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Só há uma empresa rentável na Bolívia e ela não é estatal

Há uma empresa sumamente exitosa que não entra na contabilidade do Estado, mas sustenta a economia e oferece à primeira vista uma impressão de bonança
Alfonso Gumucio

Tradução:

A própria informação do governo analisada por especialistas indica que a maioria das empresas administradas pelo Estado (existentes, nacionalizadas ou criadas por Evo Morales), fracassaram por corrupção e má gestão. Há casos mais visíveis que outros, mas não são os mais importantes.

O humilde Evo se imortaliza

Por exemplo, Bolívia é o único país do mundo que não tem um serviço de correios, porque quebrou por excesso de pessoal e falta de uma estratégia inteligente, embora ponham a culpa nas novas tecnologias. Há países pequenos no mundo (Tonga, Hungria, Islândia, Namíbia, entre outros), que há muitos anos, antes da internet, mantêm serviços de correio especializando-se em selos para colecionadores: séries sobre a natureza (aves, peixes, mamíferos, flores) ou sobre tecnologia (história da aviação) entre outros temas. (A foto de Evo não é muito atraente em uma coleção de selos). 

Quipus: nem os masistas as usam

Empresas administradas pelo Estado quebraram ou estão subvencionadas e funcionam no vermelho, como Enatex, Papelbol, Ecobol, Quipus, o Teleférico e outras. O governo nem sequer é bom para supervisionar, como é o caso da Administradora Boliviana de Carreteras (ABC). A Indústria do gás (YPFB) funciona – apesar da corrupção – porque está nas mãos de multinacionais (qual nacionalização?). Boliviana de Aviación (BOA) se mantém apesar de vários percalços técnicos porque as companhias de seguros obrigam a respeitar padrões mínimos de segurança. 

Percalços da BOA, a empresa aérea do Estado

Há uma empresa sumamente exitosa que não entra na contabilidade do Estado, mas sustenta a economia e oferece à primeira vista uma impressão de bonança. Vemos com hipócrita admiração como se erguem centenas de novos edifícios em Santa Cruz ou em La Paz, e aparecem grandes centros comerciais com lojas onde podem ser encontradas as marcas mais chiques e caras do mundo. As avenidas principais das cidades estão repletas de importadoras de veículos, desde os mais luxuosos até os mais baratos. 

Tudo isso é a miragem de uma economia próspera, mas o Estado tem pouco a ver. Em compensação o governo tem muito a ver, porque 67% da economia do país é informal, fora do controle do Estado, mas permitida e estimulada pelo governo porque, precisamente, produz essa miragem de bem-estar da qual uma boa parte da sociedade é cúmplice. 

O narco amauta de Evo: está preso?

A vendedora do mercado de Achumani que vai duas vezes por ano à Nicarágua para trazer rum Flor de Caña ou o importador legal de Johnnie Walker sabem que são parte da engrenagem paralela da economia boliviana que se nutre do contrabando e do narcotráfico, com muitas notas verdinhas circulando. 

Nessa economia informal, a cocaína é a que gera mais recursos convenientemente “lavados e passados” através de construções, vendas de autos   e outros negócios aparentemente legais, mas que não foram objeto de auditorias porque não convém ao governo fazê-las, nem aos donos desses negócios. No fundo todos estão felizes de que as coisas continuem como estão. Em privado falam pestes do governo, mas nos fatos são cúmplices. 

Antes, eram necessários 300 quilos de folha de coca para produzir um quilo de cocaína, mas agora com as modernas lavadoras e secadoras já não é necessário que uns pobres camponeses queimem os pés pisando coca e químicos. As “novas tecnologias” permitem tirar o mesmo quilo de droga de apenas 100 quilos de folha. 

A produção de 350 a 400 toneladas de cocaína por ano indica que as capturas tão publicitadas representam uma porcentagem mínima. Os Estados Unidos já não são o principal mercado, mas sim o Brasil, com uma grande fronteira permeável e bom poder aquisitivo (o Real continua forte). 

Evo Morales e a coca como pretexto

Calam-se vergonhosamente os organismos internacionais. O primeiro relatório da União Europeia ratificava que 6 mil hectares em Yungas eram suficientes para o consumo tradicional. O governo de Evo Morales não gostou desse relatório, obrigou a União Europeia a mudar e duplicar o número de hectares. Agora estamos “oficialmente” com quatro vezes mais, sem contar todos os hectares escondidos y todos aqueles que produzem coca fora de Yungas e do Chapare.

O presidente Morales disse que “ansiava” que o mundo inteiro se pusesse a pijchar (mascar coca) … Semelhante estupidez põe sua declaração à altura (ou baixura) das de Trump. Será que o mundo inteiro vai mascar a coca do Chapare? Nem os bolivianos gostam. 

*Colaborador de Diálogos do Sul, de La Paz, Bolívia

** Tradução: Beatriz Cannabrava

*** Revisão e Edição: João Baptista Pimentel Neto


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Alfonso Gumucio Boliviano. Cineasta e documentarista. Especialista em comunicação para o desenvolvimento com experiência mundial em comunicação participativa, mobilização social e desenho da estratégia. Foi Diretor de Comunicação da UNICEF na Nigéria e no Haiti

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