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Parlamento catalão aprova resolução para “reparar” a memória das “bruxas” queimadas na Idade Média

Na Catalunha, da mesma forma que no resto das regiões do reino da Espanha, houve centenas de assassinatos desse tipo
Armando G. Tejeda
La Jornada
Madri

Tradução:

Entre os séculos XV e XVII, em plena Idade Média, na Europa era uma prática habitual queimar pessoas acusadas de bruxaria, macumba e qualquer atividade definida como heresia ou blasfêmia. Muitas vezes eram levadas a fogueiras em praças públicas, para que o povo, muitas vezes sedento de vingança e castigo, testemunhasse. 

Na Catalunha, da mesma forma que no resto das regiões do reino da Espanha, houve centenas de assassinatos desse tipo; calcula-se que uns 800, por isso agora o Parlamento catalão aprovou uma resolução para “reparar” a memória dessas “bruxas”, das quais geralmente não se conhecem nem seus nomes, nem suas origens. Em um debate atípico no Parlamento catalão, que nos últimos anos se dedica quase exclusivamente a questões relativas ao processo de secessão do Estado espanhol, falou-se de bruxas, de fogueiras, de macumba e de perseguição. Os grupos parlamentares que defenderam a resolução responsabilizaram disso a “misoginia”, o “patriarcado”, o “capitalismo” e a moral imperante, marcada pelos dogmas da Igreja católica. 

Na Catalunha, da mesma forma que no resto das regiões do reino da Espanha, houve centenas de assassinatos desse tipo

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Diziam que as bruxas faziam feitiços e transformavam pessoas em animais

A resolução foi apresentada pelas nacionalistas Esquerra Republicana de Catalunya (ERC), Junts per Catalunya (JxCat) e Candidatura de Unitat Popular (CUP) e contou com os votos a favor de En Comú Podem (a marca eleitoral de Unidas Podemos na região) e do Partido Socialista da Catalunha (PSC).

Na resolução foram apresentados textos históricos, que se remontam quando foi aprovada a chamada “lei contra o crime de bruxaria”, que data de 1424, já que partir de então se iniciou a queima em fogueiras públicas, sobretudo de mulheres de procedência diferente, como ciganas ou migrantes, que cultivavam outros costumes e credos. Qualquer conduta fora da “normalidade” as podia condenar à morte. 

Segundo essas pesquisas históricas, a comarca catalã de Pallars Sobirá, na província de Lleida, foi um dos lugares da Europa com mais execuções por esses supostos delitos de “bruxaria”. O texto de “reparação da memória histórica” adverte que essas mulheres “foram assassinadas como vítimas de uma perseguição misógina” e “com a visão que temos hoje, falaríamos de feminicídio e perseguição política à dissidência”. Inclusive dizem que a execução foi um escarmento feito pelo “sistema capitalista”. 

A resolução agrega que as mulheres que foram “processadas, torturadas e executadas pela suposta bruxaria, eram migrantes, pobres, curadoras, com saberes sobre a sexualidade e a reprodução, ciganas, viúvas e as que eram consideradas conflitivas. Todas elas estigmatizadas e denunciadas por seus próprios vizinhos como bruxas e envenenadoras”. 

Na resolução se insta aos ajuntamentos da região a incorporar à nomenclatura de suas ruas, alguns dos nomes que se conhecem das mulheres queimadas na fogueira, como outro sinal de “reparação” de sua memória. 

Apesar do PSC ter respaldado a medida, questionou que seja utilizado o pleno do Parlamento catalão para essa questões e não para debater e tentar resolver “os grandes problemas que afetam atualmente à cidadania, questões reais e atuais”. 

Em termos similares se expressaram os outros grupos da oposição, ao que responderam às formações que apresentaram a moção que “a caçada às bruxas foi a repressão contra a dissidência, a misoginia e o machismo em um momento em que o nascimento do capitalismo se quer construir a modelo da mulher submissa”.

A deputada da CUP, Basha Cangue, foi além e considerou que se deve falar “delas como uma resistência ao capitalismo, em sua imposição de separar o ser humano da natureza, da terra”. 

*Tradução Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Armando G. Tejeda Mestre em Jornalismo pela Jornalismo na Universidade Autónoma de Madrid, foi colaborador do jornal El País, na seção Economia e Sociedade. Atualmente é correspondente do La Jornada na Espanha e membro do conselho editorial da revista Babab.

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