Pesquisar
Pesquisar

Se Brasil sofre epidemia de fome, culpa é do atual governo por arruinar políticas públicas

Segundo levantamento, fome é desproporcionalmente maior entre mulheres, negros, zonas rurais e moradores das regiões Norte e Nordeste
Marcos Hermanson Pomar
O Joio do Trigo

Tradução:

Apenas quatro em cada dez famílias brasileiras têm acesso pleno à alimentação e 33 milhões de brasileiros passam fome, de acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, publicado nesta quarta (08).

São 14 milhões a mais de pessoas com fome em comparação com o último inquérito, realizado em 2020, e um crescimento de 7,2% no número de pessoas em algum grau de insegurança alimentar. 

Este é o pior cenário no século 21 no Brasil. Desde que foi criada a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (Ebia), entre 2003 e 2004, jamais o país atingiu esse patamar de pessoas vivendo em algum dos três graus de insegurança.

Ao todo, são 125 milhões de brasileiros nessa condição, sendo 59 milhões em insegurança leve, 31 milhões em insegurança moderada e 33 milhões em insegurança grave (situação de fome). 

Os números representam, também, uma violação à Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional, que desde 2006 prevê o “direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”.

A pesquisa foi conduzida pela Rede Penssan, formada por pesquisadores em segurança alimentar, e executada pelo Instituto Vox Populi, com apoio de entidades da sociedade civil. Foram ouvidas 12 mil famílias em 577 municípios, de novembro de 2021 a abril de 2022.

Fonte: II Inquérito de Insegurança Alimentar e Covid-19 no Brasil | Arte: o joio e o trigo – A Flourish chart


Recortes

Segundo os dados levantados, a fome é desproporcionalmente maior entre mulheres, pessoas negras, habitantes de zonas rurais e moradores das regiões Norte e Nordeste. 

Um em cada cinco domicílios chefiados por mulheres está em estado de insegurança alimentar – um aumento de oito pontos percentuais em relação a 2020 – contra um em cada dez domicílios chefiados por homens. 

Ao mesmo tempo, domicílios habitados por pessoas brancas registraram um índice de segurança alimentar de 53%, contra 35% de domicílios habitados por pessoas negras.


Fome no Campo

As zonas rurais também são mais afetadas pela fome. Nesses locais, o índice geral de insegurança alimentar chega a 60%, sendo que 18% passam fome. 

Ao mesmo tempo, 21% dos agricultores familiares passam fome – índice maior do que a média brasileira e das áreas rurais. 


Desigualdade Regional

Se o índice de pessoas com fome (insegurança alimentar grave) no Brasil como um todo é de 15%, no Norte e no Nordeste ele chega a 25% e 21%, respectivamente. Ao mesmo tempo, Sul, Sudeste e Centro-Oeste têm médias abaixo do índice nacional.

Fatores como falta de acesso à água (insegurança hídrica), presença de crianças no domicílio e baixa escolaridade também aumentam a prevalência da insegurança alimentar, segundo o inquérito.

Segundo levantamento, fome é desproporcionalmente maior entre mulheres, negros, zonas rurais e moradores das regiões Norte e Nordeste

Palácio do Planalto – Flickr

“Não fazem mais parte da realidade brasileira aquelas políticas públicas de combate à pobreza que, entre 2004 e 2013", lembra especialista




Razões

Renato Maluf, um dos pesquisadores responsáveis pelo Vigisan, aponta a falta de políticas públicas de combate à fome como uma das razões para o aumento vertiginoso dos índices de insegurança alimentar observado nos últimos anos.

“Não fazem mais parte da realidade brasileira aquelas políticas públicas de combate à pobreza que, entre 2004 e 2013, reduziram a fome a apenas 4% dos lares brasileiros”, diz ele. “As medidas tomadas pelo governo para contenção da fome hoje são isoladas e insuficientes”.

Fonte: II Inquérito de Insegurança Alimentar e Covid-19 no Brasil | Arte: o joio e o trigo – A Flourish chart


Contexto

Desde 2019, o Joio vem documentando a extinção de políticas públicas de combate à fome executada pelo governo Bolsonaro.

Entre elas, a extinção do Consea, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – um dos primeiros atos de governo do presidente – a venda de armazéns públicos da Conab e a diminuição dos recursos destinados ao PAA, o Programa de Aquisição de Alimentos, que compra produtos da agricultura familiar e destina a famílias pobres ou escolas públicas.

Confira uma análise aprofundada sobre as características da epidemia de fome que o Brasil enfrenta no episódio “Que Fome é Essa?” do nosso podcast Prato Cheio.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Assista na TV Diálogos do Sul



Se você chegou até aqui é porque valoriza o conteúdo jornalístico e de qualidade.

A Diálogos do Sul é herdeira virtual da Revista Cadernos do Terceiro Mundo. Como defensores deste legado, todos os nossos conteúdos se pautam pela mesma ética e qualidade de produção jornalística.

Você pode apoiar a revista Diálogos do Sul de diversas formas. Veja como:


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Marcos Hermanson Pomar

LEIA tAMBÉM

Malnutrition in Zamzam camp, North Darfur
Guerra no Sudão: Emirados Árabes armam milícias, afirma investigação; Espanha dificulta asilo
El_Salvador_criancas
3 mil presas: Governo Bukele tortura crianças inocentes para assumirem crimes, denuncia entidade
Captura de Tela 2024-07-19 às 20.44
Migrantes enfrentam tragédias em alto-mar: histórias de desespero e sobrevivência nas Ilhas Canárias
Como o acordo frustrado para enviar migrantes do Reino Unido a Ruanda beneficiou o Governo autoritário de Kagame
Acordo cancelado: Ruanda transforma fundos britânicos de deportação em investimentos para o país