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Andrés Solíz Rada*
Evo Morales enfrentou, em sua primeira gestão de governo (1005-2009), o enorme desafio de arrancar a Bolívia dos esquemas neoliberais. Em importante medida, conseguiu esse objetivo com a nacionalização dos hidrocarbonetos (01/05/06), a partir do que se reorganizou parte da economia em função de um capitalismo de Estado que, acompanhado dos altos preços das matérias primas, trouxe uma bonança econômica que fortaleceu o país.
Em sua segunda gestão (2009-2014), terminou de derrotar as intenções separatistas na Nação Camba e as correntes desagregadoras de um indigenismo radical, que conseguiu que a Constituição reconhecesse a existência de 36 nações indígenas, dotadas de territórios ancestrais, justiças comunitárias e domínio exclusivo sobre os recursos naturais renováveis e o direito a veto sobre os não renováveis. Todos esses anunciados ficaram no papel.
Ao iniciar sua terceira gestão (2015-2020), tem o desafio de consolidar a viabilidade da Bolívia, permanentemente ameaçada desde as alvoradas de sua existência, devido a sua invertebrada geografia, diversidade étnica, pluriculturalismo multilingue e estratagemas contínuos de oligarquias vizinhas que atuavam e atuam como correias de transmissão das transnacionais.
Suas promessas abarcam até o 2015, ano em que Bolívia completará 200 anos de existência. O presidente considera que nos próximos 16 anos Bolívia deveria ser um país sem extrema pobreza, em que prime o interesse coletivo sobre o individual e capaz de resolver os problemas de educação, saúde e esporte.
Postula também a soberania científica e tecnológica, a soberania comunitária e financeira, sobre nossos recursos naturais com nacionalização, industrialização e comercialização, a soberania alimentar, ambiental e marítima, que permita a Bolívia recuperar seu mar cativo.
Como se percebe, o Presidente não ofereceu nem o socialismo, à margem do socialismo latino-americano, que é o único possível, nem um regresso ao tahuantinsuyo, como exigem as ONG e os “pachamânicos”. Ele colocou um projeto de país possível que deixou sem propostas os outros candidatos presidenciais, amplamente derrotados nas eleições de 12 de outubro.
As metas assinaladas têm, contudo, enormes obstáculos que obrigarão a que Evo demonstre de que é capaz de consolidar a unidade nacional e conduzir acertadamente a economia, não só em épocas de bonança, mas de enormes dificuldades que se vislumbram no horizonte imediato, sobretudo pela diminuição dos preços das matérias primas.
No ano 2019, entrará em vigência um novo contrato (possivelmente por outros vinte anos) de venda de gás para o Brasil. Evo deverá discutir os novos preços seja com Dilma Rousseff ou Aécio Neves. Nenhum dos dois tem disposição favorável com relação a Bolívia, como acontecia com Lula.
Nossa situação é mais grave ainda se se considera que os Estados Unidos e Europa Ocidental iniciaram uma dura ofensiva contra os BRICS (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul) por ter colocado as bases de um novo sistema financeiro, que limita a hegemonia absoluta do Banco Mundial e seis paraísos fiscais. Pois bem, na medida em que o Brasil sofra a ofensiva imperial, tratará de proteger-se do temporal com imposições más drásticas sobre seus débeis vizinhos.
Os organismos regionais de integração (Mercosul, Unasul, Celac e Alba) não conseguiram passar de efusivos discursos bolivarianos ao controle conjunto e coordenado de recursos estratégicos, como a jazidas minerais, o petróleo, Banco e agricultura, em que as transnacionais têm domínio quase absoluto. A maneira de exemplo, a legislatura de Chubut acaba de entregar à British Petroleum a exploração por 40 anos de Cerro Dragón, as jazidas mais produtivas de gás e petróleo da Argentina.
Dessa maneira, tanto os projetos de integração libertadores se encontram estancados, os planos de dominação dos EUA, através da Aliança do Pacífico (Peru, Chile, Colômbia, EUA e México), conseguiram importante avanço com a desnacionalização do petróleo mexicano. Em consequência, Bolívia, para se aproximar de sua ambiciosa agenda patriótica de 2015, deve fortalecer sua unidade interna, manejar com maior responsabilidade sua dívida externa e usar de maneira mais responsável seus recursos econômicos, o que nem sempre tem ocorrido nos anos precedentes.
* Advogado, jornalista e ex parlamentar. Nos últimos 30 anos foi um dos mais destacados defensores dos recursos naturais na Bolívia. Foi o primeiro ministro de Hidrocarbonatos da gestão de Evo Morales.