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Pós-pandemia exigirá esforço para retomar desenvolvimento do Brasil da Era Vargas

Muitas das medidas tomadas por Getúlio, durante o Estado Novo, são as que deram suporte à posterior democratização do Brasil
Ceci Juruá
Diálogos do Sul
Rio de Janeiro (RJ)

Tradução:

Todos os que leem diretamente Getúlio Vargas (p.ex. A Nova Política do Brasil e seus muitos discursos), ou sua filosofia de governo como é apresentada na obra La Pensée Politique de Getúlio Vargas (por Hans Klingboffer, RJ/1942), adquirem, pelo menos, duas certezas:

– a ideologia que anima Getúlio Vargas não é fascista nem nazista, não há ódio em suas palavras, não há sentimento de superioridade nem de piedade ou compaixão por aqueles que seriam, na época, os “humildes”; Getúlio gosta mais de escutar do que falar; Getúlio não é autoritário, escuta a muita gente, amadurece bem o que lhe é levado ao conhecimento, só decide ao final e aí, então, é capaz de anunciar:  eu decidi, ou – faremos assim”;  

– o modelo de sociedade que o anima é o Japão, na sua travessia do feudalismo para a industrialização; é ele próprio Getúlio, quem diz isto;  sua neta, Celina, me confirmou tal postura do avô. 

Muitas das medidas tomadas por Getúlio, durante o Estado Novo, são as que deram suporte à posterior democratização do Brasil

Reprodução
Os impostos únicos foram a principal base financeira do Estado desenvolvimentista brasileiro, durante meio século.

Muitas das medidas tomadas por Getúlio, durante o Estado Novo, são as que deram suporte à posterior democratização do Brasil. Mas também inauguraram a industrialização brasileira do século XX. Este texto procura apresentar, portanto, apenas o conjunto de iniciativas mais importantes do ponto-de-vista da fundação do Estado desenvolvimentista brasileiro, pois tiveram o sentido de “pedra fundamental” em cada bloco de atividades.

Para começar, em sinal de inauguração de um novo período em nossa história, houve a criação do DASP – Departamento Autônomo de Serviço Público – . Este departamento foi instituído pela Constituição de 1937 e criado em 1938 (Decreto-lei 579 de 30 de julho de 1938),  ficando a presidência a cargo de Luis Simões Lopes até 1945. Absolutamente significativo, e simbólico, seu nascimento ou anúncio :  na própria Constituição que instaura o Estado Novo. 

Como programado, coube ao DASP tomar as iniciativas necessárias à adoção de princípios racionais nas ações do setor público, com ênfase na elaboração e gestão do orçamento público. Graças ao DASP, pela primeira vez em nossa história de nação independente tivemos um Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, carreira na qual só se poderia entrar por mérito, isto é, mediante seleção em concurso público. Os Cursos de Administração do DASP foram criados por decreto-lei, N. 2.804 de 21 de novembro de 1940.

As normas que acompanharam a instituição dos objetivos atribuídos ao DASP, de sua criação até o final desse primeiro Governo de Getúlio, não deixam dúvidas quanto ao objetivo central: liquidar o Estado patrimonialista, substituindo-o por uma administração moderna, impessoal, de caráter público, a serviço da nação. 

Na verdade, é impossível negar que o DASP foi a  iniciativa mater, aquela que lançou a pedra fundamental do Estado desenvolvimentista brasileiro, isto é, anunciou o “nascimento” e determinou a metodologia necessária à formação de burocracia moderna e adaptada às necessidades de uma nação em desenvolvimento visando tornar-se industrializada, democrática  e, talvez, grandiosa.   

Seguiu-se a CSN / Companhia Siderúrgica Nacional, criada em 30 de janeiro de 1941 através do  decreto-lei 3002, na categoria de sociedade anônima de economia mista. No mesmo ano, em 3 de abril, o decreto-lei 3173 autorizou empresas nacionais e cidadãos brasileiros a subscreverem ações preferenciais da CSN. Graças a essa iniciativa, o século XX transformou-se, para o Brasil, no século do Aço, isto é, o século da industrialização moderna, eficiente e viável. A CSN deve ser considerada como o símbolo da sustentabilidade do modelo desenvolvimentista inaugurado durante o Estado Novo getulista. Foi o primeiro passo concreto apontando a trajetória industrial. Segundo o CPDOC: 

Já por ocasião da Revolução de 1930, a criação de uma grande indústria siderúrgica nacional havia sido fixada como um dos objetivos do governo, visando a atender às necessidades não só do desenvolvimento econômico, mas da própria soberania nacional

Guilherme Guinle foi o primeiro presidente da Companhia Siderúrgica Nacional. 

Outro fato pioneiro anunciando a modernização(entrada no século XX) do Estado brasileiro, foi o Plano quinquenal de obras e reaparelhamento da defesa nacional, elaborado para o período 1939-1943, estando o Marechal Dutra no comando do Exército nacional. 

Em 1o de maio de 1943, Getúlio Vargas decretou a Consolidação das Leis do Trabalho (decreto-lei  5452, seguido por dois outros de retificação, números 6353, de 1944, e 9797 de 1946. A CLT instituiu as normas de regulação das relações individuais e coletivas de trabalho. no âmbito do setor privado não-rural.  Surgiam então, na sua plenitude jurídica, os direitos trabalhistas. São amplos, iniciados logo após a vitória da Revolução em outubro de 1930, paulatinamente implantados em estreita colaboração com os sindicatos de patrões e de empregados, devidamente nacionalizados pela lei dos 2/3.

Enfim, do ponto de vista das Finanças públicas, iniciativa pioneira foi a criação de um imposto federal sobre os combustíveis e lubrificantes líquidos minerais, importados e produzidos no país (IULC.LG), de cuja arrecadação caberia aos Estados e Municípios uma quota parte proporcional ao consumo nos respectivos territórios, para aplicação exclusiva na conservação e no desenvolvimento das redes rodoviárias (Decreto-lei 2615 de 21 de setembro de 1940).  Foi este o primeiro dos impostos únicos instituídos no Brasil, impostos cancelados por ocasião da Constituição de 1988, sem debate público nem explicações à sociedade). Os impostos únicos foram a principal base financeira do Estado desenvolvimentista brasileiro, durante meio século.   

São estas as primeiras instituições que sinalizam o surgimento de um estado desenvolvimentista no Brasil. São instituições pioneiras na América Latina.  E são anteriores à criação da CEPAL / Comissão Econômica para a América Latina.

Este conjunto de considerações datadas permite afirmar, e ter convicção, que as instituições pioneiras do Estado desenvolvimentista brasileiro foram criadas na Era Vargas, ao longo do Estado Novo. 

Controvérsias e alternativas em torno de sua criação e consolidação requerem ainda um estudo aprofundado de parte de todos que se empenham na defesa de um Estado Nacional forte, suscetíveis de sustentar a Soberania do Brasil e a Democracia como norma de conduta social. Daqui por diante, no pós-pandemia, será exigido de todos nós um esforço suplementar para fins de reconstrução do Estado Nacional e da Pátria Soberana. Retomar a trilha desenhada na Era Vargas: trajetória de crescimento sustentável e de implantação de direitos mínimos de cidadania para todos os brasileiros, paralelamente à defesa de princípios e procedimentos democráticos modernos.

* Ceci Juruá é economista, mestre em desenvolvimento e planejamento econômico, doutora em políticas públicas, pesquisadora independente sobre História Econômica e Social do Brasil. 

Fontes – arquivos do CPDOC e legislação brasileira. E  portal https://portalsaofrancisco.com.br/historia-do-brasil/era-vargas


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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