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Toggle“Os Estados Unidos preparam novas e significativas sanções contra a Venezuela”. Esta foi a manchete de muitos jornais em todo o mundo no último dia 12 de março. A informação foi divulgada por Elliot Abrams, enviado especial do governo de Donald Trump para a Venezuela.
Declarações similares foram oferecidas por outros porta-vozes da Casa Branca. Recentemente, com o mesmo estilo de “fazer a economia gritar”, pronunciado por Richard Nixon, referindo-se ao Chile no início dos anos 70, William Brownfield disse:
“Se formos punir a PDVSA, isso terá um impacto sobre toda a cidade, no cidadão comum. O contra-argumento é que as pessoas sofrem muito com a falta de alimentos, segurança, medicina, saúde pública, neste momento, talvez, a mais alta resolução seria acelerar o colapso ainda que ele produza um período de sofrimento de meses ou talvez anos.”
Desde 1999, o povo venezuelano tem sido vítima de ataques sistemáticos por parte dos governos dos EUA. Basta lembrar da sabotagem, em novembro de 2002, contra a principal indústria do país, a Petróleos da Venezuela, empresa que gera 98% da renda em moeda estrangeira para a nação, e cuja paralisia implicou uma perda de 16 bilhões de dólares para a economia venezuelana.
A partir de 2013, após a morte do presidente Hugo Chávez e o início do primeiro mandato de Nicolás Maduro, o governo dos EUA retomou os ataques contra o povo venezuelano, que foram encobertos inicialmente, mas com o passar do tempo se tornaram não apenas abertos, formais, mas mais intensos.
Trata-se de ataques econômicos que não se limitam a medidas coercitivas unilaterais caracterizadas principalmente por bloqueios financeiros e comerciais, mas que também atacam nossa moeda, o bolívar, induzindo uma hiper-inflação e uma desestabilização de todos os setores da economia, desencadeando uma importante contração da produção nacional e, portanto, afetando a população venezuelana. Trata-se de uma guerra econômica.
Os ataques econômicos são parte de um plano cujo objetivo é derrubar o governo constitucional, legítimo e democraticamente eleito na Venezuela através da desestabilização econômica e política, acompanhada de um discurso no qual o governo bolivariano e seu modelo são responsabilizados, que permita minar o apoio popular, bem como fraturar a Força Armada Nacional Bolivariana, resultando em um golpe de Estado.
Este plano foi revelado em dois respectivos documentos assinados pelo chefe do Comando Sul dos EUA, Kurt Tidd. O primeiro deles intitula-se “Venezuela Livre-2 Operação”, de 25 de fevereiro de 2016, e o segundo, “Golpe mestre para acabar com a “ditadura” da Venezuela”, de fevereiro de 2018. Lê-se nesses documentos:
“Intensificar a derrubada definitiva do chavismo e a expulsão de seu representante, minar seu apoio popular (…) Continuar endurecendo a condição dentro das Forças armadas para levar a cabo um golpe de Estado (…)
Incitar a insatisfação popular aumentando o processo de desestabilização e de desabastecimento (…) Contribuir para tornar a situação da população mais crítica (…)
Aumentar a instabilidade interna as níveis críticos, intensificando a descapitalização do país, a evasão de capital estrangeiro e a deterioração da moeda nacional, aplicando novas medidas inflacionárias que aumentam essa deterioração (…) Obstruir todas as importações e, ao mesmo tempo, desencorajar potenciais investidores estrangeiros”.
No marco desses planos, que requerem o apoio da comunidade internacional para a posterior entrada em território venezuelano, o governo dos EUA considera como estratégia a geração de uma crise humanitária que justifique a intervenção por meio da ajuda humanitária. Pode-se ler nos documentos:
“Especial interesse adquire, nas atuais circunstâncias, posicionar a matriz de que a Venezuela entra em um estágio de crise humanitária devido à falta de comida, água e medicamentos, devemos continuar com a gestão do cenário onde a Venezuela está perto de um colapso e de implodir, exigindo da comunidade internacional uma intervenção humanitária para manter a paz e salvar vidas(…)”.
Doutrinariamente, o Estado e sua política de controle devem ser responsabilizados como causa de estagnação econômica, inflação e escassez”.
Não podemos deixar de mencionar que o ataque terrorista e criminoso ao sistema nacional de eletricidade perpetrado no dia 7 de março, que resultou em um apagão e deixou sem eletricidade, água e comunicação toda a população venezuelana por um período de quase três dias, colocando em risco a vida dos venezuelanos e violando seus direitos humanos, faz parte desses planos para gerar caos e desestabilização.
Vamos focar este relatório no impacto dos ataques econômicos para o povo venezuelano.Consideramos tanto as medidas coercitivas unilaterais, isto é, as sanções e bloqueios financeiros e econômicos, quanto o ataque à moeda. Apresenta-se a metodologia utilizada para estimar as perdas causadas por esses ataques, assim como a fonte das informações.
Divulgação | People’s Dispatch
Jornada de solidariedade com a Venezuela realizada no dia 16 de março; na foto, lê-se: "Trump, tire as mãos da Venezuela"
Cronologia das medidas coercitivas contra a população da Venezuela
Dezembro de 2014. O Congresso dos EUA aprova a Lei 113-278: “Lei Pública de Defesa dos Direitos Humanos e da Sociedade Civil na Venezuela”, através da qual é definido o roteiro para a política dos EUA em relação à Venezuela, e para que outros Estados, sob sua influência, adotem medidas coercitivas unilaterais contra a Venezuela.
Março de 2015. Barack Obama emite a Ordem Executiva 13.692 através da qual declara a Venezuela como uma “ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional e à política externa dos Estados Unidos”.
Março de 2016. O governo dos EUA renova por um ano a Ordem Executiva 13.692.
Maio de 2016. O banco Commerzbank (Alemanha) fecha as contas mantidas por diversas instituições, bancos públicos pela empresa pública Petróleos da Venezuela SA (PDVSA).
Julho de 2016. O banco norte-americano Citibank encerra, unilateralmente, o serviço de contas correspondentes em moeda estrangeira de instituições venezuelanas nos EUA, inclusive as do Banco Central da Venezuela (BCV).
As agências de classificação de risco classificam a Venezuela como o país com o maior risco financeiro do mundo (2640 pontos), bem acima dos países em guerra, apesar de ter cumprido seus compromissos de dívida externa. Desde 2013, a Venezuela pagou mais de 63 bilhões de dólares, no entanto, esse índice aumentou 202% no mesmo período, passando de 768 em 2012 para 2323 em 2016. Cada 100 pontos de risco equivale a uma taxa de juros adicional de 1%.
Agosto de 2016. O Novo Banco (Portugal) informa a impossibilidade de realizar operações em dólares com bancos venezuelanos, devido a pressões exercidas por agências credenciadas desta instituição. Setembro de 2016. O governo venezuelano faz uma oferta para trocar 7 bilhões de dólares em títulos da PDVSA, a fim de aliviar o cronograma de amortização e refinanciar parcialmente suas obrigações. As três principais agências de classificação de risco americanas assustam os investidores com a declaração de inadimplência (inadimplência) caso aceitem a proposta venezuelana.
Novembro de 2016. O banco JP Morgan emite um falso alerta para “default” sobre um suposto não pagamento da dívida da PDVSA de 404 milhões de dólares. A empresa de petróleo norte-americana Conoco Phillips processou a PDVSA em um tribunal em Delaware, nos EUA, por uma operação de resgate de títulos. O objetivo deste recurso legal era amedrontar os participantes e, assim, fazer com que a operação falhasse.
Dezembro de 2016. A empresa Crane Currency, fornecedora de cédulas do Departamento do Tesouro e contratada pelo Estado venezuelano para imprimir o papel-moeda do sistema monetário, atrasa o envio das cédulas novas.
Julho de 2017. A empresa Delaware Trust, agência de pagamento dos títulos da PDVSA, informa que sua credencial (PNC Bank) nos EUA se recusa a receber fundos da companhia petrolífera venezuelana.
O banco Citibank (EUA) se recusa a receber dinheiro venezuelano para a importação de 300 mil doses de insulina.
O Departamento do Tesouro, através do Escritório para o Controle de Ativos no Exterior (OFAC), emite sanções contra um grupo de autoridades venezuelanas, incluindo o Presidente da República, Nicolás Maduro Moros, um dia após a celebração da eleição da Assembleia Nacional Constituinte.
Agosto de 2017. O banco suíço Credit Suisse proíbe seus clientes de realizar transações financeiras com a Venezuela.
O Banco do Banco da China (BOC – Panamá) informa que, devido às instruções do Departamento do Tesouro dos EUA e à pressão do governo panamenho, não poderá realizar quaisquer operações em moeda estrangeira a favor da Venezuela.
Outubro de 2017. O bloqueio financeiro dos EUA impossibilita que a Venezuela deposite no banco suíço UBS recursos para vacinas e medicamentos adquiridos por meio do Fundo Rotativo e do Fundo Estratégico da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o que gerou um atraso de quatro meses na aquisição da vacinas, alterando esquemas de vacinação no país.
Os bancos russos relatam a impossibilidade de fazer transações para os bancos venezuelanos, devido à restrição imposta pelas agências dos EUA e da Europa às operações venezuelanas. O correspondente do banco BDC Shandong, alegando razões administrativas, paralisa uma transação de 200 milhões de dólares para a Venezuela, apesar dos fundos terem sido sacados pela República Popular da China.
Donald Trump emite a Ordem Executiva 13.808: “Imposição de sanções em relação à situação na Venezuela”, que estabelece as seguintes proibições:
– O governo venezuelano deve adquirir novas dívidas com vencimento superior a 30 dias.
– A PDVSA deve adquirir uma nova dívida, maior do que 90 dias.
– Nova aquisição de ações pelo governo venezuelano.
– Pagamento de dividendos ou distribuição de lucros ao governo venezuelano por empresas que operam nos EUA, o que afeta particularmente a refinaria da CITGO.
A empresa Euroclear, encarregada da custódia de parte dos títulos soberanos da Venezuela, congela as operações de liquidação de títulos, alegando motivos de “revisão”. Na ocasião, a Euroclear reteve 1,6 bilhões de dólares sem a possibilidade de movimentação.
Setembro de 2017. O Departamento do Tesouro, através de sua Rede de Controle de Crimes Financeiros (FINCEN), emite um alerta chamado “bandeiras vermelhas”, que impõe um sistema de vigilância e controle às transações financeiras venezuelanas, para impedir o pagamento de alimentos e medicamentos.
Um carregamento de 300 mil doses de insulina pagas pelo Estado venezuelano não chega ao país porque o banco do Citibank boicotou a compra desse importante insumo. O desembarque de 18 milhões de caixas de alimentos subsidiados do Programa Comitês Locais de Abastecimento e Preços é interrompido por entraves impostos pelo sistema financeiro estadunidense.
A Venezuela é incluída na lista de países com proibição de viagem aos EUA (travel ban). A proibição se aplica apenas aos funcionários do governo venezuelano.
Outubro de 2017. A empresa de refino PBF Energy, quinto maior importador de petróleo venezuelano da Venezuela, suspende as compras diretas da PDVSA.
O Canadá aprova o projeto de lei S-226, que autoriza impor restrições às transações de bens e congelar os ativos de autoridades estrangeiras.
A petroleira estadunidense NuStar Energy proíbe a PDVSA de usar um terminal de armazenamento no Caribe.
O Deutsche Bank informa ao Citic Bank da People's Republic of China, o fechamento de suas contas em agências credenciadas por processar os pagamentos da PDVSA.
Novembro de 2017. A Colômbia bloqueia o envio do tratamento antimalárico (primaquina e cloroquina) solicitado ao laboratório da BSN Medical nesse país. As empresas farmacêuticas transnacionais Baster, Abbot e Pfizer se recusam a emitir certificados de exportação para medicamentos oncológicos, tornando impossível a compra por parte da Venezuela.
Os EUA sancionam e banem as autoridades venezuelanas que administram os programas de fornecimento de alimentos, impedindo-os de assinar acordos comerciais ou convênios internacionais que favoreçam a política alimentar da Venezuela.
A União Européia proíbe a venda de armas e equipamentos de segurança para a Venezuela.
O Deutsche Bank, principal agência do Banco Central da Venezuela (BCV), fecha definitivamente suas contas. Um total de 23 operações financeiras da Venezuela, destinadas à compra de alimentos, suprimentos básicos e remédios por 39 milhões de dólares, são devolvidas por bancos internacionais.
A agência de classificação Standard and Poor's declara a Venezuela em “default seletivo”.
Dezembro de 2017. Os pagamentos venezuelanos são bloqueados do serviço de cabotagem para o transporte de combustível, o que causa escassez deste produto em vários estados.
Um total de 19 contas bancárias venezuelanas no exterior são arbitrariamente fechadas por bancos estadunidenses, impedindo pagamentos a credores. 471 mil pneus adquiridos no exterior cujos pagamentos foram realizados são retidos no exterior.
Janeiro de 2018. 11 títulos da dívida venezuelana e da PDVSA, no valor de 1,2 bilhões de dólares, não puderam ser pagos a seus credores por causa do obstáculo das sanções.
Fevereiro de 2018. O Departamento do Tesouro dos EUA amplia as sanções financeiras à Venezuela e às empresas venezuelanas estabelecidas na Ordem Executiva 13.808 de agosto de 2017. Ela impede a renegociação ou a reestruturação da dívida venezuelana e da PDVSA emitida anteriormente a 25 de agosto de 2017.
Março de 2018. A Administração Trump:
– Renova por um ano a Ordem Executiva 13.692
– Renova a Ordem Executiva 13.808 e impõe seis novas medidas coercivas que ameaçam a estabilidade financeira da Venezuela, ao proibir a reestruturação da dívida, e impede a repatriação de dividendos Citgo Petroleum, empresa do Estado venezuelano.
– Dita a Ordem Executiva 13.827 que proíbe que qualquer cidadão ou instituição faça transações financeiras com a criptomoeda venezuelana Petro.
O governo do Panamá publica uma lista de 55 cidadãos venezuelanos sancionados (incluindo o presidente Nicolás Maduro) e 16 empresas venezuelanas consideradas de “alto risco”.
Abril de 2018. O chanceler do Peru, no marco da Cúpula das Américas, e em nome do Grupo de Lima, anuncia que eles decidiram criar um grupo de acompanhamento para estudar medidas políticas e econômicas contra a Venezuela. Na mesma Cúpula, os EUA e a Colômbia acordam agilizar mecanismos para perseguir as transações financeiras na Venezuela e dificultar as linhas de abastecimento de mercadoria que o país requer.
Maio de 2018. Exigindo uma sentença favorável de uma decisão arbitrária por 2,4 bilhões na Câmara de Comércio Internacional, a empresa americana de petróleo Conoco Phillips anuncia que vai embargar os ativos internacionais da PDVSA.
Bloqueiam o pagamento de 9 milhões de dólares destinados à aquisição de insumos para diálise, para o tratamento de 15 mil pacientes em hemodiálise. O governo colombiano bloqueia o envio de 400 mil quilos de alimento do programa de subsídios alimentares dos Comitês locais de Abastecimento e Produção (CLAP).
Em represália à eleição presidencial para o período 2019-2025, na qual mais de 9 milhões de cidadãos votaram e Nicolás Maduro venceu com 67% dos votos, Donald Trump emite a Ordem Executiva 13.835, através da qual amplia as sanções econômicas contra Venezuela e proíbe a compra de dívidas e contas a pagar de empresas do Governo da Venezuela.
Os EUA sancionam 20 empresas da Venezuela por supostas ligações com o tráfico de drogas.
Agosto de 2018. Os EUA autorizam a Crystallex a confiscar os ativos da Citgo Petroleum, de propriedade da PDVSA.
O governo brasileiro deixou de pagar 40 milhões de dólares que devia à Corporação de Eletricidade da Venezuela pelo fornecimento de energia ao estado de Roraima. O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Aloysio Nunes, declarou que a dívida elétrica “não foi cancelada devido ao bloqueio econômico e financeiro imposto pelos EUA e pela União Europeia contra a Venezuela“.
Novembro de 2018. Donald Trump proíbe cidadãos estadunidenses de negociarem ouro exportado do país sul-americano.
Janeiro de 2019. A administração Donald Trump aprova novas sanções contra a Petróleos da Venezuela S.A. (PDVSA), que incluem o congelamento de 7 bilhões de dólares em ativos da subsidiária CITGO, além de uma perda estimada de 11 bilhões de dólares de suas exportações durante os próximos anos.
Como atacaram a moeda
Paralelamente à implementação de medidas coercitivas, bloqueios, sanções e apropriação de bens, o imperialismo esteve atacando a moeda nacional, o bolívar, a fim de induzir a inflação e afetar os níveis de produção doméstica. Isso foi feito através da manipulação diária da taxa de câmbio por meio de sites cujos domínios estão hospedados no território dos EUA, especificamente em Miami.
Ao manipular a taxa de câmbio e cotá-la a um valor mais alto do que o oficial, incidem sobre os preços de todos os bens importados, que, por sua vez, são necessários para os processos de produção. O aumento dos preços dos produtos importados aumenta todos os custos de produção e, consequentemente, os preços dos bens finais.
É o que se conhece por choque de oferta, que se manifesta em uma estagflação, isto é, um aumento nos preços (inflação) com estagnação ou recessão econômica. Historicamente, os aumentos na taxa de câmbio na Venezuela levaram a aumentos nos preços internos da economia e, a partir de 2013, tal tipo de mudança vem sendo manipulado politicamente por meio de portais hospedados nos EUA.
Este ataque contra a economia venezuelana e, portanto, contra toda a sua população tem três efeitos: 1) deteriora o salário real; 2) diminui os níveis de produção; 3) torna insuficiente o gasto público e o investimento público. Desde 2013 até agora, a taxa de câmbio foi manipulada em 3,5 bilhões por cento. Em 2013, foi cotado a 8,69 BsF [bolívar]/US$ e hoje está publicado em 3,5 bilhões BsF/US$.
Nada que tenha ocorrido na economia venezuelana pode explicar essa suposta depreciação da moeda em tais magnitudes. Tem sido uma manipulação da taxa de câmbio que atende a um padrão de comportamento político associado a momentos de alto conflito ou de processos eleitorais.
Estimamos os prejuízos que o ataque à moeda causou nos níveis de produção nacional que, somados aos causados pelo bloqueio, pelas sanções e pela apropriação ilegal de nossos bens, mostram a magnitude criminosa das medidas coercitivas unilaterais por parte do imperialismo contra o povo venezuelano.
Impacto da Guerra Econômica contra a população da Venezuela
Chegam a mais de 114 bilhões de dólares as perdas causadas por medidas coercitivas unilaterais que, desde 2013 e até o momento, os EUA tem imposto ao povo venezuelano, incluindo o ataque à moeda nacional. Destes 114 bilhões, 21 bilhões de perdas foram ocasionadas por medidas coercitivas unilaterais, bloqueios financeiros, embargos comerciais, pelo roubo de ativos da CITGO, os recursos que não são cobrados por tal ato de roubo, o ouro retido na Inglaterra e os euros bloqueados na Euroclear. A diferença, ou seja, quase 93 bilhões, corresponde ao que paramos de produzir como resultado do ataque sobre a moeda, que além de induzir a inflação, também diminui os níveis de produção nacional.
Impacto das medidas coercitivas unilaterais
Em um cenário de estimativas muito conservador, as perdas causadas pelas medidas coercitivas unilaterais somam 21 bilhões de dólares até o momento. Inclui:
1) 11 bilhões de dólares de perdas devido à apropriação ilegal da companhia petrolífera e da CITGO venezuelana pelos EUA.
2) 7 bilhões de dólares pela apropriação ilegal de ativos da CITGO.
3) 1,6 bilhões de dólares retidos pela Euroclear.
4) 1,2 bilhões de dólares equivalentes ao ouro retido pelo Banco da Inglaterra.
5) 467 milhões dólares pelo declínio no valor dos títulos em custódia no Euroclear, que passou de mais de 1 bilhão de dólares para 625 milhões, diminuindo 57,24% devido ao bloqueio financeiro.
6) 37 milhões de dólares devido a restrições operacionais impostas pelas companhias de navegação e portos internacionais, como a transferência da carga que é destinada à Venezuela e o aumento do tempo de espera; juntamente com o aumento das taxas.
7) 655 mil dólares pelas transferências, consulta de pagamentos, alterações de transferências, entre custos operacionais. Antes da aplicação das sanções dos EUA, as instruções de pagamento eram enviadas pelos bancos e executadas em 48 horas. Agora, em média, um pagamento é feito entre 10 e 20 dias corridos.
8) 20 milhões de dólares pela diferença cambial, uma vez que a República [Bolivariana] é obrigada a adotar outras moedas, diferentes do dólar norte-americano, para realizar transações financeiras e comerciais.
9) 264 milhões de dólares por perda do título adquirido através do Credit Suisse, correspondente à dívida pública externa.
Estas são estimativas conservadoras, porque elas não incluem, por exemplo, as perdas causadas pela descomposição de alimentos e medicamentos retidos por mais tempo do que o esperado em navios ou o custo adicional de transporte e procedimentos administrativos causados pela necessidade de triangulações em compras para evitar sanções a empresas ou países por parte dos EUA.
Impacto do ataque à moeda
Entre os ataques econômicos, não podemos deixar de considerar o ataque sobre a moeda pelos seus efeitos para o povo venezuelano, que não se limita apenas à deterioração do salário real da hiperinflação induzida que tal ataque ocasiona, mas também tem um efeito de contração da produção nacional e, portanto, do consumo nacional.
Esse ataque vem de páginas da web cujo domínio reside nos EUA, especificamente no portal dolartoday.
Historicamente a produção interna na Venezuela ter sido determinada a 96,6% em níveis de exportação de petróleo durante os últimos 4 anos, e particularmente desde as vendas de petróleo de 2016 afetou apenas 60% do produto interno bruto, o outro 40% é influenciado pelo choque de oferta resultante do ataque cambial. Em outras palavras, a queda do produto interno bruto que registramos desde 2016 se deve, em 60%, à queda nas exportações de petróleo e 40% ao ataque à moeda.
É por esta razão que, embora a recuperação das exportações de petróleo em 2017 e 2018, principalmente devido ao aumento do preço do petróleo, o produto interno bruto não foi recuperado, mas manteve sua tendência descendente. Em condições normais, isto é, se não houvesse manipulação política da taxa de câmbio, seria de esperar uma recuperação do PIB, à medida que as exportações aumentassem. Não foi o caso em 2017 e 2018.
Em um cenário conservador, assumindo condições normais sem guerra econômica, sem ataques ao bolívar, com um preço médio de petróleo de 45 dólares, e os níveis de exportação de petróleo em torno de US$ 37 bilhões, similares às exportações até 2015, o que supõe níveis iguais de produção de petróleo que o registrado naquele ano, ou seja, 2,9 milhões de barris por dia, e envolve supor que se não houvesse sabotagem na indústria do petróleo, produto interno bruto deve estar em torno de US$ 131 bilhões, equivalente a 2015.
Para calcular a diferença anual do PIB anual esperado, ou seja, o de 2015, com o que efetivamente foi produzido nos anos 2016, 2017 e 2018 , percebe-se que, no total, durante esses 3 anos foram deixados de produzir mais de 92 bilhões de dólares.
Dessa perda estimada em mais de 92 bilhões de dólares, que inclui os efeitos do ataque à moeda e do boicote silencioso da indústria do petróleo, US$ 41,6 bilhões correspondem ao ataque à moeda.
Ao somar as perdas causadas pelas medidas coercitivas unilaterais e aquelas relacionadas aos níveis de produção nacional devido ao ataque à moeda e ao boicote à produção de petróleo, resulta em uma perda total de 113,6 bilhões de dólares.
Impacto da guerra econômica para a população venezuelana
Esses 114,3 bilhões de dólares são também equivalentes à importação de remédios e alimentos para abastecer os 30 milhões de venezuelanos durante 26 anos.
Por exemplo, em 2004, quando não foi registrada escassez de comida, a importação, incluindo a matéria-prima para a produção, foi de US$ 2,1 bilhões (dados do Instituto Nacional de Estatística). No caso dos medicamentos, as importações somaram US$ 2,2 bilhões. Ou seja, com US$ 4, 3 bilhões por ano, as importações são cobertas e toda a população é abatecid com insumos, matérias-primas e produtos finais para alimentos e remédios. As perdas que até agora as sanções, o bloqueio e o ataque à moeda causaram, coincidem com o investimento em saúde para 10 anos, levando em conta que representa cerca de 10% do PIB anual. Em outras palavras, equivalem à garantia de prestar atendimento de saúde hospitalar, ambulatório, preventivo, tanto do setor público quanto do privado, a todos os venezuelanos durante 10 anos. Representam a garantia do direito à educação por 10 anos, tanto público como privado, da pré-escola à universidade. O investimento em educação representa 10% do Produto Interno Bruto anual.
Estas perdas representam o total das importações anuais durante 7 anos e meio, incluindo máquinas, peças de reposição, transporte, matérias-primas, insumos, alimentos e medicamentos, têxteis, produtos da indústria química, etc. Por exemplo, em 2004, quando não houve escassez, as importações anuais totalizaram 15 bilhões de dólares. Eles correspondem ao total da dívida externa da República, que devemos pagar no prazo de 20 anos. Para termos outras referências e podermos reconhecer a magnitude do ataque criminoso e genocida sofrido pelo povo venezuelano, oferecemos outros indicadores:
– Com os 1,2 bilhões de dólares em ouro que a Inglaterra mantém retido, pode-se comprar alimentos para 6 milhões de lares por 6 meses.
– Só com os 20 milhões de dólares, são cobertos o atendimento e tratamento de 3 anos para todas as pessoas com malária.
– Com 40 milhões de dólares, procura-se o tratamento antirretroviral para pessoas com HIV e AIDS por 2 anos.
– Com 18 milhões de dólares, adquirimos 9 milhões de doses de vacinas necessárias para aplicar o plano anual de vacinação.
– Com os 11 bilhões de dólares que representam as perdas decorrentes do roubo contra a CITGO, importamos todos os medicamentos e equipamentos médico-cirúrgicos incluindo os insumos para a produção interna durante 5 anos.
Cada número apresentado aqui corresponde ao rosto de uma mulher venezuelana, um homem, um menino, uma menina. Não se trata apenas do impacto econômico sobre as importações ou a produção, é sobre o impacto que esses ataques econômicos têm na garantia dos direitos humanos de cada venezuelano. Esses ataques afetam maciça e sistematicamente toda a população, tanto civil quanto militar.
No entanto, devemos ressaltar que a Venezuela não está em situação de crise humanitária. Sem desconsiderar as dificuldades para a aquisição de alimentos e medicamentos que esses ataques causaram, no país trabalho de rotina, atividades educacionais e recreativas estão se desenvolvendo normalmente. Apesar do ataque criminoso contra o povo da Venezuela, mais de 2,5 milhões de casas foram construídas nos últimos 6 anos, não foi fechado um único hospital ou escola, as empresas de alimentos e remédios ainda estão operando em nosso território. A Venezuela continua ocupando o primeiro lugar como o país menos desigual da América Latina, segundo dados da CEPAL.
São indicadores que mostram que apesar das dificuldades causadas pela guerra econômica, a Venezuela não está em situação de crise humanitária, portanto, não requer ajuda humanitária.
Nós, venezuelanos, exigimos que os ataques cessem, que as sanções e o bloqueio sejam interrompidos e que eles parem com o ataque à nossa moeda.
Guerra econômica: crime contra a Humanidade
O bloqueio financeiro e econômico contra um país, que promove um embargo comercial, retêm suas divisas, apropria-se de seus ativos e ataca a sua moeda, não só viola todas as normas internacionais, mas também constitui crimes contra a humanidade, conforme definido pelo Estatuto de Roma.
Alfred de Zayas, especialista independente sobre a promoção de uma ordem internacional democrática e equitativa da ONU, visitou a Venezuela em novembro de 2017, reuniu-se com todos os setores da sociedade e produziu um relatório no qual que afirma que “A solução para a 'crise' venezuelana está nas negociações de boa fé entre o governo e a oposição, o fim da guerra econômica e o fim das sanções”.
De Zayas sugeriu aos Estados Partes do Estatuto de Roma “reconhecer os crimes geopolíticos, incluindo medidas coercitivas unilaterais e manipulações monetárias que induzem a hiperinflação, como crimes contra a humanidade”. Ele afirma que “a guerra econômica, os embargos, os bloqueios financeiros e os regimes de sanções são equivalentes a crimes geopolíticos e crimes contra a humanidade nos termos do artigo 7 do Estatuto do Tribunal Penal Internacional”, por serem cometidos como parte de um ataque generalizado e sistemático contra uma população civil e com conhecimento de tal ataque.
Estes ataques econômicos que o imperialismo tem colocado em prática sempre que ele se sente ameaçado com a possibilidade de que se consolide um modelo de justiça social, a igualdade, a garantia dos direitos humanos para toda a população, transcendem em tempo e espaço às fronteiras venezuelanas. Aconteceu com o projeto socialista de Salvador Allende no Chile entre 1970 e 1973, ou o da revolução sandinista na Nicarágua na década de 1980, ou em Cuba desde a década de 1960 até os dias atuais.
Assim disse Allende em seu discurso na Assembléia Geral da ONU em 04 de dezembro de 1972, no qual ele denunciou que seu país estava sendo atacado, o discurso no qual, aliás, poucos acreditavam:
“O porta-voz do Grupo African declarou que o seu grupo se solidarizava totalmente com o Chile porque não era uma questão que afetava apenas uma nação, mas potencialmente todo o mundo em desenvolvimento. Essas palavras têm grande valor, porque significam o reconhecimento de todo um continente, que através do caso chileno se levanta uma nova fase da batalha entre o imperialismo e os fracos países do Terceiro Mundo“(grifo nosso).
É hora que estas ações coercitivas do imperialismo não sejam apenas reveladas e denunciadas perante o mundo, mas também reconhecidas como crimes contra a humanidade.
Nós, venezuelanos, não precisamos de ajuda humanitária, o que nós reivindicamos é justiça para impedir a impunidade das declarações como as oferecidas pelo porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, que disse, ao abordar a eficácia das medidas coercitivas unilaterais:
“A campanha de pressão contra a Venezuela está funcionando As sanções financeiras que impusemos (…) obrigaram o governo a cair em default, tanto na dívida soberana quanto na dívida da PDVSA, sua petroleira. E o que estamos vendo (…) é um colapso econômico total na Venezuela. Então nossa política funciona, nossa estratégia funciona e nós a manteremos”.
Reconhecer medidas coercitivas unilaterais e o ataque à moeda como crimes contra a humanidade seria um passo importante para a estabilidade e a paz mundial.
Neste aspecto, a ONU tem, há décadas, uma grande dívida.
*Pascualina Curcio é professora da Universidad Simón Bolívar, economista e doutora em Ciência Política.
Nota da edição: O presente artigo foi apresentado à FUNDALATIN no marco da 40ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU e da visita da Comissão Técnica enviada à Venezuela pela Alta Comissária dos Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet.
Edição: Versão para o português: Luiza Mançano