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Por um mundo sem muros

Revista Diálogos do Sul

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A Conferência Mundial dos Povos por um Mundo sem Muros para a Cidadania Universal, com a participação de quatro mil pessoas de 43 países de quatro continentes, na cidade de Tiquipaya, Bolívia, encerrada no dia 21 de junho, aprovou uma declaração que é um chamado à luta por um mundo melhor, só possível com uma nova ordem econômica, livre da hegemonia do lucro financeiro e sem muros separando os povos. Como os meios de comunicação hegemônicos ignoraram o evento, publicamos aqui a íntegra da transcendente declaração.

Conferencia Mundial de Pueblos por un Mundo sin Muros hacia la Ciudadanía Universal“Os movimentos sociais, e cidadãos e cidadãs do mundo, reunidos em Tiquipaya, logo de escutar os testemunhos de migrantes e refugiados, e debater coletivamente a partir de nossa memória história e a pluralidade de nossas identidades, aprovamos a seguintes declaração a fim de deixar claro nossa visão e propostas diante dos Estados e a Comunidade Internacional com relação a denominada crise migratória.
Os povos do mundo estamos conscientes da necessidade de continuar impulsionado com maior força por uma nova ordem mundial cujas características sejam:
O estabelecimento das relações de complementaridade, equidade e solidariedade entre as pessoas e povos; o reconhecimento e universalização do acesso aos serviços básicos como direitos fundamentais, os quais não possam ser objeto de lucro e especulação de grupos privados.
A mais ampla participação cidadã na elaboração e implementação das políticas públicas transcendendo às oligarquias, dinastias monarquias e outras formas de hierarquias políticas.
Uma nova arquitetura financeira internacional, onde não existam organismos multilaterais a serviço do capital transnacional e garanta a propriedade  social dos recursos naturais.
A convivência harmônica com a Mãe Terra e o respeito a seus direitos; assumindo que a natureza pode viver sem os seres humanos, mas os seres humanos não podemos viver à margem dela, violando seus direitos e destruindo o habitat.
A construção da paz verdadeira, que não só é a inexistência de conflitos bélicos, mas também a superação da violência estrutural que se traduz no acesso equitativo à riqueza e as oportunidades de desenvolvimento.
Constatamos como causas principais desta crise os conflitos bélicos e intervenções militares, a mudança climática e as enormes assimetrias econômicas entre os Estados e no interior deles. Tais situações destrutivas têm sua origem na ordem mundial dominante, que em sua voracidade desmedida pelo lucro e apropriação dos bens comuns gera violência, promove desigualdades e destrói a Mãe Terra. A crise migratória é uma das manifestações da crise integral da globalização neoliberal.
A mobilidade humana é um direito inerente à igualdade essencial do ser humano. Não obstante, na maior parte dos casos, não responde a uma decisão voluntária das pessoas mas a situações de necessidade que chegam a extremos de uma migração forçada. A dor do desalojo se somam as situações de injustiça, exclusão, discriminação e exploração que sofrem as pessoas em trânsito e nos países receptores que atentam contra sua dignidade, seus direitos humanos elementares e em não poucas ocasiões, contra sua própria vida.
Os discursos hegemônicos, potencializados pelas corporações mediáticas transnacionais, promovem uma visão negativa dos migrantes, ocultando as contribuições que aportam aos países receptores em temos econômicos, demográficos e socioculturais. Vemos com preocupação o avanço de posições neocoloniais, intolerantes e xenófobas que atentam contra a cooperação entre os povos e constituem uma verdadeira ameaça para a paz mundial. Paradoxalmente, tais posições se sustentam pelos centros de poder global, principais responsáveis da violência estrutural, a iniquidade planetária e a mudança climática, em prejuízo dos credores da dívida social e ambiental: os pobres e os povos pobres.
É por  isso que a partir das bases sociais promovemos o seguinte  decálogo de propostas para derrubar os muros que nos dividem e construir uma Cidadania Universal que consagre o direito de todos e todas a ter e gozar em plenitude os mesmos direitos, para o bem viver da humanidade.

  1. Superar a perspectiva hegemônica de política migratória que prevê uma gestão das migrações de maneira “regular, ordenada e segura”, por uma visão humanista que permita “acolher, proteger, promover e integrar” às pessoas migrantes.
  2. Rechaçar a criminalização da migração que acoberta falsos enfoques de segurança e controle. De maneira particular exigimos a eliminação dos “centros de detenção de migrantes”.
    Exigir a destruição dos muros físicos que separam povos; muros invisíveis legais que perseguem e criminalizam; muros mentais que utilizam o medo, a discriminação e a xenofobia para separar-nos entre irmão. De igual maneira, denunciamos os muros mediáticos que desqualificam ou estigmatizam os migrantes e apostamos por promover a criação de meios alternativos de comunicação.
  3. Criar uma Defensoria Mundial dos Povos pelos Direitos das pessoas migrantes, refugiados, asilados, apátridas, vítimas de tráfico, que promova a livre mobilidade e os direitos humanos.
    Solicitamos ao povo e ao governo da Bolívia, gerir a criação de uma secretaria de coordenação para garantir a realização das resoluções desta declaração da Conferência Mundial dos Povos por um Mundo sem Muros para a Cidadania Universal.
  4. Exigir dos governos a criação e o fortalecimento de Cidadanias Regionais que permitam a mobilidade infra-regional e o pleno exercício de seus direitos, como ponte para uma cidadania universal.
  5. Demandar que os gastos públicos destinados à guerra e a criminalização dos migrantes sejam utilizados para criação de programas de integração, que garantam o exercício pleno dos direitos das pessoas migrantes e suas famílias.
  6. Impulsionar políticas locais que permitam cidades e sociedades integradoras, onde se tornem efetivos na vida cotidiana dos migrantes os direitos a moradia, saúde, educação, seguridade social, sob os princípios de complementaridade, solidariedade, fraternidade e diversidade.
  7. Convocar a todos os governos do mundo à luta conjunto contra as redes criminosas que traficam seres humanos, e declarar o tráfico de gente como delito de lesa humanidade.
  8. Atualizar, fortalecer e avançar no sistema multilateral e seus instrumentos internacionais concernentes a migrantes, refugiados e seus familiares, em especial:
    1. A Convenção Internacional sobre a proteção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e seus familiares, posto que esta não foi ratificada por nenhum dos países do norte receptor de migrantes;
    2. A Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados da ACNUR e incorporar novas concepções com relação aos desalojados e refugiados climáticos;
    3. Participar ativamente nas negociações do Pacto Mundial que se celebrará em 2018 em Nações Unidas;
    4. Proclamar na Assembleia Geral de Nações Unidas o Decênio Internacional para um Mundo sem Muros para a Cidadania Universal;
  9. Superar o enfoque de “fronteiras rígidas” por uma visão que as entenda como pontes de integração para a unidade entre os povos e o acolhimento dos migrantes, onde a luta contra o crime transnacional  organizado seja encarado num marco de cooperação entre os Estado.
    Impulsionar o bem viver nos lugares de origem das pessoas migrantes, para que a mobilidade seja sempre voluntária e não forçada como efeito da pobreza, a violência e a mudança climática, denunciando o impacto da atuação irresponsável das empresas transnacionais e aplicando sanções àquelas que atentam contra a permanência das famílias em seu lugar de origem.
  10. Promover a mobilização popular em escala mundial para que se reconheça nas instâncias infra e internacionais o caráter inalienável dos direitos das pessoas em mobilidade para derrubar os bloqueios, intervenções e muros, que unilateralmente são erguidos pelos poderosos para perpetuar a desigualdade e a injustiça social no mundo.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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