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Obama em La Habana

Gustavo Espinoza M.

Tradução:

Gustavo Espinoza M.*

Obama+seeks+to+normalize+relations+with+cubaQuando na tarde de domingo, 19 de março, o imenso pássaro de aço que transportava o presidente de Estados Unidos pousou em solo cubano, começou não só uma nova etapa nas relações entre os dois países mas também entre a Casa Branca e todo o hemisfério americano.

Há quem compara o fato à derrubada do Muro de Berlim, e o associam ao fim da guerra fria em nosso continente, augurando que novos tempos deverão transcorrer em benefício de todos.
Os fatos seguintes, incluindo as conversações oficiais, as cerimônias diante do Memorial à Martí, o ter percorrido pela cidade, a visita ao Palácio da Revolução, a inusitada coletiva de imprensa oferecida pelos dois mandatárias a meio-dia de segunda-feira, o discurso de Obama no Gran Teatro Nacional Alicia Alonso, de La Habana, a reunião com os “13 dissidentes cubanos” e até o jogo de beisebol na Ciudad Deportiva, confirmaram que a Casa Branca tem hoje plena consciência do quão estúpida e inoperante foi sua política com relação a Cuba, nos últimos 50 anos.
Não obstante, não se atreve a questionar os temas em profundidade. Continua chamando o Bloqueio de embargo, e diz que foi inútil, más não ilegal.
Tampouco reconhece a essência criminosa nem os incalculáveis prejuízos que o bloqueio causou a Cuba e à vida dos cubanos. E mostra a inconsistência de suas promessas de “respeitar a Cuba” quando diante de Berta Soler e outros ratifica a determinação de contribuir com 30 milhões de dólares para as atividades subversivas, para que “continuem sua luta”.
E quando simplesmente se silencia quando se lhe pede uma definição sobre o tema de Guantánamo, uma “batata quente” a que não se atreve encarar. Continua utilizando ilegalmente esse solo geográfica e legitimamente cubano, como base militar e como centro clandestino de reclusão, já denunciado pela Comissão de Direitos Humanos de Nações Unidas e condenado pela humanidade.
Por isso sua retificação é frágil e é precária. Não se refere à essência mas só à forma da atuação ianque e atribui a uma sequela derivada da guerra fria. Podia ter dito também, “algo transversal a uma disputa entre dois países em conflito.
Na história humana não se conhece uma experiência similar. Nem os gregos quando sitiaram Troia se atreveram a tanto. Ficaram por nove anos.
Ter um país bloqueado por mais de 50 anos, privando-o de alimentos, medicamentos e outros bens essenciais constitui um abominável crime de guerra incompatível com a natureza humana.
Obama, em seu discurso, tinha que ter pedido desculpas em nome de seu povo e de seu governo pelos horrores praticados contra Cuba em todo esse período. E mais, reconhecer que antes da Revolução Cubana, estava já consubstanciado no ideário ianque a tese de que Cuba pertencia aos Estados Unidos em razão da sua posição geográfica.
Assim afirmava o senador por Kentuck John Crittenden em 1859, assegurando que “Cuba nos pertence geograficamente e deve vir a nós, deve ser nossa antes de muito tempo”. Porém essa não era a expressão pessoal de um parlamentar. Era o denominador comum no país entusiasmado pelas guerras de conquista.
Ninguém pode negar que o discurso do presidente estadunidense no teatro Alicia Alonso foi demonstração de brilhante oratória. E teve também passagens emotivas como quando admitiu o esforço que melhores de médicos cubanos que trabalhem mundo afora pela salvação de milhões de pessoas, ou quando reconheceu que “só mesmo o povo de Cuba tem o direito de decidir sobre seu próprio destino”.
Contudo, o brilho não basta quando se aspira reconstruir uma relação fraturada. É necessário adicionalmente concordar que a crise de ruptura teve início quando Estados Unidos se negou a admitir o direito de Cuba por percorreu seu próprio caminho de desenvolvimento. E que para obstruir esse vigoroso e heróico desafio valeu-se das armas mais horripilantes e repudiáveis.
Obama bem que poderia ter admitido o valor dos cinco heróis que o Império manteve ilegalmente presos até dezembro de 2014. E em contrapartida reconhecer o abominável fato de dar guarida em seu território a Luis Posada Carriles, o terrorista que a serviço da CIA, derrubou um avião da Cubana de Aviación, em outubro de 1976, nas águas de Barbados, matando delegação de jovens esportistas, e que praticou muitos outros crimes e que goza até hoje de vergonhosa impunidade.
Como se tratasse de uma simples terapia, Obama pediu a Cuba que “esqueça o passado”, como se Cuba pudesse esquecer as vítimas inocentes dessa tragédia. Como se pudesse reconhecer o sangue dos que morreram com a explosão do Maine, ou na Praia Girón, nos campos e cidades vítimas da onda terrorista desencadeada contra Cuba durante esses mais de 50 anos.
É um bom recurso invocar o autor de “La Edad de oro” (José Martí), quando fala da amizade ou de seu amor à liberdade, mas é enganação quando o cita para promover uma “reconciliação” isenta de verdade e de justiça. Melhor seria lembrar de Martí: “se não é nobre dizer a verdade, mais nobre é dizê-la inteira”
E os povos são os que conhecem toda a verdade por tê-las vivido, ou quando a estudam. E em Cuba há milhões que viveram essa verdade também milhões que a estudam para que jamais seja esquecida.
Na América Latina o Império cometeu muitas iniquidades. E tem apoiado forças obscurantistas que têm envilecido a boa parte da população. Por isso frutificam frutos traiçoeiros que enriquecem saqueando as riquezas das nações. Isso ocorreu em Cuba no passado e continua ocorrendo em muitos dos países da região.
E isso pode se comprovado pelo próprio Obama depois que o gigantesco pássaro de aço que o transportava saiu de Cuba e pousou em solo argentino onde encontrou uma nação dividida. Um governo como o de Macri, de joelho e servil, e um povo em luta com suas mulheres e seus jovens na primeira linha de combate.
*Colaborador de Diálogos do Sul, de Lima, Peru


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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