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Versão ucraniana do “massacre” em Bucha tem mais pontas soltas do que evidências

Cenas de corpos surgiram quatro dias após exército russo deixar território; em declaração divulgada em 31 de março, prefeito não mencionou mortes de civis
M. K. Bhadrakumar
Outras Palavras
São Paulo (SP)

Tradução:

Uma indignada Moscou exigiu furiosamente uma reunião do Conselho de Segurança da ONU na segunda-feira, por conta das alegações de atrocidades que teriam sido cometidas pelas tropas russas em áreas próximas de Kiev durante o último mês. Prima facie, as alegações são fake news, mas podem moldar percepções errôneas no momento em que são publicadas como desinformação.

Uma reportagem da agência russa Tass afirma: “O ministro da Defesa russo disse no domingo que as Forças Armadas russas deixaram Bucha, localizada na região de Kiev, no dia 30 de março, enquanto ‘as evidências de crimes’ surgiram apenas quatro dias mais tarde, depois que os oficiais do Serviço de Segurança Ucraniano chegaram à cidade. O ministério enfatizou que em 31 de março, o prefeito da cidade, Anatoly Fedoruk, confirmou em uma declaração em vídeo que não havia soldados russos em Bucha. No entanto, ele não disse nem uma palavra sobre civis assassinados nas ruas com as mãos amarradas nas costas”.

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Ainda mais surpreendente é que, poucos minutos após as “notícias urgentes”, os líderes ocidentais – chefes de Estado, ministros de relações exteriores, ex-políticos – pipocaram com declarações já preparadas e baseadas apenas em vídeos, de apenas alguns segundos, e um conjunto de fotos, prontos a despejar acusações. Não se viu nenhuma opinião de especialistas, nenhum trabalho forense foi feito, não se deu nenhuma oportunidade aos acusados de serem ouvidos.

O presidente francês Emmanuel Macron interrompeu sua campanha eleitoral, na qual está em uma disputa quente com Marine Le Pen pela reeleição no pleito do próximo domingo, para brandir que as alegadas atrocidades cometidas pelos russos são um “crime de guerra”. O mesmo fez o chanceler alemão Olaf Scholz, que também vive grande dificuldade em uma Alemanha que fecha o mês de março apresentando uma inflação de 7,3%.

Não há nada de inusitado em políticos que se encontram nas cordas abraçarem o monstro da vez. Mentes inteligentes como Macron e Scholz já devem estar se dando conta da precariedade de suas políticas, que levarão inexoravelmente a uma derrota tão estratégica para a Rússia. Mas a grande questão é: por que tamanha teatralidade só neste momento?

As fake news surgiram bem no momento em que a Fase 2 da operação especial da Rússia está prevista para começar, dentro de uma semana, na região oriental de Donbass. Algo como 60 a 80 mil soldados ucranianos, classificados como sendo as melhores unidades de suas forças armadas, foram cercados em Donbass.

Cenas de corpos surgiram quatro dias após exército russo deixar território; em declaração divulgada em 31 de março, prefeito não mencionou mortes de civis

Dmytro Kuleba – Reprodução / Twitter
Moscou exigiu furiosamente uma reunião do Conselho de Segurança da ONU para discutir questão

A finta russa deu resultado ao prender as forças ucranianas em Kiev durante todo o mês passado. Quando a verdade se abateu sobre Kiev (e seus “conselheiros” ocidentais), o estrago já estava feito. A enormidade da situação resultante demanda alguma explicação.

O mapa dos Novosti reproduzido acima (infelizmente, em língua russa) sobre a situação exata do território a partir de 3 de abril e o comentário de Ivan Andreev, um experiente correspondente de guerra que cobriu as operações russas na Síria, mostram a importância do caldeirão armado em Donbass, onde o crème de la crème das forças ucranianas, que reúne várias divisões, está aprisionado, isolado, por forças inimigas, de sua base logística e outras forças amigas.

O caldeirão é bastante grande, marcado em listras azuis e pretas no mapa, nos limites superiores da região de Donbass, na direção de Kharkiv. A enorme coluna russa que se retirou da região de Kiev há uma semana está manobrando em um grande arco em direção àquele caldeirão contornando Chernihiv no norte e as cidades de Sumy e Kharkiv (perto da fronteira russa no nordeste).

As forças ucranianas estão bem armadas e se fortificaram pesadamente, mas não têm como escapar da armadilha. Também não é viável para Kiev enviar reforços, já que o campo a oeste consiste em terras agrícolas totalmente abertas (até o rio Dniepr). Os russos têm a supremacia aérea e é impossível esconder qualquer movimento inimigo de seus olhos.

As forças russas puseram fora de ação todos os aeroportos próximos e destruíram sistematicamente as reservas de petróleo ucranianas próximas durante a Fase 1 da operação. Como escrevi em um texto anterior, há três dias as forças russas infligiram um golpe devastador: “Notavelmente, o aeroporto militar de Mirgorod, na região central de Poltava, um centro estrategicamente importante, foi desfeito e vários helicópteros de combate e aeronaves ucranianas encontradas em seus estacionamentos camuflados, assim como depósitos de combustível e de armas de aviação, foram destruídos”.

Igualmente, Kharkiv foi cercado e “em um ataque de alta precisão com os mísseis táticos operacionais Iskander na sede da defesa na cidade na quinta-feira, ‘mais de 100 nacionalistas e mercenários de países ocidentais’ foram confirmados como mortos”.

No entanto, espera-se que as forças ucranianas efetivamente lutem, em vez de se renderem – embora cercadas, sem cobertura aérea e sem ter espaço para alternar forças ou combustível suficiente para se envolverem em uma guerra de manobra e com as munições acabando.

Com certeza, uma grande batalha está se aproximando, a mais decisiva em toda a operação especial russa até agora. O problema é que o caldeirão também tem um grande número de assentamentos de população etnicamente russa (incluindo portadores de passaporte russo) e a ofensiva será uma longa batalha pacientemente executada para evitar baixas civis ou destruição da infraestrutura civil.

Fase 2

Ou seja, a Fase 2 pode durar alguma coisa como um mês ou mais para ser concluída. Não se enganem, os russos têm que vencer esta etapa (o que eles farão), pois também estarão quebrando a coluna vertebral das forças armadas ucranianas. Apesar de todo o alarido de Zelensky, Kiev perceberá a enormidade da derrota e seus mentores ocidentais também verão a consumação dos maus presságios.

Com certeza, veremos um mês inteiro pela frente em que a estratégia ocidental será fabricar incessantemente notícias falsas, intensificar a guerra de informação. Até mesmo algumas operações de bandeira falsa podem ser encenadas sob a supervisão de agentes da inteligência ocidental.

Na pior das hipóteses, Kiev pode até mesmo jogar sua última cartada: armas químicas. A Rússia divulgou detalhes de locais onde a Ucrânia mantém estoques de armas químicas. Sabe-se que os EUA forneceram, como ajuda militar, equipamentos especiais (como máscaras de gás, roupas de proteção, etc.) para lidar com armas químicas e deram treinamento especial para proteção coletiva.

A afobação com que Macron e Scholz engoliram as notícias falsas é um prenúncio de uma nova fase na guerra da informação. Em poucas palavras, há uma sóbria tomada de consciência em Paris e Berlim de que a operação russa está cumprindo com sucesso os objetivos estabelecidos.

“Abril”, escreveu T.S. Eliot em sua obra-prima O Páramo, “é o mês mais cruel, gerando flores a partir da terra morta, misturando Memória e desejo, remexendo raízes sem vida com a chuva da primavera”. Mas a ironia de abril deste ano será que a fecundidade e a renovação aqui falará da regeneração da Rússia em um mundo de história e mitos gerados por mentes ocidentais em quarentena.

M. K. Bhadrakumar, no Indian Punchline
Tradução: Maurício Ayer


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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