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O lúcido Milton Santos

João Baptista Pimentel Neto

Tradução:

Cidadão Nota 10. Foto: Nação Z
Cidadão Nota 10. Foto: Nação Z
Você sabe quem é o cidadão da foto? Ele não jogou na seleção brasileira de 1950. Não foi músico. Não nasceu na Mangueira carioca. Não cresceu na zona leste paulistana. Locutor de rádio? Também não. Pastor evangélico? Nem pensar.

Fernanda Pompeu*

Milton Santos (1926-2001), nascido na baiana Brotas de Macaúbas, é um dos mais afamados geógrafos do mundo. Em 1994, recebeu o Prêmio Internacional de Geografia Vautrin Lud – espécie de Nobel da categoria. Até 2017, o único brasileiro entre os ganhadores. Fora isso, várias universidades lhe deram o título de doutor honoris causa.

Alfabetizado em casa pelos pais professores primários, o garoto desenvolveu uma fome pelo conhecimento e pelos estudos. Conjugou como poucos o verbo estudar. Um intelectual de inteira tigela. Segundo suas palavras: intelectual é aquele que pensa em profundidade. Aquele que tem ideias próprias e coragem de defendê-las até o fim.

Autor não de quatro, mas de quarenta livros! Entre eles:

Os Estudos Regionais e o Futuro da Geografia (1953)

O Centro da Cidade do Salvador (1959)

A Cidade nos Países Subdesenvolvidos (1965)

Por uma Geografia Nova (1978)

O Trabalho do Geógrafo no Terceiro Mundo (1978)

A Pobreza Urbana (1978)

O Espaço Dividido (1979)

A Urbanização Desigual (1980)

Manual de Geografia Urbana (1981)

Pensando o Espaço do Homem (1982)

Espaço e Método (1985)

O Espaço do Cidadão (1987)

Metamorfoses do Espaço Habitado (1988)

Metrópole Corporativa Fragmentada (1990)

A Urbanização Brasileira (1993)

Técnica, Espaço, Tempo (1994)

A Natureza do Espaço (1996)

Por uma Outra Globalização (2000)

Território e Sociedade (2000)

(* Fonte: Toda Matéria)

20170321-viii--premio-milton-santos-2017Sua carreira de professor internacional deslanchou a partir do exílio. Por conta do golpe militar de 1964, Milton Santos foi destituído do cargo de secretário do estado da Bahia e demitido da Universidade Federal. Tinha então 38 anos e uma bagagem cultural fora do comum.

Depois de dar aulas em prestigiadas universidades internacionais, Milton voltou ao Brasil em 1977. Lecionou na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mais tarde ingressou por concurso na Universidade de São Paulo, onde ganharia o título de Professor Emérito. Aposentado, seguiu sendo o que sempre foi: um pensador de altos neurônios.

Foi graças a ele que a Geografia brasileira chacoalhou. O professor questionou a clássica divisão entre geografia física e humana. Para ele, o espaço só faz sentido quando ocupado. É uma instância social ativa. Em outras palavras, muito além de estudar relevos e afluentes do rio Amazonas, a Geografia é uma ciência social capaz de dar respostas aos desafios do presente.

E que desafios! No Brasil, por exemplo, o desafio monumental de ajudar milhões a saírem da pobreza, por meio da correta ocupação de espaços e da conscientização da cidadania. O professor insistia na diferença entre ser cidadão e consumidor: Somos cidadãos imperfeitos e consumidores mais que perfeitos. E acrescentava que só pela cidadania daríamos o salto de qualidade como nação.

Pouco antes de morrer, em 2001, o professor assistiu à popularização do conceito de globalização e do chamado Consenso de Washington, cuja receita continha liberdade total de mercado, Estado mínimo, arrocho de direitos trabalhistas e sociais. A coisa toda vendida como a única forma que um país podia se posicionar no mundo.

Milton Santos foi um dos maiores críticos da ditadura do pensamento único. O professor dizia que o Brasil precisava encontrar seu próprio modelo de desenvolvimento: O centro do mundo é o lugar onde se está. Sem abandonar o que somos, podemos nos tornar universais.

*Colaboradora de Diálogos do Sul – Texto foi escrito em 2008, sob edição de Carminha Fernandes


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

João Baptista Pimentel Neto Jornalista e editor da Diálogos Do Sul.

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