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O Museu do Trabalho está sendo construído em São Bernardo do Campo, município da área metropolitana da capital de São Paulo. Com previsão de abrir ao público em meados de 2013 essa importante iniciativa é descrita por nosso colaborador Ricardo Gaspar*.
O MUSEU DO TRABALHO
Cidades em todo o mundo apostam em características diferenciais que atraiam investidores e turistas. Características estas que podem ser naturais ou criadas pelo homem (construídas). Alegadamente, a requalificação do espaço urbano propiciada pela valorização de tais atributos eleva a autoestima de seus habitantes, bem como a sinergia de atitudes convergentes pode contribuir para um ambiente inovador, produtivo, criativo na cidade. A melhoria da qualidade de vida emerge como produto final esperado. Essa expectativa é algumas vezes atingida, outras não. Para tanto, centros históricos são recuperados, novas áreas para a localização de serviços modernos são disponibilizadas, erguem-se equipamentos icônicos, criam-se marcas real ou supostamente identificadas com a história da localidade, megaeventos são promovidos. Não raras vezes esse aparato de city-marketing serve exclusivamente para beneficiar o capital à custa do erário público, e seus resultados apropriados por uma minoria, sem legado apreciável para a coletividade.
Contudo, este não é o caso do projeto de edificar o Museu do Trabalho e do Trabalhador em São Bernardo do Campo, na região metropolitana de São Paulo, ora em fase de construção e com previsão de inauguração para meados de 2013. Pois, aqui, tal iniciativa tem base na história, vinculada aos trabalhadores que para cá vieram, de diferentes origens, para erguer uma cidade e prestar decisiva contribuição para a construção de um país. O sonho do desenvolvimento fincou aqui sua âncora, o grande ideal moderno da construção nacional plantou neste solo suas sementes. Essa a grande herança, a inestimável marca de São Bernardo, cujos feitos estão vivos na memória e nos fatos.
Testemunha da implantação e transformação de um modelo industrial, da indústria artesanal moveleira para a indústria automobilística fordista, e desta para a reestruturação produtiva com base nas novas tecnologias, lugar da constituição do núcleo principal da classe operária brasileira, São Bernardo merece o reconhecimento de ter se instaurado, historicamente, como cidade protagonista do imaginário, derrotas e vitórias da classe trabalhadora brasileira, cuja expressão paradigmática é a ascensão de um metalúrgico à presidência do país.
É nesse contexto que se insere a edificação do Museu do Trabalho e do Trabalhador em São Bernardo, localizado ao lado do Paço Municipal, bem no centro da cidade. A força da iniciativa é seu conteúdo real de luta e história. A classe operária, que surgira pela industrialização de São Bernardo e do ABC – núcleo fabril ao sul da metrópole paulista, formado por Santo André, São Bernardo, São Caetano do Sul e Diadema -, apareceria, nos anos 1970, como novo sujeito político do país. O interesse do mundo pela emergência – ainda incipiente – de um padrão de crescimento econômico com distribuição de renda no Brasil tem sua referência básica na luta política e sindical de trabalhadores organizados da região. Como tal, é mais que justificado o investimento da Prefeitura de São Bernardo – cujo prefeito (Luiz Marinho, do PT) é também ex-metalúrgico e notável liderança da categoria – nesse equipamento simbólico do espírito empreendedorista que uniu, desde suas origens, imigrantes, populações de outras regiões do país, empresários de toda natureza, comerciantes, profissionais que agregaram saberes especializados ao esforço produtivo, combatentes de lutas pela justiça social, e tantos outros que, juntos, forjaram o destino do país tal como ele hoje se apresenta.
Ouso afirmar que, guardadas as devidas proporções, a iniciativa do Museu do Trabalho e do Trabalhador em São Bernardo pode ter o significado emblemático que teve (e tem) o Museu Guggenheim, em Bilbao, no País Basco. Sem a envergadura e o valor arquitetônico deste, aquele também carrega em si o potencial de alavancar transformações urbanas, com a vantagem de estar umbilicalmente ligado à história da cidade e da região. Porem – é importante sublinhar -, a realização desse potencial está diretamente vinculada ao uso desse equipamento e à concepção espacial do entorno. Ademais, resta a expectativa de que a curadoria do futuro museu incorpore, ao lado da memória consubstanciada em imagens e objetos, o pleno desenvolvimento da interação lúdica dos visitantes com as mudanças tecnológicas que moldaram nossa vida nos últimos cem anos, e uma programação de atividades à altura do significado que a iniciativa tem para São Bernardo, o ABCD e a região metropolitana de São Paulo.
(*) Professor da FEA-PUCSP e Coordenador do Curso de Especialização “Economia Urbana e Gestão Pública” (COGEAE-PUCSP). Colaborador da Revista Diálogos do Sul.