Foi numa quarta-feira, 5 de maio, na sede de um clube provinciano que foi selada, na nossa capital, a unidade da esquerda no marco do processo eleitoral que nos convoca.
Talvez dentro de alguns anos a data seja considerada um marco na história do movimento popular. E até talvez haja aqueles que a vinculem com algo que os protagonistas desse acordo simplesmente não pensaram.
Muito longe do turbulento cenário da Avenida Brasil, em sua tumba de Highgate, talvez tenha sorrido o fundador do socialismo científico. Depois de tudo, e embora provavelmente sem perceber, os peruanos lhe fizeram sua melhor homenagem, ao completar-se os 203 anos de seu nascimento.
Quase ao cair da tarde, o candidato presidencial do movimento popular, o professor Pedro Castillo Terrones, e a líder de Nuevo y Juntos por el Peru, Verónika Mendoza, subscreveram o acordo que consagrou a unidade das forças progressistas de nossa pátria, mirando ao próximo 6 de junho.
É verdade que o convênio foi rubricado no marco de uma jornada eleitoral. Poder-se-ia deduzir então que ela constitui o marco desse acordo, e que não se trata de um entendimento nem político, nem programático. Mas não é assim.
Objetivamente foi gerado um documento de coincidências pontuais que reflete um conteúdo programático. Mas, ao mesmo tempo, recolheu-se uma vontade, que foi sublinhada pelos atores principais do acordo: a de assumir a condução do país para seguir um caminho novo, de dignidade e de justiça.
Nunca havia acontecido isso no Peru. Podem ser evocados os dois acontecimentos que poderiam servir de antecedentes: em 1945 a formação da Frente Democrática Nacional que postulara o depois candidato triunfante, José Luis Bustamante y Rivero; e em 1980, o acordo constitutivo da Esquerda Unida que a projetou como verdadeira alternativa de governo e poder.

Reprodução/@Vero_Mendoza_F
O professor Pedro Castillo Terrones, e a líder de Nuevo y Juntos por el Peru, Verónica Mendoza.
Mas neste caso, o entendimento foi mais qualificado. O de 45 gerou uma aliança governamental que se truncou logo depois pela ação corrosiva do APRA. E o de 80, embora respaldado por partidos organicamente solventes e politicamente definidos, assomou como um entendimento pontual, que só depois projetou perspectivas de poder.
Neste caso, a unidade forjada é o resultado de uma fragorosa experiência de luta. Mas também a consequência de uma vontade múltipla, demandada pelas massas; e sustentada como um objetivo essencial para confirmar uma real possibilidade de vitória.
É bom então que se lhe dê o peso que tem. A unidade não soma, multiplica. E projeta um cenário que deverá subsistir, inclusive à margem dos resultados eleitorais da contenda que se avizinha.
É claro que se for confirmada a vitória eleitoral de Peru Libre na votação de junho, o acordo de 5 de maio vai colocar o movimento popular diante de um desafio gigantesco. Para encará-lo, todos teremos pela frente uma tarefa inédita.
Ela deverá ser encarada com responsabilidade e vai pressupor deixar de lado o sectarismo e a mesquinharia. Na outra variante, se a vitória for esquivada, ficará colocada a luta contra um governo írrito e vulnerável.
É que além das adesões pontuais que recebe hoje a candidata da Máfia, sua gestão apareceria ferida de morte e 80% dos peruanos sentiriam que não devem respeito, nem obediência, a um governo envilecido e ungido sobre sangue.
Além do mais, esse regime seria repudiado por povos e governos de nosso continente, e mesmo do cenário europeu. É que todos sabem da mochila sinistra que Keiko Fujimori carrega.
Agora – já dissemos antes – a América Latina é um campo de batalha no qual os povos lutam resolutamente por sua independência e soberania. E isso sabem os promotores da Força Popular, o engendro do fascismo no Peru de hoje. Os dramáticos acontecimentos da savana colombiana falam por si só.
Neles, de alguma maneira, assoma a mensagem que o keikismo oferece hoje aos peruanos. Como acertadamente assinalam as redes, oferece aos peruanos que não vivam como na Venezuela, mas que morram como na Colômbia.
E isto, no marco de uma insofrível histeria anticomunista que ameaça ressuscitar o sinistro artigo 53 da Constituição de 1933 que proibiu a existência do Partido Comunista por ser una “organização internacional”.
Nesse caso, no entanto, o marinheiro Montoya vai além. Busca tirar o direito eleitoral aos comunistas e a todos os que sua ínclita excelência considere como tal. Ele, que gargareja com a palavra “democracia”, engasga-se com ela e busca recortá-la, porque termina sendo a corda que o enforca.
Como dissera Engels em 1895, os comunistas – e todos os que nos marcam como tais – nos valemos melhor dos métodos democráticos que os próprios “democratas”. E podemos vencê-los graças à unidade que referendamos em 5 de maio e à vontade de luta de todos os peruanos.
*Colaborador de Diálogos do Sul de Lima, Peru.
** Tradução: Beatriz Cannabrava
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