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Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Verbena Córdula | Por que popularidade de Lula e do governo estão em queda?

Expectativas em torno do terceiro mandato de Lula parecem estar caindo no vazio, já que as promessas de melhorar a economia e a vida das pessoas não são verificadas na prática
Verbena Córdula
Diálogos do Sul Global
Salvador (BA)

Tradução:

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem deixado muito a desejar neste seu terceiro mandado. E a percepção pública em relação ao governo está se deteriorando, conforme demonstram as pesquisa. Nesta quarta-feira, 2 de outubro, foi divulgada a última delas, na qual 32% das pessoas ouvidas consideram o governo “bom ou ótimo”, enquanto 31% classificam a administração “ruim ou péssima”, e 33% a consideram “regular”. Em setembro de 2003 (em seu primeiro mandato), a aprovação do Presidente era de 69%. 

As grandes expectativas geradas em torno do terceiro mandato do Presidente Lula parecem estar caindo no vazio. Muitas pessoas que votaram nele esperavam um retorno de políticas sociais robustas, o que não estão vendo. Além disso, as promessas de melhorar a economia e a vida das pessoas não estão sendo verificadas na prática. 

As medidas adotadas pelo governo do Presidente Lula neste terceiro mandato têm uma orientação claramente liberal, sem falar na grande aproximação com políticos de direita. Isso tem gerado descontentamento entre as bases históricas de Lula e do Partido dos Trabalhadores (PT). A sensação de traição ideológica, especialmente entre os apoiadores mais fiéis, tem sido relevante para o deterioro da popularidade do líder Lula.  

No ano de 2010, já em seu segundo mandato, o presidente Lula bateu recorde de popularidade, chegando a alcançar 87%, conforme apontou pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública (IBOPE), em dezembro daquele ano. De acordo com o mesmo instituto, o petista chegou em dezembro, último mês de seu primeiro mandato, com aprovação de 57%, a maior desde que assumiu a Presidência.

As pesquisas atuais, incluindo esta última, realizada pela Quaest, mostram uma queda nas taxas de aprovação e um aumento nas críticas. A meu ver, o distanciamento de setores importantes da sociedade, como trabalhadores e movimentos sociais, que tradicionalmente apoiaram Lula, é outro fator que agrava essa perda de credibilidade.

No terceiro mandato do Presidente Lula, estamos testemunhando um cenário político que desafia algumas das expectativas históricas em relação ao petismo partido que se diz progressista , e também em relação a parte da esquerda brasileira que apoia o governo. As medidas liberais adotadas, assim como a aproximação com políticos de direita, têm gerado um intenso debate sobre a direção que o governo está tomando e suas implicações para a sociedade.

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Defesa dos trabalhadores?

O Ministério da Fazenda anunciou cortes de R$15 bilhões no Orçamento de 2024, justificando que estaria cumprindo as regras do marco fiscal. Essa notícia foi tão neoliberal que deixou os mercados financeiros rindo à toa. Na última segunda-feira, dia 30 de setembro, o governo deu detalhes acerca dos cortes orçamentários. O Ministério da Saúde teve uma redução de R$ 4,5 bilhões, como se o SUS não necessitasse desses recursos. Já o da Educação, “dançou” com uma diminuição de R$ 1,4 bilhão, como se tudo estivesse “um mar de rosas” em termos de educação no país. No que concerne ao Ministério das Cidades, o corte foi de R$ 1,8 bilhão. É que para o governo de Lula, nossas cidades estão tão perfeitas que um “cortezinho” no orçamento não lhes fará falta.

Não bastasse isso, no que tange às emendas parlamentares aqueles recursos que deputados e senadores utilizam para fazer campanhas em seus estados, mas justificam que utilizam com fins nobres —, o Partido Liberal (PL), de Jair, foi o que mais se beneficiou com a liberação desses recursos. De acordo com dados disponibilizados pelo portal Siga Brasil, foram mais de R$ 2,7 bilhões em emendas individuais indicadas por deputados direitistas. E, em segundo lugar, ficou o Partido Progressistas (PP), também de direita, com R$ 2,08 bilhões.

Historicamente, o PT sempre se posicionou como um partido voltado para a defesa dos direitos trabalhistas, da inclusão social e da intervenção do Estado na economia. No entanto, Lula parece estar adotando uma estratégia mais pragmática, buscando estabilidade e crescimento econômico, sem se importar com questões de cunho mais social. A implementação dessas políticas liberais pode ser explicada pelo governo como uma tentativa de atrair investimentos e restaurar a confiança no mercado, especialmente após anos de crises e polarização política, mas, na prática, tem gerado mesmo é o afastamento de muita gente progressista. 

Essa aproximação de Lula e seu governo com figuras da direita, assim como a inclusão de políticos de partidos como o centrão em seu governo, têm sido interpretadas de diferentes maneiras. Por um lado, essa estratégia pode ser considerada uma tentativa de promover a governabilidade em um Congresso fragmentado, onde a construção de alianças se torna essencial para aprovar medidas e garantir a continuidade do governo. Por outro, no entanto, levanta questões sobre os compromissos ideológicos do PT e os riscos de diluição de suas bandeiras históricas. A meu ver, já não se trata de risco, porque aquelas bandeiras já foram diluídas há tempo.

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“Suavizando” o tom em relação a Israel e Venezuela

Essa mudança de direção também provoca reações dentro da própria base do partido, onde há uma preocupação com a perda da identidade e dos princípios que sempre direcionaram a militância histórica petista. Para muitos e muitas, a luta por justiça social e igualdade não pode ser sacrificada em nome de uma governabilidade que prioriza acordos com setores que, historicamente, se opuseram a essas causas.

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Por fim, o desafio para Lula será encontrar um equilíbrio entre a necessidade de implementar reformas que respondam às demandas econômicas do país e a manutenção dos compromissos sociais que definiram sua trajetória política. A capacidade de dialogar com diferentes espectros ideológicos sem perder a essência de seu projeto é o que poderá definir o legado desse terceiro mandato, em um Brasil que anseia por soluções eficazes e justas para seus problemas estruturais. Mas, “pelo andar da carroça”, isso não acontecerá. 

Há discussões sobre flexibilização das leis trabalhistas, com o objetivo de “modernizar a legislação” e torná-la mais adaptável às novas realidades do mercado. Ou seja, mais “porrada” na classe trabalhadora. Embora o PT tenha uma histórica resistência a privatizações, há indícios de que o governo está aberto a discutir “parcerias público-privadas” e concessões em setores estratégicos, como infraestrutura, que, na prática, são privatizações disfarçadas.

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A política exterior do terceiro mandato de Lula tem apresentado uma mudança significativa em relação a algumas das posturas mais críticas de seus mandatos anteriores. Essa nova abordagem tem se caracterizado por um alinhamento mais próximo com o Ocidente. O presidente tem buscado reestabelecer relações mais positivas com países ocidentais, especialmente com os Estados Unidos e a União Europeia, segundo o governo para atrair investimentos e fortalecer laços comerciais. Mas a coisa fica ainda pior quando, em contraste com sua postura anterior, Lula “suaviza” as críticas a Israel e o massacre da população de Gaza. O governo tem adotado, também, uma posição mais “cautelosa” em relação à Venezuela.

Essas e outras questões certamente têm levado parte considerável de pessoas com posturas de esquerda e também progressistas a deixar de apoiar o governo do Presidente petista, por considerar que o mesmo tem se distanciado bastante daquilo que se poderia esperar, mesmo sabendo que Lula e o PT não são de esquerda.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Verbena Córdula Graduada em História, Doutora em História e Comunicação no Mundo Contemporânea pela Universidad Complutense de Madrid e Professora Titular da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhéus, BA.

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