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ToggleUma tempestade de bombas de gás lacrimogêneo desabou no centro de La Paz, nesta quinta-feira, sobre os mais de 500 mil manifestantes que foram dar o seu último adeus aos mártires de Senkata, moradores que protegiam o terminal de combustíveis localizado em El Alto, cidade vizinha à capital, e que foi tomado pelo governo golpista.
Aos cantos de “Que renuncie, carajo” e “El Alto de pé, nunca de joelhos”, a multidão percorreu cerca de 20 quilômetros cobrando a imediata saída da autoproclamada presidenta Jeanine Áñez e justiça para as mais de 30 mortes provocadas pela ditadura “made in USA” desde a derrubada do presidente Evo Morales.
Tendo à frente mulheres vestindo negro e familiares das vítimas, com a Whipala (bandeira que simboliza a integração nacional indígena) tremulando, a peregrinação somou moradores dos 14 distritos de El Alto, da Federação das Juntas de Vizinhos da cidade e camponeses das 20 províncias do país, fechando o cerco sobre a impunidade.
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“A polícia dispersava com motos, o Exército tinha tanques, e tudo virou uma batalha campal em que só um dos lados massacrava”
CAIXÕES CONTRA ESCUDOS
“Então, quando estávamos chegando à Praça Murilo, onde está o Palácio de Governo, fomos barrados por policiais e militares a mando da senhora Jeanine Áñez. Os caixões se chocaram contra escudos, um completo disparate. E começou a chover bombas para impedir que mais de mais de meio milhão de pessoas desse seu último adeus aos companheiros, algo mais do que inacreditável, completamente desumano”, declarou Joaquim Rojas, atualmente na clandestinidade, por telefone ao HP.
Os informes realizados pelo Instituto de Investigações Forenses indicam que todos os oito corpos – encontrados até agora próximos à unidade da Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) – “todos, sem exceção, apresentavam lesões e traumas provocadas por projétil de arma de fogo”. “Mas mais do que suspeitas ou indícios, há denúncias que vários corpos continuam escondidos pelos órgãos de repressão, como infelizmente passou a ser sua prática nesta ditadura. O resultado foi uma manifestação ainda maior, inclusive de pessoas que não estavam ao lado de Evo, mas que não concordam com tamanha atrocidade”, acrescentou Rojas.
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A Comissão Interamericana de Direitos Humanos repudiou o uso desmedido de violência pelo governo ditatorial e a responsável pela Defensoria do Povo, Nadia Cruz Tarifa, conclamou a mobilização para que os crimes não fiquem impunes e se faça justiça.
“Para que os crimes não fossem registrados”, denunciou Rojas, “a polícia dispersava com motos, o Exército tinha tanques, e tudo virou uma batalha campal em que só um dos lados massacrava”. “O racismo e a covardia das forças da repressão”, assinalou, eram mais do que evidentes, “quando diziam pessoalmente para as mulheres de pollera [saia indígena] irem molestar em El Alto”.
EVO RECHAÇA A DITADURA
De forma enfática o presidente Evo Morales, exilado no México, condenou a ditadura de Jeanine Áñez quando “emite um decreto supremo dando carta branca para que os militares metam bala no povo boliviano”.
“Quero fazer um chamado às Forças Armadas: não sigam se manchando com sangue, especialmente do movimento camponês indígena originário!”, disse Evo, frisando que “os delitos de lesa-humanidade se castigam, ainda que comandantes já vão escapando porque sabem que cometeram delitos”. O ex-comandante, em questão, é o general Williams Kaliman, que após “propor” a renúncia do presidente, se aposentou e foi morar nos Estados Unidos.
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Desesperada para manter estes e outros crimes e traições desconhecidos do grande público, a ditadura boliviana anunciou que tiraria do ar o sinal de transmissão da TeleSul, canal que tem feito um importante contraponto aos seus desmandos.
A divulgação foi feita pela própria Entel SA, estatal de telecomunicações da Bolívia, segundo a qual o atropelo se justificaria por estar havendo uma “reorganização de rede de televisão”.
A presidenta da TeleSul, Patricia Villegas Marin, destacou que a decisão não é o primeiro ato de censura por parte de Áñez e seus “ministros”. “Antes disseram que tinham problemas técnicos. É evidente, a censura não aceita eufemismos. Seguiremos informando, ratificamos nosso compromisso”, concluiu.
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