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Política do horror na Colômbia: 46 líderes assassinados

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

A política do horror já contabiliza 46 seres humanos, homens e mulheres, assassinados nos 150 dias de 2017, por sua provada dedicação à defesa dos direitos humanos e por serem líderes sociais de profundas e reconhecidas convicções éticas.

Manuel Humberto Restrepo Domínguez*
ColombiaAsesinatosO dado de per se impacta e deveria provocar o repúdio unânime dos partidos, universidades, meios de comunicação, igrejas e promover uma reflexão pelo real sentido do valor da vida num país em vésperas de acabar com a guerra.
A paz avança lenta por caminhos inóspitos mas poderá ser estável e prolongada se os componentes do estado decidirem impulsionar uma cultura de direitos que preserve a vida de seus líderes e reafirmarem a implementação efetiva e material dos acordos entre Estado e insurgência, eliminando as barreiras que os beneficiários da tragédia impulsionam tratando de invalidar o espírito de paz, pressionar para uma renegociação jurídica e moral do já acordado e impedir que os setores populares tenham existência política.
Por trás dos 46 líderes assassinados há mais que uma estratégia de eliminação de dirigentes sociais e defensores de direitos. Não é só um desafio teórico, mas está a prática a indicar que há uma política de morte (embora não tenha os requisitos formais) em execução.
Visão, estrutura, metas, responsáveis, recursos, tempos, modos de ação, atores e territórios em que se executa o programa de guerra suja orientado pelos “defensores” dos privilégios garantidos pelo capital e o poder.
Não há fatos isolados, há conexão orgânica entre a política do horror, capital e poder político e persiste uma tendência de resultados com dados como este, que “nos últimos 14 meses houve 120 homicídios de defensores de direitos humanos e líderes sociais, além de 33 atentados e 27 agressões a esse mesmo grupo humano (defensoria, errando março 3,2017); “Entre 2002 e 2016 houve 558 líderes sociais assassinados (verdadabierta.com). Fica claro haver um continuum de barbárie que leva a advertir um genocídio em marcha um plano de extermínio sistematicamente executado contra pessoas indefesas que integram uma comunidade política chamada sociedade civil”.
Os 46 líderes e defensores foram assassinados em lugares precisos de uma geopolítica de riqueza estratégica e num momento político concreto em que se constrói a paz nos territórios e a verdade contada por outras vozes revela as reais intenções e os responsáveis pelo horror.
A tragédia é mais grave do que nos acostumamos a ver em outras latitudes porque ocorre num contexto de paz o assassinato de um líder é ainda mais condenável que em época de guerra. É um agravo à humanidade sobretudo porque ocorre como parte de uma política que se acreditava superada.
Na guerra a morte de líderes e defensores inocentes foi sempre negada, os algozes  condecorados e os agraciados humilhados; as vítimas acusadas de terroristas e guerrilheiros para justificar a ordem criminosa. Mas em época de paz a vítima, o assassinato,  a sistemática do horror e o móvel político e social de extermínio são visíveis. E há funcionários do Estado leais às elites, que continuam acreditar que perseguir e eliminar líderes e defensores de direitos é normal porque, segundo suas crenças, questionam ou põem em debate a ordem natural das coisas e enfrentam as hierarquias do poder e por isso é o preço de suas desobediências.
Não obstante, é hora de chamar às instituições a abandonar essa mentalidade e superar o código de guerra amigo-inimigo, e entender que o país carrega a vergonha de ser o país no mundo que mais assassinatos de líderes sociais produziu em tempos de guerra e agora está produzindo em tempos de paz. Matar os que defendem o bem comum, o justo e o correto, por reclamar do Estado o respeito, e oferecer garantias aos direitos, constitui crime genocida.
Mesmo não havendo leis nem ordens concretas em promoção do horror, o Estado é o primeiro responsável por esses crimes sistemáticos  que evidenciam a existência de uma política criminosa de extermínio. Os que executam o horror são apenas peças brutas da engrenagem de poder. Não praticam homicídios isolados nem desconexos, há sequência, tendência, intenção e pelas características do modus operandi se percebe que há uma estrutura paramilitar encarregada das execuções, que controla uma máquina de aniquilação, não para combater inimigos, mas para provocar terror, impor medo, selecionar e organizar a matança de humanos indefesos como se matam animais. Assassinaram por degola, há corpos picados à machadadas, esquartejados por motosserras, torturados, mutilados e violados. Nunca enfrentando a um líder social em combate, porque nenhum deles está a combater. São assassinados nas ruas, universidades, nos campos de cultivo, bairros populares, escritórios e sedes sindicais. São crimes de ódio, com motivação política de exterminar por serem líderes de oposição. E essa máquina de horror, praticada por grupo ou clã, tem a conivência ou aquiescência do Estado.
É hora para que o chefe de estado e de governo e sua bancada no congresso convoquem os outros poderes do estado a respeitar os acordos de paz alcançados, que são o substrato político e social do direito humano, a paz conquistada. Desmontem sem demora a política do horror, reconheçam e detenham o genocídio em marcha contra líderes, defensores de direitos e adversários políticos. O governo bem conhece a cartilha criminosa do genocídio. Os 46 assassinatos em 2017 e as centenas neste século, não são simples homicídios produto de ódios individuais, nem de frustrados veteranos de guerra, são uma parte estruturada de um genocídio em marcha contra um tipo de indivíduo que responde a uma lógica de adversários políticos e sociais, assassinados por uma ideologia e práticas de ultra direitas incrustadas no poder, cuja maior vitória tem sido dividir suas vítimas (o povo), coloca-las em contradição e lucrar com elas convertidas em multidão de fiéis eleitores.
Os líderes sociais, homens e mulheres de todas as latitudes, estão numa diáspora nacional de mobilizações sociais provocadas pela negação de direitos, o déficit de democracia, a corrupção e o clientelismo. São Multidões invisibilizadas. Doze dias de greve, milhares de veículos na principal rodovia do porto de Buenaventura, centenas de indígenas acampados nas estradas, camponeses e afros mobilizados, unidos em uma insurreição desarmada. Dez dias de paro cívico em Choco; Dez dias de greve nacional com milhares de professores nas ruas com a paralisação das atividades de 350 mil professores e oito milhões de estudantes. Bloqueios, marchas das centrais operárias, protestos dos servidores de saúde, educação, dos guardas, dos aposentados e desalojados de seus lares. Protestos contra a Corte constitucional por suas decisões adversas à paz. Protestos e comícios universitários contra a privatização e a perda da autonomia… uma guerrilha em assembleia permanente e outra em conversações de paz. Há também oportunistas políticos, gases lacrimogênios, gases de pimenta, tanques de guerra e carros de assaltos, aeronaves de guerra, avião fantasma, polícia de choque e motorizada, infiltrados, força desmesurada, morte, feridos, desaparecidos, detidos e opositores judicializados por seus direitos.
Há um país em revolta mas faltam os meios. Onde estão os meios? Onde suas câmeras que não vêem essas multidões? Onde seus microfones que não escutam o rumor desse povo? Por que os meios não falam  sobre isso nem perguntam pelos causantes do horror?
*Original de Barómetro Latinoamericano


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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