Pesquisar
Pesquisar

Retirada de tropas russas de Kherson pode camuflar estratégia contra exército ucraniano

Recuo parcial não é o final da guerra e nem sequer equivale a abandonar a maior parte da região sob controle russo
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

No que pode se tornar – a menos que seja um estratagema para estender uma armadilha ao inimigo – na até agora maior derrota militar da Rússia na Ucrânia, o ministro de defesa russo, Serguei Shoigu, ordenou no último dia 9 a retirada de todas as tropas e armamentos para o outro do Dnieper na região de Kherson, decisão que implica abandonar a zona completa da margem direita do rio, incluída a capital regional homônima, em mãos do exército russo desde começo de março passado. 

Este recuo parcial não é o final da guerra e nem sequer equivale a abandonar a maior parte de Kherson. Para pôr em cifras, a Ucrânia pode recuperar cerca de 62 mil km² de território. 

Assista na TV Diálogos do Sul

Mas a Rússia, ainda que perdendo quase 5 mil km da zona de Kherson, continua tendo 65 mil km de solo ucraniano ocupado, sem contar os 43.500 km da Crimeia e um terço de Donetsk e Lugansk que tem desde 2014.

No entanto, a retirada parcial de Kherson pela Rússia tem grande simbolismo por se tratar da única capital regional da Ucrânia que desde o começo de março passado se encontrava em mãos do exército russo e apenas 41 dias após a Rússia consumar a anexação desse território, junto como Donetsk, Lugansk e Zaporiyia, sem ter sob seu controle a totalidade de nenhum dos quatro. 

Nesse sentido, é um duro golpe para a imagem do Kremlin que havia proclamado Kherson como parte da Federação Russa e, também, para a moral das tropas russas e seus generais, já severamente criticados quando optaram pela retirada na região de Kharkov ou no falido intento, nos primeiros dias da invasão, de assaltar a capital ucraniana, Kiev. 

Recuo parcial não é o final da guerra e nem sequer equivale a abandonar a maior parte da região sob controle russo

Ministério da Defesa Russo
Surovikin ordenou redobrar os ataques russos nas frentes de Donetsk e Lugansk




Situação da frente de Kherson

A televisão pública russa fez na tarde do dia 9 uma conexão com o centro de comando das tropas do que aqui continuam chamando de “operação militar especial”, na qual o general Serguei Surovikin explicou ao ministro Shoigu a situação da frente de Kherson e sugeriu iniciar a retirada das tropas como “medida tática” para a margem direita, também chamada ocidental, do rio Dnieper, para fortificar-se e trasladar parte dos efetivos a outras frentes de combate em Donetsk e Lugansk.

“Estou de acordo com suas conclusões e recomendações. Proceda a começar esta retirada”, ordenou Shoigu no fragmento transmitido pelos distintos canais de televisão, após escutar um presumível balanço de êxitos e fracassos de Surovikin, o qual disse que o “mais importante é salvaguardar a vida de nossos combatentes, além de que há fortes problemas logísticos e os fornecimentos são cada vez mais difíceis”. 

Assista na TV Diálogos do Sul

Desde que há dias começou a evacuação dos habitantes da cidade de Kherson e dos povoados vizinhos, o que as autoridades ucranianas consideram “deportação” para a Rússia, funcionários de ambos os países alertaram que estava para começar a “grande batalha por Kherson” (a estratégica capital da região de igual nome) e um deles, o vice-governador imposto por Moscou, Kiril Stremousov, em trágica coincidência perdeu a vida também no dia 9, aparentemente em um acidente de trânsito. 

Do lado da Ucrânia, ninguém duvida que a retirada russa se deve à ofensiva de seu exército, que ameaçava rodear os cerca de 12 mil soldados russos entrincheirados em Kherson, debacle que o Kremlin não podia permitir.


Ceticismo

Alguns funcionários ucranianos são céticos, como Natalia Gumeniuk, porta-voz do grupo Sul do exército, e Mikhailo Podolyak, assessor da presidência, que apontaram que só se poderá constatar que as tropas russas se foram de Kherson depois quando houver a bandeira ucraniana nesta capital regional. 

Sustentam que poderia ser uma espécie de armadilha do general Surovikin, uma vez que há dias a inteligência ucraniana têm reportes de militares russos vestidos de civis que, dentro das casas, se preparam a receber não com flores, mas com balas e bombas o exército ucraniano. 

EXCLUSIVO: Um dia em meio à guerra na Ucrânia: bombas, destruição e silêncio

Outros, menos adeptos à teoria da conspiração, creem que, tendo em conta a iminência do inverno que vai dificultar muito para os combates entre russos e ucranianos, a retirada de Kherson, pese o elevado preço que tem para o Kremlin, poderia dar um respiro ao Exército da Rússia até a próxima primavera, uma espécie de pausa tática. 

E para que a retirada não pareça uma humilhação, Surovikin ordenou redobrar os ataques russos nas frentes de Donetsk e Lugansk, onde ambas as partes sofrem numerosas baixas e, ao mesmo tempo, não têm nenhum avanço há várias semanas.

Juan Pablo Duch | Correspondente do La Jornada em Moscou.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Assista na TV Diálogos do Sul


Se você chegou até aqui é porque valoriza o conteúdo jornalístico e de qualidade.

A Diálogos do Sul é herdeira virtual da Revista Cadernos do Terceiro Mundo. Como defensores deste legado, todos os nossos conteúdos se pautam pela mesma ética e qualidade de produção jornalística.

Você pode apoiar a revista Diálogos do Sul de diversas formas. Veja como:


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

LEIA tAMBÉM

Sanchez-Begona-esposa-Espanha
Convocação de Sánchez a depor no caso contra sua esposa alimenta pressão da extrema-direita
Netanyahu_Congresso_EUA
Atos contra Netanyahu no Congresso dos EUA expõem declínio da narrativa sionista
Malnutrition in Zamzam camp, North Darfur
Guerra no Sudão: Emirados Árabes armam milícias, afirma investigação; Espanha dificulta asilo
estudo-Lancet-palestinos
186 mil palestinos assassinados: Lancet divulga estudo alarmante sobre vítimas em Gaza