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Onda de emigrantes etíopes reflete uma grande desigualdade

Redação Diálogos do Sul

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A escassez de terra na Etiópia é um tema crítico para os pequenos agricultores que são 80% da população. Foto: Isaías Esipisu/IPS A escassez de terra na Etiópia é um tema crítico para os pequenos agricultores que são 80% da população. Foto: Isaías Esipisu/IPS

Os 30 emigrantes cristãos da Etiópia assassinados pelo grupo extremista Estado Islâmico (EI) no dia 19 de abril na Líbia planejavam cruzar o mar Mediterrâneo para buscar trabalho na Europa. Eles representam a trágica expressão dos desafios que enfrenta o crescente setor da população que busca um futuro melhor fora de seu país.

Dias depois, o porta-voz do governo etíope, RedwanHusein, em entrevista na televisão pediu às pessoas que estivessem pensando em emigrar a não arriscarem suas vidas utilizando rotas perigosas, uma reação insuficiente que gerou protestos juvenis nesta capital e desagradou os familiares dos falecidos.

Os manifestantes criticaram com muito fraca a resposta do governo pelo massacre de cristãos ortodoxos, informou a imprensa. Os enfrentamentos aconteceram mais tarde entre as forças de segurança e manifestantes com saldo de vários feridos e centenas de detidos.

Quase dois terços da população etíope são cristãos, a maioria coptos ortodoxos, que situam sua chegada a este país do Chifre da África no século I.

Na Líbia, combatentes do EI decapitaram 16 emigrantes etíopes em uma praia e dispararam contra outros 12 em uma zona desértica. Cinco deles viviam em Cherkos, um bairro pobre de Adis Abeba, entre os quais estava EyasuYikunoamilak e BalchaBelete.

O irmão mais velho de Yikunoamilak, Seyoum, disse a FBC que Eyasu e Balcha haviam saído dois meses antes da Etiópia para o Sudão com a ideia de buscar trabalho na Grã-Bretanha para ajudar suas famílias.

“Falei com eles por telefone enquanto estiveram no Sudão”, contou Seyoum. “Não soube mais nada desde que chegara à Líbia há um mês”. Eyasu trabalhou no Catar e com suas economias pagou os gastos de seu amigo para chegar à Europa, acrescentou.

Apesar da advertência do governo, MeshesaMitiku, um velho amigo de Eyasu e Balcha e também da cidade de Cherkos disse à agência Associated Press: “Vou tentar a sorte, mas não na Líbia. Aqui não tem como melhorar”.

Os legisladores etíopes declararam três dias de luto e o governo anunciou que repatriaria todos os emigrantes em países perigosos, informou a emissora em língua amárica de a Voz da América, com sede em Washington.

Para as eleições parlamentares de 24 de maio, as primeiras desde a morte do líder Meles Zenawi, a previsão é de que o primeiro-ministro HailemariamDesalegn não tenha praticamente nenhuma oposição.

“Devemos redobrar os esforços para lutar contra o terrorismo”, disse o porta-voz da chancelaria, TewoldeMulugeta, em resposta às reclamações dos manifestantes. “Procuramos criar oportunidades de trabalho para os jovens. Os convidamos a aproveitar essas oportunidades em seu país”, acrescentou.

O desencanto marcado pela repressão, desigualdade e pelo desemprego propiciou vários protestos contra o regime nos últimos anos.

“A ideia de que a maioria dos migrantes etíopes parte por razões econômicas parece infundada”, disse Tom Rhodes, representante na África oriental do Comitê para a Proteção dos Jornalistas, em resposta à IPS. Também afirmou que a violação das liberdades fundamentais está praticamente vinculada com a pobreza e a desigualdade econômica.

YaredHailemariam, ex-investigador do Conselho de Direitos Humanos da Etiópia, concorda: “A repressão generalizada e a negação das liberdades fundamentais levou à frustração, à alienação e à desilusão a maioria dos jovens”.

“A sociedade tem direito de protestar de forma pacífica”, disse Felix orne, pesquisador na África oriental da organização HumanRightsWatch (HRW). “Não chama a atenção, já que o governo para limitar os protestos pacíficos, que jovens desfavorecidos aproveitem a escassa oportunidade de uma manifestação pública para expressarem suas frustrações. É um resultado inquestionável quando não há outra forma de se expressar”, acrescentou.

Os principais partidos da oposição acusam o governo de não criar postos de trabalho e de converter a emigração na única alternativa. O regime favorece, segundo eles, os integrantes da governante Frente Democrática Revolucionária do Povo Etíope e cria desigualdades econômicas.

Considerado o “tigre africano”, a Etiópia é um dos países mais povoados do continente com 94 milhões de habitantes, superado pela Nigéria, com 173,5 milhões. Mas o desempregou afetou 20,26% da população economicamente ativa entre 1990 e 2014.
Cerca de 37 milhões de etíopes são “pobres ou correm o risco de serem pobres”, segundo um informe do Banco Mundial de 2005. A instituição também aponta que “os mais pobres da Etiópia se tornaram ainda mais pobres” na última década.

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) estima que cerca de 29% da população são pobres. Isso explica a Etiópia estar em 174º lugar entre 187, no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

O Instituto Oakland, com sede nos Estados Unidos, que estuda a monopolização de terras, esteve no meio de uma controvérsia com o governo deste país por causa de seu último informe Dizemos que a terra não é de vocês: quebrando o silencio pelo deslocamento forçado na Etiópia.

Segundo o governo, o instituto utilizou “informação sem verificar e que é impossível verificar”. E em uma resposta à embaixada da Etiópia na Grã-Bretanha no mês passado, o instituto questionou a afirmação do governo etíope de que o desenvolvimento atual melhora o padrão de vida do país. Segundo YaredHailemariam, a propriedade estatal da terra contribui para a pobreza e a desigualdade.

A trágica notícia do massacre na Líbia coincidiu com ataques xenófobos contra emigrantes etíopes na África do Sul na semana passada, que incluiu saque e queima de imóveis. Também há um grande número de cidadãos deste país presos no conflito no Iêmen, segundo a imprensa estatal.

*IPS de Adis Abeba, Etiópia, especial para Diálogos do Sul – Editado por Lisa Vives – Phil Harris / Traduzido do inglês por Verónica Firme, versão portuguesa da Envolverde.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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