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Peru: Esquerda pode vencer com movimento popular liderado por Verónika Mendoza

A simples ideia de mudança já ganhou um lugar na consciência de milhões de peruanos, e aparece como uma exigência na circunstância em que o país vive
Gustavo Espinoza M.
Diálogos do Sul Global
Lima

Tradução:

É uma expressão curiosa, muito usada por Miguel de Unamuno em seu “Agonia do cristianismo”. Pode ser entendida como o convencimento de quem simplesmente crê, sem incubar dúvidas nem contrariedades; sem exigir provas concludentes, nem se submeter a questionamentos vácuos.

Em outras palavras, a fé daquele que não cria problemas com desconfianças rebuscadas e age em função de seu instintivo apego à verdade.

Desse ponto de vista, é que eu creio nas possibilidade reais da esquerda no marco das eleições de abril na qual o movimento popular será capaz de abrir um novo cenário semeando condições para uma mudança radical na vida dos peruanos.

A simples ideia de mudança já ganhou um lugar na consciência de milhões de peruanos, e aparece como uma exigência peremptória em uma circunstância como esta, quando a crise chega ao fundo e cada um vai escolhendo suas cartas para o jogo eleitoral que se aproxima. 

A ultradireita vai além de suas propostas originais. Virtualmente abandonou velhos costumes e deixou de lado a mensagem austera e conservadora de sempre, para assumir um estridente grito reacionário. Hoje vocifera exigindo respeito aos seus privilégios mal ganhos e exige que tudo continue igual. 

Por isso perde sua característica e assume um discurso assustador, difamando a quem discrepe de suas propostas fundamentalistas. Com armas na mão, faz ajoelhar a mulher que pede a eutanásia e os jovens que reclamam um posto de trabalho e uma renda elementarmente segura. As palavras da candidata de López Aliaga à vice-presidência dizem tudo.

As propostas populares – legítimas para qualquer ser humano – aparecem como intoleráveis quando os peruanos questionam o “modelo” vigente porque o Estado atual não tem capacidade de assegurar atendimentos elementares em benefício das grandes maiorias. 

Com voracidade insaciável, depois de haver amealhado sua fortuna especulando com o preço dos remédios, com o valor dos botijões de gás, com o manejo das clínicas privadas e da administração de universidades e institutos sem pagar impostos, hoje exige que lhes permitam comercializar a vacina anti Covid. 

Como ela não pode ser adquirida no mercado internacional a não ser pelos Estados, reclama então do governo que a proporcione para usá-la aqui como eles quiserem. E se valem da “grande imprensa” onde seus áulicos repetem como papagaios o roteiro que lhes é ditado. 

Se somarmos as propostas primitivas de López Aliaga, os manejos mafiosos de Keiko, as ideias do século XIX de Hernando de Soto e a ignorância galopante de  César Acuña, teremos a síntese de uma mensagem orientada a restaurar no Peru o regime neonazista de Alberto Fujimori. 

Por isso é bom que hoje se recorde que os governantes desse período que foi chamado de “década dantesca” da política peruana não só roubaram seis bilhões de dólares rematando empresas, pactuando acordos leoninos e assumindo compromissos pelas costas dos peruanos. 

A simples ideia de mudança já ganhou um lugar na consciência de milhões de peruanos, e aparece como uma exigência na circunstância em que o país vive

Andina
Mais de 3 mil candidatos já foram inscritos para as eleições gerais peruanas marcadas para 11 de abril.

Desenvolveram, além disso, uma verdadeira guerra de extermínio sob o pretexto de enfrentar “a ameaça senderista”, artificialmente montada e administrada segundo os interesses dos serviços secretos do Peru e do exterior. 

Como pode finalmente se estabelecer, 75% das vítimas da repressão, nessa época, integravam populações originárias, falavam quéchua e viviam em zonas rurais. Barrios Altos e La Cantuta ganharam o concurso de crimes horrendos. 

Mas foi o mundo agrário que se tingiu de sangue como consequência de uma política aleivosa que não teve mais propósito que cavar uma vala infranqueável entre a Força Armada e a população, a fim de destruir o binômio histórico de 1968: a unidade do Povo e da Força Armada como garantia de vitória.   

Naqueles anos – não há que se esquecer – se oficializaram as execuções extrajudiciais, o desaparecimento forçado de pessoas, as privações ilegais da liberdade, a tortura institucionalizada e a habilitação de centros clandestinos de reclusão. O Quartel Los Cabitos, a “Casa Rosada” ou as instalações do SIN com seus fornos crematórios funcionando, não foram uma lenda, mas sim uma lacerante realidade. 

Foram estabelecidos juízes sem rosto, processos secretos, julgamentos sumários e sentenças iníquas. Centenas, e mesmo milhares de pessoas sofreram em carne viva os efeitos de uma política “de pacificação” orientada a implantar a paz dos cemitérios. 

Milhares de pessoas foram condenadas a prisão perpétua ou a longos anos de cárcere por simples delações ou acusações sem sustentação. 

Só em 1996 foram detidas 650 mil pessoas, 90% das quais foram torturadas. Em 2001, a Comissão da Verdade fixou em 15 mil o número de pessoas desaparecidas nesse período. E esse registro ainda permanece aberto. 

São essas as razões pelas quais cabe recusar o retorno às práticas sinistras, abrir a passagem à mudança que oferece ao país a única força capaz de consegui-la: a encarnada hoje por Verónica Mendoza.

Há que agir agora sem meias tintas nem preconceitos, sem mesquinharias nem subterfúgios. Esta é uma hora decisiva. Aqui se impõe a fé do carvoeiro.

*Colaborador de Diálogos do Sul de Lima, Peru.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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