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O neocolonialismo no Panamá

Nils Castro

Tradução:

La Estrella de Panamá, o jornal mais antigo do país e um dos mais antigos de Nossa América, teve sua morte decretada por Washington mas resiste e requer a solidariedade continental. Trata-se de um jornal tradicionalmente de centro que nunca negou espaço para o pensamento de esquerda.

Nils Castro*
nils_castroSeguramente por capricho do Departamento de Ativos Estrangeiros (OFAC) o principal acionista do  Grupo Editorial El Siglo & La Estrella de Panamá (GESE), Abdul Waked, foi incluído na chamada  Lista Clinton, pelo governo de Washington. Com isso fica impedida de manter relações financeiras ou comerciais com empresas estadunidenses o que, no Panamá é o mesmo que estrangulamento econômico.
OFAC argumenta acusando Waked de lavar dinheiro originado no narcotráfico, apesar de que não existe nos tribunais do Panamá nem dos Estados Unidos nenhum processo que evidencie essa acusação.
La Estrella de PanamáLogoO que choca nisso tudo é que uma decisão de um departamento burocrático estadunidense imponha o fechamento de um dos mais importantes jornais diários do Panamá. Além disso, os governantes panamenhos não disseram uma só palavra em apoio ao jornal como também os demais meios de comunicação ignoraram o fato.
O mal já foi feito. Empresas panamenhas assustadas já cortaram linhas de crédito e inserções publicitárias, o mesmo que colocar um torniquete para apressar sua morte.
Abaixo publicamos o texto de Abdiel Rodríguez Reyes para melhor entendimento do contexto.

Um mini bloqueio extraterritorial

Abdiel Rodríguez Reyes*

abdiel_rodriguez_reyes2O projeto neocolonialista no Panamá, para alguns começa a partir da morte de Omar Torrijos em 1981, outros a partir da Invasão de Estados Unidos a Panamá em 1989. O certo é que há uma desmontagem de tudo que é liberal e nacional popular que de alguma forma fortalecia o Estado nacional, para deixá-lo totalmente indefeso diante dos interesses da política exterior estadunidense, da burguesia rentista e da classe política que opera funcionalmente esses interesses, junto  a pretensão de estender o poderio extraterritorial nas antigas colônias, dilaceram a soberania nacional.

La Estrella de PanamáNa conjuntura, estamos vendo as consequências desse poderio por meio da inclusão do dono do Grupo Editorial El Siglo & La Estrella de Panamá (Gese) na Lista Clinton. O Gese é vítima das medidas adotadas pelo Bureau de Controle de Bens Estrangeiros do Departamento de Fazenda dos Estados Unidos, com o cancelamento da apólice dos seguros aos colaboradores, Visa e Mastercard suspendem seus postos de venda, e, por último, anulação da programação de publicidade. Todas essas medidas como resultado de uma disposição que não faz parte da legislação panamenha, pois é estadunidense. Trata-se de um mini bloqueio extraterritorial.

La Estrella de Panamá é o jornal com maior peso histórico no país, tem uma importância simbólica no imaginário coletivo. Assim, a tentativa de impedir seu funcionamento reanima a aversão à política exterior estadunidense. Nos últimos anos, em particular com os governos pós invasão, é evidente a servidão diante dos interesses estadunidenses, apesar de que muitas vezes preferimos fechar os olhos como se não existisse. O colonialismo estadunidense nunca deixou de estar presente, muda para outras formas, e agora se nos apresenta como de hábito. Nunca se deveria ter baixado a guarda. Agora que não golpeiam na cada, só nos resta reagir.

Em outro momento e com outra correlação de forças geopolítica, Panamá poderia contar com o apoio e o repúdio internacional a essa decisão unilateral de Estados Unidos de impor um mino bloqueio à Gese. Isto não afeta só um grupo econômico do país, como viola a soberania nacional. É uma clara demonstração de neocolonialismo.

Com justa razão já se vê algumas manifestações de apoio ao Gese e também se vê o jornal mais próximo do povo como nunca. Esse apoio mútuo não pode baixar de intensidade. Mas estamos reagindo apenas e não atuando planificadamente. Foi ingênuo pensar que Estados Unidos não imporia sua agenda contra nossa soberania. Se temos um tigre, há que alimentá-lo e o apetite do império é insaciável. Com a Lista Clinton se está aplicando a Política do Grande Garrote de Teddy Roosevelt nas repúblicas bananeiras. Enquanto os governos de turno e a burguesia rentista se conformam com as migalhas.

O assédio contra o país se produz de diferentes formas de ingerência externa e merece uma luta anticolonialista, sólida e orgânica. Não só devemos erguer a voz contra a ingerência externa, mas também  com o apoio interno dos governos de turno, e também contra a servidão dessa burguesia rentista dependente dessa estrutura. Já nos advertia Ricaute Soler sobre a necessidade de “identificar as forças, classes e grupos que subjetiva e objetivamente conspiram contra a afirmação do Estado nacional panamenho”. Isso Soler advertiu em 1991, no marco do “neocolonialismo na pós guerra fria”. Nessa linha devemos ficar alertas diante de qualquer forma de ingerência externa. Devemos saber com quem e contra quem lutamos, e onde não faltará os que queiram pescar em águas revoltas.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Nils Castro Um dos mais prestigiados intelectuais da região. É autor do livro “As esquerdas latino-americanas em tempo de criar”

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