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Um laivo de esperança no Peru

Gustavo Espinoza M.

Tradução:

A crise do socialismo nos anos 1990 trouxe catastróficas consequências em todos os países. O Peru não foi uma exceção. Surgiram vozes, inclusive no interior das filas do PCP que asseguraram que o Partido Comunista tinha sido “criação de Ravines”, a quem consideraram o expoente do “seguidismo”.

Gustavo Espinoza M.*
Afiche3Reivindicaram então que a crise nos obrigava a “voltar à Mariátegui” -que tinha denominado a organização política por ele criada com o nome de “Partido Socialista”- e mudar então o nome do partido para “romper com o passado”. Isto implicava, diziam, procurar “novos referentes europeus” e olhar “sem preconceitos” a outras criações “socialistas”: os Países Nórdicos, por exemplo, onde tinham forjado um socialismo “democrático” no qual os direitos dos trabalhadores eram garantidos.
Dessa ideia surgiram outras que inundaram em seu momento o cenário concreto. “É hora da concertação, e não da confrontação”, disseram aos trabalhadores, a quem trataram de convencer, adicionalmente, de que essa tal luta de classes era um mito, que tinham que formar sindicatos “de propostas e não de protestos” porque “na modernidade, tinham desaparecido as classes”; que a “classe operária” já não existia devido que a “tecnologia de ponta” a tinha absorvido.
Em suma, que o conceito de “Revolução Social” tinha deixado de ser um desafio e uma tarefa dos povos para se converter numa lenda da história. O dever, então, era competir na área legal e através de eleições, respeitando ao pé da letra os limites da democracia conhecida.
Tais ideias foram, na verdade, copiadas do ideário aprista que defendia desde então, as velhas propostas reformistas. Elas tinham sido desmascaradas em seu momento por um destacado revolucionário cubano, Júlio António Mella, que já nos anos 1920 disse com muita razão que a Apra era antes que nada uma “Associação Para Revolucionários Arrependidos”.
No âmbito interno, desde os tempos de Mariátegui, Haya de la Torre intentara persuadir os peruanos da necessidade de organizar partidos com fins eleitorais, que renunciassem a qualquer “ação direta”. Foi esse um dos temas de controvérsia na correspondência travada entre Haya e Mariátegui em 1928.
Por isso a direção aprista traiu a insurreição de Trujillo de 1931 delatou os rebeldes de Armada, a quem originalmente tinham alentado, em outubro de 1948. Depois daquilo, nenhuma experiência nova se viu no horizonte.
Porém a Apra legou também a ideia do “socialismo escandinavo”, como alternativa :’mais racional” para os povos. Foi a adesão de Haya à social democracia Europeia.
Na verdade, a social democracia adquiriu renome mundial depois da última década do século XIX, quando por iniciativa de Frederico Engles, surgiu a II Internacional. Com a morte desse companheiro de Marx, a social democracia entrou em crise e sofreu implacáveis derrotas: seu comportamento diante da Guerra de 1914 e da Revolução Socialista de Outubro, deixaram-na a ver navios.
De toda maneira, manteve uma certa vigência em alguns países, em que introduziu “reformas” que tornaram “mais digerível” o sistema de dominação capitalista. Surgiu assim uma espécie de “aristocracia operária”, de trabalhadores “mais bem remunerados”. Os partidos social democratas, nesse contexto, assumiram a liderança de uma opção “reformista”, que alcançou avanços precários em material social.
Hoje essa variante também caiu. Nesses países a social democracia foi varrida sem pena nem glória; e os “Partidos Socialistas”  dessa corrente, neste e noutros cenários, caíram no maior descrédito. É o que ocorre agora com o Psoe, na Espanha, com o Partido de Hollande na França; com a Social Democracia Alemã, e até com os Trabalhistas Britânicos. Um a um, foram perdendo não só posições como também bandeiras.
Não obstante, sua prédica fez estragos nestas plagas. A social democracia criou vínculos e conseguiu conexões e influências em diferentes esferas, tanto no plano dos partidos como dos sindicatos. Isso permitiu conseguir incidência em certos segmentos e até a “ganhar” para posições reformistas representantes sindicais que amamentou a partir de práticas oportunistas e concepções eleitoreiras.
Elas foram decisivas no Peru para impedir, no seu tempo, a concretização dos objetivos unitários impulsionados pelos setores mais sadios do movimento popular.
Hoje na esquerda peruana convivem cinco “correntes:’ que se proclamam de “esquerda”, mas que têm pontos de vistas diferentes tanto do cenário nacional como do continental. No plano interno alimentam preconceitos de típico corte anticomunista; e no plano externo buscam tomar distância, afastando-se de projetos revolucionários como o da Venezuela Bolivariana e inclusive do Processo Libertador Latino-americano.
Por isso foi gerado uma certa aura de otimismo no XV Congresso do Partido Comunista. Mais que previsões pontuais, ratificou sua convicção socialista, sua interpretação marxista-leninista e sua vocação internacionalista. E abriu um debate em torno do cenário local destacando, claro, que o objetivo essencial, sem práticas oportunistas ou eleitoreiras, é construir a unidade mais ampla para enfrentar o embate neoliberal de nosso tempo.
Em etapas de caos, quando entre amplos setores da cidadania se expande a desorientação, e quando a confusão se apodera da mente de algumas pessoas, é meritório que as forças políticas com maior experiência recuperem níveis de ação e se aprestam a atuar com renovado brio.
Em circunstâncias como esta é que devemos invocar a mensagem do Amauta. Recordemos: “Presenciamos a desagregação, a agonia de uma sociedade caduca, senil, decrépita; e, ao mesmo tempo presenciamos a gestação, a formação, a elaboração lenta e inquieta da nova sociedade. Todos os homens, aos quais uma sincera filiação ideológica nos vincula à nova sociedade e nos separa da sociedade velha, devemos olhar profundamente nesse período transcendental, agitado e intenso da história humana”, disse o Amauta nas Universidades Populares González Prada.
Vamos somar, então olhando novos horizontes, sem que nos detenham preconceitos, nem mesquinharias pessoais que a ninguém beneficiam.
*Colaborador de Diálogos do Sul, de Lima, Peru.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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