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Para além de O Capital: quando o comunista Karl Marx se aventurou como poeta

Em 10 de novembro de 1837, Marx, para alívio de seu refinado pai, Heinrich, comunicou-lhe que seu sonho de ser poeta chegara ao fim
Carlos Russo Jr
Diálogos do Sul Global
Florianópolis (SC)

Tradução:

* Atualizado em 05/05/2022 às 13h37.

“Filho, eu lhe sugeriria gentilmente que escrevesse alguns versos para o barão Ludwig von Westphalen. Ele anda muito triste com a nomeação do conservador Loers, na função de codiretor do Ginásio, que há tanto tempo ele dirigia só. ”

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Este é o trecho de carta escrita pelo brilhante advogado, o iluminista Heinrich Marx e dirigida a seu filho Karl, estudante da Universidade de Bonn, em princípios de 1936. 

Desde que deixara Trier, sua cidade natal, Karl se tornara membro de um ciclo de poetas na cidade onde fora estudar Direito.

Já o pai Heinrich exultava com o fato de que Karl jurara submeter-lhe, antes que a qualquer outra pessoa, seus poemas para revisão. “Eu ficaria muito triste de vê-lo surgir como um poetastro qualquer”.

Em 10 de novembro de 1837, Marx, para alívio de seu refinado pai, Heinrich, comunicou-lhe que seu sonho de ser poeta chegara ao fim

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Desde que deixara Trier, sua cidade natal, Karl se tornara membro de um ciclo de poetas na cidade onde fora estudar Direito

Por outro lado, o jovem Marx era muito próximo da família aristocrática do também iluminista Westphalen. Aliás, o barão, pai de Jenny, futura esposa de Marx, foi quem “inspirou em Marx seu primeiro amor pela escola romântica” (Eleanor Marx). O barão era capaz de recitar hinos homéricos e sabia de cor a maioria das tragédias shakespearianas em inglês e alemão.

A paixão de Karl por Jenny, aliás a mais bela das moças de Trier e sua amiga de infância, inflamara suas ambições poéticas. “Um novo mundo nasceu para mim, o do amor, que na verdade era no começo um desejo apaixonado e impossível. ” (Carta de Karl Marx ao pai).

Na sequência ele escreveu três volumes de poesia dedicados a Jenny: dois “Livros do Amor” e “Livro de Canções”. Neles se revela uma forte influência do jovem Schiller e das baladas de Goethe. De toda forma, todos se inserem no momento literário do romantismo, embora totalmente distantes da realidade social e política vivida.

“Em amplas vestes resplandecentes bravamente envolto,

Com iluminado coração alçado pelo orgulho,

Restrições e vínculos imperiosamente rejeitados,

Com passo firme, grandes espaços atravesso,

Em tua presença eu despedaço a dor,

Em direção à árvore da vida os meus sonhos irradiam”.

No poema “O Orgulho Humano”:

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“Jenny, ousarei confessar

Que no amor permutamos nossas almas

Que como uma só palpitam e resplandecem,

E que através de suas ondas uma corrente desliza…

Como em direção a Deus eu ouso

Através desse reino em ruínas correr em triunfo. 

Toda palavra é Ação e Fogo,

Em meu peito como o do próprio Criador.”

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Sophie, a irmã de Karl Marx, disse que Jenny “derramou lágrimas de prazer e dor ao ler seus poemas”. 

Escreveu também um poema satírico com vestimenta epopeica: “Oulanem”. Sua ênfase centra-se numa “ação heroica, para audaciosamente progredir em conhecimento e apoderar-se da música e da arte, dentro do mundo da cultura” (Carta ao pai):

“ Jamais consigo buscar com calma 

O que empolga a alma poderosamente,

Jamais consigo ficar confortavelmente sossegado:

Incessante e tempestivamente, vou em frente”.

Neste mesmo “Oulanem”, um idoso Fausto adiante pragueja:

“Este Universo entrando em colapso,

Logo devo agarrar a eternidade e berrar

A gigantesca maldição da Humanidade em seus ouvidos.

Eternidade! É dor eterna,

Morte inconcebível, imensurável!

Um maldoso artífice resolveu zombar de nós,

Que somos apenas mecanismo de relojoaria, máquinas cegas a quem se dá corda

Para serem os bobos do calendário do Tempo! ”

Em carta de 10 de novembro de 1837, Marx, para alívio de seu refinado pai, Heinrich, comunicou-lhe que seu sonho de ser poeta chegara ao fim. Pudera, todos seus poemas haviam sido rejeitados pelos editores de Berlim.

Mas a intensa paixão de Marx pela poesia nunca perdeu força! Em 1839, em lugar do fruto de seu próprio esforço literário, enviou a Jenny uma coletânea de poemas do folclore franco-prussiano.

Já em Berlim, muito diferentes seriam suas ânsias de conhecer os homens e o mundo, suas políticas, suas filosofias. 

Escreveu Karl Marx: “O que havia de mais sagrado em mim foi destroçado, e novos deuses tiveram que ser instalados”.

Ref. Bibliográficas:
1. Jones G.S.. Karl Marx, Grandeza e Ilusão. Comp. das Letras.
2. Mehring, F.J. Karl Marx: The Story of his life. Jonh Lane Ed.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Carlos Russo Jr Carlos Russo Jr., coordenador e editor do Espaço Literário Marcel Proust, é ensaísta e escritor. Pertence à geração de 1968, quando cursou pela primeira vez a Universidade de São Paulo. Mestre em Humanidades, com Monografia sobre “Helenismo e Religiosidade Grega”, foi discípulo de Jean-Pierre Vernant.

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