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O que é que acontece na Ucrânia?

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Chris Kanthan* 

Chris KanthanÉ a nação das mudanças. Aviões de guerra combatem no ar, tanques arruínam as ruas, destroieres navegam por mares perigosos, sanções diplomáticas e econômicas, líderes ao redor do mundo altercam acaloradas discussões. O que está a ocorrer na Ucrânia? As discussões entre os meios de comunicação ocidentais carecem de perspectiva. Com perguntas e respostas o autor procura auxiliar a compreensão dos fatos pois, coloca as coisas em seu devido lugar.

ucrania mapaP. Em poucas palavras, o que está ocorrendo na Ucrânia?

R. Houve grandes protestos em Kiev (capital da Ucrânia) durante uns dois meses e o presidente – que era pró Rússia  – abandonou o país. Um novo governo – agora pró ocidente – foi instalado reavivando algumas das tensões da Guerra Fria entre Rússia, Estados Unidos e a União Europeia. A Rússia enviou tropas para a Criméia, a península ucraniana no Mar Negro, ação que está sendo qualificada como uma invasão da Ucrânia. A Criméia, por sua vez, trata de deixar a Ucrânia e unir-se à Rússia, o que é inaceitável para a Ucrânia, os Estados Unidos e a Comunidade Europeia que responderam com enérgicas palavras e ações.

P. Os principais meios de comunicação, desde o New York Times até o Wall Street Journal, parecem estar de acordo com que Putin se equivocou ao intervir militarmente. Alguns líderes, inclusive Hillary Clinton, comparam-no a Hitler. Por que não tratamos de deter sua agressão?

R. As emoções estão a flor da pele. Em todo caso não é para comparar com Hitler. Da guerra contra o Vietnam às guerras do Iraque (I e II) ao conflito na Síria, políticos estadunidenses e os meios corporativos compararam os numerosos adversários com Hitler. É como um botão para acionar as emoções. Putin não está tratando de dominar o mundo nem mesmo reconstituir a União Soviética incorporando a Ucrânia. Recorde-se que quando Margaret Thatcher invadiu as ilhas Falkland (Malvinas), distante oito mil milhas da costa da Inglaterra, ela foi chamada de dama de ferro por sua coragem e determinação. Esses são alguns dos inevitáveis desvios dos meios de comunicação.

ucrania-dividida_1P. Em todo caso, no que se refere a tomada da Crimeia, é essencial porque ela é parte da Ucrânia, correto?

R. Você quer dizer: a “República Autônoma da Crimeia”?

P. Isso soa como se fosse um país isolado. Crimeia não é uma província, como a Califórnia é um estado dos Estados Unidos?

R. Nem tanto. Crimeia se converteu em parte da Rússia em 1783, durante o reino de Catarina a Grande, antes da Califórnia fazer parte dos Estados Unidos ou George Washington ter sido proclamado o primeiro presidente dos Estados Unidos. Crimeia pertenceu ou fez parte da Rússia todo esse tempo (exceto por 20 anos) até 1954, quando foi doada à Ucrânia pelo líder russo Nikita Khrushchev.

P. O que ocorreu nesses 20 anos e por que Khruschev doou a Crimeia à Ucrânia?

R. Em mediados do século XIX, os  impérios britânico e francês se juntaram ao Império Otomano e atacaram a Rússia, o que ficou conhecido na história como Guerra da Crimeia. Foi uma típica manobra geopolítica para manter a influência dos impérios da França e da Grã Bretanha sobre o Mediterrâneo. 200 mil russos morreram nessa guerra. Os invasores foram expulsos 20 anos depois.

O Mar Negro, onde está a Crimeia, é a única água quente (as outras estão no círculo polar) a que os russos têm acesso, ademais de ser estrategicamente vital para a Rússia. O Mar Negro se liga com o Mediterrâneo, que é a porta de entrada para a Europa, o Oriente Médio e a África. A importância da Crimeia para a Rússia, em termos de comércio e segurança nacional, não pode ser subestimada.

Com relação a Crimeia ter sido doada à Ucrânia, três fatos tiveram um papel chave. Um, o presidente Khrushchov era de origem ucraniana e viveu na Ucrânia os primeiros 30 anos de sua vida. Converteu-se em líder do Partido Comunista da Ucrânia antes de trasladar-se para Moscou. Obviamente, ele tinha um afeto especial para com a Ucrânia. Em segundo lugar, em 1954 Crimeia completou 300 anos de pertencer à Rússia. Em terceiro lugar, a década de 1950 foi a do apogeu da União Soviética e na Rússia, ninguém podia imaginar a ruptura da URSS e a Ucrânia converter-se em nação independente.

ucrania mapa1P. Assim que a história das relações entre Rússia e Ucrânia dura em torno de 400 anos?

R. Na realidade, mais: uns 1.200 anos. A primeira grande nação eslava foi Rus de Kiev, estabelecida no século nove, tendo Kiev como capital. Em certo sentido a ucrânia é a mãe pátria da Rússia.

P. E como Crimeia se torna autônoma?

R. Depois da queda da União Soviética, Crimeia adquiriu uma certa autonomia, com sua própria Constituição e Parlamento. Definitivamente não é uma outra província da Ucrânia. Além disso, Rússia tem uma base naval em Sebastopol e tem um contrato de arrendamento com a Ucrânia que é válido até 2042. A Rússia, portanto, tem razão em mobilizar 25 mil soldados em Sebastopol. Portanto, é falso os meios de comunicação chamarem isso de “invasão russa”.

P. A população da Crimeia esta de acordo com a presença russa?

R. 60% das pessoas na Crimeia são de etnia russa. Em março, o Parlamento da Crimeia votou unanimemente a favor de unir-se à Rússia. Eles celebraram um referendum que aprovou a anexação por mais de 80%. A população comprovou que está de acordo com o Parlamento. Não obstante, os novos dirigentes da Ucrânia e Obama disseram que isso vai contra o direito internacional e que os habitantes da Crimeia não tem o direito de secessão. Há alguma minorias na Crimeia, como os tártaros, que prefeririam estar com a Ucrânia.

P. Por um lado parece ser um princípio democrático permitir que as pessoas determinam seu futuro. Por outro lado, não se armaria o caos se outros povos lutassem por separação em muitas nações?

R. É certo. Estas não são coisas simples para responder. Em todo caso, temos suportado secessões ou divisões de acordo com nossos interesses naturais. É óbvio o apoio e ajuda a todas as nações que quiseram se separar da União Soviética. Os Estados Unidos ajudaram o Sudão e ha três anos se criou o Sudão do Sul; também ajudou a criação do Kosovo, uma ruptura do território da Sérvia, que passou a procurar vínculos com a Rússia. No Iraque, os neoconservadores apoiaram inclusive a divisão entre sunitas, xiitas e curdos. Claro, se regressarmos na história, quase todos os países na África e no Oriente Médio tiveram suas fronteiras desenhadas pelas nações imperiais, através de ações fundadas nos recursos naturais e estratégias militares.

P. A Ucrânia oferece alguma vantagem para a Rússia?

R. Sim, e são os fatores econômicos os mais significativos. Primeiro, Rússia é o maior exportador de gás natural para a União Europeia, cerca de 10 bilhões de dólares a cada ano. Cerca de 2/3 desse gás natural passa através da Ucrânia. Há que considerar todos os investimentos que a Rússia fez nesses dutos e na Ucrânia em geral. Para manter relações estreitas com Ucrânia a Rússia concedeu grandes empréstimos e descontos significativos no gás natural utilizado pela indústria e para uso doméstico dos ucranianos. Assim também com a União Europeia e com outras nações, como a Alemanha, em maior quantidade. Esta é uma das razões pelas quais os países europeus estão relutantes em antagonizar a Rússia.

Ucrânia é conhecida como o graneiro da Europa, bendita por ter um solo fértil e rico. Ucrânia é o quinto exportador de farinha de trigo no mundo e o terceiro maior exportador de milho. Ucrânia tem vastas quantidades de petróleo de xisto e gás natural cuja exploração ainda não foi iniciada.

P. Que benefícios econômicos teriam os Estados Unidos e a União Europeia com a Ucrânia inclinada pro lado deles.

R. Se a Ucrânia se juntasse à União Europeia, seria o maior país da Europa, maior que a França, Alemanha ou Espanha. Existem muitas companhias de petróleo com água na boca olhando o gás natural e o petróleo da Ucrânia. Chevron firmou com a Ucrânia, em novembro do ano passado, um acordo de 50 anos, de 10 bilhões de dólares para extrair gás natural; Shell firmou acordos similares. Porém, o mais importante, é que a Exxon tinha esperança de firmar um contrato com Ucrânia para perfurar no Mar Negro, o que seria quase impossível sem utilizar a Crimeia como rota para os oleodutos. Também as empresas de biotecnologia como Monsanto, Syngenta e Dow gostariam muito de tomar conta das terras da Ucrânia com cultivares, especialmente de milho e trigo com GMOs (Genetically modified organism) – Organismo geneticamente modificado).

P. Realmente, tudo isso se reduz a petróleo, GMOs e recursos naturais? O que acontece com tudo o que se tem falado sobre a difusão da democracia?

R. Se consideramos a Arábia Saudita, um dos aliados mais próximos (dos EUA), veremos que Não é um país democrático – dirigido por uma família de marionetes – onde as mulheres não podem votar nem sequer dirigir um auto. Isso não é um bom fator. O governo dos Estados Unidos tem apoiado a muitos ditadores e países não democrático quando é de seu interesse. Muitos líderes eleitos democraticamente foram assassinados ou tirados à força por golpes orquestrados. Tendemos a viver no que os psicólogos chamam “ignorância voluntária”. Um bom livro para compreender esta parte obscura da política exterior é “Confessions of an Economic Hit Man” (Confissões de um assassino econômico) de John Perkins. Por outro lado, este é o comportamento geralmente utilizado pelos impérios ao longo da história.

Democracia, é precisamente, um código para o livre mercado. Estender a democracia é um termo politicamente correto para abrir a porta para o livre mercado.

P. Isso parece horrível. O livre mercado não é bom para a Ucrânia ou qualquer outro país?

R. A Ucrânia fazer um acordo de livre mercado, sem restrições, com os Estados Unidos, isso é o mesmo que um criança de dez anos entrar num ringue para lutar box com Mohammed Ali. Pense nisto: Citybank pode entrar na Ucrânia e comprar todos os seus bancos, preenchendo um único cheque. O que a Ucrânia pode oferecer é: mão-de-obra barata e abundante recursos naturais, os que podem ser explorados. Isso só a deixaria mais pobre no longo prazo.

P. Não obstante o povo ucraniano começou a revolução, não? Não é como se atacássemos o país para difundir a liberdade como fizemos no Iraque?

R. É quase assim. Assista o vídeo em que a secretaria de Estado adjunta, Victoria Nuland, discursou seguramente com o grande cartel da Chevron ao lado. Ela admitiu que os Estados Unidos gastaram 5 bilhões de dólares (depois de 7 minutos e 25 segundos no vídeo) para ajudar os partidos pró-ocidentais. Também houve uma chamada telefônica filtrada em que se pode escutar a decisão sobre quem dirigirá o novo governo da Ucrânia. Certamente não gostaríamos se a Rússia ou a China gastassem milhares de milhões de dólares difundindo movimentos anti Estados Unidos no México e Canadá.

Além disso, o que ocorreu não foram eleições livres em que o governo pró russo perdeu. Foram uns poucos milhares de pessoas que protestavam na capital o que levou a destituição de um presidente eleito democraticamente. Tecnicamente, tratou-se de um golpe de Estado. Seria permitido que manifestantes pudessem tirar o presidente da Casa Branca? Isso é um mal exemplo de anarquia na democracia.

P. John Kerry e outros continuam afirmando que os protestos foram pacíficos. Havia inclusive um vídeo com uma mulher ucraniana falando de ditadura e de protestos pacíficos.

R. Os protestos foram majoritariamente pacíficos, porém, nem sempre. Houve momentos com bombas incendiárias (coquetéis molotov) e armas de foto que foram utilizadas pelo movimento de protesto. Agora já se sabe que alguém da oposição contratou franco-atiradores para realizar ataques de falsa-bandeira. Há elementos no movimento de protesto – os fascistas, os neonazistas – que os meios de comunicação e os políticos ocidentais têm ignorado até agora, já que serviam a seus propósitos, assim como a narrativa de uma revolução pacífica. Inclusive no novo governo, a aliança dos partidos de extrema direita (Svoboda) estão em muitos postos chaves, como o primeiro ministro adjunto. O líder desse partido, Dymitro Yarosh, disse que disputará a presidência da Ucrânia.

Com relação ao vídeo que se tornou viral, foi produzido por um grupo bem financiado pelos Estados Unidos, gente como Larry Diamond que se dedica a produzir “mudanças de regime” em todo o mundo, incluindo Irã e Venezuela. National Endoment for Democracy (NED) é uma organização neoconservadora financiada pelos contribuintes que toca muitos projetos desse tipo em todo o mundo.

Geralmente os protestos eram um pouco análogos ao movimento Tea Party, que tem por trás os irmãos Koch.

P. Os protestos não ocorreram em toda a Ucrânia?

R. Ucrânia está quase como dividida pela metade em termos demográficos. A metade do lado oriental tem muito mais pessoas de origem étnica russa e tende a ser pró-russa. Nos último dias tem havido muitas manifestações em cidades do leste, em que as pessoas ergueram bandeiras russas nos edifícios governamentais. Claro, o novo governo da Ucrânia e os meios ocidentais não veem os manifestantes pró-russos com bons olhos..

P. Apesar de tudo isso, se assumimos que os fins justificam os meios, Ucrânia alinhada à Europa será mais próspera de que com Rússia?

R. Muitos ucranianos esperam poder emular a outras nações ex comunistas, como a Polônia ou a República Checa. Ucrânia continua sendo relativamente um país pobre, com um PIB per capita em torno de seis mil dólares ao ano – uma terceira parte do PIB da Polônia e em torno de uma quarta parte das cifras da República Checa.

No melhor dos casos, a economia da Ucrânia pode crescer também e, no pior dos casos, Ucrânia pode acabar como a Grécia, uma nação cruelmente explorada pelos bancos y as corporações transnacionais. Imagine-se a Chevron e Shell fraturando o solo através das formosas terras rurais da Ucrânia enquanto a Monsanto semeia as sementes de OGM. Será a destruição dos ecossistemas e dos meios de vida dos agricultores. Em troca de seus empréstimos os bancos da União Europeia exigirão duros programas de austeridade que basicamente se traduzem em demissões em massa no setor público, seguido por cortes na seguridade social, na atenção à saúde e todos os programas de governo que se possa imaginar. Claro que tudo isso será acompanhado pela privatização da economia, que é só um eufemismo para a venda dos bens nacionais aos oligarcas e empesas a preço de banana. O pior para a economia e o melhor para os bancos e as corporações estrangeiras que obtêm as vantagens nas negociações. Certamente está é uma regra standard do jogo que tem sido utilizada pelo FMI, BIRF e Banco Mundial em todo o mundo ha mais de 50 anos.

Os novos dirigentes da Ucrânia, certamente não representam a maioria dos cidadãos ucranianos que recebem em torno de 160 dólares por mês da seguridade social. O novo primeiro ministro é um milionário, ex banqueiro e os dois novos governadores de grandes províncias são multimilionários. Ironicamente, o novo governo interino tomou posse sem que tivesse havido eleições. Se a história serve de guia, o novo governo será um símbolo do capitalismo compincha.

P. Se a Rússia atacar Ucrânia? Ou se a Ucrânia ou a aliança Estados Unidos-União Europeia atacarem a Crimeia? Seria o começo de algo horrível?

R. Se prevalecerem as cabeças frias, desastrosos resultados poderão ser evitados. Rússia não pode dar-se ao lucho de perder a Crimeia. Os Estados Unidos e a União Europeia ganharam o resto da Ucrânia e deveriam contentar-se com isso. O orçamento militar da Rússia é menor que um quinto do dos Estados Unidos, não há necessidade de alarme ou reação exagerada.

Em quanto que com relação a Ucrânia, não pode dar-se ao luxo de romper laços com a Rússia, que tem sido como família ha mais de mil anos. Ucrânia precisa evitar uma guerra civil que poderá explodir se os russos étnicos (ucranianos de etnia russa) se sentirem ameaçados ou oprimidos por um governo nacionalista Ucrânia tem que respeitar os direitos das minorias e manter os partidos fascistas e de extrema direita sob controle.

Os ucranianos se darão conta de que a vida na União Europeia não é de um caminho de rosas. Poderá haver muito remorso num futuro próximo.

O melhor caminho para a Ucrânia seria o de manter amizades dos dois lados do corredor. Não antagonizar a Rússia e os russos étnicos em seu território, integrar-se pouco a pouco com a União Europeia, evitar unir-se à OTAN e não deixar que os ocidentais instalem bases militares em seu território ou suas fronteiras. Depois do desmantelamento da União Soviética, o ocidente não cumpriu suas promessas e agregou muitos países ex comunistas à OTAN. Rússia já se sente claustrofóbica, rodeada por tantas bases militares da OTAN e dos Estados Unidos.

P. Pergunta final: Muito gente sente que é antipatriótico questionar o governo durante uma crise externa. O que se pode fazer a esse respeito?

R. Adivinhe quantas pessoas morreram na II Guerra Mundial! 60 milhões! Essa monstruosidade ocorreu porque em todos os países apoiaram cegamente a seus líderes nas decisões de política exterior. Patriotismo não significa apoiar consignas sem sentido, mas sim exigir que as elites encarregadas de representar-nos tomem boas decisões morais encaminhadas à paz e prosperidade. Todo mundo fala contra a guerra contra o Iraque, porém, onde estavam doze anos atrás? O momento de analisar, questionar, debater e educar-nos é agora e não depois que os mísseis tenham sido disparados.

*Chris Kanthan é autor do e-book “Deconstucting Monsanto” (Descontruindo a Monsanto), vive na baia de San Francisco, Califórnia, e já viajou por mais de 30 países escrevendo sobre política, finanças e alimentação.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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