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Tarcísio veta projeto de mapeamento em áreas de risco mesmo após tragédia no litoral paulista

Em entrevista à Diálogos do Sul, o autor do PL e deputado estadual Luiz Fernando Teixeira (PT) expõe a tradição de SP de esperar a tragédia acontecer
Amaro Augusto Dornelles
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Pessoas não receberam aviso ou orientação. Não fugiram do perigo a tempo. Até agora são 66 mortos. “Irresponsabilidade oficial” até que se prove o contrário. Nesta entrevista exclusiva com o deputado estadual Luiz Fernando Teixeira (PT) à Diálogos do Sul, saiba como a direita domina a Alesp e impede a aprovação de leis que poupariam centenas de vidas.

Na posse como governador, em janeiro, Tarcísio de Souza (Republicanos) falou em trabalhar com equipe técnica, pacificação e defender os legados bolsonarista e do PSDB. Só não precisava exagerar. Há poucos dias, em 8 de março, o governador vetou o Projeto de Lei (PL) 82/2022, dos deputados Luiz Fernando Teixeira (PT), Jorge do Carmo (PT) e Márcio Nakashima (PDT).

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A proposta prevê mapear, zonear e fazer levantamento cadastral de áreas de risco. Todo ano as tormentas voltam. Deixam rastros de destruição e mortes. Até agora são 66 vítimas em São Sebastião, Ubatuba e Mauá. Pois bastaram dois meses para Tarcísio deixar estatísticas e estudos de lado. E esquecer promessas. Menos o legado tucano: afinal, em 2008, o então governador José Serra (PSDB) derrubou lei similar – da deputada Ana do Carmo (PT). Resta saber a especialidade técnica da equipe governamental.

“Ao vetar esse projeto, que contaria com um comitê especializado, formado por governo e entidades governamentais, ele demonstrou que não tem nenhuma pressa na instituição de políticas habitacionais para nosso Estado”, denuncia o petista. Com a experiência de quem trabalha com o flagelo das vítimas dos aguaceiros há anos, ele antevê que Souza só vá tomar alguma atitude quando o problema de fato acontecer. A exemplo dos antecessores tucanos. “A lei já havia sido votada. Ele poderia sancioná-la com vetos, mas vetou tudo”, insurge-se o petista.


Diferenças cosméticas

A renovação da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) ocorreu em 15 de março, porém, assim como no plano Federal, é bom lembrar que a safra de eleitos tende a ser ainda mais à direita do a anterior, mesmo com a derrota e fuga do mito para o Caribe. Na verdade, creio que eventuais diferenças entre os “modus operandi” tucano e bolsonarista são apenas cosméticas.

A PL de Teixeira não morreu, mesmo ‘vegetando’ na “Casa do Povo” desde março de 2022, e petista promete voltar à carga com projeto similar, número 99/2022, ainda não pautado pela Alesp, como manda a tradição da casa. Ele segue com sua pregação mesmo depois do veto oficial: “É preciso agir preventivamente e remover as pessoas antes das tragédias. Não retirar seus corpos quando o pior acontecer.”

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A seguir, confira mais detalhes da minha conversa com Luiz Fernando Teixeira, para entender por que as autoridades preferem deixar tudo para a última hora, fingem nada a ver com a desgraça social e conseguem se esquivar de suas responsabilidades com tamanha facilidade. 


Pecado Capital

Amaro Augusto Dornelles – Quais foram os obstáculos do PL 88/2022 na Alesp, antes do veto de Tarcísio?
Luiz Fernando Teixeira – Em março de 2022 apresentamos o Projeto de Lei. Para evitar eventuais vetos. Ele foi autoritativo: autorizou o executivo a elaborar, mapear e zonear áreas de risco em todo o estado de SP. Consegui que fosse votada e aprovada sua urgência. Mas infelizmente a Assembleia Legislativa não pautou o tema. A Alesp tem pecado na sua atuação. Nós tivemos, há poucos dias, em reunião da bancada PT, questionamos justamente a falta d’autonomia do Poder Legislativo. Projetos de suma importância são ali apresentados e precisam passar pelo crivo do líder do governo. Quando aprova, acredite: chega o chefe do executivo e veta.


Defesa Civil e Serviço Meteorológico não avisam com antecedência os desastres no horizonte?
A União tem um órgão que avisou que as chuvas no horizonte seriam pesadas. Muito acima do normal. Se o estado já tivesse o mapeamento, com o monitoramento da região, certamente teria condições de remover as famílias em zona de perigo. Vidas seriam preservadas. No começo de março cobrei o presidente Carlão Pignatari (PSDB): nós, deputados, não poderíamos ficar quietos e aguardar novas mortes. Mesmo se nós pudéssemos, a toque de caixa, fazer a Assembleia participar – legislando e cobrando do Executivo paulista para que se promova um grande mapeamento de todas as áreas de risco e com monitoramento constante – seria de grande valia.

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Em entrevista à Diálogos do Sul, o autor do PL e deputado estadual Luiz Fernando Teixeira (PT) expõe a tradição de SP de esperar a tragédia acontecer

Foto: Cris Cunha/Governo do Estado de SP
"Assembleia realmente se comporta como tal: puxadinho do Palácio Bandeirantes", denuncia Teixeira. (Tarcísio de Freitas em 20/02/2023)

Mortes por descaso

Em 2017, Luiz Marinho (PT), então prefeito de São Bernardo do Campo (SP), implantou projeto similar no município…
Pois é, desde então não tivemos nenhuma morte. Porque? Por que ele implantou nos morros de S. Bernardo um mapeamento constante. Qualquer alteração geológica, aparelhos monitoram. É isso o que queremos em todo o estado de SP. Óbvio que envolve a moradia, o governo de SP não constrói habitação social e as pessoas estão indo morar no morro. Esse é um problema grave em todo estado de SP, na capital, região metropolitana, interior. Por isso queremos que esse PL seja aprovado, seja colocado em plenário com urgência. São Paulo não pode mais ser causa de mortes por descaso. Não tenho a menor dúvida, é possível monitorar.

SP optou por não fazer nada…
Não há como negar. É crônico no estado de SP: depois de as pessoas morrerem eles se mexem. Luiz Marinho fez o que precisava fazer em SBC: levantamento das áreas assoladas e passou a monitorar a região. A técnica vale-se de pequenos aparelhos que são enterrados no solo. Eles são capazes de medir a estabilidade do terreno. É capaz de avisar os problemas antes que eles provoquem mortes e flagelos: começa a apitar e alerta as famílias.


Consequências da omissão

O que o governo do estado faz no momento?
As autoridades sabiam da intensidade das chuvas. O governo de SP avisou a população através do WhatsApp. Ou seja, pessoas não receberam aviso, muito menos orientação. Não fugiram do perigo. Poderiam ser evitadas mortes, infelizmente… Consequência da omissão do governo, e aí tem envolvimentos – sobretudo do prefeito e do governo do estado. Não busco culpados agora. Quero discutir uma solução. O estado precisa mapear as áreas de risco e monitorar. Quando acontece chuva acima do normal é preciso rapidez no escoamento das pessoas. E se possível já ter um plano para onde possam ser alojadas.

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O que o estado deve fazer ao ser alertado sobre uma tormenta em formação?
Isso é possível ser previsto com dias de antecedência. O que o estado precisa fazer? Tem de fazer o levantamento que seja levado de forma séria. Vidas foram ceifadas porque o estado de SP e seus governadores não foram sérios. Meu projeto foi publicado em março de 2022. Depois ele tramitou nas comissões, foi aprovado nelas. Aí fizeram um parecer, dia primeiro de julho de 2022, dando urgência para tramitação. Aproveito a oportunidade para fazer a denúncia: até aqui a Assembleia Legislativa tem tido uma produção muito aquém do necessário.


Obrigação do Estado

Alesp é puxadinho do Palácio?
Assembleia realmente se comporta como tal: puxadinho do Palácio Bandeirantes. Se o Bandeirantes quiser resolver, resolve. Quando não quer, o deputado não pode sequer legislar. A média é de um projeto por ano, o que é absurdo. Tem muita lei de grande importância para a população e ficam ali, brecadas. Então, que esse momento seja usado para o Legislativo agir de forma eficiente, muito mais eficiente para que o estado não espere que nenhuma vida mais seja ceifada. Para que o estado cumpra sua obrigação: monitorar áreas de risco e ter política de evacuação rápida.

Qual é o papel do governo estadual na desgraça dos aguaceiros, além do veto?
Tudo poderia ser evitado. Em março do ano passado, apresentei o PL 99/2022, capaz de evitar o que está acontecendo: áreas de risco que desabam, soterram famílias. Vidas ceifadas pelo excesso de chuvas. Infelizmente o estado de SP ficou omisso – assim como a Assembleia Legislativa. O projeto está tramitando há um ano sem ser votado. Motivo é que o governador determina a quantidade de projetos a serem aprovados. Pasme: 99% são vetados.

“Um projeto como o que apresentei poderia ajudar o Poder Público a identificar o perigo com muita antecedência e, sobretudo, agir”, afirma Luiz Fernando Teixeira

Em 2010, a deputada Ana do Carmo (PT) também aprovou um PL que determinava que o governo fizesse tais estudos. Então o governador tucano José Serra vetou. Seria ele responsável por essas mortes? O fato é que isso precisa de um basta. O PL precisa ser aprovado. Além das vítimas fatais, cidades como São Sebastião, Caraguatatuba, Bertioga e Guarujá também sofreram com a destruição de ruas, rodovias, acessos e equipamentos públicos. O Poder Público precisa agir não apenas para mitigar esses efeitos mas, principalmente, evitar novas tragédias.


Mortes e tragédias

Qual é o cenário no estado mais rico do Brasil?
O cenário de São Paulo é preocupante. O déficit habitacional é de 1,16 milhão de moradias, sendo que outras 3,19 milhões não são adequadas e seguras. O Brasil como um todo tem mais de 13,5 mil áreas de risco atualmente, sujeitas a deslizamentos e enchentes a qualquer momento, colocando em risco 4 milhões de moradores e moradoras.

Um projeto como o que apresentei poderia ajudar o Poder Público a identificar o perigo com muita antecedência e, sobretudo, agir. Evitaria ferimentos, mortes e grandes tragédias. Quem sofre, enquanto isso, é a população pobre que precisa contar com a sorte para viver e sobreviver. 

Continuarei na luta para que o PL 99/2022 seja aprovado com celeridade e que outras vidas inocentes não sejam perdidas.

Amaro Augusto Dornelles | Jornalista e colunista na Revista Diálogos do Sul.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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