Figura controvertida – profeta para uns, charlatão para outros; idolatrado e odiado por igual –, Oleksiy Arestovych, conselheiro do Escritório da Presidência ucraniana sem chegar a formar parte do entorno mais próximo do mandatário Volodymyr Zelensky, apresentou nesta terça-feira (18) a sua demissão.
A causa: as declarações que fez na noite do sábado anterior, que provocaram um enfrentamento verbal com a cúpula do exército e deixaram a impressão de que o governo da Ucrânia carece de uma só política em matéria de informação sobre o que ocorre na guerra, ao mesmo tempo que permitiram à Rússia responsabilizar a defesa antiaérea ucraniana de haver causado a destruição do edifício multifamiliar no sábado (14) na cidade de Dnipro.
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Pelo menos assim foi interpretado que Arestovich deslizava a possibilidade de que a tragédia de Dnipro podia ser devida a que as forças de defesa antiaérea derrubaram um míssil russo identificado como X-22, criado no fim dos anos 60 do século passado, por suas características de voo, para atacar porta-aviões dos Estados Unidos.
O porta-voz do exército, Yuri Ignat, o descartou de maneira categórica ao ver-se obrigado a reconhecer, pela primeira vez, que a Ucrânia não tem recursos técnicos para neutralizar esse tipo de artefato. Segundo os especialistas, nos onze meses de guerra, a Rússia já lançou 210 mísseis desse tipo, a partir de bombardeiros pesados TU-22M e contra objetivos em cidades, o que, na sua opinião, diminui sua precisão.
Esta falta elementar de coordenação na hora de informar – no contexto de uma tragédia que terminou com cifras, até o meio dia desta terça-feira, quando se deram por terminados os trabalhos de resgate, com 45 mortos, dezenas de feridos e 19 desaparecidos – gerou uma inusual polêmica na cúpula ucraniana que acabou de modo abrupto com a renúncia de Arestovich.
“Acabo de apresentar minha renúncia. Quero dar exemplo de comportamento civilizado: quem cometa um grave erro, deve se demitir”, publicou em sua conta do Facebook, junto com uma foto da carta redigida à mão que dirigiu ao titular do Escritório da Presidência, Andriy Yermak.
@arestovych via Twitter
Ao despedir-se do cargo, Arestovich deixou uma mensagem nas redes sociais para seu clube de seguidores incondicionais
A diretora de administração e pessoal do Escritório do Presidente, Maria Vytushok, já assinou a ordem de cessação de Arestovich, de acordo com o portal noticioso do jornal Ukrainskaya Pravda.
Ainda na segunda-feira (16), diante do coro de vozes que pedia nas redes sociais sua destituição por “dar ao inimigo a possibilidade de usar suas palavras como prova de que não teve nenhuma culpa” na tragédia de Dnipro, Arestovich admitiu ter-se equivocado “ao não comprovar a informação” antes de participar no programa noturno “Feiguin Live”, que é transmitido pela Internet e pertence ao advogado e defensor dos direitos humanos russo Mark Feiguin, exilado em Kiev.
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“Simplesmente, estava cansado. 320 dias de transmissões noturnas direto, além do resto do trabalho, falta de sono permanente, tensão todo o tempo, viagens constantes, infinidade de encontros todos os dias e… antes do programa de Feiguin me fechavam os olhos e mal podia mover a língua”, afirmou Arestovich, mas as demandas de sua destituição continuaram com mais intensidade.
O deputado da Rada, Aleksei Goncharenko, deu a conhecer que começou a reunir firmas para exigir a destituição de Arestovich e solicitou ao comando do exército verificar se o conselheiro “cometeu traição à Pátria”.
Na noite de segunda-feira, Arestovich foi de novo ao programa de Feiguin para se desculpar com os familiares das vítimas da tragédia de Dnipro e lamentou que “os inimigos da Ucrânia tenham dado tanta importância às suas palavras”, sem outro propósito que, em sua opinião, causar mais dano.
Convertido em um ativo tóxico para Zelensky, a demissão de Arestovich estava cantada. Ao despedir-se do cargo – não da possibilidade de seguir opinando na televisão e na Internet sobre o que acontece em seu país, mas em qualidade de “ex-conselheiro” – Arestovich deixou nesta terça-feira essa mensagem nas redes sociais para o clube de seus seguidores incondicionais:
“Na vez passada quando pedi demissão (como porta-voz da delegação ucraniana nas negociações de Minsk, depois de outro escândalo), mês e meio mais tarde começou a guerra. Veremos o que vai acontecer agora”.
Juan Pablo Duch | Correspondente do La Jornada em Moscou.
Tradução: Beatriz Cannabrava.
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