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"Pacote de maldades": Oposição pressiona Senado contra PEC que afeta saúde e educação

Não basta o desemprego, fome e pobreza que hoje atinge 60 milhões de brasileiros, Guedes quer reduzir direitos dos "supostos beneficiados" pelo auxílio emergencial
Cristiane Sampaio
Brasil de Fato
Brasília (DF)

Tradução:

O coro contrário à Proposta de Emenda Constitucional 186, a chamada “PEC Emergencial”, ganhou um reforço nesta quarta-feira (24), em Brasília (DF).

Representantes de centrais sindicais, entidades estudantis e movimentos populares se reuniram com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para pedir a não votação da medida, que pode entrar na pauta da Casa nesta quinta (25).

De autoria do governo Bolsonaro, a proposta acaba com o piso de gastos que os entes federados são obrigados a manter nas áreas de saúde e educação, consideradas prioritárias no país por força de lei.

Durante o encontro, deputados e senadores de oposição se juntaram aos movimentos populares também para pedir que a prorrogação do auxílio emergencial seja desvinculada da proposta.

O governo entregou a PEC 186 ao Congresso no final de 2019, mas não conseguiu alavancar a medida graças à impopularidade do tema, que costuma sacudir as bases eleitorais dos parlamentares, gerando grande pressão contra pautas que prejudicam as áreas de saúde e educação.

Medida é fundamental na agenda neoliberal de Guedes

Este ano, em meio às tentativas de aceleração da agenda neoliberal, a gestão Bolsonaro tenta condicionar a liberação do auxílio à aprovação da proposta.  

“Consideramos isso inoportuno, inadequado e exagerado. É uma medida de dimensão muito maior. Todos os movimentos, deputados e senadores solicitaram [a Pacheco] que houvesse mais tempo pra se discutir e que houvesse a segregação desses assuntos”, disse o líder da minoria no Senado, Jean Paul (PT-RN), logo depois do encontro.

Em meio às tentativas de aceleração da agenda neoliberal, a gestão Bolsonaro tenta condicionar a liberação do auxílio à aprovação da proposta.

Para o presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão, que também esteve na reunião, o momento exige mobilização popular.

“Nós precisamos manter a pressão pra que isso seja retirado do texto, no mínimo, e pra que essa votação não aconteça amanhã porque também há um clima entre os senadores de que esse debate tem que ter mais tempo”.

“A realidade do Brasil fora do Congresso, que é de 60 milhões de pessoas passando fome, 14 milhões de desempregados, inflação de alimentos, então, a prioridade agora deveria ser o benefício” – Alexandre Conceição

O Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) aproveitou o contexto para destacar a espera dos agricultores familiares pelo auxilio emergencial voltado ao segmento, que foi aprovado no Congresso e vetado por Bolsonaro. Os vetos ainda não foram avaliados pelo Legislativo.

“Levamos pra ele a realidade do Brasil fora do Congresso, que é de 60 milhões de pessoas passando fome, 14 milhões de desempregados, inflação de alimentos, e dissemos que é impreterível ele não levar adiante a votação dessa PEC. A prioridade agora deveria ser o benefício, disse Alexandre Conceição, da direção nacional da entidade.  

Governadores articulam contra a medida

O repúdio à PEC gerou também mobilização de gestores estaduais, que tentam articular suas bases contra a medida. O Fórum dos Governadores do Nordeste, por exemplo, soltou nota nesta quarta condenando a proposta.

Em vídeo divulgado nas redes sociais, a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), conclamou os deputados federais e senadores do estado a rejeitarem o texto.

“Não podemos permitir que isso prospere. Isso significa um retrocesso, um ataque brutal a direitos de cidadania sagrados do povo brasileiro, Fátima Bezerra

“A agenda que o povo cobra dos seus representantes neste momento é vacina, é o auxílio emergencial. Isso não pode se dar às custas de se impor mais um ataque cruel aos direitos do povo”. acrescentou a governadora.

Calendário

O martelo sobre a colocação da medida em votação deve ser batido somente na manhã desta quinta (25), durante reunião entre Pacheco e líderes das bancadas partidárias.

Nos bastidores, os relatos dão conta de possível naufrágio do trecho que traz a desvinculação das receitas.

O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), por exemplo, disse acreditar que os temas acabarão sendo dissociados e convertidos em matérias legislativas distintas.

Ele também projeta um possível adiamento da votação da PEC, que pode ficar para a próxima semana, como vem sendo cogitado. “Não vai votar. Não vai. Está dando confusão aquele negócio”, disse o novo presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa.   

“Não vai votar. Não vai. Está dando confusão aquele negócio”

Vinculação de receitas

Pela legislação vigente no país, os estados e o Distrito Federal canalizam 12% das receitas para a pasta da saúde, enquanto municípios desembolsam 15%.

A União seguia essa mesma referência até 2017, mas de lá pra cá o índice passou a ser corrigido conforme a inflação.

No caso da área de educação, o governo federal também passou a atualizar a marca de acordo com a inflação desde 2017. Já dos estados e municípios é exigido um mínimo de 25% das receitas advindas das arrecadações de impostos.

A determinação de um percentual mínimo para a educação vigora no país desde 1930 e deixou de existir apenas durante governos autoritários. No caso, entre 1937 e 1946, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas, e sob o regime militar (1964 – 1985).

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Setores sociais e políticos que demandam a volta do auxílio emergencial têm reagido à conduta do governo Bolsonaro de condicionar o benefício à aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 186, a chamada “PEC Emergencial”, que deve ir à votação no Senado na próxima quinta-feira (25).

Para líder da minoria no Senado, Bolsonaro faz “chantagem nefasta” com política que socorreu mais de 60 milhões em 2020

“Eles estão construindo um discurso de verdade única de que só é possível que haja auxilio se houver aprovação dessa PEC, e ela traz uma série de problemas. Estão tentando via este momento de desespero dos brasileiros, desses mais de 60 milhões que perderam o auxílio e estão aí entregues à fome e à pobreza”, afirma Elisa de Araújo, da ONG Conectas Direitos Humanos, uma das entidades da campanha “Renda Básica que Queremos”.

PEC dos ajustes fiscais

De autoria da equipe econômica de Bolsonaro, liderada pelo ministro Paulo Guedes, a PEC se destina à criação de mecanismos de ajuste fiscal para todos os entes federados. O texto foi protocolado no Congresso Nacional em novembro de 2019, mas ficou parado no Senado por conta das antipatias políticas que circundam a proposta.

O argumento do governo é de que a volta do benefício precisaria vir acompanhada de cortes de outras despesas para evitar rombo no fluxo de caixa do Estado.

Entre outras coisas, a medida acaba com as vinculações mínimas de verbas para as áreas de saúde e educação e veta reajustes salariais de servidores públicos em todas as esferas de poder. O argumento do governo é de que a volta do benefício precisaria vir acompanhada de cortes de outras despesas para evitar rombo no fluxo de caixa do Estado.

Quatro parcelas de R$ 250

Entre idas e vindas e após uma pressão multilateral pelo auxílio, a gestão está propondo agora a criação de um benefício de quatro parcelas de R$ 250, tendo como alvo um público de cerca de 40 milhões de pessoas.

Além de o valor estar abaixo da metade do auxílio de R$ 600 aprovado pelo Congresso na primeira metade de 2020, o contingente de brasileiros a serem beneficiados cai em cerca de 25 milhões de pessoas.  

“Ele, por um lado, viabiliza o pagamento de um auxílio bem menor e, em troca, coloca uma série de medidas de austeridade que reforçarão esse regime fiscal, esse emaranhado de regras que ou vão significar corte de gastos  em meio a uma crise, que é o que estamos vivendo agora, ou  vão determinar cortes de gastos estruturalmente, independentemente da situação do país”, afirma o economista e assessor técnico do Senado Bruno Moretti, ao comentar o raio de alcance da PEC 186.

Costuras

Diante da rejeição de parlamentares à aprovação da medida, Guedes e aliados viram o coro pelo auxílio emergencial como uma janela de oportunidade para tentar alavancar as negociações políticas que podem levar à aprovação da proposta de emenda. Paralelamente, o auxílio emergencial é um tema em que o governo vem demonstrando resistência desde o início da pandemia.

O contingente de brasileiros a serem beneficiados cai em cerca de 25 milhões de pessoas.

No primeiro semestre de 2020, quando os debates sobre a necessidade de uma renda mínima emergencial começaram a pipocar no Legislativo, a gestão Bolsonaro foi duramente pressionada e reagiu apresentando uma proposta de apenas R$ 200 de socorro aos trabalhadores.

Mas, diante do agravamento da crise social e do desastre econômico nacional, o valor não convenceu a oposição, que puxou o debate sobre o assunto. Com o fechamento de mais de 700 mil empresas no país nos primeiros meses de pandemia e a pressão das bases estaduais sobre os diferentes parlamentares, a pauta atraiu apoio de nomes da direita liberal.   

O governo terminou emparedado, com a aprovação pelo Congresso Nacional de um benefício de R$ 600, depois reduzido para R$ 300, sob intensas críticas. A política se encerrou em dezembro e agora está no centro de uma das principais quedas de braço entre governo e oposição, que questiona a conduta da gestão Bolsonaro em relação ao tema.  

“O que a base do governo está fazendo é uma chantagem nefasta. A PEC deveria apenas viabilizar a prorrogação do estado de calamidade, do auxílio emergencial e de outras despesas como do SUS, mas virou um pacote de maldades que não podemos tolerar”, disse, na segunda (22), o líder da minoria no Senado, Jean Paul Prates (PT-RN).

Economia

Para além das articulações políticas em torno da PEC, o coro coletivo pela prorrogação do auxílio é atravessado pelo debate sobre a necessidade de se oxigenar a economia do país, que segue em crise sob a agenda econômica neoliberal de Guedes e Bolsonaro. 

O contexto tem como destaque o contingente de desempregados. O montante atingiu a marca de 14,1 milhões de pessoas no terceiro trimestre de 2020, segundo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

 “O que estamos vivendo é um estado de calamidade, um estado de exceção. Há muita gente na miséria, sem emprego a prioridade deveria ser o auxílio emergencial. Isso é uma obrigação humanitária, uma obrigação do Estado de garantir a vida dos cidadãos neste momento. Sem auxílio, a gente mergulha ainda mais na crise”, endossa Elisa de Araújo. 

Edição: João Baptista Pimentel Neto


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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