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Petroleira dos EUA cria tensão no Saara Ocidental

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Bryant Harris*

Organizações como a Western Sahara Resource Watch questionam a legalidade de empresas estrangeiras como a Kosmos trabalhem com o governo marroquino para explorar os recursos do Saara Ocidental. Foto: Karlos Zurutuza/IPS Organizações como a Western Sahara Resource Watch questionam a legalidade de empresas estrangeiras como a Kosmos trabalhem com o governo marroquino para explorar os recursos do Saara Ocidental. Foto: Karlos Zurutuza/IPS
Organizações como a Western Sahara Resource Watch questionam a legalidade de empresas estrangeiras como a Kosmos trabalhem com o governo marroquino para explorar os recursos do Saara Ocidental. Foto: Karlos Zurutuza/IPS
Organizações como a Western Sahara Resource Watch questionam a legalidade de empresas estrangeiras como a Kosmos trabalhem com o governo marroquino para explorar os recursos do Saara Ocidental. Foto: Karlos Zurutuza/IPS

Enquanto empresários dos Estados Unidos e do Marrocos procuram fortalecer os vínculos bilaterais, organizações da sociedade civil expõem sua preocupação pelos planos de uma firma energética norte-americana de buscar petróleo no disputado território de Saara Ocidental.

Representantes do governo e do setor privado dos dois países se reuniram na segunda Conferência de Desenvolvimento Empresarial Estados Unidos-Marrocos, em Rabat.

O governo marroquino espera capitalizar o acordo de livre comércio assinado em 2006 com Washington, apresentando-o como uma porta de entrada aos mercados da Europa, África e Oriente Médio, e incentivar investimentos norte-americanos.

“No Marrocos estão ocorrendo muitas coisas, e a grande pergunta é como realçar aquilo que pode atrair investimentos norte-americanos e que depois possa se dirigir a um mercado europeu ou ao sul, aos mercados africanos”, disse à IPS Jean Abi Nader, diretor-executivo do Centro Marroquino-Norte-Americano de Comércio e Investimentos, criado pelo rei Mohammad VI.

Em sua política energética, o Marrocos dá ênfase especial à exploração de petróleo e gás. Empresas participantes da conferência, como a Dow Chemical, tiveram a oportunidade de assistir apresentações sobre o setor energético do país, destacando o potencial do reino em matéria de investimento, tanto em fontes renováveis como nas baseadas no carvão.

Embora os investimentos internacionais em energias renováveis favoreçam há tempos o Marrocos, habilitando a construção de usinas solares e parques eólicos, corporações norte-americanas e europeias também procuram concessões para explorações de petróleo, algumas delas no Saara Ocidental. Esse território está ocupado quase em sua totalidade pelo Marrocos, mas a soberania marroquina sobre ele não é reconhecida pela comunidade internacional.

Uma das firmas interessadas é a Kosmos Energy, com sede no Texas, que já iniciou explorações marítimas de hidrocarbonos em três blocos da bacia de Agadir. O projeto mais polêmico é a exploração petroleira que a Kosmos pretende iniciar em outubro em Cabo Bojador, na costa norte do Saara Ocidental.

Rabat “não está disposta a permitir ao povo saarauí o direito à autodeterminação, e a indústria do petróleo está se tornando um obstáculo para pressionar o Marrocos a aceitar esse direito”
Rabat “não está disposta a permitir ao povo saarauí o direito à autodeterminação, e a indústria do petróleo está se tornando um obstáculo para pressionar o Marrocos a aceitar esse direito”

Organizações com a Western Sahara Resource Watch (WSRW) questionam a legalidade dos negócios de empresas estrangeiras com o governo marroquino para explorar recursos do Saara Ocidental. Rabat “não está disposta a permitir ao povo saarauí o direito à autodeterminação, e a indústria do petróleo está se tornando um obstáculo para pressionar o Marrocos a aceitar esse direito”, afirmou à IPS o presidente da WSRW, Erik Hagen.

“Os saarauí estão parados à margem desse projeto, movendo os braços e dizendo às empresas que deixam de fazer isto em nome do governo marroquino. Essas empresas trabalham com um governo ocupante”, destacou Hagen. O Marrocos tomou o controle do território, ao qual chama de Províncias do Sul, após um polêmico acordo, de 1976, com a Espanha, até então a potência colonial.

Entretanto, contra a ocupação marroquina a Frente Polisário pegou em armas, apoiada pela Argélia, e declarou a independência da República Árabe Saarauí Democrática. Após anos de conflito armado, a comunidade internacional estabeleceu a Missão das Nações Unidas para o Referendo em Saara Ocidental (Minurso), em 1991.

A Minurso recebeu o mandato de velar por um cessar-fogo e organizar para 1992 um referendo sobre o futuro do território, mas a votação nunca aconteceu por desacordos sobre quem poderia votar. A Frente Polisário não queria que colonos marroquinos no Saara Ocidental participassem da consulta. Até agora, nenhum outro Estado reconhece a soberania marroquina sobre o Saara Ocidental, que está na Lista de Territórios Não Autogovernados da Organização das Nações Unidas (ONU).

Em 2002, o Marrocos concedeu contratos de exploração de petróleo no território a uma empresa com sede nos Estados Unidos, a Kerr McGee, e à francesa Total S.A. Em resposta, a ONU emitiu o que se conhece como Opinião Corell, relativa à legalidade da extração de recursos no Saara Ocidental. Seu autor é o ex-subsecretário geral de Assuntos Jurídicos da ONU, Hans Corell.

Desde então, tanto firmas energéticas multinacionais como organizações que apoiam os interesses do Saara Ocidental interpretam de maneira diversa a postura da ONU. A Opinião Corell reconhece o Marrocos como a potência administrativa de fato no Saara Ocidental.

Mas, também estabelece que, “apesar de os contratos específicos não serem ilegais em si mesmos, se houver maiores atividades de prospecção e exploração sem respeitar os interesses e desejos do povo do Saara Ocidental, estariam violando os princípios do direito internacional aplicáveis a atividades de recursos minerais em Territórios Não Autogovernados”.

Abi Nader acredita que as atividades extrativistas do Marrocos estão gerando benefícios econômicos para a população local saarauí, como estipula a Opinião Corell. A OCP, a empresa estatal de fosfatos do Marrocos, “faz um trabalho realmente extenuante”, afirmou.

Segundo Nader, “deram participação à consultoria norte-americana PricewaterhouseCoopers e fizeram um estudo de dois anos sobre quem estava ficando com os lucros da mina Bou Craa no Saara Ocidental. É muito claro que não está contribuindo realmente com seu objetivo primordial, mas está gerando empregos. Está criando valor agregado à população da comunidade”.

Também citando a Opinião Corell, a Kosmos Energy afirma que, como o Marrocos garante distribuir de modo equitativo e justo os recursos entre a população saarauí, a exploração e potencial extração petroleira no território atenderá os padrões legais da comunidade internacional.

Em uma declaração, a Kosmos cita um informe de 2013 do Conselho Econômico, Social e Ambiental do rei Mohammad VI, segundo o qual “o objetivo do Conselho é contribuir com o esforço coletivo necessário para cumprir o desafio de obter a coesão social, a prosperidade e o benefício equitativo a partir dos recursos” do Saara Ocidental.

Porém, Hagen disse duvidar das intenções do governo marroquino de compartilhar adequadamente a riqueza com os saarauís. Além disso, eles não querem que o governo do Marrocos e as empresas multinacionais explorem seus recursos, o que torna ilegais as atividades da Kosmos no contexto da Opinião Corell, ressaltou. Hagen também expressou sua preocupação pelos frequentes abusos dos direitos humanos, tanto no Saara Ocidental como no próprio Marrocos.

“O informe de 2013 do relator especial da ONU sobre a tortura é muito ilustrativo de como as pessoas sofrem abusos ou tortura enquanto estão sob custódia policial, e isso é frequente”, pontuou Hagen. “Cada semana ouvimos reportagens sobre pessoas saarauí que foram presas pela polícia durante alguns dias ou algumas horas e depois foram soltos”, acrescentou.

A WSRW não pede apenas que a Kosmos abandone seus planos de realizar explorações no Saara Ocidental, como também pressiona uma firma perfuradora com sede nos Estados Unidos, a Atwood Oceanics, para que não forneça à Kosmos a plataforma que esta encomendou para usar em Cabo Bojador. Nem a Kosmos nem a Atwood responderam às consultas da IPS até o fechamento deste artigo.

*IPS de Washington para Diálogos do Sul


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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