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Resplandece a figura de Sandino na Nicarágua

Gustavo Espinoza M.

Tradução:

Gustavo Espinoza M. (*)

Resplandece a figura de Sandino na NicaráguaHoje, depois de 36 anos dos históricos acontecimentos de julho de 1979 que demoliram uma das ditaduras mais cruéis que existiram em nosso continente – a Dinastia dos Somoza – pode–se dizer que na Nicarágua resplandece a figura de Sandino.

Desenhando sua imagem do alto de uma montanha, o perfil do combatente assassinado em 1934 pelos esbirros do Somozismo ilumina a cidade a cada noite e a projeta dia a dia. Em cada experiência de vida na bela pátria de Rubén Darío, assoma o rosto de Sandino e seu olhar projeta um esperançoso porvir para seu povo

Visitei Nicarágua pela primeira vez, convidado pela FSLN – Frente Sandinista de Libertação Nacional, para o 36º aniversário da vitória da Revolução de 1979 e tive a oportunidade de percorrer uma grande parte do país, conhecer a capital e comparecer, adicionalmente, a encontros muito gratos e eventos de primeiro nível.

A delegação estava integrada pelo ex-congressista e recente embaixador peruano em Cuba, Víctor MayorgaManuel CabanillasCesar BerríosMarcela Pérez Silva, embaixadora da Nicarágua no Peru foi a promotora da visita.

Compartilhando a historia

Nossas atividades foram intensas desde a tarde em que chegamos a Manágua. Por iniciativa de Marcela, e com ela como guia, visitamos a chamada Praça da Revolução onde existe ainda o antigo Palácio Nacional, que foi a sede do Congresso tomada pelo Comando “Rigoberto López Pérez” em junho de 1978. Ali estivemos na tumba de Carlos Fonseca, caído em combate em novembro de 1976, três anos antes da vitória; e de Tomás Borge, poeta e guerrilheiro.

Tivemos a satisfação de partilhar experiências com um qualificado núcleo de combatentes peruanos que lutaram na guerra libertadora da Nicarágua entre 1976 e 1979: Luis Varese, Eloy Villacrez  e Luis García. Eles também foram convidados e muito justamente reconhecidos como Heróis da Pátria por sua participação, naqueles anos, nas tarefas da Frente Sul.

Esteve conosco um conjunto de personalidades de diversos ambientes. Devemos citar a Fernando Lugo e Manuel Zelaya, os mandatários derrocados no Paraguai e em Honduras; Vinicio Cerezo, o ex-presidente da Guatemala; Rigoberta Menchú, Prêmio Nobel da Paz; e representantes de muitos países de distintos continentes.

No sábado, dia 18 visitamos Rivas, província do sul, na fronteira com a Costa Rica. Em sua capital, Tola, uma sentida homenagem a um Sacerdote Guerrilheiro, Gaspar García Laviana, padre e poeta asturiano que se somou à ação armada e entregou sua vida combatendo. Em seguida, a visita a uma linda praia na costa do Pacífico e depois a uma Usina de Energia Eólica construída com apoio venezuelano.

Em Nicarágua, é sempre 19

Todos foram à Praça da Fé no domingo 19 de julho, para uma verdadeira festa de massas. Em torno de 800.000 pessoas vieram de toda parte, com infinitas demonstrações de alegria. É a primeira vez que vejo tanta gente atrás de uma só bandeira. Em outras partes vi pouca gente atrás de muitas bandeiras… disse uma jornalista argentina que estava perto de nós.

E é verdade: milhares e milhares de bandeiras tremulavam na praça, mas apenas duas: a da Nicarágua com suas listas azuis e seu vigoroso branco e a da Frente com sua Vermelha e Negra expressão de combate. E 14 “árvores da vida”, vistosas construções metálicas de muitas cores que adornam e enfeitam o palco. E roupas multicoloridas, dança e alegria por toda parte.

Intervenções? Poucas. A saudação do Vice-presidente do Conselho de Estado Cubano, que chegou acompanhado dos 5 Heróis que foram prisioneiros do Império até dezembro passado. Em seguida, a mensagem do Cardeal Obando. E depois, muitas canções e uma chuva persistente. Tudo em prelúdio ao discurso esperado, o do Comandante Daniel Ortega, jubilosamente recebido por seu povo.

A intervenção do mandatário não foi extensa, nem tediosa. Não conteve cifras de sucesso, nem avaliações otimistas. Foi simples, direta e clara. E aludiu tanto ao panorama mundial quanto à necessidade de afirmar o caminho Cristão, Socialista e Solidário do processo. “Fé, família e Comunidade”, foram consideradas suas bases essenciais. Insistiu em uma política interna e externa e valores baseados na dignidade e na justiça e exigiu do governo dos Estados Unidos o respeito aos Direitos Humanos de sua própria população.

Com Tomás, e com os 5

Depois do dia 19, nossas atividades foram ainda mais intensas e as emoções maiores. Na segunda, dia 20, participamos na colocação de flores em homenagem a Tomás, e depois em um evento similar na Escola que tem seu nome, na Colina de Manágua. Mesmo sendo feriado, fomos recebidos pelo Diretor, professores e trabalhadores do Centro Educativo que nos contaram dos avanços em seu trabalho.

Logo depois tomamos o caminho de Masaya, para visitar o vulcão Santiago, famoso por suas crateras ainda ativas. Fomos de carro por um bom trecho e depois percorremos à pé até o cume. Mas foi em Masaya que tivemos um encontro muito emotivo: quando estávamos terminando nossa visita, chegou uma comitiva especial: os 5 Heróis Cubanos Prisioneiros do Império.

Assim, tivemos a satisfação de abraçar Gerardo e Adriana; Ramón e sua esposa; Antonio e sua mãe, nossa querida Irma; René e Olga, e Fernando, hoje Vice-presidente do ICAP. Reencontro, claro, pois estivemos juntos em Havana em abril e maio passados. E o encontro de hoje foi uma nova ocasião de sentir-nos próximos a tão notáveis figuras da história contemporânea.

Depois, uma visita à cidade a Masaya para conhecer sua vivacidade, suas alegrias e suas atividades artesanais e mercantis. Nos anos 70 foi um centro muito ativo e heróico na luta revolucionária. Hoje é um fervente centro de compra e venda de produtos. O artesanato é o mais rentável de seus negócios, mas os produtos perecíveis não ficam atrás: frutas, alimentos e bebidas ocupam um lugar preferencial para os visitantes que recorrem em massa uma região paradisíaca, na qual o turismo é uma importante fonte de renda.

Um reencontro com a história

Na terça, dia 21, tivemos uma amena conversação com Carlos Fonseca Terán, filho do fundador da FSLN e atual Vice-secretário de Relações Internacionais da Frente. Seu olhar agudo, firmeza expressiva e sua transparência geram confiança.

Eu tive a sorte de conhecê-lo anteriormente. Estivemos juntos também em Caracas, em outubro de 2012, com motivo da última eleição presidencial que confirmou Hugo Chávez como Presidente da Venezuela Bolivariana. Naquela ocasião não houve a conversa que eu tinha em mente, por causa do conjunto de tarefas que ambos tivemos que cumprir, de modo que meus interesses ficaram pendentes, mas se resolveram amplamente em Manágua.

Carlos foi respondendo com calma e paciência, uma a uma de nossas inquietudes referentes ao processo, à história, aos avanços e às lutas. Também aos reveses, e às experiências acumuladas em muitos anos de tensão.

Sem qualquer sectarismo, alheio a qualquer expressão de soberba, e com o maior espírito construtivo foi burilando o perfil da atual sociedade nicaraguense, na qual cada segmento social é importante e merece a atenção prioritária do governo. Estender os benefícios e encarar a problemática de cada qual constitui, em essência, a preocupação fundamental do governo nesta etapa.

Contou-nos o que viveu, mas também o que conheceu de outras fontes e o que estudou em sua pátria já liberada. E nos mostrou uma infinita confiança na capacidade de vitória de seu povo. Absolveu todas as dúvidas que pudéssemos haver tido.

Suas palavras sempre foram confirmadas por nossas observações. Na Nicarágua de hoje, efetivamente, a alegria do povo se gesta na forja de realizações concretas, tangíveis e imperecíveis.

III Encontro de Solidariedade

Tivemos também a possibilidade de intervir no III Encontro de Solidariedade com a Nicarágua Sandinista, organizado pelos Comitês da Europa. Participaram representantes de quase todos os países do velho continente incluindo Alemanha, França, Itália, Rússia. Espanha, Portugal, Noruega, Suécia. Bélgica e outros. Mas também Coréia, China e Vietnã.

Pela parte peruana, no dia 20 fez uso da palavra Victor Mayorga e a mim correspondeu o dia 21. Desse modo nosso aporte ficou registrado nos documentos aprovados pelo evento, que tornará a se reunir na Suécia em 2016.

A Declaração de Solidariedade com a Nicarágua Sandinista aprovada em Manágua constitui um sólido reconhecimento ao direito soberano desse país à construção de um Canal Interoceânico que tanto medo provoca no exterior. Esse medo é usado como modo de intimidar os camponeses da zona aos quais se pretende convencer dos “danos ecológicos” da referida obra.

Hoje, o tema do Canal está no centro do interesse da Nicarágua e forma parte também das vagas campanhas da oposição que buscam frustrar o projeto como uma maneira de promover o “fracasso” dos planos oficiais, aspiração que certamente estará fadada à derrota.

Com Daniel Ortega

O momento culminante de nossa visita foi certamente o encontro com o Comandante Daniel Ortega, Presidente do país.

Aconteceu na noite da terça, dia 21 e formou parte do encerramento do III Encontro de Solidariedade. Localizados na primeira fila, em companhia de outros convidados especiais, pudemos apreciar em toda a sua magnitude o desenvolvimento do evento em que o “prato forte” era, sem dúvida, a presença e participação do condutor do processo Sandinista.

De fala pausada e austera, Ortega surpreendeu a todos saudando a um grande número de participantes por seu nome e sobrenome. País por país, Comitê por Comitê e pessoa por pessoa foi citando e promovendo aplausos para cada um dos amigos da Nicarágua Sandinista ali presentes, Pelo Peru, depois de mencionar elogiosamente a Marcela Pérez Silva, sua embaixadora em Lima, mencionou um por um os integrantes da delegação e em seguida os guerrilheiros internacionalistas reconhecidos como Heróis por seu Governo.

Depois fez uma exposição detida e clara em torno aos processos que se vivem em nosso tempo: a crise do capitalismo, a política ianque, os assuntos internos nos Estados Unidos, as dificuldades da Europa, a crise Grega, o renascimento do fascismo, os perigos que fluem hoje em matéria de ecologia, os acontecimentos da América Latina, a ofensiva imperial contra a Venezuela e o Equador, as manobras contra a estabilidade política no Brasil, e os planos de dominação ianque que ameaçam nosso continente.

Finalmente, resumiu os avanços conseguidos em seu país e renovou o compromisso de afirmar as mudanças, assegurando sempre que a luz de Sandino ilumine o caminho do povo da Nicarágua como parte do combate continental pela libertação e o socialismo.

Um país que merece viver em paz

Depois de haver padecido a oprobiosa ditadura dos Somozas por quase 40 anos e depois de uma guerra sangrenta e prolongada, hoje a Nicarágua conhece os caminhos da paz e transita por um mundo de equilíbrio, dignidade e justiça.

A bandeira de Sandino ondeia ereta nas colinas de Manágua, aonde chegou para ficar.

 

*Colaborador de Diálogos do Sul, de Lima, Peru.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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