Não é casual a descoberta das redes do crime metidas até o tutano das estruturas institucionais do Estado. Não é somente a polícia: o distúrbio vem desde o Exército e seu controle absoluto sobre portos e fronteiras, armamento e aparatos de inteligência. Tampouco é só o Exército, aí estão escondidos os grandes capitais que lhe outorgaram seu pleno respaldo na minuciosa obra de limpeza social e política que acabou com a liderança política durante a Guerra Fria.
Portanto, é muito o que se deve escavar no passado para encontrar uma resposta coerente que explique a situação da Guatemala de hoje, com sua inconcebível maneira de virar a cara à realidade da corrupção, esse modo de justificar a passividade social com o medo às antigas formas de repressão, esse caráter evasivo das classes sociais para excluir-se de toda decisão que transcenda sua capacidade de envolvimento.
“Inimigo é o sistema neoliberal e aqueles que o sustentam”
O inimigo continua aí. Encontra-se no arrevesado argumento com o qual pretendemos nos vitimizar em lugar de agir. Se somos o objetivo de grupos desestabilizadores ou de organizações criminosas, é porque nos colocamos à vontade e os deixamos agir sem a menor resistência. Se a imprensa publica um escândalo depois do outro, comentamos baixinho, fechamos com pedra e lodo as portas para não sentir o impulso de protestar e preferimos concentrar nossa atenção no que virá amanhã nas manchetes.
Qual é a grande diferença entre 75 ou 99,75% de ineficácia do sistema de justiça? Por acaso temos que nos conformar com algo um pouco menos mal ou levemente menos vergonhoso? Guatemala tem os indicadores mais inexplicáveis na América Latina, se tomarmos em conta sua prodigiosa capacidade de enriquecer ilimitadamente aqueles que governam, uma administração após a outra.
Então não há desculpa para ter centros de saúde carentes de tudo, mesmo de serviço de água potável. Não se explica que os policiais comprem suas próprias munições com o miserável salário que recebem. Não é lógico que crianças em idade escolar sofram a vergonha de ter aulas à intempérie sentados sobre pedaços de blocos. Menos explicável ainda é o desperdício de funcionários e deputados, prefeitos e governadores, os quais agem convencidos de sua autoridade para fazer dos fundos públicos seu cofre privado.
Se para tudo isto existe uma solução razoável, é o exercício da cidadania. Único instrumento válido para deter o abuso, exigir o cumprimento das leis, tirar os corruptos dos despachos ministeriais e das cadeiras do parlamento, este formoso conceito é a própria chave do conceito da Nação.
(Escrevi este artigo há 13 anos. Nada mudou desde então)
Carolina Vasquez Araya | Colaboradora da Diálogos do Sul na Cidade da Guatemala.
Tradução: Beatriz Cannabrava.
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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