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Vivemos cenário pior que guerra nuclear: única saída é pelo Brics, diz Paulo Cannabrava

Guerra nuclear não se ganha e nunca deve ser travada, mas há outro conflito pior, travado no campo cultural e psicossocial que avança de forma desmedida
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Nota da Edição: na terça-feira (22), o Instituto Schiller realizou o “terceiro seminário de dirigentes políticos e sociais do mundo: Paremos o perigo de uma guerra nuclear, já!”, que contou com dirigentes políticos e sociais de todo o mundo. A seguir, compartilhamos a versão traduzida ao português da exposição feita pelo editor da Revista Diálogos do Sul, Paulo Cannabrava Filho no evento: 

Aqui se faz um chamado à paz, uma mobilização de personalidades no mundo todo para que paremos o perigo de uma guerra nuclear, já! Do meu ponto de vista, só há uma maneira de dar fim a essa ameaça, que é o risco de todas as guerras: acabar com a expansão da hegemonia dos Estados Unidos.

O risco de guerra nuclear é iminente, é real, tão real como a loucura que afeta certos dirigentes submissos aos grandes senhores do capital, que se arvoraram em donos do mundo. Que esse risco não consiga desviar a atenção de outra guerra que está sendo executada contra os povos do mundo, particularmente no ocidente, sob a hegemonia o dólar.

Se trata aqui da guerra cultura, psicossocial. Uma guerra midiática, cibernética, de narrativas, que utiliza as palavras como arma. E são elas as mais mortais, as mais perigosas de todas as armas. Vocábulos, que poderiam gerar esperança, cooperação, harmonia entre os seres, estão sendo utilizados para gerar medo, ódio, confronto, a promover o caos.

E essa guerra está sendo vencida pelos senhores de todas as guerras.

Uma guerra nuclear não se pode ganhar e nunca se deve travá-la, constatam os especialistas do Conselho de Segurança da ONU. Porém, esse mesmo Conselho, criado para resolver conflitos e assegurar a paz, ao contrário, está atuando em direção ao agravamento das tensões. Transformou-se em um instrumento a mais das políticas expansionistas dos Estados Unidos, uma ferramenta da Organização do Tratado Atlântico Norte (Otan).

Para mudar isso, é necessário ampliar o número de membros permanentes e acabar com o poder de veto. Vetam por seus próprios interesses porque têm a força. Haverá paz quando impere a força moral no lugar da força das armas.

Europa volta a ser ocupada

Às vésperas dos 80 anos do fim da segunda guerra inter-imperialista, se constata que as conferências de IaltaPotsdam significaram curtos armistícios. O que ocorreu na Europa durante esses anos? Do continente, debilitado por duas guerras, saíram os nazis-fascistas, entraram os anglo-saxões — estadunidenses e britânicos.

Entraram para nunca mais sair. O Plano Marshal de recuperação para a Europa foi um dos aspectos da estratégia de ocupação através de uma guerra cultural utilizando todos os meios. Acabou a belle époque e as sociedades de bem-estar social deram lugar à sociedade de consumo, ao reino da coca-cola.

Transcorridos menos de 40 anos do armistício, a Europa está novamente ocupada militar e economicamente. Inicia outra quadra de décadas sob a égide do neoliberalismo, com a ditadura do pensamento único imposta pelo capital financeiro e a cartilha do Consenso de Washington como modelo de gestão da economia.

Do ponto de vista do desenvolvimento econômico e social, foram quatro décadas perdidas. O resultado se pode resumir nas expressões cheias de significados como: desestatização, privatização, desindustrialização, desnacionalização, desregulamentação, precarização, desemprego, desalento, miséria… que abundam por toda a União Europeia, tal como nos países em desenvolvimento.

Guerra nuclear não se ganha e nunca deve ser travada, mas há outro conflito pior, travado no campo cultural e psicossocial que avança de forma desmedida

Montagem Pixabay
Hegemonia do dólar deixa mundo à beira do apocalipse


Mergulhada em crise terminal do sistema e seu modelo neoliberal, a Europa se vê arrastada a mais uma aventura bélica, ao — praticamente — declarar-se em guerra contra a Rússia. Sim, porque decretar um bloqueio econômico é um ato de guerra, assim como fornecer tecnologia, armas, munições e inteligência a uma potência beligerante é, per se, um ato de guerra.

Surpreende que os mais prejudicados por essa guerra sejam os mesmos países que a deflagraram. O tiro lhes saiu pela culatra. À crise econômica, sem saída no sistema, se soma a crise energética. Por conta do bloqueio imposto à Rússia, os preços dispararam e começa a faltar de tudo, e isso às vésperas do inverno.

Tudo isso em prol de uma ordem mundial unipolar, que não existe nem nunca existiu, pois contempla uma minoria de menos de um quinto dos povos do mundo.

Os Estados Unidos precisam manter a Europa colonizada para sobreviver; têm que manter o continente para seus objetivos de guerra e deter a Rússia e a China. Apesar de tudo, já não há mais lugar para hegemonias.

BRICS

O mundo mudou. A China é a maior potência econômica, a Rússia, bélica, e o Brics — grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — já se impõe como uma realidade multipolar. Em um mundo de cooperação e integração, não cabe invasão, ocupação e guerra.

Não obstante, a Doutrina Biden, evidencia que, para o Império, tanto a China como a Rússia e os Brics são os inimigos a serem combatidos.

Apesar disso, por iniciativa de China, está sendo edificado um sistema alternativo, livre do sistema do dólar, que se funda na cooperação para o desenvolvimento e construção de infraestrutura para incrementar o intercambio comercial. 

Batizado como Nova Rota da Seda,o projeto contempla o Banco de Desenvolvimento do Brics, o Banco Asiático de Investimento e um sistema alternativo interbancário fundado em uma cesta de moedas locais e com lastro nas riquezas de cada país.

O Brics representa mais da metade da população do planeta. Atrativo como é por apontar para independência, estar livre da tutela do dólar, já tem como candidatos a ingressar: Argentina e México, em Nossa América; Irã e, inclusive a Arábia Saudita, que até outro dia era fiel serva de britânicos e ianques.

Segundo as Nações Unidas, a população da terra chegou a oito bilhões de humanos e há uma bomba, talvez a maior de todas, pronta para explodir, que são as 828 milhões de pessoas com fome. Esse número de famintos pode ser muito, muito mais se persistirem a voracidade da sociedade de consumo, a ocupação predadora das terras, se não for parado o aquecimento, como vaticinam os especialistas na COP 27, realizada no Egito.

A solução para esta e outras bombas está na proposta dos Brics, na qual não cabe hegemonia. Essa estrutura deve estar fundada na cooperação entre os povos para o desenvolvimento, construindo infraestrutura, fortalecendo o comércio intra-regional, o intercâmbio de saberes, sem imposições e em benefício de toda a humanidade. Assim se constrói a paz e com isso venceremos!

Intervenção na conferência internacional Paremos o perigo de uma guerra nuclear, já, transcorrido na Câmara de Deputados do México e virtualmente, organizado pelo Instituto Schiller, em 22/11/22.

Paulo Cannabrava Filho, jornalista editor da Diálogos do Sul e escritor.
É autor de uma vintena de livros em vários idiomas, destacamos as seguintes produções:
• A Nova Roma – Como os Estados Unidos se transformam numa Washington Imperial através da exploração da fé religiosa – Appris Editora.
Resistência e Anistia – A História contada por seus protagonistas – Alameda Editorial
• Governabilidade Impossível – Reflexões sobre a partidocracia brasileira – Alameda Editora
No Olho do Furacão, América Latina nos anos 1960-70 – Cortez Editora


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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