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Republicanos rejeitam evidências de golpe e engolem ideia de "caça às bruxas" a Trump

Para o ex-presidente, cada acusação e investigação fazem parte de um jogo de politicagem, uma conspiração para usar o poder judicial para fins políticos
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

Donald Trump foi formalmente acusado na terça-feira (1) de quatro delitos criminais federais por sua tentativa de reverter a eleição de 2020 violando os direitos dos eleitores. Esta é a terceira acusação formal anunciada nos últimos cinco meses – antes de março, nenhum ex-presidente estadunidense havia sido formalmente acusado de crimes.

A acusação registrada nesta terça-feira ante um tribunal federal em Washington pelo promotor especial federal Jack Smith do Departamento de Justiça inicia com um resumo categórico: “Apesar de haver perdido, o acusado estava determinando manter-se no poder”. Afirma que durante mais de dois meses depois da eleição de 2020, o acusado difundiu “mentiras” sobre fraude eleitoral, e que “o acusado sabia que eram falsas”. 

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Os quatro delitos são: conspiração para violar direitos civis protegidos por lei; conspiração para defraudar o governo; obstrução de um procedimento oficial; e conspirações para obstruir um procedimento oficial. As primeiras duas acusações levam a condenações de até 5 anos de prisão, as outras duas de até 20 anos se for declarado culpado em um julgamento. 

“Cada uma dessas conspirações – que foram construídas sobre a desconfiança ampla que o acusado estava criando através de mentiras generalizadas e desestabilizadoras sobre fraude eleitoral – atacou uma função básica do governo federal dos Estados Unidos: o processo da nação de captar, contar e certificar os resultados da eleição presidencial”, afirma a acusação formal.

6 co-conspiradores

A acusação menciona ainda que Trump tinha seis co-conspiradores, mas não os identificou, levando à especulação de que serão acusados em breve.

Nestes últimos meses, jornalistas nos EUA tiveram que se acostumar a repetir a frase “nunca antes”. Mas de fato, nunca antes na história do país se viu um caso onde um presidente e seus cúmplices tentaram o que em essência é um golpe de Estado: as acusações detalham um esforço de usar o poder para subverter um processo eleitoral e violar o princípio democrático fundamental da transição pacífica do poder executivo com o objetivo de manter-se no poder, tudo contra a vontade do eleitorado.

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A acusação é resultado de uma intensa investigação da equipe do promotor federal durante aproximadamente oito meses, a qual foi antecedida por uma intensa investigação de um ano realizada por uma comissão especial do Congresso, ambos girando em torno do que ocorreu nos dois meses entre a eleição presidencial de novembro de 2020 e o assalto ao Capitólio por fanáticos convidados por Trump para tentar frear a certificação dos resultados da eleição. 

Apesar desta grave acusação sem precedentes, por ora, para dezenas de milhões de pessoas neste país, Trump deveria ser reeleito em 2024. O presidente da câmara baixa, o republicano Kevin McCarthy, que de acordo com a Constituição é o terceiro em linha para a presidência, imediatamente reagiu à notícia declarando que esta acusação era um intento de distrair o público da corrupção do governo de Biden e um esforço para descarrilar a campanha presidencial de Trump, algo que outros republicanos (embora não todos) repetiram. Talvez mais alarmante para opositores de Trump é que as pesquisas realizadas depois do anúncio das acusações criminais contra o ex-presidente em outros casos registraram um crescente apoio.

Para o ex-presidente, cada acusação e investigação fazem parte de um jogo de politicagem, uma conspiração para usar o poder judicial para fins políticos

A terceiro acusação formal contra Trump foi apresentado pelo promotor local de Manhattan

Três acusações e outra pendente

Por ora, Trump enfrenta duas acusações formais federais, ambas formuladas pelo mesmo promotor Smith, um veterano muito reconhecido do Departamento de Justiça que foi indicado para os casos pelo procurador-geral Merrick Garland. Além da anunciada nesta terça-feira, uma primeira acusação formal foi apresentada contra Trump em junho por seu manejo ilegal de documentos oficiais de segurança nacional secretos, e por suas tentativas de obstrução nesse caso. O julgamento sobre essa questão está programado, por ora, para maio de 2024. 

A terceira acusação formal contra Trump foi apresentada pelo promotor local de Manhattan que gira em torno de pagamentos ilegalmente contabilizados que fez a uma estrela da pornografia em troca de seu silêncio antes da eleição de 2016. 

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Ao mesmo tempo, tudo indica que Trump está por enfrentar sua quarta acusação criminal pela promotora do condado de Fulton, na Geórgia, que indicou que concluiu sua investigação sobre os esforços do ex-presidente de subverter os resultados eleitorais no referido estado, território chave em determinar a eleição nacional em 2020. As autoridades em Atlanta colocaram grades de metal e outras medidas de segurança para preparar o que se supõe que será o anúncio dessa acusação ainda este mês.

Reação costumeira

Trump reagiu à notícia de sua terceira acusação com seu costumeiro ataque sobre todos os que se atrevem a acusá-lo ou criticá-lo, denunciando que é a continuação de uma “caçada às bruxas” contra ele e que tudo é parte de uma tentativa de frear sua campanha para retornar à Casa Branca nas próximas eleições de 2024. Denunciou que esta acusação é parecida a ações da “Alemanha Nazista dos anos 30, da Ex-União Soviética” e outros “regimes autoritários”, acusou de corrupção o Departamento de Justiça e declarou que será reeleito à Casa Branca para “salvar nosso país”.

Para Trump, cada acusação e investigação fazem parte do jogo de politicagem. Por isso tem buscado convencer que as acusações são parte de uma grande conspiração para usar o poder judicial para fins políticos. Mas as investigações deixam evidente que são esmagadoras as evidências de que o ex-presidente cometeu múltiplos delitos graves, muitos deles sem precedentes, durante sua estância na Casa Branca, como outros quando foi empresário e candidato. 

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No entanto, e ante a incredulidade de alguns especialistas e inclusive inimigos do presidente dentro de seu próprio partido, as pesquisas mais recentes registram que continua sendo o republicano mais poderoso do país. Em uma sondagem do New York Times/Siena realizado na última semana, Trump esmaga seus concorrentes pela nominação da candidatura presidencial republicana ao gozar de uma vantagem de 37 pontos sobre seu rival mais próximo, o governador da Florida, Ron DeSantis, e ganhando por mais de 50 dos outros cinco que estão por ora na contenda dentro de seu partido. 

Ainda mais preocupante para os democratas, na mesma sondagem: Trump está empatado com o presidente Joe Biden em uma disputa hipotética entre os dois se a eleição fosse celebrada hoje.

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Ao mesmo tempo, alguns analistas assinalam que o impacto acumulativo de tantas acusações formais poderia começar a minar o apoio de Trump entre certos setores, incluindo eleitores não alinhados moderados que serão chave em determinar a próxima eleição. 

Porém, o processo eleitoral está apenas se iniciando e as eleições gerais programadas para novembro de 2024 estão muito longe. Seguramente haverá muito mais coisas que “nunca antes” se viram.

David Brooks | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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