e garantia de diversidade e pluralidade na rádio e TV.
O governo deve parar de bancar a Globo e a Veja, que sempre expressaram seu ódio à classe trabalhadora. Este segundo mandato tem que levar adiante o projeto de democratização dos meios de comunicação, pois é inadmissível que o governo gaste 70% de verbas públicas da área da comunicação com esse monopólio, que apenas ataca e demoniza a luta do povo brasileiro com o objetivo de manter seus privilégios.
Os movimentos e organizações sociais já têm a proposta da Lei da Mídia Democrática, um Projeto de Lei de Iniciativa Popular (PLIP) das Comunicações que questiona essa concentração mediática e reivindica a regulamentação do que diz a Constituição em relação às rádios e TVs brasileiras.
Não podemos mais ser reféns das poucas famílias que dominam os meios de comunicação e oferecem o serviço da desinformação.
Dilma ganhou por uma pequena margem, e muito devido a setores da esquerda que resolveram apoiá-la neste segundo turno. Esses fatos podem levar a militância do PT e o governo mais à esquerda?
Com esta disputa acirrada coube aos movimentos sociais empunhar suas bandeiras e ir às ruas garantir a vitoria da Dilma, e principalmente ratificar nas urnas o que já tínhamos construído em 2002: a derrota ao neoliberalismo.
Nesse contexto, os movimentos sociais foram fundamentais, apesar de suas pautas estarem aquém de ser atendidas. Basta observarmos os fracos números da Reforma Agrária durante os quatro anos de governo.
Por isso, seguiremos fazendo luta e pautando nossas reivindicações. Fomos às ruas para ganhar as eleições e sem dúvida pautar a campanha da candidata pela esquerda.
Agora, seguiremos somando forças e ocupando latifúndios por uma sociedade mais justa e igualitária.
Em seu discurso da vitória, a presidenta Dilma afirmou que não acredita que a disputa das eleições tenha dividido o país, e que busca o diálogo com todos os setores da sociedade. Podemos considerar isso como um indicativo de como será seu segundo mandato?
Na América Latina, a direita segue seu projeto de tentar desestabilizar os governos populares. No Brasil não é diferente. Agora, pós-eleições, pregam que o país está dividido na tentativa de desqualificar o trabalho do governo.
O processo eleitoral foi pedagógico por conta da nítida disputa de classes que ocorreu. Por isso, acredito que a presidenta, ao ver o antagonismo dos dois projetos postos, foi inevitavelmente empurrada um pouco mais para a esquerda.
Por exemplo, apesar de serem beneficiados pelo atual governo, o agronegócio, enquanto classe, foi para a campanha de Aécio e a derrotou em todos os lados possíveis.
Como seu segundo mandato pode abarcar o anseio de mudanças difuso em todo o país?
A Dilma é democraticamente a presidenta de todos e todas brasileiras. E como tal, esperamos que em seu segundo mandato realize de fato reformas estruturantes que atendam os anseios da classe trabalhadora, dos camponeses, dos estudantes e garantias dos direitos individuais dos LGBTs, das religiões de matrizes africanas, das mulheres, etc.
Para garantir essas bandeiras de luta, a presidenta vai ter que governar com o povo nas ruas, pois o congresso, fisiologista e conservador, pode derrotar seu governo no parlamento, e suas alianças partidárias também não são confiáveis.
No quesito ‘reformas’, a presidenta afirmou que a Reforma Política e o plebiscito por meio de uma consulta popular é sua prioridade para o novo mandato. Como essa reforma pode melhorar a vida do povo?
O plebiscito popular, realizado em setembro, é um movimento vitorioso. Obtivemos 7,7 milhões de votos a favor de um plebiscito por uma reforma constituinte, e a presidenta Dilma assumiu este compromisso.
As reivindicações básicas do povo brasileiro não são atendidas porque a estrutura de poder político do Brasil e suas regras de funcionamento não permitem mudanças profundas.
Embora tenhamos direito ao voto direto nas eleições, vários elementos influenciam na vitória de candidatos que não estão nem um pouco comprometidos com as necessidades do povo.
Precisamos ter condições de construir uma ampla unidade nacional em torno de um plebiscito oficial por uma constituinte soberana e exclusiva. Por isso, vamos nos organizar, preparar a luta e cobrar dela este compromisso.
Ao mesmo tempo, a Presidenta reeleita sequer citou a Reforma Agrária, e seu programa é vago na questão do campo. Como o Movimento pretende atuar de agora em diante para exigir o avanço desta pauta?
Junto à luta pela Constituinte Exclusiva, manteremos firma nossa luta pela terra e sua democratização do acesso e uso. Seguiremos em busca de garantir a produção de alimentos saudáveis que chegue à mesa do trabalhador da cidade, com baixo custo e que inclusive ajude o governo a conter a inflação dos alimentos.
A Reforma Agrária é urgente e necessária, e a presidenta reeleita deve reconhecer esse fato e assentar as mais de 120 mil famílias acampadas pelo Brasil.
Derrotamos o neoliberalismo nas urnas e agora segue a luta para derrotar o latifúndio e o agronegócio, que não produz alimentos e nem trabalho para a população, não cria oportunidades para a juventude e expulsa os povos do campo para as cidades.
Quais os desafios de agora em diante?
Os movimentos sociais tem o grande desafio de seguir lutando por reformas estruturantes no Brasil. Devemos manter a luta pela terra, seguir construindo o plebiscito popular por uma constituinte exclusiva e exigir do governo a democratização da comunicação.
Também é necessária a reforma do Judiciário, que nos últimos anos tem criminalizado a luta pela terra, paralisado a criação de novos assentamentos ao engavetar os processos, trava as demarcações das terras indígenas e quilombolas e atua como principal conivente na impunidade dos crimes no campo.
* Original do sítio do MST