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Quanto mais rico, menos imposto

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Pedro Rafael Vilela*

Crédito: Marcos Santos/USP Imagens Crédito: Marcos Santos/USP Imagens

No Brasil, apenas 71 mil pessoas concentram 22% de toda a riqueza declarada. Sistema tributário preserva esse privilégio.
A Receita Federal divulgou recentemente os dados das declarações do imposto de renda das pessoas físicas, entre 2008 e 2014. As informações escancaram a impressionante desigualdade econômica da população brasileira. O número de contribuintes com renda mensal acima de 160 salários mínimos (ou que ganham mais de R$ 1,3 milhão de reais por ano) corresponde a apenas 0,3% do total. É uma pequena elite de 71.440 pessoas, entre os mais de 26,4 milhões de pessoas que declararam o imposto referente ao ano de 2013.
Esse topo da pirâmide social totalizou rendimentos de R$ 298 bilhões e possui patrimônio de R$ 1,2 trilhão. É tanta riqueza que faz com que essas 71 mil pessoas, que não passam de 0,05% da população economicamente ativa, sejam donas de quase 22% das propriedades, bens e ativos financeiros declarados. Somadas com os outros 136 mil brasileiros com renda acima de 80 salários mínimos por mês, essa elite passa a ser dona de 30% da riqueza no Brasil.

Injustiça tributária

A divulgação desses dados é uma ação inédita do governo. Além de demonstrar a desigualdade de renda, os números denunciam também a injustiça tributária praticada no país. Para se ter uma ideia, essa camada mais rica tem 6,4% de sua renda retida na fonte pela Receita, em média. Já os extratos intermediários, gente que tem rendimentos anuais entre 20 e 40 salários mínimos (R$ 162.420 e R$ 325.440) pagam 11,7% de imposto retido na fonte. No caso do imposto de renda, ele só é progressivo até uma determinada faixa de renda. Quem recebe acima de R$ 4.664 por mês, paga a mesma alíquota de que ganha R$ 10 mil, R$ 50 mil ou R$ 300 mil mensais.
Além disso, a isenção tributária privilegia os mais ricos, já que boa parte dos bens e ativos não recolhem impostos. Um dos exemplos mais clássicos é a isenção para bens de luxo, como iates e aeronaves. Outro flagrante é a não tributação de lucros e dividendos recebidos por acionistas e sócios de empresas. Esse privilégio foi assegurado em 1996, durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), sob o argumento de que o lucro já era tributado ao nível da empresa e não poderia ser taxado duas vezes. Ocorre que, entre as 34 nações desenvolvidas que formam parte da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), apenas a Estônia garante essa isenção. Como resultado desse esquema, cerca de 40% da carga tributária brasileira, atualmente, é composta por impostos indiretos, que são aqueles embutidos nos produtos de consumo, que acabam pesando no bolso dos mais pobres. A população de baixa renda e as classes médias comprometem 32,8% dos seus rendimentos com impostos, enquanto os 10% mais ricos gastam 22,7% da sua renda com tributos.
Para o economista Rodrigo Orair, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as informações sobre imposto de renda demonstram que a desigualdade é ainda muito maior do se pensa no Brasil. “O grande problema é a tributação do consumo, que compromete quase tudo que os mais pobres ganham, e a profunda a diferença com os mais ricos”, analisa.

Países ricos taxam os seus riscos

O Brasil vai na contramão da maioria dos países mais ricos e desenvolvidos do mundo. Em média, a tributação total da renda representa, em termos de carga tributária, 57% do total nos Estados Unidos, 64% na França e 48% na Alemanha. Significa que, proporcionalmente, os mais ricos pagam mais impostos e os mais pobres pagam menos. Nesses mesmos países, a carga tributária sobre a produção e consumo, que é igualmente paga por ricos e pobres através dos produtos, e não passa de 18% nos EUA ou de 25%, na França. Já no Brasil, corresponde a mais da metade. Por outro lado, o imposto sobre os rendimentos é tímido em nosso país, não ultrapassa 35% da carga tributária.
“As pessoas reclamam de ter que pagar imposto de renda, IPTU, IPVA, mas não vê que tá pagando muito mais de ICMS, IPI, confins, de forma invisível sobre o consumo”, exemplifica Rodrigo Orair, economista do Ipea. Isso afeta também a competitividade da economia, pois tornam os custos de produção e, consequentemente, dos produtos, muito mais caros no mercado brasileiro, penalizando a população mais pobre.

Grandes fortunas

Mestre em Finanças Públicas e ex-secretário de Finanças da prefeitura de São Paulo, Amir Khair propõe o imposto sobre grandes fortunas (IGF), como uma das formas de fazer justiça tributária e aliviar os impostos que incidem sobre os mais pobres. Em entrevista concedida à revista Carta Capital, Khair estipulou que o governo poderia arrecadar mais de R$ 100 bilhões de reais em impostos se implantasse a taxação das grandes fortunas. Esse valor é muito superior ao que o governo Dilma quer economizar esse ano (cerca de R$ 66 bilhões) como parte do ajuste fiscal.
Na avaliação do economista, se os patrimônios acima de R$ 1 milhão fossem taxados (com uma alíquota baixa, de até 1%), no máximo 5% da população brasileira seria atingida e, como resultado, o governo poderia aliviar a carga tributária sobre o consumo, que no Brasil é uma das mais altas do mundo. “Quando você tem uma tributação mais equilibrada, como nos países desenvolvidos, essa tributação sobre o consumo não excede 30%, e você tem bens a preços melhores para o consumo da população”, analisa.
*Agência Brasil de Fato, de Brasília.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

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