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Amaro Augusto Dornelles*
Pesquisa realizada recentemente pelo Instituto Methodus – e divulgada pelo site da Universidade do Rio dos Sinos, Unisinos – traz à luz um aspecto convenientemente deixado de lado pela grande imprensa nativa. Os dados ajudam a compreender melhor o que pensam os manifestantes sobre a cobertura jornalística dos protestos.
A ironia da história é que ela tem como universo a capital brasileira com o maior índice de concentração midiática do planeta (nem o Grupo Clarim, na AArgentina, chegou tão longe). O mercado é dominado pelo grupo RBS sem concorrência. O fabuloso império do reino da metodista Universal não faz nem cócegas na liderança Sirotsky. Detalhe: o grupo repete a mesma fórmula absolutista para se posicionar hegemonicamente no mercado de Santa Catarina. Há mais de um década a “RBS-SC”é campeã de audiência em rádio, tevê, jornal, revista e o que mais vier.
O instituto apurou que 72,9% dos porto-alegrenses acreditam que a imprensa brasileira é tendenciosa. O levantamento foi realizado na manifestação que ocorreu em 24 de junho, em Porto Alegre. Outro dado revela que 78% dos manifestantes consideram infundadas as informações divulgadas para a compreensão do movimento.
Para o professor dos cursos de Comunicação Social da Unisinos Carlos Alberto Jahn, a imprensa criminalizou os atos sociais nos últimos 30 anos. Ele observa que as empresas jornalísticas passaram a cobrir mais as gestões e as campanhas dos políticos e deixaram de lado outros importantes fatores políticos.
“Não há na mídia jornalistas que compreendam e saibam apurar temas como mobilidade urbana, violência, segurança pública, meio ambiente, reforma política”, avalia. Jahn aponta a pesquisa do perfil do jornalista brasileiro, divulgada em abril deste ano[PCF1] , como uma fonte de hipóteses para compreender esse fenômeno. No entanto, o professor tem dúvidas quanto ao papel do jornalismo em dar a interpretação e gerar pleno entendimento sobre um determinado assunto.
Jahn destaca ainda a recente falta de autocrítica por parte da imprensa. Segundo ele, o jornalismo tem olhado mais para o que os profissionais fazem e para o valor-notícia local do que para os seus leitores. “Se as pessoas não acreditam mais nas notícias que leem, qual a credibilidade de um veículo?”, indaga. Para o professor, os dados da pesquisa realizada com os manifestantes servem de recado para o campo jornalístico.
“Os veículos precisam discutir seus bastidores, discutir publicamente porque seus editoriais assumem uma linha x ou y ”, comenta. Jahn acredita que é importante mostrar como e porque as coberturas jornalísticas foram feitas e quais os critérios para a escolha das fontes. Para ele, a cobertura das manifestações deveria ser mais complexa do que apenas acompanhar a polícia enfrentando os vândalos. “Aliás, por que não ocorreu aos editores buscar uma explicação para essa violência?”, questiona.
Outros números
O Facebook foi a principal fonte de informação sobre as manifestações para 62,2% dos manifestantes. Outros 22,2% ficaram sabendo das ações pela TV, enquanto 21,8% se inteiraram pela internet (demais canais). Cerca de 8% dos entrevistados souberam das mobilizações por amigos ou colegas, 9% pelo rádio e 8% pelo Twitter.
Segundo Bruno Lima Rocha, também professor dos cursos de Comunicação da Unisinos, as redes de sociabilidade são fontes mais confiáveis do que a grande mídia para os que foram aos protestos. “Quem foi para a rua desconfia muito da mídia comercial. Porque, em geral, ela mente mesmo”, avalia. Para ele, é natural que hoje se acompanhe e se debate as informações por grupos de interesses.
Porque será que neste imenso país não se fez alguma coisa similar. Ou será que foi feito mas não ficamos sabendo? É isto e muito mais.
*Amaro Dornelles é jornalista e colaborador em Diálogos do Sul