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Revisão do Plano Diretor: oportunidade para debater um novo modelo de desenvolvimento urbano em São Paulo

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Nabil Bonduki*

As manifestações de junho deixaram uma mensagem clara: apesar da redução da miséria e da ampliação no acesso aos bens de consumo para os mais pobres, entre outros avanços sociais dos últimos dez anos, segmentos expressivos da sociedade, sobretudo a juventude, defendem uma alteração mais profunda do modelo de desenvolvimento do país e a adoção de novos valores e postura dos agentes públicos.
Em São Paulo, a revisão do Plano Diretor Estratégico (PDE), cujo debate está em curso em oficinas e audiências públicas, é uma grande oportunidade para se refletir e optar por novos paradigmas na perspectiva de reverter o modelo insustentável de desenvolvimento urbano da nossa cidade.
Não por acaso, a origem dos protestos foi a mobilidade, que – para além da tarifa que catalisou a insatisfação popular – sintetiza inúmeras questões urbanas resultantes desse modelo: a prioridade para o automóvel; a segregação social, que afasta os mais pobres para regiões distantes dos seus empregos; a desigualdade no território, que gera regiões muito bem servidas de infraestrutura, serviços e empregos e outras desprovidas; a reduzida contrapartida oferecida pela ocupação intensa do solo; a especialização do espaço, que gera especulação imobiliária e zonas de grande concentração de empregos e restrição ao uso residencial; a ocupação irregular das áreas de proteção ambiental e a abertura de condomínios fechados no periurbano, que vem estendendo exageradamente os limites da mancha urbana.
Enfrentar essas questões já foi o objetivo do PDE, que relatei na Câmara Municipal em 2002, elaborando a proposta substituta aprovada. Nele foram estabelecidos objetivos para reverter esse modelo e definidas ações e novos instrumentos urbanísticos para alcançá-los. Apesar de inovador no seu tempo, como um dos únicos planos que tornou aplicáveis os instrumentos criados pelo Estatuto da Cidade, a sua implementação foi interrompida durante os oito anos da administração Serra/Kassab, não alcançando o esperado.
Embora parte significativa do Plano Diretor Estratégico continue válida e deva ser mantida, é necessário incluir temas que ganharam relevância nesses dez anos – redução das emissões de carbono, implementação da política nacional de resíduos sólidos, valorização da rede cicloviária e da acessibilidade universal – e, sobretudo, radicalizar a aplicação de instrumentos urbanísticos e tornar impositivas ações (programas, projetos e obras) focadas no enfrentamento dos objetivos estabelecidos.
Entre outras intervenções, precisamos: radicalizar a aplicação das ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social) para garantir uma massiva produção de habitação social nas áreas melhor urbanizadas; focar o uso dos recursos gerados pela outorga onerosa e operações urbanas na redução das desigualdades socioterritoriais; implantar os novos equipamentos nos distritos mais carentes; evitar as megaobras, que sugam os investidos públicos e geram uma supervalorização do solo que gera expulsão e segregação social; reservar o espaço viário prioritariamente para o transporte coletivo e modos não motorizados, como a pé, em calçadas adequadas e bicicletas.
São sugestões que precisam ser detalhadas e aprofundadas. Sempre é importante lembrar, que tão ou mais importante do que um excelente Plano Diretor é a sua implementação e a gestão da cidade. Por isso, é fundamental estarmos atentos para analisar as intervenções urbanas que estão em curso em São Paulo, com recursos públicos dos três níveis de governo, para avaliar se são coerentes com o modelo de cidade que deve ser contemplada com a revisão do PDE.
*Nabil Bonduki, professor titular do Departamento de Planejamento da FAU-USP e vereador em São Paulo pelo PT. É relator da Lei do Plano Diretor Estratégico.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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