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Os líderes da MUD (Mesa da Unidade Democrática), coalizão de partidos opositores na Venezuela, declararam que não vão concorrer às eleições presidenciais de abril.
Por Franco Vielma, em Missión Verdad
Após uma alteração na Constituição venezuelana realizada pela Assembleia Nacional Constituinte (ANC), foi criada uma exceção no tempo do mandato de presidente e, assim, foi convocada a eleição presidencial, tão solicitada pela Mesa da Unidade Democrática (MUD). Agora, em um fato sem precedentes, eles decidem não participar, superando a eles mesmos como organização que em três oportunidades anteriores se retirou amplamente de eleições, o que ocorreu nas parlamentares de 2005, da Assembleia Nacional Constituinte, em julho de 2017, e nas municipais de dezembro do ano passado.
Mas quais são as razões para que a MUD tome essa decisão? O que declararam no comunicado explicativo de sua decisão? Sobre isso e sobre esta organização que se denomina “política”, mas que participa eventualmente da política, há uns elementos a serem ressaltados:
As garantias eleitorais
Na última quarta-feira (21), a coalizão antichavista fez o anúncio de boicote mediante abstenção às eleições presidenciais. No documento, denominado “um desafio” ao governo do presidente Nicolás Maduro, diz considerar necessário uma mudança de regime “o mais rápido possível”, mas aponta que, para esses efeitos, não existiriam condições eleitorais.
#COMUNICADO: LA UNIDAD DEMOCRÁTICA RETA AL GOBIERNO DE MADURO #21Feb pic.twitter.com/xfRti9mHSV
— Unidad Venezuela (@unidadvenezuela) 21 de fevereiro de 2018
Nesse sentido, faz uma contraproposta, que se assemelha ao apresentado recentemente em República Dominicana no marco dos diálogos entre o governo e a oposição. A saber: condições de garantias eleitorais o que, segundo a oposição, abririam o caminho para que ela participe das eleições.
Basicamente, se apega agora ao inesperado documento que surpreendeu os mediadores e o governo no dia da assinatura do documento consensuado, que havia sido pré-acordado na República Dominicana em 31 de janeiro. Neste documento opositor, aparecia uma série de modificações substanciais, colocando tudo a favor das demandas opositoras e torpedeando com isso qualquer possibilidade de assinatura. Este conjunto de condições tem sido apresentado agora pelos dirigentes antichavistas para participar das eleições.
Ao impor novas prerrogativas e, inclusive, ao reiterar condições já acordadas com o governo, a MUD estabelece um ato de propaganda política, tentando ressarcir o profundo dano causado pela intensa campanha de desconfiança da autoridade eleitoral venezuelana e que se traduz na baixa intenção de voto nos políticos opositores. Além da inexistência de uma liderança sólida que a dê coesão e gere confiança na população.
Para os opositores, a questão das garantias eleitorais, ou ao menos a retomada de uma suposta mudança de regras de jogo é importante para mudar a atual correlação de intenção de voto. Em janeiro deste ano, Eugenio Martínez, analista eleitoral da oposição, apresentou os dados da empresa Datincorp: enquanto 86,6% dos declarados chavistas estavam “totalmente decididos a votar” nas eleições presidenciais, apenas 46% dos denominados opositores diziam estar convencidos a participar.
As condições
A MUD denomina agora as eleições previstas para abril como “prematuras”, no entanto, há algumas semanas, quando o diálogo ficou em “recesso indefinido”, nas palavras do presidente dominicano, Danilo Medina, mediador do processo, a MUD tinha pactuado com o chavismo a realização das eleições de 22 de abril. Isso faz destoar o pronunciamento da MUD sobre a data das eleições como sendo um obstáculo para sua participação. A coalizão declarou, em seu documento de 21 de fevereiro, que apostava por eleições no segundo semestre deste ano.
Outra das demandas que tenta impor agora como condição é a substituição de reitorias no Conselho Nacional Eleitoral (CNE) para torná-lo mais “equilibrado”, embora essa possibilidade já tivesse sido pré-acordada na República Dominicana, mas o documento não foi assinado pela MUD. Isso implica que colocam como uma nova demanda uma mudança na estrutura de campanhas, o que já havia sido aceito pelo governo venezuelano nos diálogos que eles decidiram não respaldar com sua assinatura.
O convite para missões de observação internacional é outro ponto assinalado pela oposição em todos os processos: antes, durante e depois da eleição presidencial. Este ponto já tinha sido pré-acordado com o Governo.
Outro elemento que surge no documento é o voto dos venezuelanos no exterior. Sem esclarecer em que termos se desenvolve esta condição, os líderes antichavistas propõem isso em uma situação em que, efetivamente, os venezuelanos residentes no exterior já podem votar. Podem fazê-lo todos os que estejam em situação regular no país de destino e que tenha mudado o Registro Eleitoral Permanente nas embaixadas e serviços consulares, conforme ao artigo 124 da Lei Orgânica de Processos Eleitorais.
Provavelmente a MUD esteja sugerindo um não reconhecimento da lei para habilitar o voto de muitos de seus seguidores que migraram e não contam com estas condições.
Também coloca como demanda substancial para ir às eleições o acesso igualitário de meios de comunicação públicos e privados aos centros eleitorais, apesar de que se saiba que esta não é uma variável que signifique uma convocação substantiva para motivar o voto. Mas que, por outro lado, tem servido para que no passado tenha proliferado o movimento exagerado em centros eleitorais, questão que serviu para construir continuamente matrizes de “fraude eleitoral” que pesam hoje enormemente na intenção de voto da oposição.
Solicitou a revogação das inabilitações de partidos e líderes políticos. A referência não aponta concretamente a nenhum personagem político em particular. Quanto à inabilitação de partidos, a organização Primeiro Justiça teve recentemente a obrigação de revalidação, diante da autoridade eleitoral venezuelana, e não conseguiu coletar as assinaturas para poder voltar à disputa, após ausências declaradas desse partido na cédula eleitoral.
Finalmente, solicitou uma realização de auditorias técnicas ao processo eleitoral. O que para as autoridades eleitorais venezuelanas, e para a MUD, não é nenhuma novidade, pois conforme o regulamento eleitoral, são 14 os processos de auditorias prévias às eleições, durante as eleições e posteriores a estas. A MUD tem validado todos os processos de auditorias das eleições dos últimos anos, incluindo as de governadores do último dia 15 de outubro.
Qual é o sentido das condições apresentadas pela MUD?
Em termos estritamente eleitorais, só a nomeação de novas reitorias no CNE é significativa, no caso de as novas autoridades decidirem mudar as metodologias de votação e optarem por uma mudança total de sistema. Por exemplo, se ocorrer a troca do sistema automatizado atual (qualificado pelo Conselho de Especialistas Eleitorais da América Latina -CEELA- como um dos mais transparentes do mundo) por um sistema manual. No caso de que, mesmo mudando as autoridades eleitorais os métodos atuais sejam preservados, a mudança de reitorias é, em termos eleitorais, irrelevante.
Apesar da contundente negativa, a MUD parece deixar a porta aberta para participar das eleições desde que todas (ou algumas, quiçá) das condições sejam atendidas.
Então, as condições que o antichavismo busca impor, com uma agenda política midiática e sob severas condições de tutela por instâncias estrangeiras, parecem ser condições para restabelecer sua imagem política. Não estão, em essência, correlacionadas com as condições eleitorais na prática. Se apresentam com uma posição em que, se conseguir todas ou parte de suas demandas, participarão de eleições apresentando a imagem de que conseguiram “torcer o braço” ao chavismo, ainda que o chavismo ceda nas demandas que já estavam acordadas na República Dominicana.
Aqui ganha força a questão da imagem política. Para a MUD, é relevante que em sua arena (meios, pressão estrangeira e porta-vozes políticos) sejam consagradas concessões eleitorais, ao invés da posição “domesticada” que apresentou em República Dominicana. Nestas instâncias, tentam restabelecer um vínculo rompido com seus seguidores, pois grande parte destes consideram que a MUD se submeteu aos desígnios do chavismo — por só fazer o que os políticos devem fazer, que é dialogar.
Definitivamente, com relação à oposição, há situações que podem parecer imprevisíveis, especialmente por se tratar de uma instância pseudo-política que não tem critérios próprios de condução, mas, ao contrário, se encontra dirigida desde instâncias estrangeiras que tentam fabricar um palco de deslegitimação para dar lugar a um maior cerco financeiro e econômico sobre o país.
Tradução: Vanessa Martina Silva