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Foto: Kremlin

Putin, sobre Ucrânia: Não há diálogo com quem ataca civis e ameaça usinas nucleares

Presidente da Rússia, Vladimir Putin, fez a declaração nesta segunda (12) durante coletiva de imprensa sobre os ataques da Ucrânia a Kursk
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

Beatriz Cannabrava

* Atualizado em 16/08/2024 às 12h22.

Nesta segunda-feira (12) – a sétima jornada de combates na região russa de Kursk – a Rússia revelou pela primeira vez que, até o momento, perdeu 28 localidades e 480 km² de território, tendo já evacuado 121 mil pessoas, ao mesmo tempo em que confia em poder evacuar mais 59 mil, enquanto a Ucrânia, por meio de seu presidente, Volodymir Zelensky, também pela primeira vez se referiu à operação em Kursk e seu comando militar afirmou que ocupa mais do que o dobro do território admitido pelos russos, cerca de 1000 km².

A confirmação de que não se trata de uma simples “operação antiterrorista” contra “grupos isolados” surgiu inesperadamente. De Moscou, em entrevista coletiva, o presidente Vladimir Putin falou sobre “a situação nas regiões fronteiriças” com a Ucrânia (Kursk, Belgorod e Briansk), na qual participaram os respectivos governadores e os titulares de Defesa, Estado Maior do exército, Conselho Nacional de Segurança, FSB (Serviço Federal de Segurança), Guarda Nacional e outras dependências do governo russo.

Antes de escutar seus subordinados, Putin sublinhou que “a tarefa principal, neste momento, recai no ministério da Defesa: esmagar e expulsar de nosso território o inimigo e, junto com as tropas de guarda-fronteiriça (dependentes do FSB), garantir a sólida proteção de nossas fronteiras”.

O mandatário russo agregou: “tudo indica que o inimigo, com a ajuda de seus amos ocidentais, cumpre sua vontade – com as mãos dos ucranianos, o Ocidente luta contra nós – e aspira a melhorar suas posições para uma futura negociação. Mas não pode haver nenhum tipo de diálogo com pessoas que atacam de modo indiscriminado a gente pacífica, infraestruturas civis ou tentam criar ameaças para instalações de energia atômica. Não há o que falar com eles”.

Aleksei Smirnov e Putin

Por sua vez, o governador de Kursk, Aleksei Smirnov, começou seu discurso apresentando um panorama que – segundo pode ser visto na transmissão ao vivo dessa parte da reunião feita pela televisão pública russa – contrastou com os relatos triunfalistas dos porta-vozes militares: “a situação na região é complicada, atualmente o inimigo controla completamente 28 localidades. A profundidade da penetração na região de Kursk equivale a 12 km e a largura da frente de combates, a 40 km…”, o que é o mesmo que uma área de 480 km².

Surpreso e irritado, Putin interrompeu Smirnov: “escute-me, Aleksei Borísovich (nome e patronímico de Smirnov), a dependência militar já nos dirá qual é a largura e o comprimento lá. Diga-nos melhor como está a situação econômica e social na região e que ajuda está sendo fornecida à população”.

Smirnov parou abruptamente e começou a dizer: “evacuamos, conforme suas instruções, 121 mil pessoas em diferentes distritos e praticamente todos os habitantes de dois deles, Sudzha e Korenevo, mas continuamos trabalhando para evacuar mais 59 mil”.

Zelensky confirma combates

Também na segunda-feira, o presidente da Ucrânia, Volodymir Zelensky, reconheceu abertamente pela primeira vez que suas tropas estão combatendo em território russo e, após realizar uma reunião com o comando militar, tornou públicos fragmentos do relatório que lhe foi apresentado pelo comandante-chefe do exército ucraniano, Olesksandr Syrskyi:

“Continuamos levando a cabo operações de ofensiva na região de Kursk. Neste momento mantemos sob nosso controle cerca de 1000 km² de território da Federação Russa”, disse o general.

Enquanto isso, o DeppStateUA, canal de um grupo de analistas próximos à inteligência militar ucraniana, divulgou nas redes sociais que, “segundo nossos cálculos, o exército ucraniano conseguiu liberar 44 localidades (na região de Kursk). Ainda não se pode confirmar, falando em termos moderados”. A verdade, levando em consideração que todos minimizam seus retrocessos e exageram seus sucessos, deve estar no meio.

Guerra de versões

Se acreditarmos nos relatórios oficiais de guerra fornecidos por Moscou e Kiev sobre os combates na região russa de Kursk, poderia se pensar que uma das duas partes está mentindo, porque é impossível que reportem resultados antagônicos: o exército russo afirma que continua frustrando as tentativas de avanço do inimigo, oferecendo números de numerosas baixas ucranianas e blindados destruídos, enquanto as tropas ucranianas asseguram que controlam cada vez mais localidades russas e suas unidades de assalto estão se posicionando cada vez mais longe da fronteira, ao mesmo tempo em que oferecem criar “um corredor humanitário” para a população russa que queira ser evacuada para a Ucrânia.

E se ambos estão dizendo a verdade, apenas informam o que mais lhes convém e ocultam os êxitos do inimigo.

Nesta quarta-feira (14), o nono dia dos combates em Kursk, o panorama do que está acontecendo lá se complicou por duas razões: a primeira, ambos os lados também travam outra batalha, a da desinformação, e a segunda, o Parlamento russo ameaçou endurecer as penas por difundir “notícias falsas”, o que foi interpretado como uma mensagem clara para os blogueiros-Z, jornalistas e analistas russos que apoiam a “operação militar especial”, mas criticam a cúpula militar, para que cessem de falar sobre os avanços das tropas ucranianas.

Russos e ucranianos – para citar apenas dois exemplos – divulgaram nesta quarta-feira fotografias e vídeos de prisioneiros do inimigo, mas a contraparte rebate, sem negar que são seus soldados, que não os capturaram em Kursk ou que as imagens do impacto de um míssil que destrói um carro blindado em Kursk são verdadeiras, mas ocorreram no ano passado e em solo ucraniano. Não há como verificar.

O caso de Sudzha, principal localidade do distrito homônimo, merece menção aparte, e tudo aconteceu nesta quarta-feira: o comandante-em-chefe do exército ucraniano, Oleksandr Syrskyi, informou por videoconferência ao presidente Volodymyr Zelensky que o distrito inteiro está sob controle ucraniano. “Concluímos a busca e aniquilação do inimigo na localidade de Sudzha. Até agora, avançamos, em diferentes direções, um ou dois quilômetros e também fizemos mais de 100 prisioneiros”, afirma o general no fragmento de vídeo que Zelensky postou na internet.

Em declarações ao noticiário do canal de TV russo Pervy, Apti Alaudinov, subchefe da direção geral político-militar do exército russo e comandante das forças especiais da Chechênia em Kursk, afirmou que “hoje (quarta-feira) em Sudzha também há unidades do exército russo. O inimigo está cercando a cidade e já entrou em algumas partes, mas não pode dizer que controla por completo Sudzha porque não controla (sic)”.

Pouco depois, o canal de TV ucraniano 1+1 publicou um reportagens do centro de Sudzha a cargo de Natalia Nagornaya, enviada da TNS (sigla em ucraniano do Serviço de Notícias por Televisão), que mostrou as ruas vazias da cidade, entrevistou um grupo de mulheres que estavam escondidas em um porão e, para finalizar, apareceu em cena para dizer: “E agora estamos no centro de Sudzha no momento histórico em que a bandeira tricolor russa cai ao chão”, atirada por dois combatentes ucranianos do alto de um prédio.

Nas redes sociais russas, vários informantes colocaram em dúvida a veracidade do reportagens ao indicar que essa bandeira não estava no prédio da administração de Sudzha, mas em um de uma escola a 300 metros e por ter sido gravada e não ao vivo, já que, ao ser exibida, a jornalista já havia regressado à Ucrânia.

No entanto, o blogueiro pró-Kremlin Serguei Koliasnikov publicou em seu canal Zergulio: “Claro que o exército ucraniano ocupar um centro distrital é corajoso, causa dor e pena. Mas as mentiras sobre esse assunto começam a parecer toda uma palhaçada. Os nossos, como não estavam, continuam sem estar. Só há declarações sonoras e promessas”.

Mikhail Vinogradov, presidente da Fundação “Política de São Petersburgo” compartilhou uma análise de como a televisão pública russa está informando sobre Kursk. Baseando-se no noticiário das 15:00 no canal Pervy, o cientista político menciona que dedicou ao que chama de “a situação” na região de Kursk 85 segundos, separando-a da “operação militar especial”; enfatizou o número de baixas ucranianas e blindados destruídos, principalmente “americanos e britânicos”; destacou que o exército russo “continua cortando as tentativas de avanço” das tropas ucranianas; não publicou nenhum mapa, mencionou localidades de pouca importância e não disse uma palavra sobre Sudzha, Kurchatov ou Lgov; chamou de “sabotadores” os prisioneiros ucranianos que mostrou.

E enquanto a Rússia bombardeou a região ucraniana de Sumy, de onde entraram as unidades ucranianas em território russo no dia 6 de agosto passado, e o governador de Kursk, Aleksei Smirnov, anunciou nesta noite (quarta-feira) a evacuação obrigatória de toda a população do distrito de Glushkovo (antes de fevereiro de 2022, tinha 20 mil habitantes), a Ucrânia há vários dias está fazendo o mesmo em sua zona de fronteira e também assegurou nesta noite (quarta-feira) que, na madrugada de 14 de agosto, atacou quatro aeródromos militares nas regiões russas de Kursk, Voronezh e Nizhny Novgorod que serviam de base para os caças SU-34 e SU-35, assim como depósitos de combustível.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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