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O marxismo de José Carlos Mariátegui, pioneiro de um marxismo propriamente americano

Escritor, jornalista, editor, cientista social, filósofo e dirigente comunista peruano, trouxe ao centro do debate marxista temas como o comunismo indígena
Yuri Martins-Fontes
Dicionário Marxismo na América
São Paulo (SP)

Tradução:

MARIÁTEGUI, José Carlos; “Amauta”, “Juan Croniqueur” (peruano; Moquegua, 1894 – Lima, 1930)

1 – Vida e práxis política

Nascido no Sul do Peru, José Carlos Mariátegui La Chira se mudou ainda criança para Huacho, cidade próxima à capital. Seu pai, funcionário público, cedo abandonou a família, cabendo à mãe, María Amalia La Chira Vallejos – costureira católica de ascendência indígena – criar os três filhos. Em 1902, Mariátegui sofreu um acidente na escola e fraturou o joelho – episódio que evoluiu mal, deixando-o manco. Entretanto, no tempo em que esteve internado em um hospital de Lima, dedicou-se a ler diversos livros a que teve acesso e a estudar francês – dando assim um primeiro impulso a sua extensa formação, que viria a ser sobretudo autodidata.

Já em 1909, começou a trabalhar com tipografia no jornal La Prensa. No prelúdio da I Guerra Mundial, debutou na escrita, com crítica literária e versos, para logo publicar seus primeiros artigos jornalísticos com temas políticos. Sob o pseudônimo de Juan Croniqueur, satirizou a frivolidade limenha, demonstrando um amplo conhecimento que o aproximou de círculos intelectuais e artísticos de vanguarda, bem como do movimento operário (de linha anarquista) que se gestava desde o fim do século, trazido à América por imigrantes europeus.

Destacando-se como jornalista, Mariátegui pouco depois se tornou cronista do jornal El Tiempo (1916), no qual passou a se dedicar ao embate político, denunciando a falsidade da “democracia mestiça”: um sistema demagógico que servia às classes dominantes como fonte de “divertimento”, desviando a atenção popular do fato de que a burguesia da região costeira, aliada aos grandes proprietários rurais do interior, tornavam o Peru cada vez mais um “setor colonial” do imperialismo estadunidense. Seus textos deste período se desenvolveram durante uma época de forte alta nos preços dos alimentos e consequente descontentamento popular, em que crescia a agitação dos trabalhadores – e entrava em crise o domínio político da oligarquia (financeira, extrativista e agroexportadora). Já adepto do socialismo, o autor apoiou greves e enfrentou a elite dirigente limenha.

Em 1918, teve início em Córdoba (Argentina) um movimento pela Reforma Universitária, que depois abrangeria todo o continente; entusiasmado, Mariátegui afirmou ser este o “nascimento da nova geração latino-americana”. Ainda neste ano, participou da fundação da efêmera revista Nuestra Épocaoutro marco da política peruana daquele início de século: uma publicação que, se não traçava ainda um “programa socialista”, aparecia como um esforço ideológico nesta direção. Com isto, ele dava início a suas atividades como editor, o que perfaria importante parcela de sua atuação política madura: comunista.

A vitória da Revolução Russa e o fim da I Guerra assinalou – no Peru e no mundo – um período de agitação das classes trabalhadoras. Em 1919, Mariátegui e seu camarada César Falcón fundaram o jornal La Razón – que logo se tornou uma voz destacada em prol das reivindicações operárias. Neste mesmo ano, uma greve geral foi reprimida na capital com violência e prisões; iniciava-se uma década de populismo de direita – economicamente pró-estadunidense, mas que também flertava com o movimento indigenista. Mariátegui, por meio de seu periódico, saiu em defesa dos líderes operários presos, atitude que fez com que ele viesse a ser aclamado por uma multidão nas ruas. Contudo, um mês depois, a redação do jornal foi fechada, e ele, ainda que de modo discreto, exilado na Europa, vindo a receber uma espécie de bolsa governamental – supostamente a título de propagandista do Peru no estrangeiro (em verdade, uma benesse conciliadora, já que por casualidade era parente da esposa do presidente Augusto Leguía).

Como ele relataria (“Apuntes autobiográficos”, 1927), seguiu então viagem, rompendo com sua experiência inicial de literato “contaminado de decadentismo” (individualismo, ceticismo) e se voltando “resolutamente” ao socialismo. Viveu três anos por lá (entre fim de 1919 e 1923), tendo conhecido alguns países: Hungria, Áustria, Tchecoslováquia, Alemanha, Suíça, França e, em especial, Itália, onde passou a residir. Em meio à influência da conjuntura ali experimentada – na qual ecoava alto a Revolução Soviética –, a Europa o aproximou das obras de Marx, Engels e Lênin, além do movimento comunista italiano e do surrealismo. No Partido Bolchevique ele enxergou a convergência entre teoria e prática, entre filosofia e ciência</em>; afirmou que Lênin era “incontestavelmente” o revigorador “mais enérgico e fecundo do pensamento marxista”.

Ainda segundo ele, nesse período, casou-se com “uma mulher e algumas ideias”; a italiana Anna Chiappe, sua companheira, transmitiu-lhe um “novo entusiasmo político”. A família dela era próxima ao filósofo Benedetto Croce, por meio de quem Mariátegui conheceria a obra de Georges Sorel – sindicalista-revolucionário do qual absorveu ideias como a do “mito da greve geral” e da defesa do uso da violência revolucionária contra a violência instituída. Na Itália, ele assistiu a ocupações de fábricas, congressos de trabalhadores e se aproximou do coletivo editor da revista L’Ordine Nuovo</em>; participou de grupos de estudos socialistas, travou contato com o pensamento de Antonio Gramsci e de Umberto Terracini, e vivenciou a criação do Partido Comunista da Itália (a partir de cisão do Partido Socialista Italiano).

Sua estada europeia foi também um mirante donde pôde observar o Oriente: a Revolução Chinesa e o despertar da Índia, dos árabes e dos diversos movimentos nacionalistas e anti-imperialistas do pós-guerra. Nestes acontecimentos, verificou um processo de declínio da sociedade ocidental. Tal concepção se reforçaria quando viu de perto a ascensão fascista italiana – o que percebeu como resposta do grande capital a uma profunda crise social e política. Em paralelo a esta efervescência sociopolítica, Mariátegui teve acesso às obras de Sigmund Freud e Friedrich Nietzsche, interessando-se tanto pela recém-criada psicanálise, como pela filosofia intuitiva (ou vitalista).

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Porém, se de início ele trouxe consigo a humildade de um discípulo aberto ao então centro do pensamento moderno, progressivamente passou a se decepcionar com os infortúnios que presenciou na Europa. Assumiu assim uma perspectiva antropológica pioneira – invertida em relação ao que se fazia à época –, conseguindo captar detalhes da crise ocidental até então pouco advertidos pelos europeus. É o caso da decadência da dita “democracia burguesa”, processo que pouco mais tarde conceberia como uma nova farsa da classe dominante, a redesenhar seu poder com os traços autoritários do fascismo.

Quando retornou ao Peru, em 1923, Mariátegui já defendia abertamente a causa comunista; ademais, a tragédia europeia o levara a compreender com mais nitidez o alcance histórico da tragédia de sua América. Já em Lima, participou do III Congreso do Comité Central Pro-Derecho Indígena Tahuantinsuyo (CCPDIT, constituído em 1919), conhecendo o líder indigenista Ezequiel Urviola, de quem se aproximou. Nesse mesmo ano, o intelectual e político peruano Haya de la Torre o convidou para ministrar aulas nas Universidades Populares González Prada – semente do que viria a ser a Aliança Popular Revolucionária Americana (Apra), movimento continental de tendência reformista. Mariátegui fez ali duas dezenas de conferências de difusão do marxismo, apresentando sua visão da crise mundial em um cenário polarizado, no qual as teses social-democratas (fundadas no suposto evolucionismo social) já não faziam sentido; os debates abordaram também a “questão do índio”, tema que lhe seria central.

No ano seguinte, devido a um tumor surgido em sua perna sã, teve o membro amputado, passando a usar cadeira de rodas. Reestabelecido do choque, em 1925, junto a seu irmão Julio César, fundou a Imprenta y Editorial Minerva, projeto voltado a publicações “científicas, literárias e artísticas” – editora pela qual publicou seus primeiros livros e expôs ao público nacional autores peruanos e estrangeiros (como o indigenista Luis Valcárcel, a poeta aprista Magda Portal e o russo Máximo Gorki).

Em 1926, a empreitada editorial de Mariátegui se ampliou com a fundação da revista Amauta (“sábio”, em quéchua, nome pelo qual seria conhecido), cuja proposta, além do aspecto econômico, era promover o debate político, sobretudo marxista, e cultural socialista. Tratando de questões que iam de marxismo e leninismo a poesia, literatura, arte contemporânea e educação dos trabalhadores, a postura de Mariátegui se tornava mais aguda – radical. Com suas críticas ao aprismo e à intelectualidade mestiça-oligárquica, enfraqueceu-se sua aproximação com Haya; passou a refutar o indigenismo “paternalista” da Apra, defendendo a ideia de que na América não se poderia buscar apenas uma imagem refletida do comunismo europeu, mas que seria necessária uma “criação heroica”, em que a comunidade camponesa autóctone – essencialmente “solidária” em suas relações sociais – se tornaria a base do Estado contemporâneo socialista. Rechaçou também a teoria “racial” de alguns indigenistas que, em oposição à corrente eurocêntrica, afirmavam que os nativos teriam algo inato que os levaria a se libertarem “naturalmente”; considerando ambas as posições “racistas”, afirmou que todos estão sujeitos às mesmas “leis” que governam os povos, e que aquilo que assegurará a emancipação indígena é o dinamismo de uma economia e uma cultura que “portam em suas entranhas o germe do socialismo”.

Em 1927, o CCPDIT foi proibido de funcionar; com isto, alguns dos líderes indigenistas – com quem Mariátegui mantinha relações (como Urviola, Hipolito Salazar e Eduardo Quispe y Quispe) – aderiram ao socialismo marxista que se consolidava em torno do “movimento” que era a revista Amauta. Por este tempo, Mariátegui assumiu ainda a publicação de Tempestad en los Andes (1927), obra de L. Valcárcel considerada a “bíblia do indigenismo radical”. No prólogo, escreveu uma de suas frases mais emblemáticas – “a esperança indígena é revolucionária” –, passando a desenvolver sua ideia de que a “revolução socialista” era o “novo mito” dos indígenas, a fé transformadora sobre a qual o comunismo peruano construiria seus pilares. Definindo a questão indígena como sendo “econômica”, ele descartaria os enfoques “filantrópicos” que prevaleciam: o “problema do índio” – afirma – é o “problema da terra”, o “latifúndio”. Intensificando suas críticas aos apristas, acusou seu indigenismo de ter sido criado “verticalmente” por mestiços letrados das elites – uma posição que, embora útil na condenação do latifundismo, era inadequada à revolução.

Em meados deste ano, como resultado do impulso que a luta anti-imperialista havia alcançado – com o I Congresso Mundial contra o Imperialismo e a Opressão Colonial (Bruxelas, 1927) –, a revista Amauta teve número dedicado a debater o imperialismo estadunidense. Isto rendeu a Mariátegui uma prisão e o fechamento da revista por alguns meses, sendo acusado – por Leguía, sob pressão da embaixada dos Estados Unidos – de fazer parte de um “complô comunista”. Mais tarde, como que em resposta, escreveu um de seus mais impactantes ensaios, “El problema de la tierra” (1927), no qual se declarou um marxista “convicto e confesso”.

No ano seguinte, reunindo dezenas de ensaios elaborados desde 1924, publicou seu clássico: Siete ensayos de interpretación de realidad peruana (1928) – ponto alto de sua “investigação da realidade nacional de acordo com o método marxista”. Rompia assim com o nacionalismo aprista. Em carta a Haya, expôs seu desacordo quanto à política de aliança de classes. Este lhe respondeu, acusando-o de “europeísmo”. Mariátegui contestou, afirmando acreditar que “não há salvação para a Indo-América” sem a “ciência” e o “pensamento” modernos: “meus juízos se nutrem dos meus ideais, dos meus sentimentos, de minhas paixões”.

Ainda em 1928, fundou seu partido, ao qual – para não agravar as perseguições políticas que os comunistas vinham sofrendo e arregimentar mais adeptos – nomeou Partido Socialista Peruano (PSP); entretanto, colocou como prioridade a vinculação do PSP à Internacional Comunista (IC). Mariátegui havia se aproximado da IC no final do ano anterior, quando convidado a participar do IV Congresso da Internacional Sindical Vermelha (Moscou, 1928) – a que o PSP enviaria representantes –, e não mais se afastaria desta organização, embora não sem polemizar (defendendo sempre a independência crítica partidária). Este foi um momento fervilhante de sua vida, época em que iniciou vários embates político-filosóficos contra o nacionalismo conservador e o socialismo dogmático (que previa uma evolução social linear, pretensamente “natural” – e nos moldes europeus).

Em 1929, Mariátegui participou da criação da central sindical Confederación General de Trabajadores del Perú e, em seguida, o PSP enviou delegados (liderados por Julio Portocarrero e Hugo Pesce) à I Conferência Comunista Latino-Americana (Buenos Aires) – os quais expuseram as “teses” redigidas em grande medida por Mariátegui (“Antecedentes y desarrollo de acción clasista”, “Punto de vista antiimperialista” e “El problema de las razas en América Latina”). Contrapondo-se à proposta da IC de criar Estados indígenas nos Andes, as teses sustentaram que a “questão indígena” era um problema fundamentalmente “de classes”; que seu cerne não estava na divisão étnica, mas na posse da terra – e isto deveria definir a política do país. Cabia, portanto, aos revolucionários convencerem indígenas, mestiços e negros da nação a se “insurgir”, mostrando-lhes que somente um governo de operários e camponeses unidos poderia conduzi-los à libertação. Neste evento, ainda que ausente por problemas de saúde, Mariátegui foi eleito membro do Conselho Geral da Liga contra o Imperialismo e a Opressão Colonial, entidade ligada à III Internacional – começando a encaminhar a mudança de nome do PSP para Partido Comunista del Perú (o que só se efetivaria após sua morte).

Pouco depois, em abril de 1930, a saúde de Mariátegui, que era frágil, voltou a se deteriorar. Às vésperas de morrer, o ainda jovem marxista conclamou os revolucionários a estudarem o “leninismo”. Faleceu antes de completar 36 anos, sendo seu funeral acompanhado por um massivo cortejo de admiradores.

2 – Contribuições ao marxismo

A formação de José Carlos Mariátegui se deu em um conturbado momento histórico, em que, por um lado, com a I Guerra, as potências capitalistas levaram a humanidade a conhecer um de seus maiores horrores; por outro, a experiência soviética de construção socialista propunha na prática uma alternativa àquele sistema, que já dava mostras de decadência. Dedicado autodidata, teve diversas influências teóricas, mas com a evolução de sua militância política e pensamento desbravador consolidou-se como um dos mais importantes marxistas, não apenas de seu país ou continente, mas de seu tempo.

Destacando-se em sua curta existência como escritor, jornalista, editor, cientista social, filósofo e dirigente comunista, observa-se que sua atração pelo marxismo nasceu sobretudo da busca por uma explicação de longa duração para os processos históricos de seu país, bem como de uma concomitante proposta revolucionária, que vinculasse dialeticamente o passado, o presente e o futuro. Neste caminho, dedicou-se a obter um entendimento aprofundado sobre a civilização autóctone andina – atrofiada pela colonização – e a pensar as possibilidades de se romper com essa estrutura.

Lima, no início do século XX, já era uma capital cosmopolita, embora tivesse mais relação com a Europa do que com o interior de seu próprio país – indígena e pauperizado. O Peru era um país fraturado, cindido em regiões bem separadas entre si e com ritmos históricos peculiares: a costa (do Pacífico), a serra (Andes) e a selva (Amazônia). Deste fato Mariátegui depreende uma de suas principais teses: o Peru era ainda um esboço – uma nação incompleta. Ele entende que a formação nacional peruana havia sido interrompida; que seu processo revolucionário se dera pelo alto, mediante uma espécie de via não-clássica – uma concepção original e que se aproxima das de A. Gramsci (para a Itália) e de Caio Prado Júnior (para o Brasil). Era preciso, portanto, fazer-se o Peru.

Em seu país, como em tantos da América, a elite era ainda pautada por modelos estrangeiros, e somente o indigenismo, por volta dos anos 1920, havia interrompido parcialmente esta tendência. Até então, o que prevalecia – inclusive no âmbito socialista – era a ideia de que a emancipação dos povos indígenas consistiria em torná-los “civilizados” (segundo o molde europeu-ocidental). Isto só começou a mudar a partir da ação dos próprios nativos, que na década de 1910 inauguraram um novo ciclo de sua longa história de resistência contra a dominação do Estado colonial e dos latifundiários. Um dos marcos dessa transformação foi sua participação na Guerra do Pacífico (1879-1883), contra o Chile, o que serviu para que o meio socialista produzisse uma autocrítica: as populações autóctones não precisavam ser “despertadas” – mas sim era preciso que os próprios revolucionários relativizassem suas referências eurocêntricas, atentando à experiência prática das mobilizações indígenas. Enveredando nos debates acerca da chamada “questão do índio”, Mariátegui submete as tendências de seu tempo a uma crítica socialista radical. É o caso do “nacionalismo crioulo”, posição defendida pela elite mestiça peruana; no entendimento mariateguiano, as classes dominantes do país eram solidárias com o colonizador – constatação que o leva a propor a edificação de um nacionalismo vanguardista, que reivindicasse o “passado incaico”.

Escritor, jornalista, editor, cientista social, filósofo e dirigente comunista peruano, trouxe ao centro do debate marxista temas como o comunismo indígena

Arte: Marcelo Guimarães Lima
Florestan Fernandes: Mariátegui percebeu que o progresso irrefletido, promovido pelo capitalismo, redundara em um aumento da barbárie

Em seu percurso, as concepções e a práxis política do Amauta se distinguiriam especialmente por uma atenção aos conhecimentos indígenas (à sua pertinência e valor revolucionário), bem como ao ânimo vital despertado em todo o mundo pela Revolução Russa. Ele pondera que, em meio ao processo de alienação política e existencial – inerente ao capitalismo –, esta Revolução lograra despertar o “homem matinal”, este ser cansado da noite “artificialmente iluminada” (a decadência burguesa pós-bélica). Para a construção social deste novo ser humano deve-se absorver os bens de todas as fontes de saber a que pôde ter acesso o mundo contemporâneo: não apenas o conhecimento moderno, mas também os tradicionais – de povos tais como os andinos (“El alma matinal”, 1928). Relacionando aspectos econômicos e culturais, investiga qualidades de distintos períodos históricos, refletindo acerca da força do “mito revolucionário”: esta utopia concreta. Entende ser preciso trabalhar a dialética entre objetividadesubjetividade, entre outras contraposições criadoras, caso da síntese que propõe entre saberes do passado e do presente. Em sua concepção, o conhecimento dos novos tempos deveria abarcar elementos dos saberes que ele, de modo impreciso, chama de “ocidental” (no sentido de filosofias, ciências e técnicas atuais – em verdade, frutos do milenar intercâmbio universal) e “oriental” (isto é, o não-ocidental, o tradicional, autóctone, camponês – relativo aos povos ligados à terra).

A intenção de Mariátegui era revitalizar a práxis marxista, que em sua época estava abafada pelo reformismo da Internacional Socialista (IS) – organização contaminada pelo “medíocre positivismo”. Declara que a I Guerra tinha mostrado à humanidade que existem “fatos superiores à previsão da ciência” e “contrários ao interesse da civilização”; para além da razão, o ser humano tem necessidade de “fé”, de “paixão”, de “esperança” combativa.

A este respeito, mais tarde, o marxista Florestan Fernandes observaria: Mariátegui percebeu que o progresso irrefletido, promovido pelo capitalismo, redundara em um aumento da barbárie (realidade subestimada desde a “perspectiva eurocêntrica”); que de um mero progresso técnico não se obtém espontaneamente uma evolução humana, social; pelo contrário, observando-se a sociedade em sua totalidade (guerras, genocídios, fome, desigualdade), vê-se o agravamento da desorientação, das contradições “implosivas” desse processo civilizacional autodestrutivo.

Com o objetivo de questionar a estreiteza do cientificismo moderno, o Amauta se interessou por certos conceitos de Freud e de Nietzsche, sendo um dos primeiros marxistas a trazer concepções destes pensadores – críticos da divinização da razão operada na modernidade – para o debate comunista. Buscou aí elementos que permitissem abarcar a irracionalidade humana na interpretação marxista do todo real (ampliando assim a perspectiva cognitiva da realidade social concreta). Em parte destas ideias identificou sólidas armas interpretativas para a denúncia da alienação, da impotência, da artificialidade do humano inserido na estrutura sociocultural repressiva burguesa e cristã.

Entretanto, é importante destacar que Mariátegui passa longe de qualquer proposta de síntese eclética, que almejasse mesclar princípios do materialismo histórico com outros conflitantes ou alheios a este pensamento revolucionário. Ao se apropriar de alguns dos conhecimentos psicológicos e sobretudo vitalistas (e isto apesar de desprezar o “ceticismo” e o “relativismo”, vendo o “nietzscheanismo” como uma “doença” do espírito), o propósito mariateguiano é o de reforçar o embate por uma concepção marxista efetivamente dialética, em contraposição ao reformismo (determinista, mecanicista) que afetava – e afeta – influentes correntes socialistas, posturas lineares que ele define como uma “fossilização acadêmica” do marxismo. Em suma, sua preocupação é a de valorizar a dimensão ética que compõe a noção marxista de práxis – a vontade de liberdade, a esperança a ser reerguida, o sentimento emancipatório que impele à ação o ser humano desejoso de autonomia, justiça, felicidade. Para tanto, em oposição à apatia reformista (parlamentar, evolucionista), abre-se a teorias que investigam o inconsciente, as paixões humanas, a questão subjetiva da “fé” revolucionária, do “mito” que anima o espírito combativo dos oprimidos. Compreende a esfera sentimental do marxismo como um fator potente – necessário à revolução.

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Neste sentido, sua concepção marxista destaca o valor das tradições comunitárias, ressaltando certos aspectos que permitiram aos indígenas desfrutar de uma melhor qualidade de vida anteriormente à invasão europeia – como a “solidariedade”, característica do “comunismo agrário” da sociedade incaica, em franco contraste com a competitividade louvada pelo capitalismo. No entanto, afirma que se antigamente o indígena trabalhava com prazer e mais plenitude, no presente já não seria possível abdicar dos diversos saberes a que alcançou o mundo contemporâneo. Cabe, então, relacionar os melhores frutos do conhecimento atual (as técnicas avançadas, as ciências modernas e, em especial, o pensamento marxista) com os conhecimentos tradicionais (refere-se aqui particularmente ao povo inca, cujo vigor revolucionário vê materializado no hábito de cooperação mútua e em sua fé na revolução).

É nesse itinerário que Mariátegui desenvolve sua concepção de um “novo romantismo” – que compreende como “espontânea e logicamente socialista”. Seu intuito é relacionar o impulso revigorante e idealista da subjetividade romântica à concretude conflitiva da objetividade realista. Reelabora assim o conceito de “mito” (de G. Sorel), transformando-o, aprofundando-o: o “mito revolucionário” é uma “esperança sobre-humana” que traz ao povo um novo encantamento perante a vida. Deste modo, atualiza o antigo e abstrato espírito romântico, incorporando a ele a objetividade epistêmica do “realismo proletário” (antipositivista, consciente da imperfeição humana) – no intuito de cultivar, de forma mais realista, a energia subjetiva presente na esperança por uma nova sociedade. Em síntese: romantismo e realismo são para ele duas posturas intrínsecas ao marxismo, que concorrem para a transformação revolucionária, segundo uma dialética que se pode chamar romântico-realista.

Já no tocante à historiografia, uma das principais contribuições mariateguianas é sua análise da questão nacional peruana, elaborada na perspectiva materialista histórica – reflexão que, em parte, ele estenderia para as nações latino-americanas de modo geral. Neste âmbito, dentre seus aportes de maior impacto político está sua conclusão de que na América não se formou uma “burguesia nacional” (supostamente interessada em se aliar aos socialistas no confronto com o imperialismo). Em tal debate, a posição dita “aliancista” defendia a proposta de uma coalizão de classes que deveria ser comandada por setores burgueses pretensamente progressistas, enquanto aos socialistas restava tão somente uma posição submissa. Todavia, segundo Mariátegui, as elites latino-americanas não teriam nenhum interesse em enfrentar o imperialismo, pois, diferentemente de outros povos (como os asiáticos), não tinham vínculos com o povo – nem história, nem cultura comuns. Pelo contrário: o burguês peruano, “branco”, desprezava aquilo que era “popular”, “nacional”, sentindo-se acima de tudo como um branco; já o “pequeno-burguês”, “mestiço”, o imitava. Somente a revolução socialista – afirma – poderia barrar o imperialismo de um modo radical. E é na Revolução Russa que ele enxerga o melhor exemplo a ser seguido – não no sentido de um “modelo” a se copiar, mas de um “guia” para as decisões que cada povo deve tomar por si.

Em posse desta bússola – a experiência bolchevique –, o marxista andino polemizou com revisionistas, nacionalistas, com o reformismo social-democrata da II Internacional (IS) e, mais tarde, com algumas teses da III Internacional (IC) que considerou eurocêntricas. Embora tenha desde cedo apoiado a IC, e depois a ela aderido (vinculando seu partido), Mariátegui criticou a proposta desta organização segundo a qual os comunistas peruanos deveriam promover a criação de “repúblicas nativas independentes”, considerando-a uma leitura equivocada das teses de Lênin sobre a autodeterminação dos povos. Em sua concepção, o problema de seu país era a não resolvida “questão agrária” – e tendo em vista que três quartos da população era indígena, seria este povo, em sua maioria camponês, o protagonista do processo revolucionário.

Pioneiro de um pensamento marxista propriamente americano, Mariátegui exerceria influência sobre diversos movimentos sociais na história do século XX, desde agrupamentos de resistência camponesa e indígena até grupos guerrilheiros e políticos de várias tendências revolucionárias – sendo que, na atualidade, com o acirramento da crítica ao eurocentrismo, suas ideias têm adquirido projeção ainda maior.

3 – Comentário sobre a obra

Os escritos de José Carlos Mariátegui abordam temática abrangente, que vai da filosofia, historiografia, sociologia e economia, até a literatura, psicologia, crítica de arte e educação, entre outros campos do conhecimento. Dado seu precoce falecimento (1930), teve publicados em vida apenas dois livros (por sua editora Minerva), deixando mais três organizados. Os seus demais escritos foram selecionados e começaram a ser publicados (sob o selo da Empresa Editora Amauta) três décadas após sua morte, a partir de um empreendimento editorial dirigido por sua esposa Anna e seus filhos, em parceria com camaradas como H. Pesce e Alberto Tauro.

Seu primeiro livro, La escena contemporánea (Lima: Minerva, 1925) é uma seleção de artigos que têm como foco figuras e aspectos da realidade internacional, tratando de temas como: fascismo, “crise” da democracia liberal e do socialismo reformista, literatura revolucionária, “fatos e ideias” da Revolução Russa e ensaios sobre povos do Oriente.

Siete ensayos de interpretación de la realidad peruana (Lima: Minerva, 1928) é sua obra mais difundida e importante. Com dezenas de edições e diversas traduções, reúne ensaios em que ele aplica o materialismo histórico para compreender a realidade de seu país, abordando assuntos como: a evolução da economia nacional, a “questão do índio” e “da terra”, a educação pública, o “fator religioso” na formação do Peru, o problema do “regionalismo” e do “centralismo” peruano e a literatura nacional.

Entre os livros póstumos que deixou encaminhados está Defensa del marxismo: polémica revolucionaria (Santiago-Chile: Ediciones Nacionales y Extranjeras, 1934), escrito entre 1927 e 1929 e centrado em questões filosóficas, no qual apresenta pontos de vista fundamentais de sua filosofia marxista. Partindo de uma análise do revisionismo “desencantado” de Henri de Man, critica a economia liberal, o reformismo social-democrata, o evolucionismo e pragmatismo trabalhista britânico e a “literatura conformista”; analisa as limitações da filosofia moderna, mostrando como o marxismo (apenas “em parte” uma filosofia) a superou e seguirá válido enquanto persistir a sociedade de classes; e, ainda, em um pioneiro ensaio sobre o tema (quando poucos haviam se dedicado à questão) relaciona os pensamentos de Marx e Freud, apontando afinidades.

El alma matinal y otras estaciones del hombre de hoy (Lima: Amauta, 1950) é uma seleção de textos de 1923 a 1929 em que ele discute variados assuntos relativos à filosofia e à cultura, como: literatura contemporânea, história da arte, cultura italiana moderna e a “emoção de nosso tempo” – contrapondo a impotente perspectiva “cética” da sociedade burguesa em crise ao renovado espírito “romântico” (que anima o novo “mito”, o “socialismo”).

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A terceira obra, La novela y la vida (Lima: Amauta, 1955), mostra que Mariátegui mantém na maturidade sua verve literária da juventude. Conforme descreve o autor – que valorizava muito a literatura no processo da construção socialista –, trata-se de um “relato”: “mistura de conto e crônica, de ficção e realidade”. Baseado em um curioso caso judicial ocorrido na Itália, a trama envolve um professor supostamente sem memória que uma mulher afirma ser seu esposo desaparecido – passando assim a viver outra realidade (a de um operário).

Foi somente três décadas após sua morte que começaram a vir à luz edições (inclusive populares) reunindo seus demais escritos. Iniciada em 1959, a coleção intitulada Obras completas (Lima: Editora Amauta), embora distante de conter a prolífica obra do marxista, traz em 16 volumes (de textos efetivamente seus), para além dos livros já citados, os seguintes títulos: Ideología y política (1959), que trata do indigenismo e da filosofia política marxista de Mariátegui; Temas de Nuestra América (1959); El artista y la época (1959); Signos y obras (1959); Historia de la crisis mundial: conferências (1959); Cartas de Italia (1969); Peruanicemos al Perú (1970); Temas de educación (1970); e Figuras y aspectos de la vida mundial (1970), publicada em três volumes divididos por períodos (I: 1923-1925; II: 1926-1928; III: 1929-1930). A coleção traz ainda alguns tomos extras com escritos sobre a obra do autor – como o livro Poemas a Mariátegui (com prólogo do poeta Pablo Neruda).

Mais recentemente, foi lançada a obra Mariátegui total (Lima: Amauta, 1994), edição comemorativa do centenário do marxista, que em dois tomos (com quatro mil páginas) inclui, além dos textos já publicados nos livros anteriores, também seus escritos de juventude, correspondência e álbum fotográfico.

Dentre os principais ensaios mariateguianos (contidos nas edições mencionadas), vale uma atenção especial a estes, em que o autor trata de temas que lhe foram centrais, como a filosofia marxista e a práxis política revolucionária: “El crepúsculo de la civilización” (1922), que analisa a decadência da “civilização capitalista” (“essencialmente europeia”); “El hombre y el mito” (1925), que discorre sobre o novo “mito”, a “revolução social”; “Dos concepciones de la vida” (1925), que acusa o “respeito supersticioso” à ideia de “progresso” e defende a “necessidade de fé” para, como “os bolcheviques, rumar-se à utopia”; “Crisis de la democracia” (1925), que mostra o fascismo como reação à crise do regime burguês “envelhecido”, uma adaptação da elite aos novos tempos de “imperialismo monopolista” em que a “democracia liberal” já não lhe servia; “Existe un pensamiento hispano-americano?” (1925); “Heterodoxia de la tradición” (1927); “Mensaje al Congreso Obrero” (1927); e algumas cartas do período italiano. Ademais, para a compreensão de seu pensamento político vale se remeter aos “Principios programáticos del Partido Socialista” (1928), em que reivindica ser preciso adaptar as ações partidárias às condições sociais do país, mas sem deixar de observar critérios universais, pois as circunstâncias nacionais se submetem à história mundial, declarando que o método de luta do PSP era o “marxismo-leninismo”, e a forma, a “revolução”.

Apesar dos esforços editoriais das últimas décadas, a maior parte dos cerca de três mil textos escritos de Mariátegui (muitos deles, artigos para diários) permanecem dispersos em revistas do Peru e exterior (como Mundial Variedades).

Com relação à pequena parcela de sua obra que já foi traduzida para a língua portuguesa, destacam-se: duas edições de Sete ensaios de interpretação da realidade peruana, a da Alfa Omega (1975), prefaciada por F. Fernandes, e a da Expressão Popular/Clacso (2008); as coletâneas Política (Ática, 1982), e Por um socialismo indo-americano (Editora UFRJ, 2006); e a edição ampliada Defesa do marxismo: polêmica revolucionária e outros escritos (Boitempo, 2011), que, além de seu livro sobre filosofia marxista, traz ensaios inéditos em português sobre temas como Revolução Russa e feminismo.

Os volumes da coleção Obras completas estão disponíveis na rede, em portais como Patria Roja (https://patriaroja.org.pe), Archivo Chile (www.archivochile.com) ou Marxists (http://www.marxists.org). Além destes livros, o Archivo J. C. Mariátegui – em cooperação com a Universidad Nacional Mayor de San Marcos (que a partir de doação da família conserva sua biblioteca particular) – vem promovendo a organização e digitalização de ampla documentação sobre o marxista, estando disponíveis em seu portal (https://archivo.mariategui.org) numerosas cópias de seus manuscritos originais, correspondências e documentos, além de fotografias (como as usadas em suas publicações) e a coleção completa da revista Amauta. Com relação a estudos sobre o pensamento mariateguiano, estão também acessíveis na rede várias coletâneas e ensaios de pesquisadores do assunto.

4 – Bibliografia de referência

ESCORSIM, Leila. Mariátegui: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2006.

DEVEZA, Felipe S. “Mariátegui, González Prada e o indigenismo radical no Peru da década de 1920”. Tempo, UFF (Niterói), v. 28, n. 2, mai-ago. 2022.

FERNANDES, Florestan. “Significado atual de José Carlos Mariátegui”. Coleção Princípios, n. 35, 1994-1995. Disp.: http://grabois.org.br.

FLORES GALINDO, Alberto. La agonía de Mariátegui. Lima: Desco, 1980. Disp: http://www.catedramariategui.com [Cátedra J. C. Mariátegui].

LUNA VEGA, Ricardo. Sobre las ideas políticas de MariáteguiLima: Ediciones Unidad, 1984.

MARTINS-FONTES L., Yuri. Marx na América. São Paulo: Alameda/Fapesp, 2018.

______. O marxismo de Caio Prado e Mariátegui. Tese (Doutorado em História Econômica) – USP/CNRS, 2015. Disp.: https://www.teses.usp.br.

______. “Mariátegui e a filosofia de nosso tempo” [Introdução]. Em: MARIÁTEGUI, J. C. Defesa do marxismo: polêmica revolucionária e outros escritos [org. e tradução: Yuri Martins-Fontes L.]. São Paulo: Boitempo Editorial, 2011.

MELIS, Antonio. José Carlos Mariátegui hacia el siglo XXI (Cuadernos de Recienvenido) [1994]. São Paulo: Depto. Letras Modernas/FFLCH-USP, 1996.

OBANDO M., Octavio. Ordenamiento cronológico de las Obras completas populares de J. C. Mariátegui. Lima: Espigón, 1999. Disp.: http://www.archivochile.com.

QUIJANO, Aníbal. “José Carlos Mariátegui: reencuentro y debate”. Em: MARIÁTEGUI, J. C. Siete ensayos… Caracas: Biblioteca Ayacucho, 2007.

ROUILLON D., Guillermo. La creación heroica de José Carlos Mariátegui [2 tomos]. Lima: Editorial Arica, 1975.

SÁNCHEZ VÁZQUEZ, Adolfo. De Marx al marxismo en América LatinaCidade do México: Itaca, 2012.

Notas

* Yuri Martins-Fontes L. é coordenador-geral do Núcleo Práxis-USP e editor do Dicionário Marxismo na América</em>; professor de História Contemporânea, escritor, tradutor e jornalista; doutor em História Econômica (USP/CNRS), bacharel em Filosofia e em Engenharia (USP), com pós-doutorados em Ética e Política (FFLCH-USP) e em História, Cultura e Trabalho (PUC-SP). Autor de, entre outras obras: Marx na América: a práxis de Caio Prado e Mariátegui (2018) e Cantos dos infernos (2021).

* Com edição de texto de Joana Coutinho e Solange Struwka, este artigo foi originalmente publicado no portal do Núcleo Práxis-USP, sendo um dos verbetes do Dicionário Marxismo na América, obra coletiva coordenada por essa organização; permite-se sua reprodução, sem fins comerciais, desde que citada a fonte (nucleopraxisusp.org) e que seu conteúdo não seja alterado. Sugestões e críticas são bem-vindas: nucleopraxis.usp.br@gmail.com.


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